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Georgetown

Christoph Waltz acerta em sua estreia na direção ao dar uma demonstração na prática como tornar mentiras convincentes

Texto por Leonardo Andreiko

Foto: Paris Filmes/Divulgação

Filme de estreia de Christoph Waltz na cadeira de diretor de cinema, Georgetown (EUA/Áustria, 2021 – Paris FIlmes) retrata a história de um, se muito, anti-herói – também interpretado por Waltz, ator imortalizado como o personagem Hans Landa, de Bastardos Inglórios, de Quentin Tarantino. Aqui, ele é Ulrich Mott, um diplomata de sua própria ONG financiado – e tutorado – pela esposa Elsa Breht (Vanessa Redgrave). Quando ela, já com seus 91 anos, é encontrada morta em seu apartamento, o também general de brigada do exército iraquiano é considerado o principal suspeito. Começam, então, as investigações sobre o passado de Mott.

O filme é escrito por David Auburn e inspirado livremente em um artigo jornalístico sobre uma história real bem similar a esta. Em seu roteiro, bem como na mise en scène de Waltz, o longa-metragem convida o espectador ao ceticismo a todo momento, ilustrando de maneira muito bem-humorada o conceito de pós-verdade. Somos constantemente apresentados a exageros, narrativas falaciosas e mentiras descaradas, que são a fundação dos feitos de Mott. Nessa teia de dúvidas, Waltz imprime um protagonista muito carismático, que encontra tamanho eco na química com Breht que assistimos suas manobras com entusiasmo e, por vezes, esquecemos sua suspeição.

A arquitetura sutil das mentiras (ou pós-verdades) de Mott é confrontada com igual delicadeza – seus dois “antagonistas”, a enteada Amanda (Annette Bening) e o advogado Volker (Corey Hawkins), tratam-no de maneiras muito distintas, mas nunca recebemos diálogos condescendentes. Quando interagem entre si, prova-se como a figura de Ulrich é capaz de suscitar questionamentos a qualquer um, a todo momento.

Em seu longa de estreia, Waltz não brilha com um formalismo ímpar, quadros e movimentos dinâmicos ou um maneirismo que salta os olhos. Pelo contrário, sua abordagem à mise en scène é, por vezes, convencional, restando à montagem das sequências, construída por Brett M. Reed, o frescor do novo diretor. Ele demonstra cada passo de seu personagem rumo ao sucesso político com foco naquilo que costuma cair nas salas de edição. A elipse criada por sua direção omite, precisamente, nos diálogos mirabolantes e argumentos que Mott usou para receber o dinheiro de George Soros, Robert McNamara e afins. Waltz se interessa em mostrar-nos o nervosismo da cozinha durante um jantar, até mesmo o papo nervoso com a secretária antes de uma reunião.

Georgetown apresenta momentos brilhantes de demonstração prática de como se constroem as mentiras convincentes, especialmente em meio político. Contudo, para uma análise frutífera de sua construção de linguagem, são necessários muitos spoilers, o que torna esse caminho textual inviável aqui. No entanto, à medida que se acostuma com a imprevisibilidade, é possível enxergar padrões narrativos tornando a história previsível. Se no começo Georgetown prende o público com redes bem amarradas de versões (verdadeiras ou não), seu arco é concluído com cartas que já víamos antes de expostas e um ritmo aquém dos minutos iniciais. 

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