Music

Coldplay – ao vivo

Plateia de Curitiba recebe a banda pela primeira vez e faz parte de um espetáculo com um universo próprio de cores, luzes e protagonismo

Textos por Janaina Monteiro e Carolina Genez

Foto: Coritiba Foot Ball Club/Reprodução

Nos minutos que antecederam o primeiro show da turnê Music Of The Spheres em Curitiba (21 de março último), o som de um sino ecoava pelo estádio Major Couto Pereira. Esse tilintar, que assume propósitos distintos em cada religião, traz um simbolismo em comum: representa a harmonia universal. 

“Ativar o sininho” antes do espetáculo era como se a banda inglesa Coldplay fizesse um convite para plateia entrar em sintonia e acompanhar o storytelling espacial da jornada que estava prestes a começar. E a missão seria cumprida com sucesso: ao longo das duas horas seguintes, todos alcançariam a mesma frequência e entrariam numa completa catarse. 

Quando Chris Martin, Jonny Buckland, Will Champion e Guy Berryman surgiram no palco B, as famosas e “caras” pulseiras luminosas entram em cena e mostram o poder que a multidão tem de abraçar uma banda que acaba de completar 23 anos de carreira fonográfica. Uma trajetória marcada por voos altos e rasantes, que explora diferentes ritmos mas com um denominador comum: olhe para as estrelas. 

Céus repletos delas, aliás, sempre estiveram presentes, de alguma forma, nas canções de Coldplay, até inspirarem esse álbum kubrickiano, em que as 12 canções formam um sistema solar próprio. O próximo, muito provavelmente, será sobre o lado brilhante da lua. E desde o big bang coldplayano é possível perceber esse embate entre luz e escuridão. Até que a luz decide tomar conta de tudo. Literalmente.   

A primeira canção do show, “Higher Power” já incendeou o estádio como uma bola de fogo. São mais de 43 mil pessoas presentes neste universo iluminado. Cada uma delas se tornou uma estrela. A estrela viva que brilha na vida de Chris Martin desde Parachutes, lançado em 2000. 

Predestinado ao sucesso, o britânico da Cornualha e filho do seu Anthony – que faz questão de acompanhá-lo na turnê ­ – previu no documentário Coldplay: A Head Full Of Dreams (lançado há seis anos, após sua separação da atriz Gwyneth Paltrow) que a sua odisseia terrestre começaria logo ahead. Em… 2002! E, de fato, nesse ano Coldplay trouxe ao mundo o disco que o catapultou ao status de uma das maiores bandas dos anos 00. A Rush Of Blood To The Head apresentava sucessos como “Clocks” e “The Scientist” (e seu videoclipe arrebatador, com a narrativa de trás para frente). No início do milênio, o bug não aconteceu e os britânicos conquistavam o mainstream com um som melódico, misturando guitarras elétricas ao piano. Foram três prêmios Grammy.

Nessa época, Chris Martin era um jovem frontman, ainda de espírito meio rebelde, impulsivo, que volta e meia aparecia na mídia sendo acusado de agredir fotógrafos, bem diferente de seu comportamento atual, e seu ritual de gratidão. Hoje, quem tem um celular nas mãos é um potencial paparazzo. Por isso, Chris, que sempre se mostrou arredio a esse tipo de coisa, foi de certa forma obrigado a fazer um “combinado” com a plateia antes de entoar seu hino “A Sky Full Of Stars”. Em cada apresentação, o vocalista lança aquele “xiiiiu” imponente, que faz parte da linguagem universal, sobretudo entre pais e filhos, para milhares de pessoas. Seja na sua terra natal ou no Brasil, onde é mais complicado pedir silêncio.

Educadamente, ele solicita que os presentes aproveitem apenas uma música sem fazer registros pelo celular. 99% do público obedece. Entre o 1% estava uma guria do meu lado. Por isso, fiz questão de colocar o braço na frente da câmera dela. Sorry, aê! Mas pedido do boss a gente obedece.

