Diretor do cultuado As Vantagens de Ser Invisível retoma o universo da adolescência em outro ótimo longa-metragem
Texto por Abonico R. Smith
Foto: Paris Filmes/Divulgação
Cinco anos atrás, Stephen Chbosky adaptou para o cinema, com um certo burburinho, seu próprio best-seller As Vantagens de Ser Invisível. Agora ele retoma a carreira por trás das câmeras assinando mais uma dobradinha de roteiro e direção baseada em outra boa obra literária que gira sobre o período da adolescência com todos os seus problemas e percalços possíveis. De novo, acerta a mão.
Extraordinário (Wonder, EUA/Hong Kong, 2017 – Paris Filmes) é centrado no último ano letivo da ensino fundamental de August Pullman, um garoto que, apesar da pouca idade, já passou por 27 cirurgias plásticas porque nasceu com uma deformação facial. Prestes a entrar na adolescência, ele enfrenta suas dificuldades com muita naturalidade – e bastante humor, nunca perdendo a chance de fazer comentários irônicos sobre as coisas ao redor. Entretanto, quando anda na rua com os pais, usa um estiloso capacete de astronauta para que não haja mais estranhamento das pessoas (e consequentes atos de bullying) em virtude de seu rosto.
O que tinha tudo para ser tornar um melodrama lacrimonoso e repleto de piedade e compadecimento por Auggie se transforma radicalmente no roteiro encabeçado por Chbosky. Desta maneira, o foco recai para outros problemas mais universais da adolescência. E mais: apesar de ter um protagonista, a história é contada sob o ponto de vista não apenas dele, mas também dos principais personagens que gravitam ao seu redor: o melhor amigo da escola, sua irmã um pouco mais velha, a melhor amiga dela e “que é quase como uma outra irmã”, a mãe que largou todos os sonhos pessoais e profissionais para dedicar-se exclusivamente à família.
Assim como fizera de maneira brilhante no longa anterior, Chbosky também vai dando sutis pinceladas em problemas universais da adolescência e o fato inevitável de todo mundo crescer um dia. São as descobertas, as alegrias, os relacionamentos de amor e amizade, a vida em família, as expectativas, os esforços, as frustações, as mágoas, as decepções. Tudo sem nunca perder a linha que liga o humor refinado sobre as coisas do cotidiano com o ótimo gosto musical, que fornece uma sensível trilha incidental (assinada pelo brasileiro Marcelo Zarvos) ligada a canções do universo indie como a sempre fofa “We’re Going Be Friend” (em duas versões, na original com o White Stripes e em um cover não menos fofo feito por Caroline Pennell, ex-concorrente do The Voice norte-americano) e “Reach For The Sun” (hit maior do coro neopsicodélico Polyphonic Spree que neste longa é cantado por um pequeno coral formado por crianças do colégio onde o menino estuda).
Encabeçando o elenco, Jacob Tremblay (revelado em O Quarto de Jack) prova, de novo, ser um pequeno grande monstro na atuação, dando um ar tão delicado quanto seguro de si a seu August. A escalação feminina também se destaca durante o filme. A mãe Isabel (Julia Roberts) ilumina a tela com sua dedicação sempre sorridente, embora tenha aberto mão de muita coisa para si sempre de maneira consciente. Ja a avó (Sonia Braga) aproveita seus poucos minutos de participação na tela para consolar a primogênita Via (Izabela Vidovic, em primeira boa oportunidade nos cinemas), que apesar da pouca idade também serve de segunda mãe para o pequeno Pullman dando-lhe todo o afeto, amor e orientações de que ele precisa. Já Owen Wilson, como o pai boa-praça e amigão, não compromete com possíveis exageros.
A lamentar somente a escolha inadequada do título em português (em inglês, a palavra “wonder”, quer dizer “maravilha”, “espanto”, “admiração”, “surpresa”). Estas quatro escolhas cairiam melhor sobre todo o universo de dores e amores abordado por Chbosky. A opção feita para lançar a obra no Brasil parece ter sido direcionada para chamar a atenção para algo que justamente não está no filme: a vitimização de Auggie Pullman.
Um comentário em “Extraordinário”