Eu não sou pai, mas tenho plena noção de que a vida de uma pessoa muda completamente após o nascimento de um filho. Bom… da maioria pelo menos. O peso da responsabilidade e da educação das crianças transforma a pessoa que curte tudo, diz sim para tudo, para uma cuja vida é cheia de nãos. Não pode isso, não pode aquilo. A vida se torna um emaranhado de regras.
Então é com alguma surpresa que, em Dia do Sim (Yes Day, EUA, 2021 – Netflix) Allison (Jennifer Garner) percebe que, depois de ser a garota que aproveitava a vida e dizia sim para todas as aventuras, ela se tornou a mãe que diz não o tempo todo para os filhos e, para eles, se tornou a mãe chata, controladora e ditadora. Quando entende que, enquanto isso, o pai passa a mensagem do cara legal e divertido e que seus filhos podem estar recebendo a mensagem errada na sua educação, toma uma atitude radical: influenciada pelo treinador da escola, o casal descobre o tal “dia do sim” e, num rompante de “olha como eu sou divertida”, ela resolve usar a tática com as crianças.
Como se trata de um filme para toda a família, Allison e Carlos Torres (Edgar Ramírez) vão estipular regras: o dia do sim terá de ser merecido e conquistado com boas notas e bom comportamento. E, nas 24 horas que os pais devem dizer sim para tudo, regras também são estabelecidas como orçamento, distância de casa e não pedir nada ilegal (ufa!).
Dia do Sim é adaptado de um livro infantil escrito por Amy Krouse Rosenthal, bestseller nos Estados Unidos que parte da mesma premissa: um dia onde os pais digam somente SIM para seus filhos. E, no fim das contas, para si mesmos. Voltar a ser criança, permitir-se ser bobo ou “irresponsável” (dentro dos limites, é claro), voltar a sentir prazer em coisas que há muito deixamos para trás. Por que não? A liberdade pode ser tanto para as crianças quanto para os adultos. Sair com as roupas que os filhos escolheram pra você, ir ao show de uma banda adolescente, empanturrar-se de sorvete logo de manhã. Por que não? Quando foi que passamos a dizer só não para tudo, inclusive para nós mesmos?
Claro que a grande mensagem é a de que o sim também pode ter consequências. Às vezes mais desastrosas que o não, inclusive. Mas, pelo sim ou pelo não, as crianças aprendem sobre responsabilidades e consequências. De maneira mais divertida que uma lista infindável de regras, podem valorizar e entender a educação dos pais. Estes pais, usando a desculpa de que estão fazendo isso pelos filhos, podem se permitir pequenas bobeiras e infantilidades pelo menos por 24 horas.
Desde a primeira princesa da Disney tanto seu conceito quanto o mundo mudaram bastante. De 1937 (quando o filme Branca de Neve e os Sete Anões foi lançado) pra cá muita coisa também mudou. Ainda bem!
De mulheres que dormiam esperando seu príncipe (como Branca de Neve ou Aurora) a outras que tinham como único objetivo de vida se casar (como Ariel, Jasmine ou Cinderela), foi um longo caminho até que uma princesa mais “ativa” e a diversidade aparecesse em Mulan (1998) e a primeira que realmente trabalhava fora – e a primeira negra – na pele de Tiana (de A Princesa e o Sapo, de 2009). Daí pra frente a evolução foi cada vez mais rápida e melhor, até que chegamos em Merida (Valente, 2012) e Moana (2016), que sequer tinham um príncipe na mira.
Então nada mais natural que alcançarmos um ponto onde a figura masculina sequer aparece em Raya e o Último Dragão (Raya and the Last Dragon, EUA, 2021 – Disney). Raya surge em 2021 como o símbolo do girl power que tomou conta da sociedade e de Hollywood: ela se basta, ela não precisa da ajuda de homens, ela é independente e pretende salvar o mundo sozinha. E não tem nada de errado nisso!
O longa, majoritariamente de personagens asiáticos, conta a história de Raya, a filha do chefe de uma tribo de um lugar que um dia se chamou Kumandra. De acordo com informações, o local ficaria no sudeste asiático – região da Ásia entre a China e a Austrália composta por diversas ilhas e países como Tailândia, Indonésia, Laos, Filipinas, Malásia, Singapura e Vietnã. Raya seria, portanto, a primeira princesa da Disney desta região.
