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Arnaldo Antunes + Vitor Araújo

Oito motivos para você não perder a chance de ver ao vivo o show em conjunto do cantor e compositor paulista e o pianista pernambucano

Texto por Abonico Smith

Foto: Divulgação

Fevereiro de 2020. Mês de lançamento do décimo segundo álbum de estúdio de Arnaldo Antunes. O Real Resiste, como diz o próprio título (além dos versos que compõem a letra da faixa que o batizou, servia como um contraponto para o autor. Sob um clima de meia-luz, harmonizando teclas e cordas e dispensando a parte rítmica de percussão e bateria, era um pretexto para uma retomada de ar de toda a loucura na qual o país mergulhara no ano anterior, com todos os bichos escrtos que saíram dos esgotos sob o comando do inominável presidente.

Mas eis que veio a pandemia da covid e o Brasil parou. O mundo parou. Isolamento radical e a mais completa falta de possibilidade de seguir em frente no meio artístico e cultural. Arnaldo foi pego em cheio por este tsunami planetário. Estava preparado para estrear a turnê que divulgaria e espalharia por diversas cidades o disco novo. Ainda mais porque a empreitada traria uma novidade: em vez de estar acompanhado por uma banda no palco, haveria apenas um músico ao seu lado. E não qualquer músico. O escolhido havia sido o pernambucano Vitor Araújo, enfant terrible dos pianos, que alguns anos atrás despontara como uma grande revelação da música brasileira ao se propor a experimentar novos caminhos e sonoridades em seu instrumento, indo além da convencional exploração das teclas pretas e brancas com os pedais.

O novo show virou apenas lives (Sesc Pompeia, Inhotim) e gravação para documentários (Arnaldo 60). O entrosamento estava tão grande, porém, que Arnaldo voltou para o mesmo estúdio situado em uma fazenda do interior de São Paulo, levando Vitor para criar mais um disco. De lá saíram nove faixas (algumas inéditas, outras já lançadas antes por Roberto Carlos, Erasmo Carlos, Itamar Assumpção, Titãs e o próprio Arnaldo em carreira solo) registradas  no período de uma semana. A temática compreende  as instabilidades emocionais tão pertinentes àqueles dias (distanciamento, saudade, comunicação ruidosa, fim de relacionamento) e a participação do jovem pernambucano não se limita à condição de mero coadjuvante musical. Vitor revela-se tão intérprete quanto Arnaldo, desdobrando o seu piano em muitas camadas e climas, dando a impressão de estar se ouvindo mais gente colocada ali no aquário do estúdio durante a gravação.

Aos poucos, depois do lançamento do álbum Lágrimas no Mar em setembro de 2021 (portanto, ainda naquele clima de incertezas vivido pelo lento arrefecimento do lockdown), Arnaldo e Vitor vão levando à estrada o show que a pandemia insistiu em adiar, agora com um repertório de canções ainda maior por conta do trabalho em conjunto. Nesta sexta, 17 de maio, é a vez de Florianópolis (clique aqui para mais informações sobre local, horário e ingressos). No sábado, a dupla se apresenta em Curitiba (clique aqui para mais informações sobre local, horário e ingressos). E o Mondo Bacana preparou abaixo oito motivos para você não perder a chance de assistir ao perfeito entrosamento entre Arnaldo Antunes e Vitor Araújo ao vivo.

Som do silêncio

Uma das ideias de Arnaldo ao apostar no formato de piano e voz ao vivo – ainda mais com as intervenções autorais de Vitor Araujo – foi justamente chamar a atenção para o momento das pausas. O intervalo, o interim, o pequeno espaço entre um som e outro, seja a sua voz ou de algum instrumento. Então, fazer a audiência poder desfrutar dos curtos instantes de silêncio também passa a ser um requinte que poder realçar o valor de uma canção – algo que seria quase impossível se estivesse ali com o vocalista uma banda inteira.

Piano autoral

A presença de um nome como Vitor Araújo significa perceber as canções – do próprio Arnaldo ou as releituras – de uma outra forma. O pernambucano assina o arranjo de todas as músicas para seu instrumento e se multiplica de uma forma pouco vista no terreno da música pop. Também apresenta ao gênero o piano preparado, que consiste na montagem de peças introduzidas entre as cordas, de modo que quando a pressão das teclas as fazem ressoar sejam produzidos efeitos sonoros inusitados e diferentes. Henry Cowell e John Cage são os principais nomes desta técnica.

