Books, Movies

A Hora da Estrela

Baseado na obra literária de mesmo nome de Clarice Lispector, clássico do cinema nacional dos anos 1980 é restaurado e relançado

Texto por Leonardo Andreiko

Foto: Vitrine Filmes/ Divulgação

O cinema brasileiro é repleto de grandes clássicos desconhecidos do grande público. Se muitos já “ouviram falar” de Glauber Rocha ou, mais recentemente, assistiram a um sucesso de Kleber Mendonça Filho nos cinemas, é certo que estamos culturalmente desfamiliarizados com a filmografia produzida antes da retomada, no final dos anos 1990. Por sorte, a preservação dos negativos na Cinemateca Brasileira garante que iniciativas de restauração deem um novo respiro a alguns desses títulos, relançados aos cinemas. Nos últimos anos, foi o caso de Rainha Diaba, de Antônio Carlos da Fontoura (leia a crítica publicada no Mondo Bacana clicando aqui), e é o caso de A Hora da Estrela (Brasil, 1985 – Vitrine Filmes) de Suzana Amaral, que acaba de reestrear em circuito nacional na sessão Vitrine Petrobrás.

Antes de tudo, é preciso reconhecer o tamanho desta obra à época de seu lançamento. Em 1985 e 1986, A Hora da Estrela angariou os principais prêmios do Festival de Brasília (filme, direção, roteiro, atriz, ator, montagem, cenografia, trilha sonora e fotografia, além dos prêmios do Júri Popular, Especial da Crítica e Troféu Jangada) e garantiu o Urso de Prata de Melhor Atriz para Marcélia Cartaxo no Festival de Berlim. Em Havana, foi eleito o Melhor Filme de 1986.

A partir de um roteiro que adapta o romance homônimo de Clarice Lispector, o filme conta a história de uma jovem nordestina recém-chegada a São Paulo com pouquíssimas posses e menos dinheiro ainda. Macabéa (Cartaxo) é, aos olhos dos demais, feia e suja. Não sabe se portar com os costumes da cidade e, sempre se desculpando, é uma figura frágil e tímida. “Tão pobre que só comia cachorro quente”, como diz Clarice em uma entrevista anterior à publicação do livro.

Mas Macabéa é ser humano e, sendo assim, tem curiosidade e desejo. Não cabe num mundo que não a formou Enfeita seu pequeno espaço em um quarto compartilhado com outras três mulheres com recortes de revista. Escuta religiosamente a Rádio Relógio. Busca sentido nas palavras que datilografa com dificuldade. E, principalmente, quer o quer todos querem: amor, afeto e dinheiro. Por detrás do silêncio e da timidez, a inocência de quem não tem nada nem ninguém em uma corrida pela vida contra a malícia da cidade.

É natural, portanto, que o primeiro homem que a desse bola se tornasse seu grande amor. Dito e feito, Macabéa se apaixona pelo operário Olímpico de Jesus (José Dumont), também nordestino, cujo delírio de grandeza insiste em projetá-lo como eventual “deputado geral do Brasil” e ver nossa protagonista com os olhos amargos do machismo ressentido de seu tempo. Ainda que seja constantemente menosprezada ou rechaçada por seu companheiro, Macabéa não deixa de encará-lo com inocência e enxergar afeto onde há desprezo.

A direção de Suzana Amaral é muito astuta em delinear o desequilíbrio desta e das demais relações do filme. Olímpico constantemente está de costas para Macabéa, que não se importa com o protagonismo roubado do mau caráter que a enrola. Os planos e contraplanos mais despretensiosos são capazes de ilustrar o universo de densidade que perpassa as interações com Glória (Tamara Taxman), a colega de trabalho duas-caras. ou as vizinhas, com quem Maca partilha a cumplicidade da solidão na linha da miséria. Amaral dirigia seu primeiro longa-metragem, mas demonstrava a maturidade necessária para dar vida às personagens de Clarice Lispector desde a primeira cena.

O humor ácido com que expõe as personalidades autocentradas ao redor da protagonista bem como os exageros místicos da cartomante (Fernanda Montenegro, em uma performance brilhante) que se voltam contra si são a fortaleza do filme, que não cansa de delinear a hostilidade monstruosa com que a metrópole recebe Macabéa. Sua verve sonhadora é explicitada pelos lindos e raros momentos de solidão da personagem, que se descobre entre o desejo e a paixão com o caminhar da história. A beleza arquitetônica dos metrôs vazios, que a encantam no início do longa, logo são substituídos pelos braços e sovacos de desconhecidos que, se a conhecessem, não lhe dariam bola. Eterna rejeitada, mesmo pelo homem que namora, Macabéa só recebe contato humano quando este é indesejado, na multidão do metrô.