Antes unido, hoje Kumandra se divide em cinco partes inimigas que brigam pelo poder. Por conta da cobiça dos homens, o reino foi destruído, os dragões extintos e uma estranha bruma passou a aterrorizar os moradores de todas as divisões, transformando tudo o que se toca em pedra e cinzas e acabando com a vida. A única possibilidade de salvação é encontrar o último dragão. Ele pode restaurar a vida um dia eliminada e trazer a paz. O que faz deste um filme sobre otimismo e confiança, que deixa como grande mensagem uma questão: não confiamos mais nas pessoas porque o mundo se tornou um lugar ruim ou o mundo se tornou um lugar ruim justamente porque não confiamos mais nas pessoas?
É bem verdade que Raya e o Último Dragão por vezes parece um grande mash up de outras coisas que já vimos, como Kung Fu Panda, Mulan e Mad Max: Estrada da Fúria. Não que isso seja uma coisa ruim (e não é!) e duas produções ecoam bastante. Em seu estilo “equipe em ação” e, principalmente em um acontecimento específico quase no final do filme, ele remete muito a Operação Big Hero. Por falar em dragão voador + guerreiro + sombra que destrói a vida, alias, é impossível não pensar em A História Sem Fim.
Mas nada disso tira a magia do longa. O final emocionante, a mensagem, as cenas de luta impressionantes e um visual de cair o queixo (preste atenção nas texturas e brilhos dos tecidos, pelos e cabelos) fazem de Raya e o Último Dragão mais um clássico da Disney. É só uma pena que o filme não terá a exposição que merece. Quem sabe a partir de 23 de abril, quando o título chegar sem custo adicional ao Disney+, ele ganhe maior visibilidade. Porque, definitivamente, merece.
Longa brasileiro repete clichês das histórias do gênero mas encontra seu ritmo e proporciona diversão com uma boa comédia familiar natalina
Texto por Ana Clara Braga
Foto: Paris Filmes/Divulgação
No final de ano é inevitável a chegada dos filmes de Natal. Embora já esperados pelos entusiastas (e odiados de antemão pelos haters), os longas natalinos nem sempre surpreendem. O arroz com feijão das produções muitas vezes é o suficiente para alegrar quem sai do cinema, mas a monotonia também pode ser inimiga mortal do gênero. 10 Horas Para o Natal (Brasil, 2020 – Paris Filmes) é uma produção nacional dirigida por Cris D’Amaton que acompanha a saga de três crianças, Julia (Giuilia Benite), Miguel (Pedro Miranda) e Bia (Lorena Queiroz) para organizar o Natal de sua família. Cansados de parentes chatos e da família separada, os irmãos se unem em prol de um final de ano melhor.
O filme é uma mistura de Um Natal Muito, Muito Louco, protagonizado por Tim Allen e Jamie Lee Curtis, e Os Batutinhas, releitura recente da antiga série em que as crianças cometem mil e uma trapalhadas com espírito natalino. Aliás, espírito é a palavra que melhor descreve a história. Todos os clássicos dos filmes de final de ano estão reunidos: a mensagem de união, piadas com Papai Noel, reflexão sobre o verdadeiro significado do feriado. É bonitinho, mas não é inovador.
A escolha por começar o filme com narração é questionável, principalmente se ela será inconstante. As intervenções de Julia utilizando a quebra da quarta parede revelam-se em sua maioria desnecessárias, em nada contribuem à história e são um recurso descartável. Giuilia Benite (mais conhecida por ser a Mônica dos cinemas) está ótima no papel, mas nem seu carisma salva as interações diretas com a câmera.
Histórias que escolhem focar muito tempo no elenco infantil precisam tomar cuidado para não apelarem, justamente, apenas ao humor infantil. Filmes para toda a família precisam de um equilíbrio entre a inocência e o que de fato fará quem pagou o ingresso rir. As cenas da irmã mais nova se esgoelando de chorar para conseguir o que quer com certeza não fará nenhum pai rir. A adição de Luis Lobianco ao trio é a medida exata para o humor equilibrar. Nem sempre ele é certeiro e muitas piadas apenas são sem graça, mas o humorista contribui para bons momentos, como a sequência do mercado.
