Music

Arnaldo Antunes + Vitor Araújo

Oito motivos para você não perder a chance de ver ao vivo o show em conjunto do cantor e compositor paulista e o pianista pernambucano

Texto por Abonico Smith

Foto: Divulgação

Fevereiro de 2020. Mês de lançamento do décimo segundo álbum de estúdio de Arnaldo Antunes. O Real Resiste, como diz o próprio título (além dos versos que compõem a letra da faixa que o batizou, servia como um contraponto para o autor. Sob um clima de meia-luz, harmonizando teclas e cordas e dispensando a parte rítmica de percussão e bateria, era um pretexto para uma retomada de ar de toda a loucura na qual o país mergulhara no ano anterior, com todos os bichos escrtos que saíram dos esgotos sob o comando do inominável presidente.

Mas eis que veio a pandemia da covid e o Brasil parou. O mundo parou. Isolamento radical e a mais completa falta de possibilidade de seguir em frente no meio artístico e cultural. Arnaldo foi pego em cheio por este tsunami planetário. Estava preparado para estrear a turnê que divulgaria e espalharia por diversas cidades o disco novo. Ainda mais porque a empreitada traria uma novidade: em vez de estar acompanhado por uma banda no palco, haveria apenas um músico ao seu lado. E não qualquer músico. O escolhido havia sido o pernambucano Vitor Araújo, enfant terrible dos pianos, que alguns anos atrás despontara como uma grande revelação da música brasileira ao se propor a experimentar novos caminhos e sonoridades em seu instrumento, indo além da convencional exploração das teclas pretas e brancas com os pedais.

O novo show virou apenas lives (Sesc Pompeia, Inhotim) e gravação para documentários (Arnaldo 60). O entrosamento estava tão grande, porém, que Arnaldo voltou para o mesmo estúdio situado em uma fazenda do interior de São Paulo, levando Vitor para criar mais um disco. De lá saíram nove faixas (algumas inéditas, outras já lançadas antes por Roberto Carlos, Erasmo Carlos, Itamar Assumpção, Titãs e o próprio Arnaldo em carreira solo) registradas  no período de uma semana. A temática compreende  as instabilidades emocionais tão pertinentes àqueles dias (distanciamento, saudade, comunicação ruidosa, fim de relacionamento) e a participação do jovem pernambucano não se limita à condição de mero coadjuvante musical. Vitor revela-se tão intérprete quanto Arnaldo, desdobrando o seu piano em muitas camadas e climas, dando a impressão de estar se ouvindo mais gente colocada ali no aquário do estúdio durante a gravação.

Aos poucos, depois do lançamento do álbum Lágrimas no Mar em setembro de 2021 (portanto, ainda naquele clima de incertezas vivido pelo lento arrefecimento do lockdown), Arnaldo e Vitor vão levando à estrada o show que a pandemia insistiu em adiar, agora com um repertório de canções ainda maior por conta do trabalho em conjunto. Nesta sexta, 17 de maio, é a vez de Florianópolis (clique aqui para mais informações sobre local, horário e ingressos). No sábado, a dupla se apresenta em Curitiba (clique aqui para mais informações sobre local, horário e ingressos). E o Mondo Bacana preparou abaixo oito motivos para você não perder a chance de assistir ao perfeito entrosamento entre Arnaldo Antunes e Vitor Araújo ao vivo.

Som do silêncio

Uma das ideias de Arnaldo ao apostar no formato de piano e voz ao vivo – ainda mais com as intervenções autorais de Vitor Araujo – foi justamente chamar a atenção para o momento das pausas. O intervalo, o interim, o pequeno espaço entre um som e outro, seja a sua voz ou de algum instrumento. Então, fazer a audiência poder desfrutar dos curtos instantes de silêncio também passa a ser um requinte que poder realçar o valor de uma canção – algo que seria quase impossível se estivesse ali com o vocalista uma banda inteira.

Piano autoral

A presença de um nome como Vitor Araújo significa perceber as canções – do próprio Arnaldo ou as releituras – de uma outra forma. O pernambucano assina o arranjo de todas as músicas para seu instrumento e se multiplica de uma forma pouco vista no terreno da música pop. Também apresenta ao gênero o piano preparado, que consiste na montagem de peças introduzidas entre as cordas, de modo que quando a pressão das teclas as fazem ressoar sejam produzidos efeitos sonoros inusitados e diferentes. Henry Cowell e John Cage são os principais nomes desta técnica.