Também encantam os momentos em que Suzana Amaral e Alfredo Oroz, que assinam o roteiro, deixam brilhar a potência literária de Lispector. O trabalho de adaptação é preciso em evitar a verborragia por meio da composição de mise-en-scènes que se destacam em comparação ao cinema atual. Em uma das muitas interações em que é sumariamente ignorada por Olímpico, a protagonista dispara: “eu não acho que sou muita gente”, uma oração tão densa que aluga espaço na cabeça do espectador por um bom tempo.

Mas, no fim, não há muita gente ao redor dela e A Hora da Estrela é o romance de uma inocência surrada, batida e escorraçada que, apesar dos percalços e tropeços, termina feliz, confiante de que tudo vai mudar para melhor.

Books, Movies

Veríssimo

Documentário promove um olhar carinhoso sore a vida cotidiana de trinta dias por volta do aniversário de 80 anos do sempre afiado autor gaúcho

Texto por Tais Zago

Foto: Boulevard/Vitrine/Divulgação 

Para quem ainda não o conhece (se isso ainda for possível!), Luís Fernando Veríssimo é um escritor, humorista, cartunista, tradutor, roteirista de televisão, autor de teatro e romancista brasileiro. Já foi publicitário, revisor de jornal e ainda músico, tendo tocado saxofone. Um homem de múltiplos talentos e que explorou todos eles magistralmente.

Em 2016, ele estava prestes a comemorar seus 80 anos. Foi nessa época que Angelo Defanti o acompanhou por 15 dias antes e 15 dias após seu aniversário, no dia 26 de setembro. Este empenho resultou no filme Veríssimo (Brasil, 2024 – Boulevard/Vitrine), que chega agora aos cinemas do país já como um programa obrigatório para os fãs do autor.

No documentário editado de forma simples e com muitos takes amplos e estáticos, somos conduzidos pela rotina diária do tímido e introvertido escritor em sua casa. Participamos de sua dinâmica doméstica com filhos e netos e a mulher Lúcia, que, ao contrário do autor, faz o contraponto com sua personalidade extrovertida. A narrativa segue a linha de um countdown, marcando os dias até a data das festividades.

O filme começa num ritmo bastante moroso. Até Veríssimo começar a falar diretamente com o documentarista já se passaram mais de 20 dos 87 minutos do tempo total da obra. E talvez esse lento florescer seja o segredo e o atrativo dessa produção. Veríssimo se revela em doses homeopáticas com suas pílulas de sabedoria, o inconfundível senso de humor e as observações certeiras. Uma lucidez invejável da mente, mesmo quando o corpo já dá sinais de cansaço.

Ao ser indagado sobre qual seria a pergunta que nunca lhe foi feita, Veríssimo pondera brevemente e, sem hesitar, responde: “não me ocorre nenhuma”. E eu sou inclinada a acreditar que o introvertido porém afiado observador já refletiu, mesmo, sobre quase todas as perguntas que existem. Quem está familiarizado com o grande escopo de sua obra – que, para citar apenas as mais famosas, vai do detetive trapalhão Ed Mort (1979) e o hilário e ácido humor de O Analista De Bagé (1981) até a popular Comédias Da Vida Privada (1994) – sabe que poucos autores brasileiros foram (ou são) cronistas tão eficientes e atuantes quanto Veríssimo. O incansável artista para o qual a profissão também é sua atividade predileta e que queria (mas ao mesmo tempo também não queria) se aposentar ao chegar ao octogésimo ano de vida.

Foram mais de 100 horas de filmagens feitas pela paciente equipe de Defanti e um trabalho bastante árduo na sala de edição, que tomou vários anos. Como resultado, temos uma obra feita com carinho, mas que nem sempre empolga. Por vezes a qualidade do áudio e algumas cenas externas deixam a desejar. De qualquer forma, é inegável importância desse registro histórico de um dos maiores escritores que o Rio Grande do Sul já pariu por esses prados. 

Luís Fernando, nossa prata da casa, já está hoje com 87 anos e passa um bom tempo em sua casa se recuperando de um AVC. Mesmo assim o escritor não deixa de acompanhar os jogos de futebol do seu time, o Internacional. Junto com a escrita e a esposa Lúcia, essas são suas mais perenes paixões.

Movies

Eu, Capitão

A aventura de dois adolescentes senegaleses que tentam entrar ilegalmente na Europa pela lente de polêmico cineasta italiano

Texto por Abonico Smith

Foto: Pandora/Divulgação

Suavidade é uma palavra praticamente inexistente no léxico cinematográfico de Matteo Garrone. O cineasta italiano, por sinal, é bastante ardiloso ao envolver o espectador com belas imagens, daquelas de encher os olhos e prender de vez a atenção em seu longa-metragem. Entretanto, com requintes de crueldade, dá aquela reviravolta e passa a pincelar a história com tomadas violentas, incômodas, daquelas de fazer quem está vendo na mesma vibe de sofrimento de quem está levando a pior na tela.

