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Tetris

Longa-metragem aborda a corrida de russos, americanos e ingleses pela patente de uma das criações mais famosas da história do videogame

Texto por Tais Zago

Foto: Apple TV+/Divulgação

Mais um filme sobre espionagem e Guerra Fria? Já não temos histórias suficientes, do ponto de vista ocidental, sobre como a URSS era a malvada anticapitalista a e os EUA os mocinhos do planeta? Poderia ser, mas Tetris (Reino Unido/EUA, 2023 – Apple TV+) se trata, em regra, de um jogo de gato e rato onde o pote de ouro no final do arco-íris são os direitos sobre um dos jogos mais famosos da história do videogame.

Alexey Pajitnov (Nikita Yefremov) é um programador russo, apaixonado por jogos e puzzles, servidor da ELORG (Elektronorgtechnica) estatal russa de tecnologia. Nas horas vagas, Alexey, usando o hardware e software disponíveis em seu trabalho, criou o que chamou de Tetris, baseado em um jogo de tabuleiro de origem grega chamado Pentominoes, no início dos anos 1980.

Henk Rogers (Taron Egerton) é um homem multifacetado. Nasceu na Holanda, tem ascendência indonésia e cidadania americana. Estudou no Havaí, onde conheceu a futura esposa Akemi (Ayane Nagabuchi), e passou a viver e trabalhar em Tóquio, no Japão. Henk era apaixonado por jogos e era programador. Após alguns tiros saírem pela culatra, decidiu concentrar os esforços em encontrar jogos ainda pouco conhecidos, comprar seus direitos e repassar para as grandes do mercado como a Nintendo.

Nessa área, Robert Stein (Toby Jones) já era um especialista. Ele revirava as salas de programação no leste europeu, principalmente na Hungria, na busca de novos sucessos para patentear. Ao ver uma versão pirata de Tetris, imediatamente entrou em contato com a empresa britânica Mirrorsoft, do magnata de mídia Robert Maxwell (Roger Allam), para quem ofereceu a intermediação com os russos pela sua patente. 

A partir daí vemos uma guerra de negociações, trapaças, fraudes e promessas não cumpridas entre russos, americanos e ingleses. Em 1988, no finalzinho da União Soviética, pouco antes da queda do Muro de Berlim em 1989, sob o governo de Mikhail Gorbachev (Matthew Marsh) e com resistência de políticos corruptos russos em busca de propina, um acordo é fechado para a distribuição mundial de Tetris.

Quem venceu a batalha? Para quem leu o livro The Tetris Effect (2016), do jornalista de tecnologia Dan Ackerman, a resposta já é sabida. Para o resto, temos essa produção do canal de streaming Apple TV+, dirigida por Jon S. Baird. Os verdadeiros Henk e Alexey leram previamente o roteiro de Noah Pink e afirmaram que é a versão hollywoodiana de sua história, mas bastante baseada nos fatos. Um exemplo de ficção é a personagem Sasha (Sofia Lebedeva), que trabalha como intérprete para Rogers. Ela nunca existiu na história oficial.

Baird nos apresenta o enredo em capítulos que mimetizam fases de jogos de videogame. Imagens pixeladas em 8 e 16bit e sonoplastia de sintetizadores se mesclam às imagens que dão o toque saudosista, junto, claro, à estética oitentista de gamers, nerds, consoles, arcades e do revolucionário Game Boy. E, como não poderia faltar, do lado soviético temos a estética comunista pelo filtro ocidental – frieza, pragmatismo, tecnologia obsoleta e perseguição. Adentramos um filme cheio de clichês, que poderia constar na longa lista de filmes norte-americanos que já trataram do tema Guerra Fria. Porém, também é uma obra repleta de referências para saudosistas que acompanharam desde cedo o mundo dos jogos, dos PCs e da evolução rasante na área de TI que ocorreu entre os anos 1980 a 2000.

Tetris é uma diversão – de alta resolução – para todas as idades. Mas, sobretudo, é um filme para agradar os fãs da história dos jogos eletrônicos. Aborda o primeiro programa que gerou hordas de pessoas completamente viciadas em seus elementos geométricos e bidimensionais, caindo em velocidade acelerada e que chegavam a nos acompanhar em sonhos. Ao soar da musiquinha baseada no clássico do folclore russo Korobeiniki (a palavra russa para “mascate”), que é oriunda de um poema de 1861 de Nikolay Nekrasov, já mergulhamos em lembranças da infância e adolescência.

Tetris nos acompanhou no console, no computador e hoje ainda é muito popular em aplicativos para smartphones. Suas inúmeras representações, inclusive as tridimensionais, foram o pontapé inicial para jogos como Candy Crush, que viraram mania em todas as faixas etárias. Eis o alívio da ansiedade por meio do pensamento lógico-matemático.

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