Spoken word

Além da música, Arnaldo sempre foi bastante ligado ao mundo da poesia, chegando a fazer instalações e brincadeiras visuais com palavras e letras de canções para algumas exposições. Quase despido da instrumentação convencional da música pop, encontra um terreno ideal para injetar a leitura de alguns poemas entre uma música e outra do set list. Mas não espere que haja só a declamação por meio de sua voz. Vitor o acompanha criando efeitos e sonoridades que transforma tudo em um breve happening, tão visceral quanto o momento das harmonias e melodias.

Duas vezes Titãs

Claro que aqui não poderia deixar de ter a presença de faixas assinadas por Arnaldo para o repertório de sua ex-banda. A tensão da harmonia de “O Pulso” combinada à lista quase declamada de doenças e distorções do corpo e da mente é um dos momentos mais vibrantes do show. O arranjo elaborado por Vitor dá um novo gás à canção que sempre foi uma das favoritas dos fãs dos Titãs e foi muito bem recebida no resgate da recente turnê de reunião de seus integrantes da formação clássica. Já “Saia de Mim” tem as dissonâncias harmônicas das teclas de Araújo muito bem casadas com o vocal raivoso e gritado de Arnaldo, que parece expelir, na hora de cantar, as excreções corporais relacionadas em sua letra (suor, peido, vômito, escarro, espirro, pus, porra, sangue, lágrima, catarro). Tudo para chegar ao fim com a exclamação “saia de mim a verdade”.

“Fim de Festa”

Na releitura deste blues de pura fossa de Itamar Assumpção, Arnaldo e Vitor injetam um certo ar soturno, com a exploração de timbres graves (a linha contínua do baixo mais o vocal-tenor quase falado do paulista) e uma repetição mântrica propícia para o pernambucano criar alguns barulhos estranhos no arranjo, manipulando diretamente as cordas do piano no interior da cauda. Vale lembrar que o resgate da canção é mais uma referência ao período da pandemia, quando vários casamentos e namoros chegaram ao fim por conta justamente da incompatibilidade de gênios, modos e pensamentos reforçada pela intimidade extrema do isolamento social. Outra curiosidade: a gravação original veio outro disco criado em parceria entre São Paulo (Itamar) e Pernambuco (Naná Vasconcelos), lançado em 2004, um ano após a morte do cantor e compositor. O videoclipe oficial da faixa registrada em Lágrimas no Mar tem Rubi, neta de Itamar, fazendo a performance de dança.

“Manhãs de Love”

Composta por Arnaldo Antunes e Erasmo Carlos gravada pelo Gigante Gentil no álbum que leva justamente seu segundo apelido como título, em 2014. Faz parte do renascimento artístico do Tremendão, com uma sucessão de álbuns nos quais ele abriu seu leque de parceiros, indo bem além do costumeiro amigo de fé e irmão camarada Roberto Carlos. Este movimento fez com que o artista se aproximasse de uma nova geração de fãs, algo que continuou até a sua morte há dois anos. Faz dupla com “Fim de Festa” na cota de momento bluesy de dor-de-cotovelo neste trabalho parceira com Vitor Araújo. O piano, executado de modo mais tradicional, acentua a melancolia da letra.

Como 2 e 2

Composta por Caetano Veloso, gravada originalmente por Roberto Carlos e também bastante conhecida na voz de Gal Costa, a canção foi recriada por Vitor e Arnaldo para o álbum Lágrimas no Mar. Feita durante o período de maior repressão da ditadura militar no Brasil, sua letra expressa, recorrendo à matemática e alterando metaforicamente as suas certezas (e, claro, fazendo referência direta ao estado totalitário imaginado por George Orwell para o clássico livro 1984), a imprevisibilidade das coisas, seja na expressão dos sentimentos de qualquer pessoa ou mesmo na vida perante a uma sociedade que muitas vezes se transfigura no horror ao qual não desejamos para a gente. A manipulação da verdade – aqui, no caso de somar dois e dois e dar cinco como resultado – anda bastante em voga hoje em dia, em um mundo cheio de distorções provocadas por uma enxurrada diária de fake news, grande imprensa bastante tendenciosa e um bando de políticos que agem e dizem tudo de acordo com seus interesses e conveniências.