Spoken word

Além da música, Arnaldo sempre foi bastante ligado ao mundo da poesia, chegando a fazer instalações e brincadeiras visuais com palavras e letras de canções para algumas exposições. Quase despido da instrumentação convencional da música pop, encontra um terreno ideal para injetar a leitura de alguns poemas entre uma música e outra do set list. Mas não espere que haja só a declamação por meio de sua voz. Vitor o acompanha criando efeitos e sonoridades que transforma tudo em um breve happening, tão visceral quanto o momento das harmonias e melodias.

Duas vezes Titãs

Claro que aqui não poderia deixar de ter a presença de faixas assinadas por Arnaldo para o repertório de sua ex-banda. A tensão da harmonia de “O Pulso” combinada à lista quase declamada de doenças e distorções do corpo e da mente é um dos momentos mais vibrantes do show. O arranjo elaborado por Vitor dá um novo gás à canção que sempre foi uma das favoritas dos fãs dos Titãs e foi muito bem recebida no resgate da recente turnê de reunião de seus integrantes da formação clássica. Já “Saia de Mim” tem as dissonâncias harmônicas das teclas de Araújo muito bem casadas com o vocal raivoso e gritado de Arnaldo, que parece expelir, na hora de cantar, as excreções corporais relacionadas em sua letra (suor, peido, vômito, escarro, espirro, pus, porra, sangue, lágrima, catarro). Tudo para chegar ao fim com a exclamação “saia de mim a verdade”.

“Fim de Festa”

Na releitura deste blues de pura fossa de Itamar Assumpção, Arnaldo e Vitor injetam um certo ar soturno, com a exploração de timbres graves (a linha contínua do baixo mais o vocal-tenor quase falado do paulista) e uma repetição mântrica propícia para o pernambucano criar alguns barulhos estranhos no arranjo, manipulando diretamente as cordas do piano no interior da cauda. Vale lembrar que o resgate da canção é mais uma referência ao período da pandemia, quando vários casamentos e namoros chegaram ao fim por conta justamente da incompatibilidade de gênios, modos e pensamentos reforçada pela intimidade extrema do isolamento social. Outra curiosidade: a gravação original veio outro disco criado em parceria entre São Paulo (Itamar) e Pernambuco (Naná Vasconcelos), lançado em 2004, um ano após a morte do cantor e compositor. O videoclipe oficial da faixa registrada em Lágrimas no Mar tem Rubi, neta de Itamar, fazendo a performance de dança.

“Manhãs de Love”

Composta por Arnaldo Antunes e Erasmo Carlos gravada pelo Gigante Gentil no álbum que leva justamente seu segundo apelido como título, em 2014. Faz parte do renascimento artístico do Tremendão, com uma sucessão de álbuns nos quais ele abriu seu leque de parceiros, indo bem além do costumeiro amigo de fé e irmão camarada Roberto Carlos. Este movimento fez com que o artista se aproximasse de uma nova geração de fãs, algo que continuou até a sua morte há dois anos. Faz dupla com “Fim de Festa” na cota de momento bluesy de dor-de-cotovelo neste trabalho parceira com Vitor Araújo. O piano, executado de modo mais tradicional, acentua a melancolia da letra.

Como 2 e 2

Composta por Caetano Veloso, gravada originalmente por Roberto Carlos e também bastante conhecida na voz de Gal Costa, a canção foi recriada por Vitor e Arnaldo para o álbum Lágrimas no Mar. Feita durante o período de maior repressão da ditadura militar no Brasil, sua letra expressa, recorrendo à matemática e alterando metaforicamente as suas certezas (e, claro, fazendo referência direta ao estado totalitário imaginado por George Orwell para o clássico livro 1984), a imprevisibilidade das coisas, seja na expressão dos sentimentos de qualquer pessoa ou mesmo na vida perante a uma sociedade que muitas vezes se transfigura no horror ao qual não desejamos para a gente. A manipulação da verdade – aqui, no caso de somar dois e dois e dar cinco como resultado – anda bastante em voga hoje em dia, em um mundo cheio de distorções provocadas por uma enxurrada diária de fake news, grande imprensa bastante tendenciosa e um bando de políticos que agem e dizem tudo de acordo com seus interesses e conveniências.