E foi assim, sem câmera e com um celular tijolinho, que fui ao show da turnê X&Y, em 2007. O terceiro álbum da banda, um dos meus preferidos. Local: Via Funchal, uma casa de concertos em São Paulo com capacidade para apenas três mil pessoas. Aliás, assim como na turnê Music of Spheres, os ingressos foram disputadíssimos. Graças ao meu PC 486 com conexão dial up, consegui garantir um par de entradas.  Mais tarde, assistindo ao mesmo documentário, soube que a gravação de X&Y foi conturbada por vários fatores, entre eles a saída do coprodutor do álbum, Ken Nelson. Ao contrário da explosão de cores da turnê atual, a banda se apresentou de preto nessa turnê. 

E aquele rock espacial com elementos eletrônicos de “Talk” (que traz um sample de “Computer Love”, do Kraftwerk), “Speed Of Sound” e, claro, “Fix You” me fisgou 100%. Depois desse show, o universo conspirou e consegui me aproximar de Chris Martin, mesmo com receio de sua fama de explosivo. “Você fez parte da cura”, disse a ele, mencionando “Clocks”, canção favorita da minha mãe quando tratava seu primeiro câncer de mama. Já, durante a pandemia, foi “Higher Power” que entrou na playlist da cura do meu carcinoma in situ

De volta a 2023, antes mesmo de o Coldplay aterrissar em São Paulo, a banda do contra já preparava terreno para eles. No mundinho das redes sociais, uma chuva de meteoros da magnitude haters invadia o meu feed. Era um bombardeio de textos, justificando que “a banda acabou no segundo disco”, “essa banda é pra fã que usa sapatênis” (bem, eu fui de tênis plataforma) e “Coldplay é uma banda coach”.  Enquanto uns seguem no “bla, bla, bla”, prefiro pegar carona no “ooh, ooh, ooh, ooh, ooh, ooooooh, oh” e viver a minha vida! 

Mesmo porque a banda dos contra sempre existirá. O que não existiu até agora foi um espetáculo tecnológico nessas proporções (que deixou o U2 nas Havaianas), com uma estrutura gigantesca em três palcos, aproximando a plateia do artista, e, o mais importante, que promove a inclusão, a sustentabilidade e torna o espectador o protagonista do espetáculo. 

Chris era, em Curitiba, como o maestro de uma orquestra, conduzindo suas estrelas, com sua mensagem clara como a luz da lua, sempre estampada no peito (“Love” e “Everyone is an alien somewhere”). Ele corria freneticamente pela passarela e aproveitava cada centímetro da megaestrutura, do palco principal até o palco B, onde cantou a belíssima “Viva La Vida”, do álbum de mesmo título produzido por Brian Eno e que representou um salto na carreira dos ingleses. De lá, entoaram também “Something Just Like This”, uma canção fofa, graciosa, sobre heróis da vida real e que, por sinal, era o sinal do recreio do meu filho na escola. No palco C, lá no fundo do estádio, surgiram para cantar “Magic”. Dessa vez, na versão aportuguesada, repetindo a performance do Rock In Rio em 2022 (concerto que fez a banda postergar a turnê brasileira para 2023, aliás). No Couto Pereira, não tivemos sandys, nem jorges, nem miltons. Mas tivemos “Every Teardrop Is A Waterfall”, do álbum Mylo Xyloto (2011). Inclusive, essa fora a segunda vez que a canção entra no setlist da turnê. No dia seguinte, para alegria dos fãs na capital paranaense, teve “Orphans”, do introspectivo Every Day Life.

Como Chris Martin se movimentava na “velocidade do som”, é muito fácil perdê-lo de vista ao vivo. Isso explica o uso de bases pré-gravadas. Mesmo estando em plena forma, é difícil conseguir tanto fôlego assim. Enquanto o vocalista cantava e passeava pelo seu universo, durante boa parte das canções, Jonny, Will e Guy permaneciam em suas posições no palco principal, curtindo o próprio show, como se fossem músicos de apoio. 

Quando revisitam os hits mais antigos e que catapultaram a banda ao estrelato, como “Yellow”, “The Scientist” e “Clocks”, os ingleses mostram que tocam de verdade. Na primeira, o coro da plateia chegou a emocionar Chris Martin, que dizia “beautiful”. Lindo mesmo foi poder ver Jonny dedilhando o riff a poucos metros de distância. Já na segunda, houve um problema na modulação das guitarras e foi preciso interromper a música. Em vez de voltar ao start, entretanto, seguiram da metade.