É válida a tentativa da ideia de uma família tipicamente brasileira, a começar pelo sobrenome Silva. Os personagens são construídos para que quem veja o filme consiga identificar a si e outros membros de sua própria família, o tio chato, as tias fofoqueiras, a avó coruja, a mãe durona, o pai crianção.
O número musical no meio do filme, por sua vez, não funciona. É esquisito. A música em si não é ruim, mas o número parece desajeitado onde foi colado. Se fosse nos créditos finais teria sido algo mais efetivo. O ator Pedro Miranda é ex-The Voice Kids e provavelmente não queriam perder a oportunidade de aproveitar os talentos da criança. Porém, em questão de montagem, foi uma má escolha.
No todo, 10 Horas Para o Natal começa fraco mas acaba encontrando um ritmo. Não é inovador e espetacular, mas entrega o que propõe: uma comédia familiar natalina. E com atores que já falam o idioma português.
Charlie Kaufman usa e abusa de simbologias e flerta com o surrealismo para abordar temas tão (tristemente) presentes no cotidiano
Texto por Andrizy Bento
Foto: Netflix/Divulgação
No currículo de Charlie Kaufman constam os roteiros de Quero Ser John Malkovich e Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças. Sinédoque, Nova York e Anomalisa também carregam sua assinatura, não apenas no texto como na direção. Os fãs de cinema indie conhecem seu estilo e os que ainda não assistiram a algum destes títulos provavelmente nem ficarão surpresos quando os créditos finais surgirem na tela após uma sessão de cinema no meio de Estou Pensando em Acabar Com Tudo (I’m Thinking Of Ending Things, EUA, 2020 – Netflix). Já os desavisados e não habituados ao trabalho dele, bem como os fãs do livro no qual o longa se baseia, correm o sério risco de se decepcionar. Ou de ficar extremamente confusos com as escolhas narrativas e estéticas (que, por vezes, soam absurdas) adotadas por Kaufman para contar a sua versão da história.
Disponível na plataforma de streaming Netflix desde o dia 4 de setembro, o filme adapta o romance homônimo do autor canadense Iain Reid. Mas como Kaufman é, sobretudo, um criador na acepção da palavra – que gosta de esbanjar originalidade tanto no que concerne a questões de roteiro quanto de visual – obviamente, ele dispensou a fidelidade ao material de origem. Portanto, não se limita – tampouco se contentaria com isso – em contar a mesma história presente nas páginas do livro. Inclusive, mudou completamente o final.
Lucy (ao menos, a princípio, é assim que ela se chama), interpretada por Jessie Buckley, decide pegar a estrada em uma curta viagem com o namorado para visitar os pais dele na fazenda em que vivem, mesmo em meio a uma tempestade de neve. O casal ainda está bem no início do relacionamento, tendo se conhecido há poucos meses. A garota percebe as inúmeras qualidades presentes em Jake (Jesse Plemons), declarando que se trata de um rapaz inteligente, simpático, sensível. Contudo, não consegue evitar pensar que há algo de errado com ele. “Estou pensando em acabar com tudo”, ela repete sistematicamente. Ela está se sentindo sufocada, mas é como se estivesse em processo de perceber isso. No carro, durante a viagem, Jake atinge um novo patamar de manterrupting ao conseguir até mesmo interromper os pensamentos da namorada. Ela gostaria de um pouco de silêncio e espaço durante a viagem, apenas para mergulhar em uma rápida reflexão e tentar colocar as coisas em ordem na sua cabeça, enquanto observa a melancólica paisagem ao redor, tão agredida pelo rigoroso inverno.
O filme acompanha toda a viagem de ida e volta de carro do casal, com uma parada na casa dos pais de Jake na fazenda, outra em uma sorveteria 24 horas e, por fim, no colégio onde ele estudou. Todos esses espaços, em sua maioria claustrofóbicos, são reveladores e corroboram a construção do personagem de Plemons, nos oferecendo mais e mais de sua personalidade confusa e sombria. Expandem tanto a percepção que a protagonista carrega quanto a que o espectador tem sobre ele.