O Real Resiste

“Autoritarismo não existe/ Sectarismo não existe/ Xenofobia não existe/ Fanatismo não existe/ Bruxa, fantasma, bicho papão/ O real resiste/ É só pesadelo depois passa/ Na fumaça de um rojão/ É só ilusão, não, não/ Deve ser ilusão, não, não/ É só ilusão, não, não/ Só pode ser ilusão/ Miliciano não existe/ Torturador não existe/ Fundamentalista não existe/ Terraplanista não existe/ Monstro, vampiro, assombração/ O real resiste/ É só pesadelo depois passa/ Múmia, zumbi, medo/ Depressão, não, não/ Não, não/ Não, não, não, não/ Não, não, não, não/ Trabalho escravo não existe/ Desmatamento não existe/ Homofobia não existe/Extermínio não existe/ Mula sem cabeça, demônio, dragão/ O real resiste/ É só pesadelo depois passa/ Com um estrondo de um trovão/ É só ilusão, não, não/ Deve ser ilusão, não, não/ É só ilusão, não, não/ Só pode ser ilusão/ Esquadrão da morte não existe/ Ku Klux Klan não existe/ Neonazismo não existe/ O inferno não existe/ Tirania eleita pela multidão/ O real resiste/ É só pesadelo depois passa/ Lobisomem, horror/ Opressão, não, não/ Não, não/ Não, não, não, não/ Não, não, não, não”. Esta é a letra toda da canção criada durante o primeiro ano de desgoverno do inominável. É preciso dizer mais alguma coisa depois disso tudo?

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Jethro Tull – ao vivo

Ao proibir o uso de celulares durante quase toda a noite, Ian Anderson leva à plateia de Curitiba bastante do clima de um concerto do início da carreira

Texto por Daniela Farah

Foto: Abonico Smith

Se Ian Anderson queria reproduzir um concerto dos anos 1970 para o público que está em plena temporada de 2024, ele conseguiu. Tanto para o bem quanto para o não tão bem assim. Na noite de 12 de abril, o artista trouxe sua performance de Jethro Tull para Curitiba, mais precisamente o Teatro Positivo. A escolha por ser um teatro determinou todo o contexto do show. Não pela casa em si, já que o local recebe diversos concertos, mas pela estrutura da apresentação – dividida em duas partes, com direito a um intervalo de 20 minutos.

Quem foi lá esperando um show de rock saiu de lá frustrado, assim como quem se deixou levar pela ansiedade causada pela dependência digital e a raiva pela obrigação de deixar o celular guardado. O uso do aparelho era expressamente probidio por Anderson e havia alguns seguranças para vigiar quem insistisse em ignorar a ordem e botar medo de uma possível exclusão do recinto. Por outro lado, quem se abriu e deixou-se levar pela proposta do escocês saiu de lá diferente. Anderson encarnou a experimentação, a arte, a mistura com a tecnologia do presente apenas no palco (toda canção tocada era acmpanhada por um vídeo recentemente produzido, cheio de efeitos digitais e aquele ritmo fragmentado típico do videoclipe) e sua personalidade forte para dar o tom da apresentação da RökFlöte Tour.

Essa mudança de show para performance artística se refletiu inclusive nos arranjos sonoros das principais músicas do Jethro Tull. Mas isso não pegou ninguém desavisado: após entrar ovacionado e tocar “My Sunday Feeeling”, Ian conversou com o público. “Bem-vindos para celebrar sete décadas de lançamentos de discos”, disparou.

O cantor comentou com uma tonalidade um tanto quanto jocosa a respeito do fato de “Hotel California” ser curiosamente parecido com a sua composição “We Used To Know”, criada em 1969. “Ela é dedicada aos Eagles, aquele grupo pop fabuloso dos Estados Unidos que surgiu com uma música pop brilhante em 1974. Você vai poder notar similaridades entre as canções. Esta é uma minha que eu escrevi anos antes, particularmente o solo de guitarra que Jack irá tocar”, disse Ian, só errando a data do megahit (a faixa foi gravada em 1976 e lançada em dezembro do mesmo ano, dando nome ao quinto álbum dos anericanos).

Anderson contou histórias de todas as suas obras apresentadas no Positivo, como a do catavento em forma de galináceo que vive no teto de sua casa (o “Sr. Weathercock”). Ele ainda trouxe o clima de Natal antecipado – porque nunca é cedo para comemorar o Natal, ainda mais para cantar canções do Jethro Tull. “Ela traz elementos de música de igreja e folk mais algumas coisas da minha própria criação. Nós chamamos essa de “Holly Herald” e Scott Hammond vai começar com os bongôs.”

O passado logo foi substituído pelo presente e uma música do RökFlöte, “Wolf Unchained”, chegou, enfim, ao set list. E como o grande contador de histórias da noite, Ian mostrou seu humor britânico (ou seria o particularmente escocês?) especialmente nessa aqui, que soa muito sério no começo e surpreende no final. “É sobre aquele barulhento lobo perverso chamado fenrir. Era um cachorro muito mau… e eu ficava dizendo a ele para não lutar contra o entregador da Amazon senão não iria ganhar presente de Natal”, disse o músico fazendo o público cair na gargalhada.