No final de toda essa viagem estelar, cheia de luzes, com direito a planetas infláveis (alguns deles voltaram pra casa de ônibus biarticulado, inclusive) e que reuniu um público tão diverso, de crianças a idosos, o que ficou foi a prova da evolução. As letras mais recentes do Coldplay podem até soar um pouco repetitivas. Mas talvez não estejamos acostumados a tamanha positividade e de uma banda que alcançou um séquito de fãs por mérito e não por ter caído de paraquedas. 

Claro que sempre haverá a turma do contra. O importante é saber conviver com ela. E isso o tal do Cristóvão João Antônio Martins parece ter aprendido direitinho. E isso é “Biutyful”! (JM)

***

A experiência do primeiro dos dois shows do Coldplay em Curitiba (21 e 22 de março) começou já na fila quilométrica para o estádio Major Antônio Couto Pereira. Os fãs cantavam as músicas e comemoravam a cada curva que os deixava mais próximos da entrada. Com a pulseira no braço, a noite foi aberta pelo trio escocês Chvrches. Mesmo com eles entregando a alma em sua performance, os fãs apenas chamavam os astros ingleses para o palco. Com o Couto lotado e quase nenhum espaço livre entre as mais de 40 mil pessoas, a banda entrou às 21h ao som da música “Flying Theme”, do filme E.T.– O Extraterrestre, de Steven Spielberg. Isso já deixava claro que a noite seria mágica.

set list apresentado pelos britânicos começou com “Higher Power”, Mesmo particularmente não gostando, a canção se tornou uma experiência inesquecível. Todo show  tem uma atmosfera mágica, capaz de transportar qualquer um para outra realidade durante as duas horas de duração. O Coldplay, porém, conseguiu subir o nível desta virtude artística. As pulseiras brilhantes se tornaram um espetáculo à parte ao iluminar todo o estádio de acordo com as batidas de cada música. De certa forma, o público virou parte da performance da banda. A noite ainda contou com fogos de artifício, balões em formato de planetas (fazendo referência ao novo álbum deles), luzes coloridas e muitos confetes que tornaram tudo ainda mais bonito e especial. É até difícil escolher um destaque máximo. Para mim, o grande espetáculo aconteceu durante “Clocks”, quando todo o estádio assumiu uma cor verde que brilhava acompanhando as notas dedilhadas ao piano  enquanto um show de luzes formava um céu também esverdeado e projetado em cima da plateia.

O ânimo da banda também era contagiante. Consgeuia deixar todos alegres e animados do começo ao fim. Ajudava também o engajamento de Chris Martin com seus fãs. O cantor falou em português, leu diversos dos cartazes levados pelo público, pediu para a plateia completar as letras e cantar junto com ele durante músicas como “Paradise” e “Viva La Vida”. O que tornou a experiência ainda mais única foi na hora de convidar uma fã para tocar uma música com ele. O cantor ainda desceu do palco principal para se apresentar em um espaço menor disponibilizado no meio da plateia. Lá mandou “Sparks” e uma versão em nosso idioma de “Magic”. “Chamo de mágia”, começou, com aquele sotaque.

O final do show também foi maravilhoso. A performance de “FixYou”, penúltima do extenso repertório, ficará, com certeza marcada na mente de todos os fãs que estavam presentes naquela noite do Couto Pereira. Todas as pulseiras brilhavam em um amarelo dourado enquanto Chris, ainda com toda energia do mundo, cantava o refrão (“Lights will guide you home/ And ignite your bones/ And I will try to fix you”). Pouco depois,quando começou a gravação de “A Wave”, todos foram embora radiantes e “consertados” com toda aquela vibração transmitida pela banda. (CG)

Set list em Curitiba: “Music Of The Spheres” (intro), “Higher Power”, “Adventure Of A Lifetime”, “Paradise”, “The Scientist”, “Viva La Vida”, “Something Just Like This”, “Fly On”, “MMIX”, “Every Teardrop Is A Waterfall”/”Orphans”, “Yellow”, “Human Heart”, “People Of The Pride”, “Clocks”, “Infinity Sign”, “Hymn For The Weekend”, “Aeterna”, “My Universe”, “A Sky Full Of Stars”, “Sparks”, “Magic” (em português), Humankind”, “FixYou”, “Biutyful” e “A Wave” (outro).