Ë assim novamente com sua mais nova obra, Eu, Capitão (Io Capitano, Itália/França/Bélgica, 2023 – Pandora), um dos cinco títulos finalistas para a disputa do Oscar de Filme Internacional neste ano. Chegando nesta semana ao circuito brasileiro, a história gira em torno da tentativa de dois primos adolescentes senegaleses que usam dia após dia surradas camisas e agasalhos de seleções e clubes de futebol europeus. Eles estão em busca de um grande sonho: deixar para trás a vida na pobreza na periferia de Dacar e embarcar em uma viagem rumo ao continente europeu, onde lá pode ser vivida uma vida melhor e mais digna, com mais oportunidades para trabalho, sobretudo no meio da música, a grande paixão do protagonista Seydou (Seydou Sarr, um então desconhecido talento que aponta para um grande futuro tanto na dramaturgia quanto na música). Ele e Moussa (Moustapha Fall) juntam uma boa grana em segredo e partem sem avisar ninguém, nem mesmo as mães. São alertados algumas vezes de quão perigosa é a tentativa de cruzar o Mediterrâneo em condições precárias para emigrar de modo ilegal pelo território italiano. Mas nem dão bola para isso. Fala mais alto o idealismo, a bravura, a esperança, a coragem e aquela impulsividade típica dos jovens somada à certeza de que absolutamente nada vai dar errado.

Então Seydou e Moussa partem para uma aventura que, sob a direção de Garrone, torna-se tão bela quanto épica no início. Uma das primeiras dificuldades é a sobrevivência no deserto árido, sob sol escaldante e aquela sensação angustiante de só se ver areia para todos os lados, até a linha do horizonte. Durante o começo da trip, então, vem a Seydou o primeiro sinal e que sempre alguma coisa pode dar muito ruim, quando ele se separa do primo e do grupo com os outros andarilhos para tentar socorrer uma mulher à beira da morte por sede. É justamente aí que Matteo tem a oportunidade de inserir outros elementos típicos de seus longas: a polêmica, o realismo fantástico e a mitologia. Na tela, Seydou passa a puxar pela mão a mulher que voa candidamente, enquanto o espectador se confunde, sem saber o que é realidade e o que é alucinação (de ambos!). Quando mais a situação vai se tornando perigosa para o garoto, mais Garrone vai trabalhando suas características no desenrolar da história.

O que se mostra ser um road movie pintado por tintas da triste realidade de uma questão social que se abate entre os migrantes ilegais que tentam passar da África para a Europa. Quem verdadeiramente se aproveita do sonho ingênuo de quem embarca na tentativa de deixar uma vida para trás e recomeçar outra do zero? O que acontece com quem morre no meio do caminho? E o que é feito com aqueles que conseguem atravessar o Mediterrâneo e chegar ao outro lado? São perguntas que o cineasta vai fazendo brotar na cabeça de quem assiste sem perder a chance de desenvolver uma trama ficcional em torno disso tudo, com muito de sua assinatura pessoal, que vem chamando a atenção do universo da moda e do cinema hollywoodiano nos últimos quinze anos.

Talvez este conjunto de coisas impactantes tenha impulsionado Eu, Capitão para a disputa final com outras grandes produções não faladas na língua inglesa. Muito provavelmente não deveria ganhar, mas ajuda a compor um excelente time de obras de fora do eixo nesta temporada.

Movies, Sports

Ferrari

Cinebiografia do criador da escuderia mais cultuada do automobilismo traz empolgantes cenas de corrida mas derrapa na parte dramática

Texto por Abonico Smith

Foto: Diamond Films/Divulgação

Mesmo que não seja assim tão fã de Fórmula 1, todo brasileiro sabe muito bem que o sobrenome Ferrari carrega há décadas o status de símbolo máximo de grife ligada ao automobilismo. Todo piloto quer dirigir uma. Todo milionário sonha em ter uma. Alguns jogadores de futebol que já passaram temporadas em campos europeus já dirigiram uma. Seu fundador e proprietário, Enzo Ferrari, declarou, inclusive, que enquanto outras escuderias participavam de corridas para vender automóveis ele fazia exatamente o contrário: virou empresário para continuar pisando fundo no acelerador. Mesmo que nos bastidores, por trás de tudo, comandando tudo com mão de ferro em boxes, oficinas e escritórios.

Por isso, a chegada de um longa-metragem como Ferrari (EUA/Reino Unido/Itália/China, 2023 – Diamond Films) aos cinemas pode causar bastante alvoroço em tanta gente que ama a velocidade dentro de algum bólido de motor possante e quatro rodas. A assinatura de Michael Mann, então, veterano diretor especializado personagens bastante obcecados por suas atividades, tornava-se um atrativo a mais.

Eis que, com o foco ligado sempre em um Adam Driver completamente transfigurado para se assemelhar ao protagonista, o filme se mostra uma obra dividida entre o drama e a ação. Neste último quesito, a mão de Mann – que havia três décadas tentava levar às telas esta adaptação de uma biografia publicada em 1991 – mostra-se perfeita. As muitas cenas de corrida, seja em circuitos fechados ou pelas ruas e estradas da região da Emilia-Romagna, são de encher os olhos, ainda mais na grande tela. Só que nem só disso vive um bom filme e justamente na outra parte que este Ferrari derrapa.

