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Clara Sola

Filme costa-riquenho reflete sobre a metamorfose na sexualidade de uma mulher aprisionada e isolada do convívio social

Texto por Taís Zago

Foto: Imovision/Divulgação

Em um vilarejo da Costa Rica, Clara vive com sua mãe e a sobrinha em um pequeno sítio um pouco afastado. A ela são atribuídos poderes de cura. A mulher de 40 anos vive uma rotina completamente isolada do convívio social e é superprotegida pelos seus familiares, que ainda a tratam como uma criança. O motivo atribuído para os cuidados e o seu isolamento seria uma suposta (e misteriosa) doença óssea que dificultaria os movimentos, exigindo cuidados constantes e o uso de coletes. 

Clara, interpretada pela atriz e dançarina Wendy Chinchilla Araya, parece, a princípio, resignada à sua condição de vulnerável, consolo e companhia ela encontra nos animais da região, como a égua Yuca ou seus besouros de estimação, e na natureza. O mundo de Clara é somente dela e nele ela vive seus sonhos. Hordas de moradores locais e viajantes aparecem todos os dias para serem abençoados e curados por ela em uma sala com altares criados por sua mãe, uma senhora extremamente rígida religiosa.  

Quando sua sobrinha, Maria (Ana Julia Porras Espinoza), planeja a celebração da sua Quinceañera, a tradicional festa de 15 anos para muitos países latinos, Clara começa, de forma tardia, e explorar sua sexualidade e a descobrir seu corpo. A chegada de Santiago (Daniel Castañeda Rincón) traz a ela a descoberta do primeiro amor, o que se torna o ponto culminante para a explosão dos sentimentos reprimidos durante toda a vida por Clara mediante o controle de sua austera mãe.

A roteirista Nathalie Álvarez Mesén faz com Clara Sola (Suécia/CostaRica/Bélgica/Alemanha, França, EUA, 2021 – Imosion) seu début como diretora de um longa-metragem e assina o roteiro junto com Maria Camila Arias. O trabalho de Mesén é primoroso ao ressaltar a angústia silenciosa de Clara com closes fechados. A natureza, como coprotagonista, preenche o vazio de uma vida com poucos encantos terrenos. As cores, os sons e a maravilhosa fotografia nos mostram a transição do conforto de Clara em sua solidão para a gradativa revolta e a curiosidade que cresce em suas entranhas a cada dia. Clara é sola, mas anseia deixar de ser.

Ao roteiro ficou a tarefa difícil de gerar empatia sem exagerar no tom do pathos. Os personagens recebem nuances que os deixam humanos sem cair em estereótipos exagerados. Todos têm seus momentos bons e ruins. A narrativa transcorre de forma lenta, talvez em alguns momentos até lenta demais, porém no conjunto isso não chega a atrapalhar ou interromper a fluidez dos acontecimentos.

O clima opressivo religioso, que gradualmente sufoca e cerceia as atitudes espontâneas e naturais humanas, é uma das críticas principais desse filme. Para os cosmopolitas de “nascença”, a obra pode até parecer um passeio em um passado distante, mas não a aqueles mais conectados com as realidades periféricas e rurais dos países latino-americanos. Clara Sola nos dá uma estranha sensação de familiaridade, principalmente nos tempos em que vivemos hoje.

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