O Real Resiste

“Autoritarismo não existe/ Sectarismo não existe/ Xenofobia não existe/ Fanatismo não existe/ Bruxa, fantasma, bicho papão/ O real resiste/ É só pesadelo depois passa/ Na fumaça de um rojão/ É só ilusão, não, não/ Deve ser ilusão, não, não/ É só ilusão, não, não/ Só pode ser ilusão/ Miliciano não existe/ Torturador não existe/ Fundamentalista não existe/ Terraplanista não existe/ Monstro, vampiro, assombração/ O real resiste/ É só pesadelo depois passa/ Múmia, zumbi, medo/ Depressão, não, não/ Não, não/ Não, não, não, não/ Não, não, não, não/ Trabalho escravo não existe/ Desmatamento não existe/ Homofobia não existe/Extermínio não existe/ Mula sem cabeça, demônio, dragão/ O real resiste/ É só pesadelo depois passa/ Com um estrondo de um trovão/ É só ilusão, não, não/ Deve ser ilusão, não, não/ É só ilusão, não, não/ Só pode ser ilusão/ Esquadrão da morte não existe/ Ku Klux Klan não existe/ Neonazismo não existe/ O inferno não existe/ Tirania eleita pela multidão/ O real resiste/ É só pesadelo depois passa/ Lobisomem, horror/ Opressão, não, não/ Não, não/ Não, não, não, não/ Não, não, não, não”. Esta é a letra toda da canção criada durante o primeiro ano de desgoverno do inominável. É preciso dizer mais alguma coisa depois disso tudo?

Music

Madonna

Oito motivos para não conter a ansiedade e ficar contando as horas até o início do megaespetáculo A Celebration Tour na praia de Copacabana

Texto por Abonico Smith

Fotos: Reprodução/Live Nation

O próximo sábado vai marcar uma data especial da música pop de todos os tempos: Madonna, enfim, subirá à megaestrutura de palco montada nas areias e Copacabana para fazer o maior show não só de toda a sua carreira como da história da música pop. A estimativa de público para a noite de 4 de maio pode chegar até dois milhões de pessoas naquela que é uma das praias mais conhecidas de todo o mundo.

Esta será a única escala do atual turnê de Madonna não apenas no Brasil mas como em toda a América do Sul. A Celebration Tour começou seu giro em Londres. Depois passou por outros países do centro-oeste europeu, Estados Unidos, Canadá e México. Entre 14 de outubro do ano passado e o último 26 de abril foram 80 apresentações realizadas. Cinco datas acabaram canceladas por motivos de logística e agenda. A princípio nosso país não estaria incluso na agenda, mas uma negociação com grandes atrativos de infra-estrutura e grana bancada por um banco gigante acabou colocando, meio que de última hora, o Rio de Janeiro no encerramento e todo o cronograma. Algo perfeito para um espetáculo que celebra a majestade adquirida pela cantora e compositora em quatro décadas de carreira. Desde seus primeiros videoclipes veiculados pela MTV até hoje, a soberania de seu reinado musical (e extramusical também) é incontestável.

O Mondo Bacana antecipa o concerto dando oito motivos para você não conter a ansiedade e ficar contando as horas até o início da apresentação neste próximo sábado. O objetivo aqui não é falar apenas da suprema importância da Madonna Louise Ciccone como artista e ícone pop, mas sim no que isso se cruza com os detalhes e particularidades as quase duas horas e meia deste concerto, que se estabeleceu como o maior e todos os megashows de um só artista em toda a História.