O arco dramático, que no roteiro acaba de sobressaindo e tendo mais destaque do que as provas em si, começa em 1957, alguns anos depois que o piloto Enzo Ferrari decidiu abandonar de vez o volante depois de ver dois grandes amigos perderem a vida em acidentes ocorridos em um mesmo dia de corrida. Contudo, em uma Itália ainda se recuperando economicamente e juntando os cacos provocados pela Segunda Guerra Mundial, o futuro da escuderia que leva o seu nome parece incerto. O agora entrepeneur busca espantar de vez a assombração da falência tentando levantar dinheiro por meio da família e de empréstimos bancários. Para poder decolar e se manter profissionalmente, entretanto, era necessário se obter vitórias, sobretudo na Mile Miglia, percurso de longa distância (mil milhas, com dizia o nome) que passava por várias cidades italianas que fora retomado naquele pós-guerra. Como Enzo tinha grandes adversários nas pistas sua obsessão por chegar em primeiro aumentava a cada ano, custasse o que custasse, inclusive a vida de vários pilotos da Ferrari.

Aliás, a vida pessoal do protagonista é bastante devassada nas telas. A constante luta contra a morte aparece do início ao fim do filme. Além da perda dos pilotos da escuderia – motivo pelo qual era constantemente atacado pela imprensa esportiva local – também havia o sentimento perene na família. Ainda na adolescência, em 1916, ele já perdera pai e irmão mais velho para um surto de gripe que se espalhara por todo o país. Contudo o abalo maior ficou por conta do falecimento em 1956 de Dino, o único filho com a esposa Laura e por isso seu sucessor, aos 24 anos de idade, vitimado por uma distrofia muscular. Aliás, o nascimento de Dino também havia sido um outro forte motivo para que Enzo fizesse a transição definitiva de piloto para empresário em 1932.

O casamento com Laura, que já não vinha bem desde o período da guerra, já havia virado um leite derramado. Tanto que Enzo mantinha vida dupla com outra mulher e criando um outro filho, mesmo não podendo ser reconhecido legalmente por ele por conta da então ainda inexistente lei do divórcio em território italiano. O que quase todo mundo já sabia veladamente nos bastidores Laura acaba descobrindo, dificultando ainda mais o entendimento entre os dois “sócios” da escuderia.

Aqui, portanto, reside o grande problema de Ferrari, que é a sua parte dramática. Adam Driver termina o filme como começou: quase escondido, não apenas pelo disfarce da caracterização e os quilos de maquiagem. Fala bem pouco em cena, muitas vezes resmungando e lacônico, com a cara fechada, pisando em seus trabalhadores e interlocutores. Pode-se até argumentar que esta seria de fato a personalidade rude do “comendador”, mas também acaba jogando contra a mise-en-scène do protagonista. Penélope Cruz, por sua vez, dá vida, viço e sangue a uma Laura ofendida e impulsiva, capaz de atirar à queima-roupa no marido em casa ou ser tão grossa quanto ele nas ligações da imprensa e de financiadores. Já Shailene Woodley (a sempre resignada Lina Lardi, a amante e mãe do filho bastardo) não diz muito a que veio em seu pouco tempo de tela.

Além do desnível das interpretações, Ferrari também “sai da pista” e “bate na mureta” ao cometer o grande erro de muitas produções hollywoodianas ambientadas na Europa continental e com personagens reais que, em seu cotidiano, falam em idioma natal. Este é mais um filme de italianos, de história bem italiana, de característica italiana falado em inglês! (Detalhe: Adam Driver também estava no elenco de Casa Gucci, que chafurdou em críticas e bilheteria por este motivo.) E o que faz ali o competente ator brasileiro Gabriel Leone, fazendo um piloto espanhol (Alfonso de Portago), conversando com o patrão italiano, em inglês?

Ao final da sessão fica aquela lembrança histórica do maior momento de narração de Cleber Machado na F1 – aliás, uma enorme polêmica protagonizada justamente pelos dois competidores da Ferrari na temporada de 2002. Na volta derradeira do GP da Áustria, Rubens Barrichello estava bem à frente do companheiro de escuderia, Michael Schumacher e iria cruzar a linha de chegada e receber a bandeirada da vitória. Contudo, sua equipe obrigou o brasileiro a desacelerar e ceder, nos metros finais, a frente para Schumacher, já que isso contabilizaria mais pontos para que o alemão pudesse vencer o campeonato de pilotos. Ferrari, o filme, faz ecoar na mente o futuro bordão com a empolgação sendo subitamente trocada pelo tom de decepção. Hoje não, hoje não… hoje sim!

