Série provoca riso e choro com protagonistas conflituosos que só pensam em um dar ao outro um “troco” cada vez mais mirabolante
Texto por Tais Zago
Foto: Netflix/Divulgação
Até onde um pequeno desentendimento no trânsito pode chegar quando as duas pessoas envolvidas estão profundamente infelizes e insatisfeitas? Essa é a questão central de Treta (Beef, EUA – Netflix). Não, apesar do nome original, a série – iniciada agora em 2023 – não tem nada a ver com culinária ou alguma paixão carnívora. Nos Estados Unidos, a palavra para a carne bovina também serve como gíria para um desentendimento, um ressentimento ou, mais precisamente, uma “treta” entre pessoas. E esse “bife”, aqui, não é para amadores.
Lee Sung Jin é o criador e o roteirista dessa tragicomédia entre dois personagens completamente diferentes. Amy (Ali Wong) é uma bem sucedida empreendedora. Ela tem dinheiro, um marido considerado “perfeito”, uma filha e todo o luxo californiano na classe artística aos seus pés. Já Danny (Steven Yeun) é um empreiteiro endividado e fracassado, lutando para sobreviver e sustentar o irmão mais novo, enquanto sonha em comprar uma casa para seus pais. Em um cenário comum, os dois nunca coexistiriam. Apesar de ambos terem origem asiática, nada mais parece conectá-los. Até que um desentendimento no estacionamento de um shopping center – Amy buzina incessantemente enquanto Danny se recusa a sair da vaga – culmina em uma absurda perseguição pelas ruas de Los Angeles, quando ambos infringem diversas leis de trânsito e colocam pessoas em risco. Logo o acontecido cai nas redes sociais e assim se inicia uma procura dos dois por “investigadores amadores” de bairro da localidade de Calabasas.
A comediante e stand up Ali Wong nos entrega uma Amy profundamente frustrada e em conflito com suas verdadeiras vontades e a realidade da vida que ela construiu para si mesma. Se tudo é tão perfeito, por que ela ainda se sente infeliz? Esta é a questão que já nos acompanha a partir do primeiro episódio e continua até o último. Já Steven Yeun, mais conhecido do grande público por sua atuação como o Glenn de The Walking Dead, interpreta um Danny repleto de medos e insatisfações, apesar da sempre aparente autoconfiança, ele é castigado pelos seus sentimentos de fracasso e uma depressão que esconde de todos. Em cima da base criada pelos dois, cada episódio se torna uma montanha-russa de paybacks, onde cada decepção diária dos personagens consigo mesmos os leva a montar planos cada vez mais maquiavélicos e mirabolantes um contra o outro. Na vida de Amy e Danny, o foco principal se torna o beef, a treta, a qual nenhum deles parece realmente querer resolver ou perdoar.
Apesar da sinopse nos levar a crer que Treta seria mais uma comédia de slapsticks e vinganças malsucedidas, Lee Sung Jin consegue incluir uma miríade de conflitos internos, traumas e experiências que enriquecem seus personagens de tal forma, que, lá pelo meio, já conseguimos nos compadecer com a imagem horrível, mas real e crua, que Amy e Danny tem deles mesmos. É a queda da máscara construída com muito esforço. Os sonhos despedaçados deixando apenas o desespero e o ódio como substitutos da tristeza. A série possui diálogos e situações hilárias, daquelas de rirmos até chorar. Mas também nos arrasta a um abismo onde choramos sem rir. O toque reflexivo chega até a nos lembrar um pouco as divagações filosóficas do vitorioso do último Oscar, Tudo Em Todo Lugar Ao Mesmo Tempo. Uma tendência que parece permear muitas das obras da produtora indie A24, assim como uma forte queda para representações de um psicodelismo surrealista.
Será que não existe um pouquinho de Danny e Amy dentro de todos nós? Eu acho que sim. Ao menos quando invariavelmente descontamos nossas frustrações em discussões acaloradas, porém absurdas e sem utilidade prática, em redes sociais ou em situações mundanas do dia a dia. Nesse quesito, Treta vai além das telas e nos traz questionamentos válidos que podem nos conduzir a uma jornada de autoconhecimento.