Music

Black Crowes – ao vivo

Maduros, os irmãos Robinson voltam ao Brasil depois de 27 anos e mostram que seguem precisos como relógios suíços

Texto por Fabio Soares

Foto: Rafael Strabelli/Divulgação

A São Paulo de 2023 está muito diferente daquela que os irmãos Chris e Rich Robinson encontraram 27 anos atrás. Em janeiro de 1996, eles tocaram num sábado com Pacaembu lotado na mesma noite em que Jimmy Page e Robert Plant foram as atrações principais na derradeira edição do (posteriormente extinto) festival Hollywood Rock, um dos únicos benefícios que o consumo de cigarros trouxe ao Brasil. Hoje, o Pacaembu já não mais existe como estádio de futebol, destruído pela iniciativa privada, e a capital paulista está abandonada sob o “comando” de um prefeito tão fantasma que se ele entrar num elevador ninguém na cabine o verá.

Mas corta pra 2023! Os Robinson estão de volta para a turnê comemorativa de 30 anos do álbum de estreia dos corvos, Shake Your Money Maker, de 1990, atrasada em dois anos por conta da pandemia. O Espaço Unimed (antigo Espaço das Américas) não estava com sua lotação completa naquela noite de terça-feira 14 de março – o que foi ótimo porque cerca de quatro a cinco mil privilegiados poderiam ter sua festinha particular. E acabou que foi muito mais que isso.

Pontualmente às 21h30 os primeiros acordes da gravação de “Are You Ready”, do Grand Funk Railroad, deram as caras nos autofalantes, enquanto o grupo adentrava o palco para suas posições. Brian Griffin na bateria, Sven Pipien no baixo, Erick Deutsch e Joel Robinow nos teclados e os Robinson, então, iniciaram a execução da íntegra de Shake Your Money Maker com “Twice as Hard” e o inevitável acontecendo: a péssima equalização de som do Espaço Unimed! A dificuldade de se desfrutar um show com boa qualidade técnica no Brasil beira a incredulidade. Passada a frustração da canção de abertura, a segunda pôs a pista inteira para dançar: “Jealous Again” permanece maravilhosa mesmo após 33 anos de seu lançamento. Banda afiadíssima sentindo-se em casa, visivelmente se divertindo e com a plateia entoando os versos a plenos pulmões. Que momento!

“Sister Luck”, “Could I’ve Been So Blind” e “Seeing Things”, escancaram as influências da banda: blues rock embebecido em álcool e setentismo. O simples que muitos insistem em complicar. Sem firulas, sem telões, sem luzinhas piscando.

O balanço da cover de “Hard To Handle” também merece destaque: a canção de Otis Redding permanece viva, atemporal e transformaria um cemitério numa festa-baile. Aquecimento mais que especial ao ponto alto de Shake Your Money Maker – “She Talks To Angels” é o emocionante bálsamo que precisávamos trazendo um importantíssimo aspecto: a voz de Chris Robinson permanece impecável! Muito bom constatar que os excessos cometidos pelo cantor nos anos 1990 (e atire a primeira pedra quem também não os cometeu) não afetaram seu principal instrumento de trabalho. Nessa música, mais uma vez, o refrão foi cantado em uníssono pelo público. 

A arrasa-quarteirão “Stare It Cold”, encerrou a execução da íntegra do primeiro disco e o entrosamento da banda impressionava sob o comando de seu capitão. Ao contrário do despojamento do vocalista, Rich Robinson empunhava sua guitarra como um sagrado ofício a ser executado. Nada de sorrisos, apenas a forma precisa de riffs poderosos que alçaram a banda ao panteão da história do rock.

Abrindo a segunda parte da apresentação, dedicada ao restante do repertório, um particular soco em meu estômago. “Sometimes Salvation” (que não havia sido tocada nas mais recentes apresentações da turnê) possui um dos videoclipes mais perturbadores da história, sobretudo a quem foi dependente de drogas nos anos 1990 (este que vos escreve, incluso). Por isso, sua execução nesta noite será algo que guardarei na memória por muito tempo. Chris esgoelando-se à frente da banda a executando como um ato episcopal foi algo que explodiu corações dos presentes. O show poderia muito bem ter acabado ali mas faltava algo.

