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Mirador

Principal luta do boxeador desta história não é nos ringues, mas sim contra a invisibilidade e a dificuldade de criar sozinho uma filha pequena

Texto por Ana Clara Braga

Foto: Olhar Distribuição/Divulgação

Existem vidas por trás dos sonhos. A criança que quer ser médica vai à escola e tem pais, o menino que sonha em ser jogador de futebol e que brinca com os amigos e tem planos para o fim de semana, o homem que luta boxe tem uma filha para sustentar. O olhar neorrealista de o Mirador (Brasil, 2022 – Olhar Distribuição) é a lembrança de que entre rostos na multidão existem diversas histórias para serem contadas.

Maycon (Edilson Silva) trabalha em subempregos para bancar seu sonho de lutar boxe. Ele também é pai da menina Malu (Maria Luiza da Costa). Quando a mãe da criança vai embora, não tem escolha a não ser criar a filha sozinha. Maycon já era pai, mas é nesse momento que descobre a paternidade. 

Enquanto a maternidade é uma obrigação, pais escolhem quando entram em cena. O personagem principal de Mirador calça os sapatos maternos com dificuldade, a comida, o leite, a ida ao médico, o choro, tudo é um mundo. Bruno Costa, o diretor, trata a vida cotidiana de forma crua e natural. Maycon não se torna um mártir e sua vida não vira um melodrama. É um caso de estudo, um fragmento de realidade. 

Histórias de luta não servem para virar exemplo, mas, sim, aviso. A de Maycon é um aviso. Costa conduz o filme de maneira a gerar um sentimento de cautela em quem assiste. O que vai acontecer agora? Ao contrário de grandes dramas hollywoodianos, aqui não existem percalços dramáticos e vilões sem coração – a vida é apática, difícil e real. Edilson Silva é um grande ator que entrega uma interpretação contida e sincera. O Maycon é uma pessoa que existe em todas as cidades de nosso país, não é alguém complexo ou misterioso. É apenas um brasileiro. 

Rodado em Curitiba, Mirador não é um filme sobre heroísmo, é sobre vida e dignidade. Sobre um homem que sonha em lutar e precisa colocar comida na mesa, que enfrenta burocracias, invisibilidade, luto e menosprezo. É mais uma história que não sabemos que existe, mas existe apesar de nosso conhecimento.

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