Oito motivos para lembrar-se sempre da cantora como uma das maiores divas de todos os tempos do olimpo da música pop
Tina Turner em sessão de fotos para o disco Private Dancer
Texto por Abonico Smith
Fotos: Reprodução
Anna Mae Bullock teve seu falecimento anunciado no último dia 24 de maio. Ela morreu em casa, aos 83 anos, na cidade suíça de Küsnacht, próxima a Zurique, onde vivia havia três décadas. A cauda da morte não foi revelada, mas sabe-se que nos últimos anos ela vinha lutando contra algumas doenças, além de ter perdido dos filhos em um curto espaço de tempo.
Sob a alcunha de Tina Turner, tornou-se figura de suma importância na música pop dos anos 1960 para cá. Na juventude, fez história ao ser a linha de frente da dupla formada com o marido, o produtor e multiinstrumentista Ike Turner . O relacionamento, sempre movido a drogas, machismo, abusos e violência física, ruiu de vez em 1976. Com o divórcio veio a carreira solo ea famosa tríade “levanta, sacode a poeira e dá a volta por cima”. Com mais de 40 anos, já em meados dos 1980s, transformou-se em sex symbol dos palcos, sempre chamando a atenção pelos vestidos curtos mostrando as pernas torneadas e favorecendo os movimentos frenéticos das coreografias que sempre foram parte integrante das performances desde o início da trajetória profissional). Também viu sua carreira ser elevada ao status de rockstar mundial. Com a ajuda da MTV e dos videoclipes, passou a vender milhões de discos, tornar-se atriz bissexta cultuada em Hollywood e carregar multidões para ver os seus concertos em grandes arenas. Em 1988, entrou para o livro Guinness dos recordes ao ter um público pagante de quase 200 mil pessoas no seu primeiro show em solo brasileiro, realizado no estádio do Maracanã, no Rio de Janeiro.
Se Anna Mae desencarnou desta dimensão, seu legado deixado como Tina Turner continuará sendo eterna. Por isso, o Mondo Bacana preparou aqui oito motivos para se lembrar sempre da cantora.
Tina Turner cantando no Ed Sullivan Show ainda na dupla com Ike Turner
Furacão nos palcos
Descoberta ainda adolescente pelo produtor Ike Turner – que logo viria a se tornar seu marido – tornou-se estrela solitária em tempos de auge dos girl groups. Ao vivo, à frete da banda comandada por Ike, sempre trazia seu grupo de backings para lhe ajudar a encorpar os vocais e as coreografias do palco. E colocava fogo sempre em todos os palcos nos quais se apresentava, rodopiando feito um furacão, equilibrando-se no salto e soltando o vozeirão em canções que traçavam um diálogo entre o wall of sound de Phil Spector e a energia crua do rock’n’roll. Portanto, se hoje você tem dezenas de divas pop cantando e dançando absolutas em cena, coloque isso na conta de Tina Turner.
Relacionamento abusivo
Ao lado de Ike, Tina conheceu o paraíso em sua trajetória profissional, sobretudo varrendo o mainstream do showbiz norte-americano entre os anos de 1966 e 1975, vendendo discos e discos e arrasando nos concertos. Só que a década áurea também não trouxe apenas sorrisos e boas lembranças. Pelo contrário. Aquela Tina se jogava de cabeça para seu público passava muito sofrimento nos bastidores. As atitudes de Ike, sempre movidas ao abuso de drogas, passaram a se tornar gradualmente cada vez mais insanas frente a Tina. O relacionamento abusivo incluía muita, muita, muita violência física e emocional. No dia do casamento, em 1962, logo após a cerimônia, Ike o obrigou a entrar em um bordel e assistir a um show de sexo explícito. A escalada foi aumentando até que em 1976, depois de uma viagem de carro durante uma turnê, Tina saiu correndo estrada afora só com a roupa do corpo para mudar de vez seu destino e virar, tanto na carreira artística quanto no estado civil, uma estrela ainda maior do que era sob o covarde cabresto do companheiro troglodita.
Tina Turner no filme Tommy (1975)
“The Acid Queen”
Em 1975, o diretor e roteirista Ken Russell levou às telonas uma impactante versão da ópera-rock Tommy, lançada seis anos antes em disco pelo Who. O protagonista era, inclusive, interpretado pelo vocalista do grupo britânico, Roger Daltrey. Outras presenças marcantes neste musical são Elton John (como o mágico do pinball em antando “Pinball Wizard”), Eric Clapton (como o pregador que recupera o antigo blues “Eyesight To The Blind”) e Tina Turner (como o “barato das drogas químicas” em “The Acid Queen”). A interpretação que Tina imprimiu à faixa foi tão poderosa que logo a gravadora embarcou na veia rock’nróll da cantora e bancou um álbum solo dela (ainda que estivesse presa ao casamento e à parceira com Ike naquele ano), também batizado como The Acid Queen. No lado A, Turner arrasa cantando clássicos dos Rolling Stones (“Under My Thumb”, “Let’s Spend The Night Together”), Who (“I Can See For Miles”, a faixa-título) e Led Zeppelin (“Whole Lotta Love”). No outro lado do vinil, quatro composições de Ike, sendo “Baby Get It On” gravada em dueto com ele. Foi o grande rito de passagem de sua trajetória pessoal e profissional, que a fez ficar livre de vez do encosto que passou a tomar conta de sua vida.