Com sua inconfundível introdução, “Thorn In My Pride” segue estremecendo sistemas nervosos a granel: redonda, coesa, sem sustos e fazendo a cama perfeita para “Remedy”. O maior hit da banda fez brotar uma cambada de red pills na pista (sim, eles existem!). Destaque às backing vocals, assim como no clipe, assim como no disco, assim como sempre!

“Virtueand Vice”, faixa que fecha o álbum By Your Side, de 1999, também encerrou os trabalhos da noite. Noventa minutos sem cenários tridimensionais, tendo apenas a música como pano de fundo. Mesmo com os problemas técnicos, os Black Crowes personificaram naquela terça a expressão “trator sonoro”. Ainda bem! Só tomara que este trator não mais demore quase três décadas para retornar ao Brasil.

Set list: “Twice As Hard”, “Jealous Again”, “Sister Luck”, “Could I’ve Been So Blind”, “Seeing Things”, “Hard To Handle”, “Thick n’ Thin”, “She Talks To Angels”, “Struttin’ Blues”, “Stare It Cold”, “Sometimes Salvation”, “WIser Time”, “Thorn In My Pride”, “Sting Me” e “Remedy”. Bis: “Virtue And Vice”.

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Floripa Rock Festival – ao vivo

Pitty com Nando Reis, Paralamas do Sucesso e CPM 22 levam à capital de Santa Catarina um grande tributo ao rock nacional

PittyNando

Texto e fotos por Frederico Di Lullo

Cheguei em cima do laço para prestigiar o Floripa Rock Festival no último dia 4 de fevereiro, no Stage Music Park. E foram logo os primeiros acordes de “Tarde de Outubro” que fizeram as milhares de pessoas irem abaixo. Sim, a banda que teve a honra de abrir a primeira edição do evento realizado na capital catarinense foi o quinteto paulista de hardcore melódico CPM 22.

Tudo ocorreu como eu imaginei. Badauí e sua trupe fizeram uma apresentação longa, recheada de clássicos que fizeram a plateia sentir nostalgia dos anos 2000. No repertório não faltaram os clássicos como “Regina Let’s Go” (cantada a plenos pulmões) e “Irreversível”, além de um sample de “Mantenha o Respeito”, que fez subir uma leve maresia no ar. O som estava mais ou menos, algo que de fato me surpreendeu pela estrutura de palco. Deixava quem estava mais à frente com os ouvidos estourados. 

O grupo fez um show enérgico, que empolgou boa parte da galera, que ia de jovens a não tão jovens assim como eu. É inegável que o CPM 22 curte muito a Ilha da Magia e a Ilha da Magia curte muito a banda. A performance terminou lá em cima, mas ainda tinha tempo para mais. Foi aí que os músicos retornaram para ecoar “O Mundo Dá Voltas” e “Ontem”, além de uma miniversão de “We’re Not Gonna Take It, hino do Twister Sisters. Nesse momento, o velho roqueiro que habita em mim sorriu timidamente. Enquanto todos corriam para os banheiros e para pegar uma cerveja gelada, aproveitei para escalar algumas posições e me posicionar para o próximo show.

Paralamas do Sucesso

Já passava das 22h e chovia de maneira grotesca quando Herbert Vianna, Bi Ribeiro e João Barone subiram ao palco (acompanhados do fiel escudeiro João Fera nos teclados) e começaram seu magnifico concerto, que contou com quase duas horas de duração. A história que estes caras carregam nas costas é algo incrível, mas muitas pessoas ainda não percebem o quão importantes são para a cultura brasileira. 

Na estrada há 40 anos, sabem como agradar cada plateia em cada cidade do nosso país. Em Florianópolis foi um sucesso atrás do outro: “Ska”, “Vital e Sua Moto”, “Alagados”, “Trac Trac”. Nesta última, presenciei uma cena emocionante que envolveu pai e filha, cantando juntos, com ele visivelmente emocionado. São coisas que marcam pra sempre os envolvidos. Até minha pessoa. E no set dos Paralamas ainda cabiam mais sucessos, como “A Novidade”, “Meu Erro”, “Melô do Marinheiro” e “Você”. Uma verdadeira festa, afinal. 