Depois de “Mine Is The Mountain” e “Bourrée In E Minor” (versão da obra de Johann Sebastian Bach), chegou ao fim a primeira metade. Depois foram 20 minutos de intervalo, importante para que todo mundo pudesse relaxar da tensão e poder esticar as pernas. Ou mexer nos próprios celulares e coisas assim.

Talvez pela dispersão da pausa, a segunda parte não empolgou tanto assim. Exceto, claro, por dois momentos muito importantes. Um deles foi “Aqualung”. O clássico dos clássicos do Jethro Tull protagonizou o clímax da noite e levou o público a se soltar na cadeira, dançar e gritar. Anderson parecia feliz em proporcionar essa alegria aos fãs. É tão bonito quando a gente vê um momento genuíno de troca entre artista e público, especialmente com uma música que ele tocou tantas vezes durante toda a extensa carreira.

O outro grande momento foi a última música “Locomotive Breath”. Aqui, Ian Anderson foi genial. Como já estava no bis, ele permitiu que todo mundo pegasse seus celulares e câmeras e filmasse e fotografasse tudo o que quisesse. O público entrou em frenesi e milhares de celulares foram apontados para o palco praticamente a canção inteira. Assim distraídos, ninguém pode perceber a falta que a guitarra de Martin Barre (habilidoso membro da formação original que brigou com Anderson em 2011 e passou a excursionar com uma banda própria sem deixar de tocar os clássicos do Jethro Tull) fazia, especialmente nessa música.

Set list: Parte 1 – “My Sunday Feeling”, “We Used To Know”, “Heavy Horses”, “Weathercock”, “Roots To Branches”, “Holly Herald”, “Wolf Unchained”, “Mine Is The Mountain” e “Bourrée In E Minor”. Parte 2 – “Farm On The Freeway”, “The Navigators”, “Warm Sporran”, “Mrs Tibbets”, “Dark Ages”, “Aquadiddley” e “Aqualung”. Bis: “Locomotive Breath”.

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Bruce Dickinson – ao vivo

Vocalista do Iron Maiden inicia turnê brasileira do novo disco solo, The Mandrake Project, fazendo mágica sonora para o público de Curitiba

Texto e foto por Daniela Farah

Hipnose, olhos, gestos das mãos são poderes telepáticos usados pelos melhores mágicos do mundo. Enquanto o público olha para a direita, ele tira um coelho da cartola, na mão esquerda. Sinônimos de ousadia, mestre das fugas, senhor das sombras, mandrake, são vários apelidos dados aos ilusionistas. Ainda que Bruce Dickinson não se aposse desse título, ele veste a carapuça muito bem. Ou melhor, a cartola. E assim o fez na noite de 24 de abril, na Live Curitiba. A estreia da sua Mandrake Project Tour contou com um roteiro estruturado e muitos truques de quem é bem experiente.

A noite começou com a abertura de Clash Bulldog’s, que entregou um show animado, com bastante conexão com o público, que respondeu muito bem as interações. Cabe aqui um adendo em dizer que a primeira atração tem uma missão sempre muito difícil e que pode gerar um desses três sentimentos: deixar o público entediado, desvirtuar as pessoas ou animá-las para a próxima atração. Quem sabe o que está fazendo escolhe as duas últimas opções. A banda de Nova Friburgo (RJ) incluiu em seu repertório de músicas autorais um cover de “Sad But True”, do Metallica. FIzeram todo mundo cantar junto e esquecer a ansiedade.

Já havia passado das 21 horas e o palco ainda estava sendo arrumado para a estrela da noite. Por causa de alguns prováveis problemas de telão, o show atrasou uns 15 minutos. O que não significou absolutamente nada para os fãs, que o receberam com a gritaria habitual e os milhares de celulares apontados para o palco, na intenção de registrar os primeiros momentos do artista em palco brasileiro.

Bruce Dickinson veio ao Brasil acompanhado da House Band Of Hell, formada por Chris Declercq e Philip Näslund (guitarras), Mistheria (teclados) e Dave Moreno na bateria. Mas quem brilharia mesmo no palco seria a baixista Tanya O’Callaghan, que já tocou com Whitesnake, Dee Snider, Orianthi, Steven Adler (Guns N’ Roses), Nuno Bettencourt (Extreme) e mais uma lista enorme de estrelas do rock. Demonstrando muita técnica e carisma, ela vem se destacando lá fora.

Eis que, como um passe de mágica, os olhos dos fãs brilhavam. Então, Dickinson mostrou um cinco de copas numa mão, nada na outra e tirou um coelho brilhante da cartola. Vou explicar.