Rasteira no etarismo
Tina Turner tornou-se popstar de números e recordes mundiais já depois da virada dos anos 1980. De quebra, transformou-se em sex symbol do rock, sempre arrebatando corações com seus looks de pernas de fora, saltos e vestidos curtos. Este período áureo da carreira solo coincidiu com o apogeu da Music Television, que no decorrer dos anos 1980 alastrou-se para o planeta todo com suas filiais inundando de videoclipe as televisões de jovens e adolescentes espalhados pelos quatro cantos. Era o formato audiovisual dando todas as cartas na indústria fonográfica, pautando todas as rádios, alavancando vendagens estratosféricas e dando início ao que passamos a entender por grandes turnês mundiais. Tina Turner conseguir tudo isso – vale bem lembrar – já tendo passado dos 40 anos e em um mundo onde machismo e etarismo ainda rolavam soltinhos na sociedade. Portanto, ela dava um banho de talento, beleza, sensualidade, força, liderança e perseverança sendo uma mulher em uma faixa etária majoriatariamente descreditada pelo então ainda impiedoso patriarcado.
Fase de ouro
Quinto álbum solo de Tina, Private Dancer chegou às lojas no final de maio de 1984 revelando uma artista pronta para ser catapultada ao megaestrelato. Sua nova gravadora bancou vários produtores e compositores de sucesso para as nove faixas, que formavam uma mistura eletrizante de baladas e canções dançantes, além do flerte com elementos do rock, do pop, do r&b e do jazz. O resultado foi a chegada de vários hits nas paradas (“Better Be Good To Me”, “Private Dancer”, “What’s Love Go To Do With It” e a releitura do clássico soul “Let’s Stay Together”). Além de muitos discos de platina em vários países, a obra rendeu ainda quatro prêmios Grammy. Dois anos depois, o sucessor Break Every Rule foi capaz de sustentar Tina no olimpo pop, que rendeu nada menos do que oito singles (!!!). Novamente muitos produtores (entre os nomes, agora, os endeusados Bryan Adams e Mark Knopfler, que compusera a canção “Private Dancer” com Jeff Beck), novamente hits enfileirados nas paradas (“Two People”, “Typical Male”, “Paradise Is Here”, “What You Get Is What You See”), agora participações especialíssimas nos créditos das gravações (Knopler, Adams, Steve Winwood, Phil Collins, Branford Marsalis). Novamente múltiplos discos de platina ao redor do mundo, novamente o Grammy de melhor performance feminina de rock.
Tina Turner cantando no Maracanã
Recorde no Maracanã
O sucesso expandido pelo álbum Break Every Rule rendeu uma megaturnê que levou treze meses girando pelo mundo. Veio parar inclusive por aqui em uma época em que, ajudado pelo Queen e pelo Rock In Rio em 1985, o Brasil estava começando a entrar na rota dos grandes shows internacionais. Tina já havia cantado duas vezes na semana anterior em São Paulo, mas foi a passagem pelo Rio de Janeiro o seu maior momento – no país e, como indicam as memórias transpostas para a autobiografia Minha História de Amor – e da própria tour. A cantora levou 188 mil pagantes ao Maracanã, quebrando o recorde de pessoas em um evento não futebolístico – e superando marcas obtidas por outros nomes gigantes da música como Paul McCartney (184 mil), Frank Sinatra (175 mil), Rolling Stones (141 mil) e Kiss (137 mil). Aproveitando a estrutura utilizada dias antes pela primeira edição do festival Hollywood Rock, aquela histórica noite de 16 janeiro começou com bateria de escola de samba e o puxador Neguinho da Beija-Flor adaptando seu característico bordão para a estrela que chegou ao palco levada por um carro alegórico de Joãosinho Trinta. O set list contou com 19 canções. Começou com “Addicted To Love”, cover de Robert Palmer. Passou por várias canções daquele momento mágico que ela vivia nos anos 1980 (“Girls”, “Private Dancer”, “Typical Male”, “What’s Love Got To Do With It”, “Break Every Rule”, “What You Get Is What You See”, “Show Some Respect”, “Better Be Good To Me”, “Paradise Is Here”, “We Don’t Need Another Hero”), outras releituras de clássicos (“Help!”, “Let’s Stay Together”, “Proud Mary”) e pescou faixas de sucesso do passado (“The Acid Queen”, “Nutbush Cuty Limits”. Esta última, gravada em 1973 ainda como Ike & Tina Turner e uma quase autobiografia em versos e melodias composta por ela própria, encerrou a apresentação. Este show está disponível para streaming na Globoplay, por meio de um especial preparado e transmitido na época pela Rede Globo.