Cansado cheguei ao show de Pitty e Nando Reis, dupla também conhecida como PittyNando. O clima se diferenciava dos outros dois anteriores: se por um lado tínhamos energia e vibrações pairando no ar, agora tudo era intimista e de despedida. Afinal de contas, foi a última apresentação do duo, pelo menos nesta versão de concerto. A escolha de Florianópolis como palco derradeiro não deve ter sido à toa. Eles se sentiam muito à vontade: não cansavam isso de falar nos intervalos das músicas. 

Desfilando por sucessos com arranjos distintos das gravações originais, destacava-se a alegria de “Marvin” na voz sentimental de Pitty. Outra música, que agora ganhou um viés ainda mais politizado foi “Máscara”, cantada de maneira polifônica pelos presentes.

Durante a apresentação, percebi que o espaço ia ficando menos lotado, talvez fosse seja pela chuva que não dava trégua. Mas, no palco, o clima era outro. A evidente sintonia entre Pitty e Nando ia deixando o ambiente em vibe nostálgica e totalmente emotiva. Eles entoaram outros clássicos seus como “Por Onde Andei”, “Me Adora”, “Pra Você Guardei o Amor” e “All Star“. No fim de tudo, o sentimento de realização e emoção tomou conta de todos. Plateia, artistas e equipe de apoio mandaram uma sonora e longa salva de palmas. Ficamos agora na expectativa e na vontade de uma nova parceria entre eles, talvez em formato diferenciado ou com novas composições além das conhecidas músicas autorais de cada um.

Este primeiro Floripa Rock Festival foi emocionante. Do fundo do coração, espera-se que outras edições do festival sejam anunciadas e que possamos curtir mais bandas destaque do cenário nacional que, muitas vezes, apresentam-se de maneira esparsa por aqui e a preços exorbitantes.

Music

Purpurata Festival

Oito motivos para você não perder o Purpurata Festival, que levará rap, brasilidades e cultura alternativa efervescente a Florianópolis

Otto

Texto por Frederico Di Lullo

Fotos: Rui Mendes/Divulgação (Otto) e Divulgação (Black Alien)

Se a agenda cultural da Ilha da Magia do ano que está acabando foi boa, a de 2023 promete ainda mais! Os primeiros festivais já estão com seu line up pronto, com ingressos à venda. Por enquanto, é hora de falar sobre o Purpurata Festival. O evento estava programado inicialmente para os dias 13 e 14 de janeiro, mas teve suas datas adiadas. Agora, tudo será realizado nos dias 18 de março e 8 de abril, em novo local: o Vereda Tropical, na Barra da Lagoa. Mais informações sobre o Purpurata você tem aqui no site oficial.

Bora conhecer oito motivos para ir a este forte candidato a ser um evento inesquecível?

Duas noites de muito som

Novato na área, o Purpurata aparece como mais uma iniciativa para agitar a crescente cena de festivais independentes em Santa Catarina, tendo a capital do estado como ponto de partida. Diferentemente outras iniciativas, o Purpurata surge com um line up focado, em dias diferentes, no rap e em brasilidades. Por isso, é uma oportunidade tanto para quem prefere ver apenas a sexta-feira ou o sábado – ou, então, aventurar-se nas duas noites, que sempre iniciarão às 21h. Vai dar de curtir um dia de praia e, depois, mergulhar no festival.

Rap de primeira

O festival terá um line up feito para fãs do hip hop nacional: Kamau (SP), MC Versa (SC), Tássia Reis (RJ) e o carismático e consagrado Black Alien (RJ) vão agitar os presentes em duas noites para os fãs do estilo.

A noite das brasilidades

Também terá vez que gosta das brasilidades. Teremos os shows de Otto (PE), Letrux (RJ), Francisco El Hombre (SP) e os nativos da ilha Brothers Reggae (SC). Ou seja, duas noites para todo aquele que é fã de música alternativa em português e pretende se divertir numa noite de verão.

Otto

Passado um pouco mais de três anos do último show, Otto Maximiliano Pereira de Cordeiro Ferreira retorna à Ilha da Magia para incendiar a noite das brasilidades. O cantor, compositor e percussionista pernambucano desembarca na capital catarinense para apresentar Canicule Sauvage. O álbum, lançado neste ano, traz ao seu repertório novos clássicos como “Menino Vadio” e “Peraí Seu Moço”. O set list também conta com clássicos como “Farol”, “Crua” e “Saudade”. Mas é sempre bom não se esquecer de que, quando se fala de Otto, também podem vir boas surpresas ao vivo.