Jake fica desconfortável ao lado da namorada na presença de seus pais (Toni Collette e David Thewlis). Em cenas histriônicas, que quase descambam para a galhofa, percebemos que os pais dele são bastante inconvenientes em diversas colocações e questionam tudo. Mas é como se Jake os culpasse totalmente por sua miséria. A sequência na fazenda já deixa explícita a assinatura de Kaufman, pois é quando os personagens começam a sumir e ressurgir na tela, ora mais velhos, ora mais jovens, como se a protagonista tivesse um vislumbre de todo o passado, presente e futuro do namorado ao lado dos pais. Quando ela, enfim, deixa a casa dos sogros, Jake atribui sua confusão ao excesso de vinho que ela bebeu durante o jantar.
Além da família, outra das instituições com a qual Jake revela uma relação conflituosa (o que é sinalizado por meio de algumas linhas de diálogo) é a escola. Outro dos espaços com os quais sua vida possui uma conexão intrínseca. É ao estacionarem no colégio, que a protagonista, já totalmente atormentada pelo que viu na fazenda, pelos diálogos sufocantes com Jake no carro e pela estranha conversa com a atendente da sorveteria – que expressou verbalmente a preocupação com sua integridade –, começa a se perguntar (ainda que não com todas as letras) se está em um relacionamento abusivo.
Ela diz que Jake nunca bateu nela e que suas interações sexuais foram boas, na maior parte das vezes. Mas está tomada por dúvidas. Afinal, em tentativas contínuas de rebaixá-la intelectualmente, ele insiste em corrigi-la ou citar livros que ele sabe que ela não leu. Durante a viagem, ela avisa repetidas vezes que precisa voltar para casa logo a fim de trabalhar em um artigo, mas ele propositalmente distorce suas palavras, perguntando se ela quer voltar para a fazenda. Por meio de pequenas mas suficientemente nocivas manipulações mentais, ele tenta convencer a garota de que o problema está somente nela.
A obra investe em alegorias para tratar de assuntos sérios e delicados como se toda a narrativa ocorresse em um plano de delírio. Intercala a verborragia dentro do carro (inclusive com um diálogo brilhante sobre o filme Uma Mulher Sob Influência, de John Cassavetes), com cenas altamente nonsense, que emulam musicais e trazem porcos em animação e jingles persuasivos de uma franquia de sorvetes. Desse modo, jamais traindo seu estilo, Kaufman explora a toxicidade das relações, a solidão, o abandono, a perda de identidade, o sexismo tão enraizado na sociedade – que trata de maneira cruel aquelas que têm sua juventude apagada pelos anos e ousam envelhecer. Compõe tanto uma narrativa aterradora com um toque lúdico, quanto uma fantasia com contornos de suspense, garantindo uma experiência inquietante ao espectador.
Se Kaufman erra a mão em algum ponto, é no fato de, desde o começo, apresentar sua história sob a ótica da personagem de Jessie Buckley – até mesmo contando com a narração desta e deixando inequívoco que se trata de uma visão feminina para os temas que planeja tratar – para, então, transferir o protagonismo da metade em diante a Jake. A namorada passa a ser uma peça ou esquecida de sua memória ou a figura idealizada que fica ao seu lado – à sombra do homem. Sabemos que, infelizmente, não deixa de ser uma realidade com a qual nos deparamos através de décadas e que vem dando passos gradativos (não por falta de empenho, mas de oportunidades e igualdade entre gêneros) em direção a mudanças. Mas, ao final, a história toda parece ter girado em torno de Jake, tendo sua narradora simplesmente como aquela que o coadjuvou.
É particularmente curioso quando alguém diz que os filmes de Kaufman são complexos, comparando-os a labirintos e alegando que o espectador possui a difícil tarefa de montar as peças de seus alucinados quebra-cabeças. Eu, pelo contrário, acho que seus filmes são perfeitamente estruturados e suas metáforas, compreensíveis. Óbvio que há uma coisa ou outra que continua parecendo sem sentido após as sessões de seus longas (mas o quanto disso é realmente simbolismo na tentativa de transmitir uma mensagem e o quanto se trata apenas de conceito, de caprichos e idiossincrasias para corroborar a assinatura do autor?). De qualquer maneira, acredito que a forma é que é insana e absurda; a mensagem, entendível e bastante lúcida.
Como o próprio Kaufman diz lá pelas tantas, por meio de uma das falas da personagem sem nome (ora Lucy, ora Louisa, ora Amy), trata-se de imprimir universalidade ao específico. Nisso, o cineasta continua sendo um especialista.