“We Don’t Need Another Hero”
Em 1979, George Miller apresentava ao mundo a trama pós-apocalíptica Mad Max, cujo sucesso comercial fez ainda dois títulos (em 1982 e 1985) para a trilogia oitentista protagonizada por Mel Gibson. Recentemente a franquia foi retomada com sucesso de público, crítica e premiações, mas naquele ano de 1985 a recepção fora bem diferente. Se não fosse pela presença de Tina Turner na produção, talvez Mad Max: Além da Cúpula do Trovão tivesse fracassado ainda mais. Nas telas, ela fez o papel de Aunty Entity, governante de Bartertown, uma cidade incrustada no deserto, que tenta a todo e qualquer custo consolidar seu poder na área. A interpretação da cantora transformou-se no ponto mais interessante de um filme perdido em um roteiro confuso e defendido sem qualquer empolgação por seu diretor. O visual marcante da personagem ainda se estendeu para o videoclipe da música-tema “We Don’t Need Another Hero”, esta sim o maior trunfo do longa-metragem. Além de indicações para o Oscar e o Grammy, Tina fez desta balada um hit mundial, capaz de mantê-la nas paradas durante o intervalo entre os discaços Private Dancer (1984) e Break Every Rule (1986).
Tina Turner no filme Mad Max: Além da Cúpula do Trovão (1985)
Cidadania renegada
Em 1986, Tina conheceu o executivo alemão do mundo da música Erwin Bach, com quem logo engatou um namoro. No começo da década seguinte, mudou-se para a cidade de Küsnacht, próxima a Zurique, para morar com Bach. O casamento só foi oficializado em 2013, quando solicitou a nacionalidade suíça em detrimento da norte-americana. Definitivamente os Estados Unidos não lhe encantavam mais. Afirmava apenas ter nascido lá e possuir familiares morando do outro lado do Atlântico. De certa forma, todo este processo de mudança foi uma saída para passar uma borracha em todo o sofrimento pessoal do passado e construir uma nova vida para Anna Mae Bullock, longe dos holofotes ligados para iluminar o glamour vivido como Tina Turner. Haja atitude para um artista dos EUA apagar suas ligações todas com o país natal.
Os 30 anos de criação do mangue beat ganham em Florianópolis uma noite de festa e homenagens por meio de uma de suas bandas mais icônicas
Texto por Frederico Di Lullo
Foto: Tiago Calazans/Divulgação
No próximo dia 10 de junho (sábado), todos os caminhos da música independente da capital catarinense irão se cruzar na Cervejaria Matura Floripa, no coração da Praia do Campeche. O espaço será o palco do Noites Saravá, que nesta edição traz a lendária banda recifense Mundo Livre S/A novamente a Florianópolis, agora rendendo sua homenagem à história do mangue beat. A promessa é de uma noite épica para os fãs e apreciadores do movimento criado há 30 anos em Recife e que se transformou em uma das principais peças criativas da música brasileira do final do século passado – clique aqui para ter mais informações sobre o evento.
Quem mora pela região já pode deixar reservada a data na agenda. E aqui estão oito motivos para não perder o espetáculo de Fred 04 (voz, guitarra e cavaquinho), Pedro Diniz (baixo), Xef Tony (bateria), Leo D (teclados) e Pedro Santana (percussão). Bora?
Experiência presencial
O Mundo Livre S/A é conhecido por suas performances intensas e cheias de energia, proporcionando uma experiência musical inesquecível. Deste modo, não podemos esperar outra coisa que uma apresentação épica como foi aquele show no Riozinho, em janeiro de 2013.
