Music

Pearl Jam

Quinteto alivia os fãs ao esquecer a sonoridade moderada do último trabalho e lançar um novo disco com notas de nostalgia e inovação

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Texto por Ana Clara Braga

Fotos: Divulgação

O auge do grunge foi há quase trinta anos. Enquanto isso, o Pearl Jam, um dos maiores nomes do subgênero, não parou de produzir música, para a alegria dos seus fãs. Conhecidos por um som sujo e tido como rebelde pelo mainstream, o grupo preocupou seguidores em sua última obra de estúdio, Lightning Bolt (2013), que continha músicas mais moderadas, algo como um rock de meia idade. Mas o alívio chegou. Lançado há poucos dias, o novo Gigaton traz notas de nostalgia… e inovação!

O disco abre com “Who Ever Said”, música de base muito bem construída e que remete aos tempos áureos do grupo. Na sequência, “Superblood Wolfmoon”, apropria-se de um fenômeno natural para expressar sensação de angústia. A faixa já nasce com potencial de ser sucesso em shows e festivais de grande porte. As duas músicas iniciais são, portanto, uma prova de que o velho PJ não morreu: apenas se adaptou.

Fãs mais conservadores podem torcer o nariz para alguns dos sons eletrônicos incorporados ao longo deste álbum. De forma alguma eles estragam ou tiram o vigor das músicas. Pelo contrário: os artifícios ajudam a amplificar a experiência proposta pela banda. Talvez esses mesmos fãs conservadores prefiram que a “inovação” venha como em “Comes Then Goes”. O problema? Sonoridade dissonante não significa algo novo, visto que Eddie Vedder já andou por esses terrenos em suas aventuras solo.

Gigaton pode nunca virar unanimidade entre os admiradores da banda, mas é preciso reconhecer ser um trabalho de qualidade. Em tempos em que o rock não é mais a estética sonora dominante, o PJ mostra não ter medo de experimentar, sem perder a essência, para que não fique obsoleto.

Ao contrário da rebeldia um tanto inconsequente, a revolta agora é amarga e dolorida. A vitalidade juvenil deu lugar a introspecção adulta. “River Cross” é a música que resume bem esse novo modo de pensar, em um tipo de comentário social melodioso. “While the government thrives on discontent and there’s no such thing as clear”, canta Eddie Vedder.

Em seu novo álbum, o Pearl Jam reencontra diferentes versões de si mesmo, sempre apontando para o futuro. Gigaton é um meio-termo entre os jovens inconformados dos anos 1990 e os já tranquilos e maduros músicos, que permanecem juntos até hoje.

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Movies

Midsommar: O Mal Não Espera a Noite

Diretor de Hereditário traz inovação para o gênero do horror ao apostar em rituais, traumas e uma trama clara e impactante como o sol da meia-noite

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Texto por Ana Clara Braga

Foto: Paris Filmes/Divulgação

O desconhecido e o diferente podem ser aterrorizantes sem muito esforço. Juntando esses fatores a um relacionamento arruinado e férias frustradas o aumento da adrenalina parece justo. Midsommar: O Mal Não Espera a Noite (Midsommar, EUA, 2019 – Paris Filmes), o novo filme do jovem diretor Ari Aster é um conto de horror em que o medo não se esconde atrás de portas esperando para dar um susto. Ele é claro e impactante como o sol da meia-noite.

Quando cinco jovens viajam para a Suécia para participar de um festival local de verão, inicialmente o mais estranho parece ser o sol que nunca se põe e os hábitos da pequena comunidade. Com o decorrer da história, os rituais, os maneirismos e tudo o que é desconhecido passa a ser temido. Florence Pugh vive o papel de Dani, uma jovem com uma carga de traumas passados, que embarca de última hora na viagem para acompanhar seu namorado (Jack Reynor).

O relacionamento dos dois personagens já está fadado ao fracasso e isso fica cada vez mais evidente a cada interação. Os atores conseguem passar o desconforto de duas pessoas que ainda estão juntas, mas já não se amam ou confiam uma na outra. A crise no namoro é um ponto central para o desenvolvimento da trama e alguns de seus pontos mais tensos.