Bruce entrou direto com a sequência “Accident of Birth”, do álbum de mesmo nome; “Abduction”, de Tyranny Of Souls; “Laughing In The Hiding Bush”, de Balls to Picasso; “Afterglow Of Ragnarok, de The Mandrake Project. Vale lembrar que este foi o primeiro single do novo álbum, lançado no último 30 de novembro, na CCXP23.

Daí o músico cantou uma das favoritas da noite. “Chemical Wedding”, de The Chemical Wedding, foi um dos momentos mais bonitos na interação com o público, que surpreendeu Bruce, cantando mais alto que ele em um coro, não tão afinado mas com o coração cheio. As luzes se acenderam e sua cara de satisfação ficou exposta. Fechava-se assim um belo cinco de copas, conectado direto ao mesmo coração inebriado dos fãs.

“Caros cidadãos de Curitiba! Nós nos divertimos ontem, bebendo cerveja e dirigindo motocicletas e ansiosos para ver você em todos os lugares, motherfucka. Então, vamos lá! Wstamos de volta com essa banda incrível, mostrando para vocês o primeiro show no Brasil. Faremos muitas coisas, todos os tipos de coisas, em todos os lugares”, disse Bruce antes de anunciar “Many Doors To Hell”, que fala sobre uma vampira que cansou de morder pessoas.  Um silêncio reinou durante boa parte da música, até que o artista pediu palmas, e, claro, foi atendido. Estava, então, na hora de tirar o coelho da cartola, correto?

“Este é um momento muito perigoso. Esta [música] não é de The Project Mandrake. Vou deixar para vocês adivinharem”, provocou. Logo os primeiros acordes começaram e o público respondeu emocionado e com o celular em mãos. “Tears Of The Dragon”, um dos hits mais icônicos da carreira solo de Bruce Dickinson. Tinha gente tremendo, chorando, cantando, de olhos fechados e, claro, gravando o momento para rever depois.

Se o vocalista já tinha usado seus maiores números antes da metade do show, o que poderíamos esperar para a segunda parte? Experiente como é, ele sabe que nada poderia chegar aos pés dessa emoção para o público. Então, incluiu duas músicas do álbum novo: “Resurrection Men” e “Rain On The Graves”.

Passado o frisson, a instrumental “Frankenstein” (cover do Edgar Winter Group) mostrou um Bruce realizando um sonho de criança, tocando percussão. E não foi só isso: a mensagem na tela, feito grafismo de filme mudo, já avisou: “Oh, Meu Deus! Isso é um teremim!”. E lá foi ele tocar o prosaico instrumento. E toda essa encenação foi durante a execução da música.

E assim, como o experiente ilusionista que é, o vocalista não tardou a desaparecer um pouco tempo depois na cortina de aplausos, deixando os clássicos na memória.

Set list Clash Bulldog’s: “Intro”, “Prophets Of Time”, “Tears Of Blood”, “Take The Liars Down”, “Sharp Teeth”, “Them Bones”, “Sad But True”, “Evil Within” e “Anger Grows”.

Setlist Bruce Dickinson: “Accident Of Birth”, “Abduction, “Laughing In The Hiding Bush”, “Afterglow Of Ragnarok”, “Chemical Wedding”, “Many Doors To Hell”, “Tears Of The Dragon”, “Resurrection Men”, “Rain On The Graves”, “Frankenstein”, “Gods Of War”, “The Alchemist” e “Darkside Of Aquarius”. Bis: “Navigate The Seas Of The Sun”, “Book Of Thel” e “The Tower”.

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Bruce Dickinson

Oito motivos para não perder o show da turnê The Mandrake Project, referente ao novo álbum solo do vocalista do Iron Maiden

Texto por Daniela Farah

Foto: John McMurtrie/Divulgação

Existe um caso de amor declarado entre a cidade de Curitiba e Bruce Dickinson, o icônico frontman do Iron Maiden. Volta e meia ele está na capital paranaense para se apresentar ao vivo. Quando não vem pilotando o boieng que pertence à sua longeva banda, dá um pulo para reforçar outras atividades paralelas: lançar um disco solo, visitar a fábrica que produz a cerveja artesanal oficial do sexteto britânico ou, ainda, segundo algumas línguas mais ferinas, descansar um pouquinho do corre em uma suposta mansão comprada ali nas redondezas da Pedreira Paulo Leminski justamente para aproveitar o vai-vem frequente. Bruce está tanto por aqui que (isso sim, fato!) vereadores locais propuseram, semana passada, entregar-lhe a cidadania honorária da cidade. O veterano artista agora tem um “curitibano” para o seu gentílico.

