Natureza dos afetos e relações dos jovens durante a temporada do verão é o foco principal deste longa francês

Texto por Leonardo Andreiko
Foto: Belas Artes/Divulgação
Há algo de particular nas viagens de verão. O sol forte, roupas frescas, o contato com gente de todos os cantos e aquele barzinho para passar a noite. Para quem vive na fria Paris, ainda por cima, a experiência de deixar a chuva pra trás soa ainda melhor. Pelo menos é o que parece quando se assiste a Embarque! (À L’Abordage, França, 2020 – Belas Artes), novo longa-metragem de Guillaume Brac.
Nele, a viagem de verão é particularmente curta e de intuito muito bem definido: Felix (Eric Nantchouang) acabou de conhecer Alma (Asma Messaoudene) e, já apaixonado, decide surpreendê-la em sua viagem com a família para o interior francês. Ele e o melhor amigo Chérif (Salif Cissé) conseguem uma carona com Edouard (Édouard Sulpice), um filhinho da mamãe que rapidamente se incomoda com o tom jocoso dos caroneiros.
Presos num camping devido à quebra do carro de Edouard (de sua mãe, na verdade), o grupo é forçado a estar junto. Daí surge uma qualidade peculiar do roteiro de Brac e Catherine Paillé, que remete à natureza leve e livre do veraneio que abre esse texto. Apesar da odisseia de Felix tentando conquistar uma nada interessada Alma conferir a trama ao longa, esse não é, propriamente dito, um filme de enredo. As cenas que se constroem optam deliberadamente por uma investigação muito sutil e bem-humorada sobre a natureza dos afetos – e é nos pequenos momentos em que eles se solidificam.
Somos convidados a acompanhar Chérif, deixado para escanteio pelo apaixonado Felix, em seus pequenos momentos aproximando-se de Helena (Ana Blagojevic) e Nina, sua filha bebê. Enquanto o apaixonado protagonista disputa Alma com o arrogante salva-vidas Martin (Martin Meisner), Edouard consegue conectar-se com Nicolas (Nicolas Pietri), o ansioso amigo do “vilão” do romance de Felix, e, como quem não quer nada, acaba com um dos mais significativos arcos narrativos do filme.
Essa natureza pacata sem deixar de lado a leveza e a diversão permite que as personagens respirem e interajam sob uma fotografia bastante naturalista, em que a claridade que o sol emana dificilmente deixa a tela. O que poderia conferir um visual “chapado” à obra (ou seja, sem dimensões e profundidades) é o que lhe garante a dramaticidade tão sutil.
Embarque!, que extrai seu nome de uma cena em que o trio de protagonistas, sem ter o que fazer, assiste a uma apresentação de comédia infantil no centro da cidade, convida-nos justamente a um embarque despretensioso nas relações afetivas que se formam, seja na ausência de expectativas e intencionalidades, seja no empacamento que elas são capazes de gerar. Ao fim do longa de Brac, não apenas nos intimizamos com cada uma das personagens em tela, mas estamos prontos para deixá-las ir em paz. Uma relação leve como as amizades de verão.