Movies, Music

Priscilla

Cinebiografia assinada por Sofia Coppola mostra como, longe dos holofotes, o idolatrado Rei do Rock prendia a esposa em uma gaiola

Textos por Janaina Monteiro e Abonico Smith

Fotos: O2/Mubi/Divulgação

As lágrimas custam a cair dos belos olhos azuis de Priscilla Beaulieu. Aos 27 anos, em 1972, a jovem texana simetricamente perfeita está diante de um Elvis Presley milimetricamente sugado pela exaustão da fama e já em processo de deterioração. Ela, finalmente, consegue dizer “não”.

Cilla, como era carinhosamente chamada pelo eterno Rei do Rock, sai de cena antes de assistir à derrocada de um dos principais artistas de todos os tempos, ídolo de uma geração. Um astro de tamanha magnitude, cujo brilho, aos poucos, ia sendo ofuscado pelos excessos. 

“O casamento transforma muitas loucuras curtas em uma longa estupidez”, escreveu o alemão Nietzsche, em Assim Falou Zaratustra, obra que inspirou o também alemão Richard Strauss a compor seu poema sinfônico de mesmo nome (Also Sprach Zarathustra). A música foi tema do filme 2001: Uma Odisséia no Espaço e serviu de introdução para a turnê de Elvis nos anos 1970, em arranjo assinado e gravado pelo brasileiro Eumir Deodato. 

No semblante de Priscilla, interpretada gloriosamente por Cailee Spaeny no filme homônimo da diretora Sofia Coppola, o espectador acompanha a odisseia da ex-mulher do astro. É o desgaste de um relacionamento que começou em um terreno puro e cristalino e culminou em um árido deserto chamado ofuscamento e solidão. 

O que vemos em Priscilla (EUA, 2023 – O2/Mubi) é um blend de emoções: a triste decepção do não finalmente dito se une ao alívio de um sim. Um sim diferente daquele que simbolizava a autorização dos pais de Priscilla em consentir o relacionamento amoroso entre uma adolescente de 14 anos e um dos rapazes mais cobiçados do mundo, que na época tinha 24. 

Era um sim diferente daquele proclamado seis anos antes, quando Elvis pediu o amor da sua vida em casamento. Trata-se do sim à liberdade, do sim à busca pelo sua verdadeira identidade. Uma resposta que exigiu muita força e coragem para ser verbalizada.

Como num soneto de Vinícius de Moraes, o conto de fadas que havia começado em 1959, chegava ao fim. Mas, nesse caso, é Dolly Parton quem entrega a trilha sonora do desfecho de uma das histórias de amor mais icônicas do mundo, “I Will Always Love You”, canção composta por uma das mais representativas cantoras da country music e que, inclusive, Elvis tentou gravar mas não conseguiu. 

Nesse coming of age, Sofia Coppola acrescenta mais uma mulher forte e solitária à sua lista de protagonistas e se torna especialista em levar relacionamentos tóxicos às telas. Como no caso de Encontros e Desencontros, que, aliás, trata do próprio divórcio de Sofia com o diretor de cinema Spike Jonze. 

Coppola, com a montagem frenética e elipses temporais que já se tornaram sua marca registrada, consegue condensar esse romance supostamente improvável diante das inúmeras assimetrias da vida. Mas nem a diferença de idade (10 anos) e nem a diferença de altura (Priscilla tem 1,63; Elvis, 1,82) serviram de obstáculo para o casal. Priscilla estava no lugar certo, na hora certa.  

Inspirado na biografia Elvis e Eu, lançada em 1985 e assinada por Priscilla Presley e Sandra Harmon, o filme chega aos cinemas brasileiros no ano seguinte ao lançamento de Elvis, de Baz Luhrmann, em que todos os holofotes se voltavam ao grande ídolo pop do século 20 e sua relação turbulenta com o pai e o empresário salafrário. Contudo, agora, pela primeira vez, Elvis é o coadjuvante da história retratada a partir da versão de sua ex-mulher.

Coppola nos faz mergulhar de cabeça entre os anos de 1959 e 1973. Para isso, utiliza outra caraterística de sua cinematografia: uma trilha sonora impecável, que traz hits daquela época, alguns em versões mais recentes como “Baby I Love You”, de Ramones. As músicas que eram sucesso na voz de Elvis e não foram autorizadas para o filme definitivamente não fizeram falta.

De início, já somos fisgados pelo ar angelical da protagonista, que era fã de Elvis (afinal, quem não era?). Da fase idílica do relacionamento até a separação, imergimos no mundo de Priscilla, solitário e puro, que transparece na paleta de cores usada pelo diretor de fotografia Philippe Le Sourd (que trabalhara com a cineasta em O Estranho que Nós Amamos). 

Interpretado por Jacob Elordi (mais conhecido por aqui pelo trabalho no filme A Barraca do Beijo), o furacão Elvis é visto aqui em sua intimidade, com seus caprichos, manias e vícios. Com seu jeito sedutor de falar, suas pernas inquietas, seu gosto por decoração esdrúxula. Mas longe do spotlight e do frenesi ao redor, existia um drama particular: as dores de Priscilla ao se tornar a senhora Presley. 