Novo disco solo registra a clausura pandêmica com muitas memórias afetivas, críticas à ignorância e belas parcerias multinacionais
Texto por Janaina Monteiro
Foto: Dudi Polonis/DeckDisc/Divulgação
Quando muitos procuram legitimar seu discurso contra a injustiça aos berros, exaltando a raiva, eis que surge o caminho inverso: o da voz doce e terna de Fernanda Takai. Em Será Que Você Vai Acreditar? (DeckDisc) a mineira vocalista do Pato Fu, mulher do produtor e guitarrista John Ulhôa, mãe da adolescente Nina, dá seu recado sutilmente, tecendo críticas à ignorância num trabalho baseado em memórias afetivas. Takai se veste de nostalgia para registrar este ano inesquecível, que nos obriga a esconder os rostos para salvar vidas.
Como todo artista que sente na pele as mudanças mais que pobres mortais mundanos, assim que a pandemia se instaurou Fernanda e John se isolaram no estúdio montado em casa para se concentrar no álbum que já vinha sendo formatado desde o início do ano. O resultado é um trabalho capaz de mesclar a lembrança de um passado não tão distante, através da escolha de parcerias e versões, e a esperança de um futuro minimamente saudável para as novas gerações.
Canção após canção, o disco evidencia a coesão tanto na escolha do repertório quanto na vida familiar de Takai. John produziu, mixou e tocou todos os instrumentos, preparando o terreno para a voz calma e serena da esposa, que logo na abertura “Terra Plana” carrega mensagem que ataca o retrocesso da humanidade. John conta que havia escrito a música para a filha como presente de aniversário, numa espécie de cobrança e autoquestionamento que pais sempre fazem no sentido de querer o melhor para os filhos e cujo propósito foi potencializado na pandemia (“Se eu disser que mesmo tendo medo você deve se arriscar/ Será que você vai se machucar?).
A segunda faixa dá sequência ao tema paternidade: “Não Esqueça” é uma composição de Nico Nicolaiewsky, membro do duo Tangos e Tragédias que morreu em 2014 por conta de uma leucemia aguda. O casal do Pato Fu era amigo do artista e procura até hoje manter viva a memória da obra do gaúcho. A canção traz uma série de conselhos à filha de Nico e é pura ternura: “Eu te digo, minha filha/ Não esqueça de sempre sorrir/ Não esqueça de ligar pra mim/ Se por acaso conseguir/ Não esqueça que é tudo ilusão/ Não esqueça de lavar as mãos”.
Há três releituras, sendo duas em inglês. “Não Creio em Mais Nada”, uma das baladas mais famosas do compositor Totó (amigo de Peninha e Antônio Marcos) e sucesso na voz do também já falecido Paulo Sérgio, ganhou arranjo moderno, com texturas vocais e sintetizadores. A cantora mostra afinação na clássica “One Day In Your Life”, gravada por um Michael Jackson ainda teenager. Em “Love Is a Losing Game”, por sua vez, presta homenagem a Amy Winehouse em uma versão bossa eletrônica.
O repertório ainda traz parcerias nostálgicas. Na romântica “O Amor em Tempos de Cólera”, que lembra o título do livro de Gabriel García Marquez, Takai divide os vocais com Virginie Boutaud, da banda francopaulista Metrô, e também dona de voz delicada. Takai conta que o trabalho foi feito à distância – Virginie na cidade francesa de Toulouse e ela em Belo Horizonte – e considera a canção como “um momento de aconchego em tempos tão difíceis”.
Quem também participa do disco é Maki Nomiya, do duo nipônico Pizzicato Five e coautora de “Love Song”, sobre um amor distante que sobrevive às diversidades. Metade em japonês, metade em português, a faixa é a mais animada do disco e destoa um pouco das demais. Será Que Você Vai Acreditar? é, enfim, é um questionamento a esse mundo pandêmico, que parece ter engatado a marcha ré e escancarado o que há de pior no ser humano. Muito disso é resumido na melancólica “Corações Vazios”, composição de John, que aborda a falta de compaixão e estupidez. “Espere só pra ver/ Você vai entender”, diz o refrão. Esperemos, Fernanda, esperemos.