Na próxima quarta-feira, 24 de abril, Dickinson sobe mais uma vez ao palco em Curitiba. Agora para dar o pontapé inicial da perna brasileira da nova turnê, referente ao álbum The Mandrake Project. Lançado agora em primeiro de março, o sétimo trabalho de estúdio de sua discografia solo ganhou um intenso cronograma que, após a capital paranaense, pousará em outros seis locais pelos dias posteriores. Porto Alegre (25), Brasília (27), Belo Horizonte (28), Rio de Janeiro (30), Ribeirão Preto (2) e São Paulo (4) completam a agenda em nosso país. Para ingressos e outras informações sobre todos estes sete concertos você pode ter clicando aqui.

O Mondo Bacana elaborou oito motivos pelos quais você não pode perder esta nova passagem por aqui do gogó mais idolatrado do heavy metal.

Ele mesmo

Claro que o primeiro motivo é o próprio Bruce Dickinson! Não haveria como ser diferente com esse artista que conquistou fãs no mundo todo. Com mais de 40 anos de estrada e 90 milhões de álbuns vendidos como vocalista do Iron Maiden, Bruce é muito mais que uma voz icônica. Não se engane, porém: o cara não é apenas um mestre do metal. Ele também domina os céus, voando como um pássaro de aço sua própria frota de aeronaves. Ele até mesmo se aventurou no mundo das cervejas, criando uma poção mágica que transforma os fãs em devotos fervorosos. Então, enquanto outros se contentam em apenas fazer música, Dickinson eleva o jogo, conquistando os palcos e os céus com um sorriso sarcástico e um grito de guerra. É o rei do metal, o capitão dos céus e o mestre da ironia. Duas máimas pairam sobre Bruce: ele não para quieto e ninguém nunca sabe o que virá na sequência. 

Sete álbuns solo

Largar uma banda como o Iro Maiden no auge do sucesso para se dedicar a uma carreira solo precisa de muita coragem. Qualidade essa que Bruce Dickinson já demonstrou ter de sobra, aliás. Inclusive, suas primeiras aventuras solo foram baseadas no puro experimentalismo, fugindo do heavy metal tradicional do Iron Maiden. Isso causou confusão nos fãs, que não abraçaram muito os primeiros projetos. O vocalista, então, entendeu e resolveu fazer sons mais assertivos, para as multidões sedentas de distorção e solos de guitarra. A turnê relativa ao novo álbum The Mandrake Project faz um apanhado das melhores fases do artista – Bruce já avisou que as mais experimentais como a dos discos Skunkworks (1996) e Tattooed Millionaire (1990) vão ficar de fora dessa vez.

The Mandrake Project

Apresentar o recém-lançado disco é a razão da vinda do Bruce Dickinson para o Brasil desta vez. Não que ele precise de uma, claro, mas agitado como é, sempre acaba encontrando um projeto novo para se divertir. O novo projeto solo do vocalista alcançou números interessantes pelo mundo, chegando ao top 10 na Alemanha, Suécia, Finlândia, Suíça, Reino Unido, Brasil, Bélgica, Itália, Holanda, França e México. Até agora figuraram no set list dos shows as faixas “Afterglow Of Ragnarok”, “Many Doors To Hell”, “Rain On The Graves”, “Resurrection Men”.

Bongôs

Isso mesmo! Durante a divulgação do novo projeto, Bruce contou uma história curiosa: ele queria ser baterista na época da escola e tinha o sonho de tocar bongôs. Durante a gravação de The Mandrake Project, ele jurou tê-los ouvido. Só que não: era apenas um barulho feito pela guitarra!). Então ele resolveu incluir os tais bongôs. Agora fica o questionamento: será que ele vai tocá-los ao vivo também?

1972

Você já considerou a ideia de voltar ao tempo? Tanto a literatura quanto o cinema garantem frequentemente essa ida ao passado. Agora Bruce tem prometido aos quatro ventos que a apresentação dele vai ser exatamente como em 1972. “Será um show analógico e autêntico”, comentou o artista em uma coletiva. O resgate do passado é um movimento que acontece na História quando a humanidade sente que está avançando muito rápido – como, de fato, estamos. Dickinson não é o primeiro artista a querer trazer de volta essa sensação em um concerto, mas agora bate aquela curiosidade a respeito de como ele fará isso. Será que a viagem vai ser de DeLorean ou TARDIS?