>> Leia aqui a matéria do Mondo Bacana com 60 curiosidades sobre Madonna, publicada no dia em que a cantora completou 60 anos de idade, em 2018

>> Leia aqui a matéria do Mondo Bacana com as 25 melhores e mais importantes músicas da carreira de Madonna

O maior espetáculo de todos os tempos

Não é exagero, nem empolgação. Basta uma rápida olhada nos números para se convencer disso. Cachê de 9 milhões de dólares e produção orçada em 60 milhões de reais. Três aviões de carga trouxeram ao Rio de Janeiro a popstar, sua trupe e o equipamento de 270 toneladas 45 baús de figurinos e adereços. Fazem parte da equipe oficial de Madonna 200 pessoas e 90 quartos foram ocupados no Copacabana Palace, cabendo à estrela a suíte do último andar, com piscina privativa e mordomo à disposição 24 horas por dia. Três academias e cinco salões foram disponibilizados pelo hotel para treinos e ensaios. O palco montado na praia terá 812 m2, o dobro do tamanho daquele que foi normalmente utilizado durante a turnê mundial. Foram espalhados pela faixa de areia de Copacabana 16 torres de som e 15 telões de led. Para garantir a visão das pessoas, a altura do palco será de 2,4 metros do chão. A economia do Rio prevê 300 milhões de injeção por parte de 150 mil turistas, que ocupam quase 100% da rede hoteleira da cidade. Quatro mil pessoas estão envolvidas na produção nacional do espetáculo. A Polícia Militar contará com 3,2 mil agentes para garantir a segurança, mais 12 câmeras de reconhecimento facial, 64 viaturas, quatro drones e 65 torres de observação.

Transmissão simultânea ao vivo

Você tem pavor de multidão ou não pode, por algum motivo, estar no Rio neste sábado? Não tem problema. A Rede Globo vai transmitir ao vivo e na íntegra a passagem d’A Celebration Tour por Copacabana, a partir das 21h45. O antes e o depois do show em si também poderão ser acompanhados em tempo real pela Globoplay (com sinal aberto para não assinantes) e o canal Multishow. Três das quatro cotas de patrocínio,orçadas em 17 milhões de reais já haviam sido vendidas pela emissora até o começo desta semana. Claro que o banco que financiou tudo isso é uma delas.

Revisionismo da carreira

Claro que todos estes números superlativos não foram obtidos ao acaso. Madonna soube construir uma carreira fonográfica gloriosas a partir de 1983 e a turnê, iniciada em outubro de 2023, celebra justamente todas estas quatro décadas recheadas de hits nas paradas não só dos Estados Unidos como também dos quatro cantos do planeta. Entre as marcas alcançadas por ela estão a de nome feminino que mais vendeu álbuns e singles em todos os tempos (ficando atrás na colocação apenas de Elvis Presley, Beatles e Michael Jackson); a popstar com o segundo, o terceiro e o quarto videoclipes mais caros de todos tempos (“Die Another Day”, “Express Yourself” e “Bedtime Story”), o que significa uma trinca de apostas milionárias em um tempo em que grandes gravadoras jorravam muita grana para produzir estas peças musicais publicitárias); a artista internacional que mais vendeu no mercado fonográfico brasileiro (3,6 milhões de cópias, com certificado emitido em 2021 pela Pró-Musica Brasil (antiga Associação Brasileira de Produtores de Discos); e a cantora que mais emplacou músicas no Top 40 da Billboard norte-americana em todos os tempos (foram 44 no total). Por tudo isso, é mais do que merecido que a celebração destes 40 anos de sucesso tenha um repertório longo, que celebre boa parte das canções históricas escritas e gravadas por Madonna. Claro que não dá tempo de entrar todas elas, mas para isso armou-se uma solução criativa: várias da músicas que não são entoadas pela cantora no palco aparecem brevemente citadas nos arranjos de outras e alguns interlúdios entre os sete atos que dividem a programação d’A Celebration Tour. Por isso, espere ouvir de quase um tudo que você mais conhece de Madonna, nem que seja só um pequeno e quase irreconhecível trechinho remixado e emendado em outras coisas.

Presente x passado

Desde 1983 você se acostumou a ver várias Madonnas em ação. Diferentes no figurino, nos cabelos, nas letras da músicas, nos videoclipes. Nada mais normal do que a celebração revisionista deste extenso e diversificado passado a colocasse ali, no palco, frente a frente com um certo toque de ficção científica. Algumas vezes a Madonna de hoje se conecta e encontra com aquela de ontem. Não apenas em imagens e vídeos projetados telões e nas roupas utilizadas no decorrer da apresentação, mas também “pessoalmente”. Chama muito a atenção o momento em que a popstar é beijada e sexualmente tocada por uma bailarina fantasiada de Madonna da virada dos anos 1990, aquela de aplique de grande rabo de cavalo loiríssimo e sutiã de cone assinado pelo estilista Jean Paul Gaultier. Mas também tem a transgressiva jovem das roupas justas e rendadas do início de carreira, a fase country do início dos anos 1990, a pegação geral dos tempos de Erotica e do livro Sex