Black Alien

Habitué de Floripa como poucos, o ex-Planet Hemp não poderia começar o ano longe da cidade: promete uma performance incrível, como todas as que já realizadas na capital catarinense. E não poderia ser diferente: Black Alien estará na primeira das duas noites com sucessos estrondosos como “Vai Baby”, “Final de Semana”, “Como Eu Te Quero”, “Carta Pra Amy” e “Que Nem o Meu Cachorro”. Somente estas cinco faixas somam mais de 100 milhões de plays no Spotify. Um fenômeno da música brasileira atual.

DJs de primeira

Embora ainda não tenham sido anunciados os DJs, a organização informou em suas redes sociais que os dois dias terão nomes locais e de expressão nacional, para que todo mundo coloque o corpo para dançar. Por isso, a festa também estará garantida antes e depois dos shows. E será completa!

Ingresso solidário 

Está apertado de grana e não se encaixa nos critérios da meia entrada? Não se preocupe! O Purpurata Festival contará com entrada solidária para todos, para que ninguém tenha motivos para não curtir um festival diferente, com bandas e rappers que são destaque na cena nacional.

Transporte gratuito?

A prefeitura de Florianópolis havia anunciado catraca livre nos ônibus durante o dia 14 de janeiro, para desafogar o trânsito da Ilha. Até agora não há nada garantido, mas esperamos que a decisão seja mantida para uma ou mesmo as duas novas datas do evento.

Music

Floripa Eco Festival – ao vivo

Jorge Ben Jor, Planet Hemp, Baco Exu do Blues, Donavon Frankenreiter, Emicida e outros grandes shows aliados à discussão sobre sustentabilidade

Jorge Ben Jor

Texto e fotos por Frederico Di Lullo

Um festival Massa. Com M maiúsculo. No dia 18 de setembro, todos os caminhos levaram ao Eco Festival, com shows nacionais e internacionais de renome, lembrando até os bons e velhos Planetas Atlântida que rolavam na temporada de verão de Florianópolis na primeira década (e parte da segunda) deste milênio. Como esse é um papo saudosista, esse detalhe fica para outro momento. Vamos, então, viver o hoje e falar um pouco do que vivemos na atualidade. 

Infelizmente, a cidade sofre com acessos restritos e, por isso, naquele sábado chegamos ao Centro de Eventos Luiz Henrique da Silveira quando o Floripa Eco Festival já estava aquecendo todos os presentes. Era a vez de Mike Love, num tremendo pôr-do-sol, agitar a todos com seu reggae, numa perfeita simbiose com o fim de tarde da capital catarinense. Assim, o músico havaiano passou pelos principais sucessos de sua extensa carreira. Sem dúvida, apreciar a performance dele em “Permanent Holiday” e “Human Race” foi um dos pontos altos do evento. E isso que ele estava só começando!

Com uma produção impecável e pontualidade britânica, o Eco Festival continuou com nada menos do que Donavon Frankenreiter. Não se pode deixar de citar aqui que a combinação de surfista e artista é a cara da Ilha da Magia. O cantor mandou um set list com seus maiores clássicos, entre eles as necessárias “Big Wave”, “Free”, “It Don’t Matter” e “Shine”, tudo numa vibe muito especial. Sempre ouvimos que amor de festival tende a ser para sempre. Por isso, acreditamos que casais que assistiram juntos ao show do californiano tendem a ficarem juntos. Mas não foi o nosso caso: pouco antes de Donavon acabar já estávamos posicionados no outro palco para a atração que estava escalada para depois: o aguardado Baco Exu do Blues.

Antes de continuar, não há como deixar de comentar a respeito o objetivo do evento, que une música e sustentabilidade. Numa proposta muito utilizada em 2022, quando muito se fala sobre os impactos de ações da sociedade para um mundo melhor, precisa-se lembrar que, além dos shows de sábado, houve nos dois dias anteriores o Eco Summit. O congresso reuniu conteúdo em prol da sustentabilidade ambiental, por meio de workshops, apresentações, mesas de debate e apresentações de cases de sucesso. Sim, é necessário discutir o entretenimento para além do entretenimento e a Sleepwalkers, empresa que produziu o festival, fez isso de maneira exemplar. Parabéns, amigos!