Sofia permanece fiel ao início da biografia e nos introduz à protagonista ao som dos acordes oníricos de “Venus”, de Frankie Avalon, na fase em que ela está na Alemanha. No livro, Priscilla conta que, como seu pai era oficial do exército, as mudanças eram constantes em sua vida, o que dificultava manter laços de amizade. Portanto, quando ela é abordada por um amigo de Elvis, que a convida para ir à casa do cantor, o tédio de seus olhos se transforma em esperança.

No primeiro ato, acompanhamos o encontro de dois corações solitários. A adolescente tímida, que ainda não usava as maquiagens e roupas cheias de glamour, e um astro da música e do cinema, que havia recém perdido a mãe. Depois do primeiro encontro, a adolescente passa a viver nas nuvens e numa constante espera por alçar voo. Se uma garota já perde o chão por um simples mortal, imagina quando esse namorado se trata de Elvis Presley. 

Apesar da diferença de idade, Priscilla acreditava que Elvis havia encontrado nela uma confidente, alguém para conversar. Aos poucos, entretanto, o filme nos mostra como ela era moldada conforme a vontade do rei. Trata de como o rei a prendeu numa gaiola.

Quando é convidada a se mudar para Graceland, em Memphis, Priscilla passa por uma transformação aquém da sua vontade. É Elvis quem dita como ela deve se vestir (“listras não valorizam o seu corpo”), como se maquiar (devia usar o delineador mais marcado para valorizar os traços) e até a cor do cabelo. Elvis também lhe oferece pílulas para dormir (que são uma constante no filme!) e a introduz no mundo psicodélico do LSD. E assim segue a viagem pelos anos 1960, com olhos delineados de gatinho, sapatos de salto alto adornados com margaridas e laquê. Muito laquê.

Priscilla vira uma espécie de bibelô de Elvis. Uma boneca de porcelana intocável e munida de uma resiliência impressionante. Tanto é que seu relacionamento leva anos para ser consumado. Não por sua vontade, mas por capricho e prudência de Elvis. O romance permanece limitado a beijinhos e abraços, tanto é que muitas das cenas são rodadas com o casal na cama, como num namoro adolescente. Cristão devoto, Elvis pedia para que ela esperasse o momento certo. 

Enquanto o marido viajava para gravar seus filmes, Priscilla passava seus dias em Graceland acompanhando as mesmas revistas de fofoca que agora estampavam os supostos affairs dele. Numa certa altura do filme, a angústia chega a tomar conta. Será que ela vai suportar tudo isso sem se rebelar? Sem gritar? Sem se descabelar? 

Até que, afinal, chega o momento do confronto. E a resposta de Elvis é direta: quero uma mulher que seja capaz de entender e suportar essa situação. Nesse ponto, Cailee mostra porque foi indicada ao Globo de Ouro. Sua fisionomia expressa a dualidade de sentimentos: o olhar frustrado e amargurado diante dos rumores rapidamente se transforma numa postura de conformismo. Priscilla é a oficial e conseguiu cumprir o pacto das vistas grossas que tantos casais famosos acabam assumindo. 

Por outro lado, o roteiro de Sofia mostra um Elvis que também buscava transcender, seja com LSD ou com suas leituras sobre espiritualidade, como o livro Autobiografia de um Iogue, que ele queima depois na fogueira. Infelizmente, Elvis não teve um coach ou um empresário à altura.

E quando os dois finalmente se casam, Coppola opta pela elipse: Priscilla ressurge grávida de Lisa Marie, que, por sinal, não aprovou o roteiro da cinebiografia. À imprensa internacional, disse que pai fora retratado como um sujeito predador e manipulador. 

Nas cenas pós-créditos da vida real, Priscilla conhece um novo amor: o brasileiro Marco Antônio Garibaldi, de Curitiba, com quem teve um filho, o músico Navarone Garibaldi (Garcia), e de quem também se separou. Esta é a prova de que o mundo dá voltas. É a prova que nossas escolhas definem o nosso destino. (JM)

***

Priscilla (EUA, 2023 – O2/Mubi) é, como entrega seu título, sobre Priscilla Presley, por mais que Elvis apareça em cena como um belo coadjuvante da história (e, detalhe, quase nunca em ação em palcos e estúdios). Só que justamente por retratar a intimidade da esposa do astro e sua conturbada relação conjugal que se arrastou por mais de uma década do lado de dentro dos suntuosos portões de Graceland que é perfeitamente possível dar uma de Gay Talese (que em 1965 cunhou um marco do New Journalism fazendo uma extensa reportagem-perfil sobre Frank Sinatra apenas entrevistando mais de uma centena de pessoas que gravitavam ao redor dele e sem trocar uma palavra com o astro) e perceber, no decorrer das cenas dirigidas e roteirizadas por Sofia Coppola, uma “cinebiografia paralela” do Rei do Rock.