The Chemical Wedding

Bruce prometeu em entrevista que incluiria muitas faixas de The Chemical Wedding no set list da turnê. O quinto álbum de sua carreira solo foi lançado em 1998 e foi nesse aí que ele deixou os experimentalismos de lado. O peso do trabalho, produzido pelo mesmo Roy-Z de The Mandrake Project, agradou demais aos fãs. E sobre trazer essas músicas para a turnê, bem, ele não mentiu. Nos sets lists de até então, a seleção de músicasdos dois discos está praticamente em pé de igualdade. “The Chemical Wedding” e “The Alchemist” integram a lista oficial, enquanto “Book Of Thel” e “The Tower” costumam chegar no bônus do bis. Para saber se vai acontecer, entretanto, só estando por lá!

“Tears Of The Dragon”

Bem, esta é uma daquelas músicas que até aqueles que vivem debaixo de uma pedra já ouviram falar. Lançada em 1994, no álbum Balls To Picasso, “Tears Of The Dragon” é tipo a marca registrada de Bruce Dickinson, Mesmo que você não tenha ideia de quem seja Bruce, aposto que já se deparou com essa música em algum lugar. Inclusive ele, como bem conhece seu público brasileiro, sabe que não pode chegar por aqui e não tocar essa.

Cidadão honorário de Curitiba

Sabe aquela brincadeira de que um artista que veio tanto ao Brasil deveria fazer um CPF? Nesse caso, a gozação virou verdade! Ou quase isso. A cidadania honorária de Paul Bruce Dickinson saiu no último dia 17 de abril, após votação da Câmara Municipal de Curitiba. Entre as justificativas está o fato de que Dickinson escolheu a curitibana Bodebrown como a primeira cervejaria oficial do Iron Maiden fora da Inglaterra, criando a Cerveja Trooper Brasil IPA – Iron Maiden. Bruce não só virou curitibano como agora vai começar por aqui o giro pelo Brasil com a The Mandrake Project Tour.

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Jethro Tull

Oito motivos para não perder a apresentação da icônica banda liderada por Ian Anderson em sua nova passagem pelo Brasil

Texto por Daniela Farah

Foto: Divulgação

Seven Decades é o nome oficial da nova turnê. Pode parecer muito. E, de fato, é. Pode parecer erro de cálculo, já que o vocalista e fundador, o escocês Ian Anderson, vai completar 77 anos de vida no próximo mês de agosto. Mas, de fato, não é. O Jethro Tull foi fundado em 1967, quando o músico ainda estava saindo da adolescência. Portanto, o período em atividade compreende justamente sete décadas, dos anos 1960 aos anos 2020. Mesmo com alguns pequenos períodos de pausa, provocada por afastamento entre os principais integrantes e remanescentes, certo é que a carreira permanece seguindo em frente.

A boa notícia para os fãs brasileiros é que esta turnê volta a trazer Anderson e seus músicos para o Brasil. Serão quatro apresentações nesta semana e a rota de escalas compreende Belo Horizonte (dia 9 – para compra de ingressos e ter mais informações, clique aqui), Porto Alegre (dia 10 – para compra de ingressos e ter mais informações, clique aqui), Curitiba (dia 12 – para compra de ingressos e ter mais informações, clique aqui) e São Paulo (dia 13 – para compra de ingressos e ter mais informações, clique aqui). O repertório trará grandes sucessos espalhados pela longeva trajetória com a adição de faixas do mais recente álbum de estúdio, RökFlöte, lançado há exatamente um ano.

Para celebrar a nova vinda de Anderson e seus asseclas para cá, o Mondo Bacana discorre sobre oito motivos para você não deixar de ver a banda em ação novamente aqui.

Raiz folk

Ainda que Ian Anderson tenha passado boa parte da sua vida na Inglaterra (mudou-se aos 12 anos), ele nunca deixou de lado suas raízes escocesas. Isso reverberou na sonoridade do Jethro Tull. Anderson achava que faltava algo que desse uma cara mais europeia para o seu som e foi buscar isso em suas raízes inglesas e escocesas. Vem daí, dessa vontade de ter seu ambiente representado na sua arte, que surgiu a pitada celta que faltava para completar o Jethro Tull. Diga-se de passagem, aliás, que essa proposta bucólica até combina muito bem com o nome, inspirado em um agricultor famoso. A banda ficou conhecida por levar essa representatividade da musicalidade celta para o mundo. Ou seja, é a possibilidade de assistir cara a cara o folk britânico em sua mais pura raiz criativa. E de uma maneira bem divertida!

Performance de palco

Ian Anderson é, por si só, uma figura controversa. Um escocês, apaixonado por blues, que resolveu fazer rock tocando flauta. E fez isso tão bem que em 1989, o Jethro Tull abocanhou o Grammy de Melhor Performance Hard Rock/Metal, tirando-o das mãos do Metallica e seu aclamado álbum … And Justice For All. Ian tem uma presença de palco cativante. Entrega tudo e um pouco mais, seja através de seus olhos que parecem interpretar cada nota da flauta, por suas danças peculiares, tocando em uma perna só ou dando pequenos pulos enquanto canta.