Baco Exu do Blues

Voltando a aquele sábado, um dos concertos mais aguardados iniciou, apresentando as músicas do recente trabalho Quantas Vezes Você Já Foi Amado?, lançado em janeiro deste ano. Foi assim que as mais de 22 mil pessoas presentes cantaram as já clássicas canções “20 ligações”, “Samba In Paris”, “Lágrimas” e “Mulheres Grandes”. Sim, estamos falando de Baco, caso você não tenha entendido! Também não faltaram “Flamingos”, “Hotel Caro” e “Me Desculpa, Jay Z”. Todo mundo cantou e dançou junto. Foi uma vibe incrível!

Logo após chegou a vez de apresentar a prata da casa. Muita gente que não mora em Floripa ou até mesmo nos limites de Santa Catarina se perguntava quem era essa tal de Dazaranha. Mas os veteranos nativos jogavam em casa e fizeram um show incrível, como sempre, impressionando quem não os conhecia e entregando a qualidade de sempre para quem já os acompanha há mais de 20 anos. E, acredite, praticamente todos os presentes cantaram boa parte dos refrãos das músicas. No repertório não faltaram clássicos como “Fé Menina”, “Salão de Festa a Vapor” “Vagabundo Confesso” e “Com ou Sem”. Pelo menos pra nós, contudo, o ponto alto foi “Afinar as Rezas”, quando se presenciou a maior interação com a plateia. E ainda tinha mais coisa para apresentar…

Sim, apesar do cansaço, como ficar parado na hora de Jorge Ben Jor? E se tem algo que o morador do Copacabana Palace sabe é fazer apresentações memoráveis. Acompanhado por uma banda afiada, Ben Jor colocou todos os presentes para dançar com clássicos como “Take It Easy My Brother Charles”, “Oba, Lá Vem Ela”, “Menina Mulher de Pele Preta”, “Chove Chuva”, “Mas Que Nada”,  “Balança a Pema”, “Magnólia”… Poderíamos citar todo o repertório e ainda faltariam adjetivos para descrever Jorge. O tempo passa e, aos 83 anos, cada vez fica mais evidente que ele é um alquimista e tem a pedra filosofal da imortalidade do corpo –  porque a do trabalho está mais do que assegurada.

Minutos depois, o público foi à loucura quando Emicida iniciou sua performance com uma introdução em vídeo necessária nos tempos atuais. Ele não veio sozinho também: reuniu em cima do palco os maiores nomes do rap nacional na atualidade: Criolo, Rael e Rashid. Cada um no seu momento, participaram do show emplacando os clássicos como “Levanta e Anda”, “Passarinhos”, “AmarElo”, “Libre”, “Paisagem” e “Eminência Parda”. De repente, Marcelo D2 e BNegão se juntam à trupe para uma performance incrível em conjunto na música “Grajauex” de Criolo. Mais uma das cenas que cravaram o festival no coração de todos os presentes.

Tinha tempo para mais? Sim. Eram quase duas da madrugada quando a ex-quadrilha da fumaça pousou no Eco. Era o Planet Hemp, mais Hemp do que nunca! Não dá para negar que é uma das nossas bandas favoritas, seja pela mistura entre rap, rock, reggae e hardcore, tão característica pela sonoridadeou pela ideologia. O fato é a trupe comandanda por BNegão e D2 incendiou tudo até a última ponta, num show fod@ pra c@r@lho, com uma vibe renovada, que nos traz a esperança de um mundo melhor. Começando com “Não Compre, Plante!” e passando por músicas como “Legalize Já“, “Maryjane”, “100% Hardcore”, além da cover de “Crise Geral”, do Ratos de Porão, a banda tirou as últimas forças de energia que ainda restavam da galera presente, fechando o line up com chave de ouro.

Sem dúvida, o Eco Festival foi um dos festivais do ano. E já foi anunciada sua próxima edição, para 2023. Ficamos ansiosos e expectantes por novas experiências musicais. Agora é esperar e descansar.