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Pelebroi Não Sei?

Idolatrado quarteto de punk rock lança novo álbum depois de longo intervalo e faz show arrasador em Curitiba

Textos por Luciano Vitor

Fotos: Divulgação (estúdio) e Luciano Vitor (ao vivo)

O tempo não atinge determinados artistas ou bandas. É imutável, inclassificável e flui em um caminho próprio, longe dos segundos, minutos, horas, dias e afins pertinentes do que classificamos exatamente como tempo.

O que são 18 anos sem lançar um novo álbum (sem contar os singles lançados em 2018, “Girassois” e “Flores de Ipê”, mais “Lamento Para Mariana, de 2021)? Aos Farsantes Com Carinho, de 2005, foi o último trabalho “cheio” do grupo curitibano Pelebroi Não Sei? com petardos do calibre como “A Triste Figura”, “Alice Clair” e “Sobre o Tempo e Nunca Mais”. Estas são canções atemporais e, de certa maneira, estão em um disco que faz sentido e proporcionou um upgrade à carreira do quarteto até os dias atuais.

Desiderato, o tal novo álbum, é uma trama pessoal. Não procure aqui letras políticas. Não tente achar alguma deferência ou desabafo referente aos últimos anos do momento vivido pelo país. Todas as canções deste mais recente trabalho fazem parte de um contexto pessoal e que atravessa de maneira coerente os últimos 25 anos da banda pela perspectiva de um dos componentes do grupo. Oneide Diedrich, vocalista e letrista do quarteto, soube rasgar a alma para não apenas expor sentimentos guardados mas evitar a beligerância política que vem se arrastando há alguns anos no Brasil. A banda abraçou musicalmente esse fato e o transformou em um trabalho, redondo e certeiro. Sem firulas, sem rodeios e direto ao ponto. Como em todo trabalho com a alma punk, crua, objetiva e direto ao ponto.

E como um álbum abraça, de maneira uniforme, canções de 1999 (“Cinco Pedras”) e 2000 (“Aquele Abraço”), outras mais recentes, um músico do Terminal Guadalupe (Alan Yokohama), uma artista plástica, amores vividos, esquecidos e um dos bardos do Rio Grande do Sul chamado Frank Jorge? Sendo o Pelebroi Não Sei? tudo isso é possível e plausível. Basta ter na mente que mesmo os punks podem se organizar de tal maneira que o improvável acontece. Um álbum de punk rock falando muito de amor e conflitos conquista os ouvidos com uma pegada mais suave. Por isso, mesmo ainda estando na metade do ano, Desiderato já entra na lista dos melhores trabalhos da temporada até aqui.

O baterista da banda, Guilherme Bandeira, conseguiu imprimir a pegada de sempre nas gravações. Mesmo ele tendo um estilo mais rápido e costumeiramente mais pesado, aqui a bateria emoldura de maneira ímpar as já tratadas canções de amor. Já Joca e Paulo Slovenski fecham o quarteto com as cordas em momentos ímpares e de maneira inteligente e simples, sem também deixar a veia punk de lado.

Ouvir o disco de maneira contínua é ouvir canções sobre o mais belo dos sentimentos. Nunca imaginei um dia escrever isso: os punks também amam e ainda sabem fazer um disco tão ou mais maduro que os indies ou mesmo artistas tarimbados na arte de escrever e cantar a respeito do amor na MPB.

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Para quem está acostumado a assistir a shows que começam às 23h ou meia-noite, estar em uma apresentação de punk rock prevista para um pouco além das 21h é novidade. E se não fosse a live do Instagram da banda, publicada pela assessora de imprensa, Gisela Garcia, eu não teria sinceramente sobre o que escrever.

Chegando esbaforido ao Armazém Garagem Bar, em Curitiba, deparo-me com um local gigante, digno das grandes bandas, digno do retorno dos punks mais amados de Curitiba, o quarteto Pelebroi Não Sei?. Em um minuto estava de frente para o palco, quase colado (os óculos para a miopia levados por engano para outro estado não fizeram muita falta), tendo tempo de ver no palco, Frank Jorge (sim, o próprio ícone gaúcho!), Fabio Elias (frontman da Relespublica), Emanuel Moon (também Relespública) na bateria, Oneide, Joca e Paulo completando a formação e impondo a icônica canção “Amigo Punk” aos mais de 400 presentes. Foi simplesmente avassalador!

Com a saída de Frank, Fabio e Moon, a banda retomou seu quilométrico repertório, que resgatava “Lagrimas Alcoólicas” e manteve a plateia de maneira ensandecida! Apesar da minha chegada, próxima das dez da noite, o que vi foi um show de digno de várias questões. Primeiro: por que o Pelebroi, não conseguiu furar a bolha do independente para o mainstream?  É uma banda com mais de 25 anos de carreira, que já tocou em dezenas de lugares Brasil adentro, e o que vemos em pleno 2023 não passa um rock made in Brazil acéfalo, burro e com carinha de bom moço. Segundo: por que as letras do quarteto são mais inteligentes do que a maioria dos versos cantados em canções por artistas novos nos últimos anos? O Pelebroi tem letras contundentes, irônicas, satíricas, sem perder a essência popular. E, por último, onde mais pode se estar em um show que congrega senhoras do alto dos seus 75 anos (D. Graciosa!), crianças, pais, adolescentes e um público mais velho (que ia dos 25 aos 55) pulando enlouquecidamente ao som de 32 canções?

Tudo isso é uma apresentação ao vivo do Pelebroi Não Sei?, uma das melhores bandas de punk rock que existe no Brasil. Mas a grande mídia, aquela que ainda se arrasta no eixo Rio-São Paulo, não quer que você saiba disso. Então, procure saber!

O show daquele dia 7 do mês 7 último foi insano, profano e com uma energia juvenil de quatro senhores do alto dos seus mais de quarenta anos nas costas – algo que não se vê sempre. Presenciar Oneide, Joca, Paulo e Guilherme entregando tudo foi de alegrar o coração e deixar um sorriso no rosto.

Perto da meia noite, o show no Armazém já terminava. Restava a certeza que dias melhores virão.

Set list: “Velhos Dias”, “Because Que”, “Alice Clair”, “Teddy Holiday Club”,  “Tum Tum Pah Yeah!”, “Só Para Disfarçar”, “O Intransigente”, “A Triste Figura”, “Sem Açúcar, Sem Afeto”, “Sobre o Amor”, “Mais um Blá Blá”, “Desiderato”, “Blue”, “Mini Punk/Amigo Punk”, “Lágrimas Alcoólicas”, “Se Viver Fosse Doce”, “Onomatopeia”, “Não Dá Nada”, “O Rolê”, “Aquele Abraço”, “Odontalgia”, “5 Pedras”, “Fantasminha”, “Sádica e a Rosa”, “Tá Foda/Yaskara”, “Céu Sem Cor”, “O Funil”, “Contra Senso II”, “Contra Senso I” e “Somos Assim”.

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