Fusões musicais
O quinteto pernambucano mescla diferentes estilos musicais, como rock, samba, mangue beat, electronica e influências regionais tradicionais. Esta fórmula criou um som único e autêntico para fazer os puritanos passarem longe.
Repertório variado
De carreira extensa, a banda tem um repertório repleto de sucessos e hinos da música brasileira, como “Meu Esquema”, “Bolo de Ameixa”, “A Bola do Jogo”, “O Mistério do Samba” e “Livre Iniciativa”. De quebra, outras músicas compostas por Fred 04 (mais algumas do colega Chico Science, o falecido líder da Nação Zumbi, por exemplo) farão parte da apresentação, aquecendo o coração de todos que estiverem ali na plateia.
Performance marcante
Fred 04, o carismático vocalista, é conhecido por sua presença de palco que sempre envolve o público. Prestes a completar 58 anos, o autor do manifesto Caranguejos com Cérebro, que deu origem ao mangue beat, é sinônimo de contracultura brasileira e sabe como agitar a galera desde o minuto zero (quack!).
Atmosfera de festa
Os shows organizados pelo Saravá Cultural são uma verdadeira festa, sempre com clima descontraído, alegre e com ótimas atrações. Por isso, essa noite especial com o Mundo Livre S/A rendendo homenagem ao mangue beat e misturando isso com composições próprias é um convite a se divertir para valer.
Mensagens de resistência
As letras do MLSA abordam temas sociais, políticos e culturais de forma inteligente e provocativa, levando o público a refletir sobre questões importantes da sociedade. Ou seja, nada mais atual… embora estejam na estrada fazendo isso há 30 anos.
Músicos talentosos
Todos os integrantes são instrumentistas excepcionais. Dotados de habilidades técnicas diferenciadas, honram o legado da “Veneza Brasileira”. Sim, este é o apelido de Recife, a cidade que pulsa música boa há décadas e desenvolve talentos como a trupe que vem se apresentar neste especial da Saravá Cultural.
Legado histórico
O Mundo Livre S/A é considerado uma das bandas de maior influência e importância do rock nacional a partir da cena recifense do mangue beat dos anos 1990. Com mais de três décadas de carreira e dez álbuns lançados, o MLSA construiu uma história sólida na música brasileira, inspirando novas gerações de artistas e deixando um legado mais presente do que nunca, ainda na ativa, rodando e provocando por aí. Portanto, está dada a morta: prepare-se para uma noite cheia de emoções e momentos memoráveis de arte em seu mais puro estado.
Inimaginável dobradinha eletrônica proporcionada pelo C6 Fest entra para a memória dos shows internacionais no Rio de Janeiro
Kraftwerk
Texto e fotos por Fabio Soares
Vez por outra, novos festivais de música vêm à tona no Brasil com diferentes nomenclaturas. Nada, porém, apaga o fato de que poucas majors do entretenimento detém o controle de grandes eventos, monopolizando a contratação de nomes consagrados, elevando seus cachês à enésima potência e dificultando ao máximo a vida de produtores independentes de shows.
Sendo assim, quando o C6 Fest foi anunciado imaginou-se que seria mais um tentáculo de uma grande corporação do entretenimento. Entretanto, a divulgação de que membros de sua curadoria também montaram line-ups dos extintos Free Jazz e Tim Festival trouxe um alento para entusiastas. Com datas praticamente simultâneas entre São Paulo e Rio de Janeiro, foi justamente o 18 de maio da capital fluminense que chamou a atenção.
Juntos, dois mastodontes da música eletrônica tocariam na mesma noite em solo carioca: Kraftwerk e Underworld. Porém, nem o apelo da presença de ambos na mesma noite pareceu balançar os corações do público carioca. Encalharam os ingressos, o que forçou a direção do festival a oferecê-los pela metade do preço.
Mesmo com a promoção, o Vivo Rio (casa de shows localizada no Parque do Flamengo) não lotou. Quinze minutos antes do início da apresentação do Kraftwerk, notáveis eram os “clarões” na plateia. E com apenas cinco minutos de atraso, o fundador e único membro original do grupo de Dūsseldorf, Ralf Hūtter, e seus atuais escudeiros Fritz Hilpert, Henning Schmitz e Falk Grieffenhagen iniciaram a viagem audiovisual que é a marca registrada de toda gig do conglomerado alemão.