Ok, você pode até argumentar que Baz Luhrmann já havia feito isso ano passado, com louvor e inclusive recebendo prêmios e indicações ao Oscar. Só que o objetivo de seu filme era justamente revelar como determindas particularidades da vida pessoal do cantor transformaram-no na persona pública que conquistou o mundo. O longa de Sofia, que faz da ancoragem da perspectiva feminina a principal marca em toda a sua trajetória de cineasta, revela justamente o inverso: como o maior astro do rock’n’roll interferiu no cotidiano de quem mais tempo esteve ao seu lado sem ter  vínculos familiares.

Por meio de aparições do Elvis ídolo pode-se ver como tudo isso o tornou em opressor, agressor, vilão. Claro que a intenção de Coppola passa longe do maniqueísmo, por mais que a filha Lisa-Marie, nos meses que antecederam a precoce morte, tenha chiado publicamente com a diretora e roteirista a respeito do modo como seu pai fora retratado por ela. Também não há a intenção de embate com a extensa legião de fãs do artista. Pelo contrário: entendendo como Elvis interagia com o mundo dá para entender como isto prejudicou (e bastante) a intimidade com a companheira, dez anos mais nova. Vale a pena ressaltar também que o filme é adaptado das memórias escritas por Priscilla e que a própria é diretora executiva da empreitada. Portanto, a fidelidade aqui é alta e sem passar pano para a imagem construída pela indústria do entretenimento.

Aqui estão oito passagens de Priscilla que servem também como testemunho de quem viveu de perto um pouco da História do rock.

A invenção da adolescência

Foi tudo culpa do cinema de Hollywood e seu amálgama com o efervescente rhythm’n’blues que saiu dos guetos noturnos negros para dominar rádios e lojas de discos com o novo batismo de rock’n’roll. No decorrer da primeira metade dos anos 1950 os mais jovens começaram a se sentir representados nas grandes telas. Seus problemas, suas angústias, seus comportamentos muitas vezes erráticos diante de uma sociedade repressora e, sobretudo, o fato de querer gritar ao mundo que, mesmo deixando de usar calças curtas e serem tratados como crianças, eles eram bem diferente do mundo chato de seus pais, tios e avós. O rock fez a função de trilha sonora de toda essa rebeldia que, de fato, já andava sendo reproduzida havia alguns anos nas ruas dos grandes centros urbanos estadunidenses. Os filmes representaram a mola propulsora para amplificar essa nova voz. Elvis era um apaixonado pela sétima arte. Decorava inúmeras falas de longas que via repetidas vezes e seu sonho era atuar em Hollywood, tal qual seus principais ídolos, James Dean e Marlon Brando – inclusive passando um período estudando no Actors Studo, em Nova York. Por sua vez, Priscilla era uma garota que, entre muitos nomes do rock, curtia ouvir… Elvis Presley.

Saudades da mãe na Alemanha

Em razão da carreira do padrasto nas Forças Armadas dos EUA, Priscilla morou em várias cidades e também outros países durante a infância e começo da adolescência. Por isso, sua maior dificuldade era fazer amizades por onde passava. Durante a passagem por Wiesbaden, na Alemanha, acabou conhecendo Elvis Presley por intermédio de um convite de um amigo dele, que a vira numa lanchonete bastante frequentada por jovens na região. Ela tinha apenas 14 anos e ainda estava no colégio. Ele, aos 24, já um astro do rock consolidado e dera uma pausa na carreira musical para, durante 18 meses, prestar o serviço militar em base estadunidense fixada por lá. O cantor estava abalado com a perda precoce da mãe Gladys, com quem possuía uma forte ligação sentimental. Foi justamente na ingenuidade dos 14 anos de Priscilla que Elvis afirmava ter reconhecido a pureza que enxergava na mãe, que falecera aos 46 durante o período vivido em solo germânico. Foi de presente para mãe que Elvis comprou a mansão chamada Graceland, onde morou ao voltar aos EUA e ficou até a sua morte. Foi para Graceland que Elvis levou Priscilla em definitivo, em 1962, depois da garota terminar suas obrigações escolares na Alemanha. Só que, em nome da manutenção de sua imagem pública de sex symbol e a garantia da alta popularidade, o artista se negava a se expor em fotos e aparições junto com a namorada.

Máfia de Memphis

Graceland era enorme. Não servia apenas como residência de Elvis. Era também seu escritório de trabalho, com direito a duas secretárias para fazer tudo o que o astro, seu pai Vernon e seu empresário Coronel Tom Parker solicitavam. Mas também o local era repleto de seus amigos inseparáveis. Uma turma de machos que ganhou a singela alcunha de Máfia de Memphis. Andavam sempre a tiracolo, parasitando a boa vida que ele levava na condição de artista multimilionário, Rei do Rock e, a partir de então, ator que carregava multidão de fãs ao cinema para ver seus filmes. Elvis carregava o pessoal para cima e para baixo, para suas viagens a Los Angeles e aos sets de filmagem. Com eles fazia tudo o que homens jovens foram acostumados a fazer em uma sociedade machista e patriarcal: se divertir em conjunto, deixando as mulheres de lado e em muitos casos menosprezando-as a maltratando-as verbal, física e psicologicamente. Com Priscilla “trancada” em Graceland, muito de seu cotidiano era acompanhar as travessuras pós-adolescentes do menino Elvis por meio de notas e matérias publicadas pela imprensa.

