Documentário mostra celebridades culturais contando boas histórias sobre o efeito alucinógeno em suas experiências pessoais
Texto por Ana Clara Braga
Foto: Netflix/Divulgação
Uma discussão sobre os pontos positivos e negativos do uso de alucinógenos poderia durar horas, principalmente se baseada em apenas fatos científicos. Maior Viagem: Uma Aventura Psicodélica (Have a Good Trip: Adventures In Psychedelics, EUA, 2020 – Netflix) coloca a ciência em segundo em plano e foca nas histórias de personalidades famosas que usaram alucinógenos.
Partindo da premissa que pessoas interessantes têm histórias interessantes para contar, o novo documentário da Netflix é uma junção de relatos cortados por esquetes e encenações. O mais bacana de assistir é o uso de animação para dar vida à psicodelia e à confusão que a viagens no ácido podem virar. O visual é bonito, colorido, o que contribui para a experiência. A escolha dos grafismos é certeira para o tema.
A$ap Rocky, Nick Kroll, Natasha Lyonne, Sarah Silverman, Sting, Kathleen Hanna, Adam Horowitz, Ben Stiller, os saudosos Anthony Bourdain e Carrie Fisher e outros convidados dividem tela para compartilhar suas melhores histórias sobre drogas. Alguns relatos são realmente divertidos, outros apenas desconfortáveis. Algumas histórias, com certeza, se contadas em um grupo de amigos próximos foram motivo de gargalhadas, mas na tela ficaram um pouco sem graça. As encenações com atores não contribuem positivamente para a história e poderiam ter sido deixadas de lado.
Ben Stiller – que, curiosamente, é um dos produtores do documentário – contribui com uma das histórias mais interessantes. Ao contrário de muitos de seus colegas de elenco, sua experiência com o LSD foi desastrosa, fazendo-o recorrer a seus pais por ajuda. A reação do recentemente falecido ator Jerry Stiller ao filho usando drogas fora doce e divertida, trazendo leveza para o filme.
Quem teve algum tipo de programa antidrogas na escola irá reconhecer os absurdos de “Bad Trip”, pequenas esquetes em formato after school special apresentadas por Adam Scott. As piadas com a janela, o exagero na inocência dos personagens, o vilanismo como as drogas são tratadas… Todos os elementos contribuem para boas risadas. É também uma crítica, nas entrelinhas, de como as crianças são ensinadas sobre drogas a base do medo e do castigo, não da informação.
Entretanto Maior Viagem: Uma Aventura Psicodélica se perde ao tocar no delicado assunto de “ser adicto” sem saber de forma desleixada e cômica. A atriz Rosie Perez tem uma boa história para contar, mas usar sua experiência para algo tão sério que pode ser traumático para quem vive é irresponsável.
A participação de Sting, por sua vez, é uma das mais interessantes. O cantor e compositor fala dos alucinógenos de um ponto de vista mais espiritual do que os outros entrevistados. Até por uma iniciação de seita ele passou. O filho de Timothy Leary também faz uma ponta. Ele relembra os estudos de seu pai, psicólogo e neurocientista, que acreditava que o LSD seria responsável pelo progresso humano, expandindo a consciência de seus usuários.
Maior Viagem esteve em produção por onze anos. A quantidade de material coletado pode atrapalhado no produto final. Algumas histórias são muito melhores que outras e alguns entrevistados que despertam curiosidade acabam ganhando poucos minutos de tela. Ao fim dos créditos, o espectador não aprendeu, necessariamente, muita coisa nova sobre alucinógenos. Mas certamente teve a oportunidade de entender mais o efeito dele nas pessoas. Ou, pelo menos, em pessoas famosas.