O medley de “Numbers” e “Computer World” deu início aos trabalhos e. como já era esperado, as projeções nos três telões (um no palco e dois laterais) deixavam bem claro a intenção do grupo em ressaltar que TUDO começou com eles. Que é deles a transição analógico/digital na música pop. Que partiu deles a ignição do primeiro transistor em um sintetizador.
Em “Spacelab”, um afago na Cidade Maravilhosa: imagens do Google Earth mostravam o Rio de Janeiro a partir do espaço para, a seguir, um disco voador sobrevoar o Pão de Açúcar e literalmente pousar na porta do Vivo Rio.
Historicamente, a iluminação em led nas vestimentas dos “homens-robô” sempre foram uma espécie de elemento vivo das apresentações. Destaque para “The Man Machine”, com uma iluminação vermelha que totalmente preencheu o ambiente.
Em “Autobahn”, a eterna autoestrada germânica convidou o público a uma viagem no tempo. Sozinho nos vocais, Ralf Hūtter (do alto de seus 76 anos de idade) permanecia econômico em sua performance, com gestuais curtos a comandar os quase invisíveis sintetizadores do bólido alemão sonoro, cuja imagem e funcionamento exerce um histórico segredo tal qual a fórmula da Coca-Cola.
Misteriosamente posicionado no meio do set list, o hino mundial “The Model” pôs a casa inteira para dançar. A satisfação no semblante de Hūtter era evidente. Mais de quarenta anos depois, a inconfundível “cama” de teclados ainda faz um estrago dos grandes. Estrago este, aliás, que foi seguido por uma versão de quase dez minutos de “Trans-Europe Express”, a saga ferroviária e sonora que não perde sua beleza mesmo também após quase meio século de seu lançamento.
Na sequência, um verdadeiro PANDEMÔNIO foi instalado no recinto com a execução de “The Robots”. A imagem de “homens-robô” com camisas vermelhas e gravatas negras segue sendo um atemporal ícone pop capaz de ditar moda, ditar ritmo, ditar tudo.
Um grande momento que anestesiou a plateia para o tão esperado epílogo com a dobradinha arrasa-quarteirão “Boing Boom Tschak” e “Musique Non Stop”. Este foi um daqueles momentos inesquecíveis com o grave dos sintetizadores refletindo nas paredes do ambiente e voltando no peito dos presentes com um peso inacreditável. No fim, ver Ralf Hūtter ser ovacionado pela plateia foi o momento mais emocionante da noite, fechando com chave de ouro uma noite de celebração à pedra fundamental da música eletrônica no terreno pop.
Underworld
De forma não surpreendente, muita gente foi embora após o término da apresentação do Kraftwerk, deixando (literalmente) a pista livre para o Underworld. Na estrada há 44 anos, o duo galês já começou a apresentação com a arrasa-quarteirão “Juanita 2022”, lançada no ano homônimo. A iluminação ora etérea ora caótica reforçada por muita fumaça cenográfica deu ao Vivo Rio o tom de balada já esperado. E a dupla Rick Smith/Karl Hyde mostrou um entrosamento digno de amigos do tempo do colégio: o primeiro, envolto a um arsenal tecnológico, poderia muito bem deitar eternamente no berço esplêndido de suas programações prévias mas, ao contrário, acelerou, diminuiu, acelerou e diminuiu novamente o ritmo para a performance arrasadora de Hyde. Aos 66 anos, o frontman dançou e pulou muito. Só faltou plantar bananeira no palco.
O set list? MA-TA-DOR! “Two Months Off”, “Push Upstairs”, “Jumbo”. O Vivo Rio ia à loucura a cada explosão sonora que era acionada pelo DJ do duo. A cada faixa, Hyde dançava em lados distintos do stage, convidando os presentes a fazer o mesmo. Em “King of Snake”, soltou: “estar no Brasil é um sonho e no Rio, ainda mais!”.
O recém-lançado single “And The Colour Red” talvez tenha sido o momento menos incensado de uma apresentação impecável. No fim, o clássico secular “Born Slippy”, imortalizado na primeira versão da película Trainspotting deu números finais a um repertório de uma hora e dez minutos hipnotizantes e imortalizados na memória de quem os viu.
Por fim, o saldo foi inesquecível. Por ser patrocinado por um banco, o C6 Fest pouco se abalará pelo prejuízo causado pelos ingressos encalhados em sua edição carioca. Por outro lado, a ficha só caiu depois: em qual outra cidade do mundo seria possível assistir (na mesma noite) uma apresentação com Kraftwerk e Underworld na sequência? Obrigado, Rio! Nos lembraremos deste 18 de maio por muito tempo.