Idade avançada

Para os fãs é sempre uma benção ter a oportunidade de seguir acompanhando seus ídolos lançando novidades e realizando concertos e turnês. Entretanto, também chega a ser cruel pensar que a cada temporada que se vai, menos tempo resta para aproveitar as suas presenças neste plano. Para quem mora no Brasil, então, chega a ser pior quando o assunto são os grandes deuses do rock de todos os tempos. Já são bem menores as chances de todas as turnês chegarem à América do Sul por questões financeiras, de logística e de maior percurso territorial a ser enfrentando sobretudo para quem mora longe dos grandes centros urbanos para onde as datas dos concertos acabam sendo marcadas. Ian Anderson está com 76 anos e é um poucos pilares do rock dos anos 1960 e 1970 ainda em plena atividade, compondo, criando, gravando, tocando ao vivo, correndo o mundo.

Confusão de gêneros

É hard rock, heavy metal ou rock progressivo? Qualquer fórum de discussão sobre música na internet (os melhores!) possui um tópico sobre a sonoridade do Jethro Tull. A diversidade é tanta que fica difícil encaixar em uma só gavetinha. Mesmo que os mais xiitas (ou troo) concordem que o grupo não entra na categoria metal, é uníssono que o Jethro Tull é uma das bandas que exerceu uma influência muito forte nas principais bandas do gênero que vieram depois. A experimentação foi tanta (hard rock, blues, folk, clássico, etc) e deu tudo tão certo que estamos aqui falando deles em pleno ano de 2024. A questão é que vale a pena sair de casa por uma lenda como essa, que transformou, inspirou tantos músicos (dos quais você provavelmente é muito fã!) a seguir suas carreiras. Inclusive, Ian Anderson participa em quatro músicas do novo álbum do Opeth. Então, nada como beber diretamente da fonte, não é mesmo?

“Aqualung” (a música)

Se você acha que não conhece Jethro Tull, pare tudo o que está fazendo neste momento e coloque os primeiros minutos da música “Aqualung”. Ela soa familiar? A indústria do entretenimento usou e abusou bastante dessa introdução dos Simpsons aos Sopranos. E com razão: ela é genial. “Aqualung” fazia parte do álbum homônimo lançado pelo Jethro Tull em 1971. Nada convencional, como tudo que remete à banda. A letra, repleta de realismo, fala de um homem que é morador de rua e observa o mundo a partir de um banco de parque. “Aqualung”, tocada e cantada pelo próprio Ian Anderson, é o tipo de coisa que faz a gente querer sair de casa. Sempre.

“Locomotive Breath”

“Locomotive Breath” também faz parte do histórico álbum Aqualung e que também faz parte do repertório da atual turnê. A letra é pura loucura filosófica. Segundo Ian, lá em 1971, estávamos num trem de crescimento populacional e ninguém sabia onde ele iria parar. Mas a sonoridade, essa é para aplaudir de pé. As guitarras criadas de Martin Barre são um espetáculo à parte, provavelmente para descrever a velocidade do trem e a pressão contidas na narrativa. Não é à toa que bandas de metal como WASP e Helloween lançaram suas versões para essa música.

RökFlöte

Após ficar anos e anos  sem lançar material novo, Jethro Tull tem um novo álbum, seu 23º. Ian Anderson criou a sua versão sobre o Ragnarok, da mitologia nórdica, em RökFlöte. Desta vez ele contou com David Goodier (baixo), John O’Hara (teclados), Scott Hammond (bateria) and Joe Parrish James (guitarra). Mesma banda que vem com ele ao Brasil, exceto o guitarrista Joe, substituído por Jack Clark. E, sim, eles vão tocar músicas do novo trabalho ao vivo.

Sete décadas em um concerto

Sete é rico em simbolismos. Sete são as notas musicais e as figuras de tempo na música. O número também é o símbolo da vida eterna no Antigo Egito; e, se a numerologia considera um número divino, a aritmética o considera feliz. Mas sete décadas é um número absurdo. Chega a ser até impensável o quanto o mundo mudou nesse tempo. Só para citar os suportes do mercado fonográfico: vinil, fita cassete, compact disc, DVD, MP3 player, pendrive, streaming… E o Jethro Tull tem a árdua missão de trazer um pouco dessas décadas de criação e ação em um só show. A vantagem é que suas músicas continuam a fazer sentido mesmo com toda a passagem de tempo. Por isso é excepcional quando uma banda que atravessou todo este período se apresenta nos dias de hoje. Não é só música, é História.