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Pacarrete

Diálogos mal montados e personagem exagerada marcam a irregularidade de história protagonizada por Marcélia Cartaxo

Texto por Leonardo Andreiko

Foto: Vitrine Filmes/Divulgação

O legado de uma atriz pode ofuscar ou elevar uma obra. Marcélia Cartaxo, a protagonista de Pacarrete (Brasil, 2020 – Vitrine Filmes), tem trinta e cinco anos de carreira, é sempre reconhecida por sua estreia cinematográfica: a personagem Macabéa, de A Hora da Estrela. Nesse longa, em que interpreta a própria Pacarrete, Cartaxo é o foco – não somente do filme em si, mas de todo o falatório envolvendo seu lançamento.

A atriz interpreta aqui uma professora de balé aposentada que deseja se apresentar no aniversário de 200 anos de sua cidade, a pequenina Russas, no interior do Ceará. No roteiro, um esforço conjunto de quatro pessoas (entre elas o próprio diretor, Allan Deberton), Pacarrete briga, insiste e se interessa por aqueles que vivem ao seu redor. Por ser tão próxima da personagem, a trama é absolutamente ligada às suas relações. Por consequência, é de extrema importância que a própria protagonista seja, no mínimo, gostável.

No entanto, cai por terra a empatia quando, por uma questão estrutural da montagem, somos introduzidos ao universo de Pacarrete por meio de seus defeitos. É evidente a tentativa de estabelecê-la como cômica e excêntrica, ao menos quando inserida na sociabilidade interiorana, mas despontam nela defeitos como a insistência, intransigência e descolamento completo da realidade. Este último, no entanto, é resultado da atuação de Cartaxo, que imposta a voz e assume caras e bocas que destoam consideravelmente do restante do elenco. 

A insistência agressiva com que o filme tenta solidificar os trejeitos e a personalidade de sua protagonista acaba por atrapalhar – e muito – qualquer tipo de conexão empática. É por conta disso, portanto, que esperamos mais da metade do longa para que o arco pelo qual Pacarrete passa torne-se significativo. 

Somente quando a obra assume um rumo mais contido e distante das “comédias Globo Filmes” que as qualidades da atuação de Marcélia Cartaxo se sobressaem, bem como da direção de Deberton. Na sobriedade, ambos assumem os conflitos e se aprimoram. Se a mise-en-scène se encontrava despida de textura, inventividade e, até mesmo, singularidade, o diretor acaba por orbitar o semblante sofrido de sua protagonista, que sem quaisquer palavras é capaz de emocionar.

Marcado pela inconsistência, Pacarrete é daqueles filmes que requerem paciência. Porém, mesmo em seus melhores momentos, está distante de seu público. Manchado pelos diálogos mal montados, escolhas indigestas de personagem e discrepância entre a protagonista e seu entorno, esse é um longa com boas peças (com um destaque especial à ótima atuação de João Miguel) unidas num todo decepcionante. 

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