O visual de Midsommar é atípico para um longa de terror. A claridade conflita com a violência gráfica, deixando tudo mais absurdo e difícil de digerir. É um filme ambicioso que se apropria de diversos elementos que se desenrolam lentamente nas quase duas horas e meia de duração. Aster já havia determinado padrão diferenciado com seu filme de estreia e agora impõe algo novo. Enquanto Hereditário (2018) continha truques tradicionais do gênero, seu mais novo trabalho distancia-se da maioria dos outros títulos, confundindo quem foi ao cinema esperando por uma história linear e recheada de momentos intensos.

A transição de Dani da sala para o banheiro do avião é um rápido e bom resumo do sentimento que o filme traz: o de confusão. Nunca dá para saber exatamente o que está acontecendo. Por partes pelo uso de alucinógenos pelos personagens e por nunca se saber quais os limites dos rituais do até então desconhecido vilarejo sueco. As belas paisagens, as lindas roupas, as flores coloridas, a estética contrasta a todo momento com os horrores vividos pelos personagens.

O terror é um gênero que costuma colocar mulheres em evidência. Aqui não é diferente. Na reta final, Midsommar surpreende (ainda mais) ao escolher um caminho diferente e catártico para sua personagem principal. Dani assume um papel de relevância no local e tem uma epifania, talvez o desconhecido não seja tão esquisito assim, até sueco descobre que consegue falar. Esse inédito sentimento de pertencimento guia a personagem a cena final do longa.

A ambição de Ari Aster é valiosa. Midsommar, que acaba de ser disponiblizado em streaming pela Amazon Prime Video, não é sua melhor obra, mas tem grande importância ao tentar quebrar barreiras de um gênero que implora por novos ares. Com seu segundo filme, o diretor consegue estabelecer um tipo de horror que amedronta. Não por dar sustos, mas, sim, por lidar com sentimentos.

Movies

O Melhor Está Por Vir

Relação entre dois grandes amigos de infância desconstrói a ideia de que o fim da vida precisa ser apenas triste

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Texto de Ana Clara Braga

Foto: Paris Filmes/Divulgação

Morte não é um tema simples de ser tratado, nem na vida real e nem no cinema. Um exagero e o filme pode tornar-se triste demais ou escrachado demais. O novo filme da dupla de diretores e roteiristas Matthieu Delaporte e Alexandre de la Patellière, O Melhor Está Por Vir  (Le Meilleur Reste à Venir, França/Bélgica, 2019 – Paris Filmes) acaba sendo uma boa balança entre o comédia e o drama.

Cesar (Patrick Bruel) e Arthur (Fabrice Luchini) são melhores amigos desde a infância. Um dia são impactados ao saberem que um está muito doente e vai morrer em breve. A notícia, fruto de uma grande confusão, leva os dois a realizarem seus maiores desejos. Com momentos cômicos que só poderiam ser proporcionados pelo humor francês, o filme navega pelo doce e o amargo de uma evidente despedida.

Com ótimas atuações dos atores principais, o longa tem roteiro simples e leve. A tristeza da história não é sufocante. Pelo contrário, é esperançosa. Enquanto de um lado existe um Cesar radiante, bem-humorado e enérgico, seu melhor amigo, Arthur, é o oposto: tenso, pessimista, nebuloso. Essa relação em forma de antítese ajuda a história a construir-se sozinha, sem necessitar grandes intervenções. Os dois protagonistas são muito bem construídos, fascinantes de acordo com suas peculiaridades.

Se em uma breve sinopse pode parecer que o tema principal do filme seja a morte (ou a vida), a amizade talvez seja o elemento mais rico e belo dessa narrativa. Além dos desejos exóticos e extravagantes, os dois também desejam melhorias na vida do outro antes do final. Mesmo que o ato de se meter na vida do outro cause conflito na história, eles estão sempre dispostos a ouvir e a seguir os conselhos do amigo. Uma frase que poderia ser a síntese da história é “a amizade tem o que falta no amor: a certeza”. Cesar e Arthur ensinam que apesar das adversidades, separações, reconciliações e doenças a amizade permanece.

O Melhor Está Por Vir desconstrói a ideia de que o encerramento da vida precisa ser apenas triste. A bela montagem ajuda a criar um clima nostálgico em que as quase duas horas de filme passem rápido. Lágrimas podem ser inevitáveis no final, mas, ao contrário de outros dramalhões, essa comédia dramática deixa espaço para um sorriso.