Set list: “Numbers/Compuetr World”, “Spacelab”, “The Man Machine”, “Autobahn”, “Computer Love”, “The Model”, “Tour de France 1983/Prologue/Tour de France Étape 1/Chronos/Tour de France Étape 2”, “Trans-Europe Express/Metal On Metal/Abzug”, “The Robots”, “Planet Of Visions” e “Boing Boom Tschak/Musique Non Stop”.
Set list Underworld: “Juanita 2022”, “Two Months Off”, “Push Upstairs”, “Jumbo”, “Dark & Long (Dark Train)”, “King Of Snake”, “Rez/Cowgirl”, “And The Colour Red” e “Born Slippy .NUXX”
Oito motivos para não perder um show desta que muito provavelmente deverá ser a última passagem da cantora por nosso país
Texto e tradução por Abonico Smith
Foto: Divulgação
Nesta sexta-feira se consumará mais um encontro mágico entre o público brasileiro e uma das maiores cantoras norte-americanas de música pop em todos os tempos. Dionne Warwick começa hoje, por Curitiba, uma nova passagem por nosso país, com direito a outras três datas (Rio de Janeiro, Brasília e São Paulo, respectivamente nos próximos dias 20, 23 e 28 de maio). Mais informações sobre a turnê você encontra clicando aqui.
A mais perfeita tradução vocal das melodias compostas por Burt Bacharach em parceria com os versos do letrista Hal David, Dionne Warwick chega por aqui com sua nova tour. O nome, One Last Time, entretanto indica uma coisa triste: apesar da química sempre perfeita demonstrada nas outras vezes em que artista e audiência verde-amarela estiveram frente a frente, esta parece ser mesmo a última oportunidade para desfrutar ao vivo de sua voz doce.
O Mondo Bacana preparou oito motivos para você não perder esta noite especial comandada por Warwick. As aspas foram retiradas de uma entrevista concedida por ela dias antes do embarque rumo ao nosso país.
Última vez?
A expressão que dá nome à tour, One Last Time, pode ser traduzida para o português como “uma última vez”. Claro que tudo no showbiz pode mudar dependendo das circunstâncias de momento, além do entretenimento do ramo dos concertos gostar de usar bastante batismos que apelem para o emocional dos fãs. Só que isso indica mesmo ser esta a derradeira passagem da cantora por terras brasileiras. No último mês de dezembro ela completou 82 anos e a idade começa a pesar quando os artistas vão envelhecendo e ficando sem muita paciência para encarar longos tempos de viagens de lá para cá, daqui para ali. Warwick ainda corrobora a questão sendo franca em relação a isso. “Não estou parando com a música. Saberei muito bem quando chegar esta hora de parar, acredite em mim. Será quando eu notar que não conseguirei mais dar o meu melhor. Mas eu venho de um grande número de turnês, tantas quantas eu consigo fazer. Portanto, este nome não indica sobre parada na carreira, apenas um jeito de desacelerar o ritmo das viagens. É aquele negócio de passar menos dias na estrada, correndo por aeroportos”.
Melhor de si ao vivo
Dionne nunca escondeu sua satisfação e extrema vontade de subir aos palcos mundo afora. “Fico excitada sobretudo por estar em plena capacidade de vir a uma platéia e cantar aquilo que todo mundo espera de mim. Eu me preparo bastante para isso por todo este tempo. Entrego vários clássicos e ainda posso fazer surpresas com algumas canções nunca antes ouvidas. Estive ainda trabalhando ativamente esses últimos anos, gravando coisas novas”.
Clássicos eternos
Segundo a própria Dionne, existe um punhado de músicas “obrigatórias” em todos os seus shows. “I Say a Little Prayer” não pode ficar fora das turnês. “Do You Know The Way To San José?” não pode focar fora das turnês. “Alfie” não pode ficar fora das turnês. “I’ll Never Fall In Love Again” não pode ficar fora das turnês. “Toda canção que eu tenho em meu set list é uma canção que eu sei que as pessoas estão esperando que eu cante. Então eu preparo um repertório sempre de acordo com isso”.
