Chadwick Boseman e Viola Davis são os destaques de história centrada em estrela do blues americano das primeiras décadas do século 20

Texto por Leonardo Andreiko
Foto: Netflix/Divulgação
Indicado a cinco Oscar e vencedor de diversos prêmios, a maioria por suas atuações, A Voz Suprema do Blues (Ma Rainey’s Black Bottom, EUA, 2020 – Netflix) retrata um ícone do blues sob uma ótica tortuosa e enfoque absoluto no elenco. Inspirado na peça de August Wilson, o roteiro de Ruben Santiago-Hudson gira em torno de Ma Rainey, estrela do blues americano dos anos 1920 e 1930 interpretada por Viola Davis. Ela é o centro gravitacional de uma tensão crescente, que faz do estúdio de gravação onde se passa maior parte do filme uma panela de pressão. Ma é uma presença autoritária, envolta por seu sobrinho Sylvester e a amante Dussie Mae e em constante choque com os executivos do estúdio e membros da banda. Entre eles, Levee (Chadwick Boseman, em atuação que deve lhe render a estatueta póstuma dos Academy Awards), um trompetista soberbo e desrespeitoso – e que, além de tudo, constantemente dá em cima de Dussie.
A direção assinada por George C. Wolfe empresta muito do estilo teatral que inspira o roteiro. As cenas seguem uma progressão verborrágica com grandes monólogos, atos muito bem definidos e desenvolvimento em pouquíssimas locações – características que indicam constantemente que, antes de um filme, o que vemos é uma adaptação do teatro. Essa sensação permeia toda a narrativa mas não se torna um incômodo de grandes proporções.
Manter a base teatral do roteiro cria um ritmo dinâmico de exposição e presenteia o filme com seus momentos mais genuínos. A banda, brilhantemente interpretada por Colman Domingo, Glynn Turman e Michael Potts (além de Boseman), estrela as cenas mais espirituosas e divertidas do longa, que balanceiam perfeitamente a sombriedade dos arcos de Ma e Levee. Ambos têm a chance de explicar, por assim dizer, seus temperamentos egocêntricos e mesquinhos, por meio de pesados solilóquios típicos dos palcos.
Contudo, a similaridade dos personagens se dá mais no campo dos defeitos que das qualidades. Seus conflitos não imprimem fragilidades ou benesses tanto quanto deveriam, o que os torna, no fim, personagens maus. Santiago-Hudson e Wolfe não redimem seus protagonistas de suas más ações e, muito pelo contrário, acabam por sacramentar sua indigestão.
Este é, portanto, um filme (ou peça gravada, por falta de uma adaptação inventiva que aproveite o máximo da linguagem fílmica) que apresenta seus personagens como humanos defeituosos, mas soa interessado mais no adjetivo que na humanidade. Dotado de um blues interessante, embora não o suficiente para carregá-lo, o longa é, sim, uma panela de pressão. O problema é que o prato a ser preparado demora para ficar pronto e, quando se revela, é muito aquém das expectativas geradas. Pior que um filme sempre morno é um que ora borbulha mas acaba frio.
>> A Voz Suprema do Blues concorre no dia 25 de abril ao Oscar 2021 em cinco categorias: ator, atriz, direção de arte, figurino e cabelo & maquiagem