Viva Las Vegas

Umas das muitas decepções de Priscilla com o comportamento de Elvis ocorreu durante as filmagens de Viva Las Vegas (de 1964, que no Brasil ganhou o título de Amor a Toda Velocidade). Ignorando total e completamente a existência dela Graceland, o astro se apaixonou pela colega de elenco Ann Margret e nem sequer se importou em tomar cuidados para não tornar a relação pública. Só que o caso não durou muito tempo. Foi árduo durante as filmagens, mas, depois que a imprensa descobriu e passou a noticiar o tórrido romance (chegou a se falar até sobre noivado que nunca existiu!), a atriz sueca confrontou o parceiro e Elvis deu para trás no período da divulgação do filme por causa de Priscilla. O astro, também, sequer foi à pré-estreia em Londres porque Tom Parker não tinha passaporte não poderia sair do território estadunidense. Em Viva Las Vegas, Presley interpretava um obcecado piloto de corridas que quer participar de uma disputa na cidade dos cassinos mas é obrigado a enfrentar o revés de perder o dinheiro que usaria para comprar um motor possante. Como solução, passa a trabalhar de garçom. É aí que ele conhece uma bela professora de natação (Margret). Contudo, a relação não engrena por dois motivos: ela se sente incomodada com os riscos à vida que a velocidade do automobilismo pode trazer e ainda fica dividida ao ser cortejada por um nobre italiano que, ao contrário do protagonista, alardeia que largaria a paixão por carros caso encontrasse um grande amor.

Mão de ferro

Tom Parker sempre foi o grande manda-chuva da carreira de Elvis. Muito pela ingenuidade e credulidade do jovem, que deixava todas as questões “burocráticas” na mão do empresário para ficar livre para se divertir e performar. Isto deixou Parker com poderes totais para negociar e decidir tudo o que envolvia os bastidores da marca Elvis Presley. Se com o tempo este fator foi deixando-o com ares de vilão, trouxe também benefícios à então estrela em ascensão meteórica: o velho coronel soube trabalhar como ninguém a imagem do galã em seus primeiros anos de carreira. O licenciamento de Elvis foi vinculado a diversos tipos de produtos do dia a dia e impulsionou ainda mais a conquista da horda de fãs, primeiro nos Estados Unidos e depois mundo afora.

Frustração com o cinema

Se para o jovem Elvis Presley o cinema era uma grande paixão, ao longo de sua pausa na carreira musical tornou-se também sua grande frustração. Longe de ser aclamado publicamente pela imprensa especializada como um grande ator, passou a culpar os papeis, personagens e roteiros escolhidos por Tom Parker pelo “fracasso” na investida. Os milhões de dólares feitos pela sucessão de longas-metragens não faziam seus olhos brilharem. Ele estava cada vez mais inclinado a retomar de vez o caminho da música.

Retorno aos palcos

De saco cheio com os filmes “vazios” que estrelava para Hollywood, Elvis começou a forçar a barra com Tom Parker para retornar ao seu “habitat natural”: os palcos. Depois de quase uma década de ausência, acertou seu retorno em um especial para a TV no fim de ano. Já estava mais do que atrasado para isso. Afinal, o posto de Rei do Rock já estava mais do que perdido para os Beatles, que havia quase meia década mandavam e desmandavam nas paradas, vendagens e histeria da juventude. As filmagens ocorreram em meados de 1968 e o que seria inicialmente um programa voltado ao Natal transformou-se em um furioso retorno de um Elvis, agora bem mais velho e seguro de si, vestindo preto e voltando a flertar com a música negra, sobretudo o furioso soul de um EUA embalado pela luta por direitos raciais, civis e femininos. No dia 3 de dezembro, a NBC levou ao ar em rede nacional o programa. A melhor parte foi a seção intimista, com o astro ladeado pelos músicos de sua banda e em um palquinho cercado pelo público.

Residência em Las Vegas

Tom Parker não podia sair do território americano: ele não tinha passaporte por ser imigrante ilegal nos EUA. Então, a saída foi armar uma residência triunfal de Elvis em Las Vegas, terra da gastança de dinheiro em hotéis luxuosos e cassinos. A ideia deu tão certo que, entre 1969 até a morte do cantor em 1977, foram realizados 636 concertos, sempre com plateia lotada e o recebimento de todos os convidados VIP no camarim logo após. Durante  cada período de shows, eram realizados dois deles por noite. Portanto, esta intensidade provocou um turbilhão movido a drogas na vida de Elvis, cada vez mais, deixando o cotidiano com Priscilla completamente de lado até o envolvimento dela com o professor de artes marciais e as consequentes separação e “fuga” de Graceland. (AS)