Burt Bacharach & Hal David
Pode reparar. Mil e um nomes já fizeram suas versões de composições assinadas pela dupla que se transformou em excelência no cancioneiro popular norte-americano. Entretanto, Dionne Warwick se transformou em excelência da excelência com sua voz arrebatadoramente aveludada ao gravar dezenas de canções desses compositores. Tanto que até hoje mais da metade de seu repertório dos concertos é composta por seus hits – a ponto dela se dar ao luxo de emendar uma na outra, como medleys, sem deixar qualquer tempo para espectadores maravilhados se recomporem nas poltronas dos teatros. Além daquelas citadas por ela mesma no parágrafo acima, aí vai outra pequena lista das preciosidades que não costumam ficar de fora da qualquer set list: “What The World Needs Now Is Love”, “Anyone Who Had a Heart”, “That´s What Friends Are For”, “This Girl Is In Love With You”, “Message To Michael” e, claro, “Walk On By”.
Ligação especial com o nosso país
“Eu amo o Brasil e o Brasil já me mostrou que me ama também. Não poderia pedir por uma relação melhor, aliás. O Brasil me deu uma dos melhores abraços que já tive na carreira, melhor do que muitos outros países. Sinto que os brasileiros querem que eu seja uma parte do que eles já são. Dizem para mim “você tem de ser brasileira” e eu me desculpo dizendo que não posso ser brasileira… (risos) É um dos sentimentos mais quentes que se pode ter, o de ser bem aceita e com paixão por um povo. Eu tento arranhar umas palavras na língua portuguesa, mas só um pouquinho… (risos) Também sempre fui muito ligada na música brasileira. Eu a amo porque ela é algo feliz para mim, me faz sorrir. É ainda uma eterna referência para o país, que faz a gente amá-lo e isso é muito importante. E a feijoada é uma coisa absolutamente extraordinária”.
Ouvidos atentos para novidades
“Não conheço muita coisa nova não, mas eu tenho sete netos e eles sempre me mantêm atualizada no que está rolando por aí, ficam tocando o que gostam para eu ouvir. Claro que continuo ouvindo música durante todos esses anos, é algo que faz bem aos meus ouvidos. E gosto de ouvir qualquer tipo ou gênero musical, é o que me mantêm aqui até hoje. Um nome mais novo que me vem imediatamente à cabeça é o de Beyoncé. Eu a conheci quando ela tinha quinze anos de idade. Já dava para saber o porquê do tamanho do sucesso que ela iria obter depois em sua carreira. Outro nome é o de Rihanna, mas não gosto só das suas aventuras no mundo da música, também do que ela fazia fora disso. Ela cresceu como uma jovem que tinha aspirações a muitas, muitas coisas, não apenas musicais. Sabe, há diversas pessoas na indústria da música seguindo os seus próprios caminhos, o que é maravilhoso, por sinal. E usando o mundo dos negócios muito bem. Há muita gente abaixo dos 30 ou mesmo lá pelos 30 anos que estão imprimindo em suas carreiras justamente aquilo que gostariam de ouvir. Claro que algumas coisas não conseguem se encaixar perfeitamente nos meus ouvidos, então não há motivos para eu ouvi-las. Mas aquilo que está sendo gravando é de acordo com a sua música, a sua sonoridade, as suas palavras. E estas pessoas depositam na indústria a sua paixão”.
Ativismo social
“Todo o tempo em que me envolvi na campanha de conscientização em relação à aids foi maravilhosamente importante. Estávamos perdendo de forma precoce muitas pessoas dentro do nosso meio. Então era hora de alguém encarar os fatos e perguntar o que está acontecendo. A última coisa que eu poderia ter feito a respeito disso era fugir. Sempre fui de me meter em questões bem sérias como essas e procurei saber como poderia ajudar quem estava contraindo o vírus na época. Fui eleita uma das embaixadoras dos Estados Unidos nesta área para descobrir como poderíamos lutar contra isso não só aqui mas em outros países. Então comecei a viajar para me encontrar com pessoas em todo o mundo, observar o que estava sendo feito e dando certo em outros lugares para que pudesse retornar e trazer isso também para o meu país. O mais importante sempre foi fazer as pessoas compreenderam como e por que tudo acontecia para lutar contra isso da maneira mais apropriada, entender as causas da aids e fazer as pessoas entenderem como se cuidar e se prevenir. Isso deu toda a repercussão para este trabalho. Mas com certeza sou e sempre fui uma pequena parte disso, não levo para mim os créditos desta empreitada inteira não”.
Poder de cura pela música
“Claro que sim, acredito nisso. É de fato uma das principais forças de cura. Veja como isso funciona em hospitais, asilos… Em bebês! Bebês reagem à música. Musica traz o poder da cura. Canções são escritas e elas também podem curar as pessoas”.