Andrew Patterson impacta logo em seu primeiro filme por investir na narrativa literária em história sobre invasão alienígena nos anos 1950
Texto por Leonardo Andreiko
Foto: Amazon Prime/Divulgação
São várias as vantagens em estabelecer um controle autoral de um filme. Ao entregar a um roteirista as cadeiras de direção e produção, confere-se à obra uma possibilidade de maior controle estilístico. Claro, não é uma receita para o sucesso, mas um caminho que, quando o consegue, traz um produto interessante. A Vastidão da Noite (The Vast Of Night, EUA, 2019 – Amazon Prime) é um exemplo.
Andrew Patterson dirige a obra, escrita e produzida por James Montague e montada por Junius Tully – na verdade, pseudônimos do autor. Nela, abientada no ano de 1958, o radialista Everett (Jake Horowitz) e a telefonista Fay (Sierra McCormick) encontram, por acidente, um estranho som na transmissão do programa de Everett que atrai duas narrativas em torno de sua origem: as de Billy (Bruce Davis) e Mabel (Gail Cronauer). Patterson propõe, desde o início, uma obra diferente do tradicional imbróglio alienígena dos blockbusters da última década. Cheio de inspirações vintage (como A Guerra dos Mundos, O Dia em Que a Terra Parou e o programa de TV Além da Imaginação), o longa constrói uma atmosfera fortemente nostálgica pela qual somos guiados em um plano sequência atrás de outro. Ainda na intenção de estabelecer um sentimento antes de um enredo tradicional, a primeira hora de uma trama que dura apenas 91 minutos e é fortemente calcada no diálogo tarantinesco – um papo furado rápido e dinâmico.
É por sua causa, como também pela forma que Patterson escolhe estabelecer o andamento da trama, que é possível traçar um forte paralelo entre a narrativa de A Vastidão da Noite com a de um conto sci-fi ou até mesmo das radionovelas da época que retrata – cujo esforço em tecer comparações é visível na abordagem do diretor. Tal como na literatura, há bastante espaço para a construção dialógica dos personagens – é por meio da fala que entendemos quem são, como agem e suas relações interpessoais na pequena e fictícia comunidade de Cayuga. Tal como no rádio (como também por meio dele), ouvimos o desenrolar da história. Muito mais que a história de Everett e Fay, o longa é o conto de Billy e Mabel e, assim como os protagonistas, assistimos à entrega da trama por meio da voz destes.
Portanto, há uma novidade na condução fílmica de Patterson durante boa parte da narrativa. O diretor brinca bem com o suspense e a construção atmosférica da cidade, mas acaba por se repetir ao espelhar a receita de sua primeira metade. Como aqui não há muito espaço para uma discussão despida de spoilers, peço desculpas de antemão por soar vago, mas, para não deixar a argumentação aberta, convém dizer que rompe-se com a condição primária do espectador. Inicialmente, somos acompanhantes passivos de Fay e Everett, assistindo-os com espaço e descobrindo junto deles o desenrolar da narrativa. No entanto, conseguimos nos descolar dessa condição de companheiros distantes para nos tornarmos, sem intermédio, os descobridores da trama.
À medida que Patterson se distancia da abordagem “literária” também deixa para trás o frescor de sua unidade estilística. Isso não torna o filme ruim, mas seu fechamento é frustrante, até mesmo decepcionante. É convencional considerar casualmente que uma conclusão bem feita é mais satisfatória que um desenvolvimento primoroso. Contudo, este longa serve de contraponto. A Vastidão da Noite é um exercício de direção fresco, uma demonstração do potencial de um diretor, roteirista, montador e produtor estreante.