“Live To Tell”

Na hora desta balada, um dos grandes hits radiofônicos de True Blue (1986), o terceiro álbum da cantora, Madonna se prende a uma barra de ferro e, dentro de uma cabine sem vidros, faz um grande voo panorâmica por sobre as cabeças de seus fãs. Ela sai do palco justamente para que o grande momento ocorra nele, com os telões gigantescos mostrando retratos em preto e branco de personalidades e amigos pessoais que faleceram em decorrência da aids. No primeiro grupo estão os cantores Freddie Mercury e Sylvester. No segundo, o fotografo Herb Ritts, o professor de dança Christopher Flynn, o designer Martin Burgoyne e o grafiteiro Keith Haring. Para a apresentação em Copacabana, a produção brasileira sugeriu ao estafe da cantora a inclusão de ícones nacionais como Betinho, Renato Russo e Cazuza. Madonna sempre foi uma incansável batalhadora pela propagação de informações a respeito da prevenção da doença e tudo mais que a cercava. No encarte do álbum Like a Prayer (1989), fez questão de publicar uma enorme cartilha a respeito do vírus HIV. Na subsequente turnê mundial Blond Ambition (1990), três dos seus sete bailarinos haviam sido diagnosticados com aids. Os grandiosos painéis somados à letra de “Live To Tell” emocionam até os corações mais empedrados. Afinal, a canção trata justamente da terrível experiência de passar por uma situação bastante difícil e sobreviver para poder conta-la depois. As pessoas mostradas neste momento de A Celebration Tour não tiveram esta chance.

“Vogue”

Na virada dos anos 1990, Madonna lançava em single uma de suas faixas mais famosas. Inspirada por uma dança famosa no underground gay de Nova York, em que os movimentos sugeriam poses fotográficas (daí o nome, retirado da famosa revista sobre moda e estilo e vida), a música tornou-se sucesso mundial por causa da alta rotação nas MTVs espalhadas pelos quatro cantos do planeta e seu estiloso videoclipe em preto e branco. A direção da obra era celebrado fotógrafo fashion David Fincher, que anos depois migraria para o cinema e acabaria se tornando um dos nomes mais cultuados de Hollywood neste século 21. No palco da atual turnê, Madonna recria o clima de improviso e diversão das pistas de dança de onde nasceu a vogue dance. É a deixa para criar um suposto concurso entre seus bailarinos e chamar celebridades para participar da encenação como jurados. No México, a atriz Salma Hayek participou caracterizada como Frida Kahlo. Em Nova York, Ricky Martin estava lá no palco distribuindo nota dez. No Rio, será vez de Pabllo Vittar.

Presença de Anitta

O mais recente álbum de estúdio de Madonna, Madame X (2019), concebido já com a popstar morando em Lisboa, trazia a participação especial da brasileira em uma faixa de nome em português (“Faz Gostoso”). Agora as duas estarão reunidas em um mesmo palco. Não se sabe ainda se haverá algum dueto, se Anitta cantará, dançará ou fará outra coisa. Isso ainda está sendo mantido em segredo, embora especule-se que também ocorra durante o “concurso” da música “Vogue”. Só vazou até agora uma condição imposta pela anfitriã: a aprovação prévia do figurino da convidada, algo bem normal por causa da conhecida rigidez da norte-americana em relação a todos os figurinos de seus concertos, clipes e fotografias desde sempre.

Prince e Michael Jackson

Tudo culpa da MTV. Se não fosse a emissora especializada em veicular videoclipes lá nos meados dos anos 1980, Madonna, Michael Jackson e Prince não teriam se tornado a santa trindade da música pop de todos os tempos. Os três foram os primeiros artistas a personificação a equidade da importância entre som e imagem para construir uma carreira sólida perante jovens e adolescentes. Quatro décadas se passaram, o consumo do videoclipe mudou bastante por causa da internet 2.0, a Music Television persiste até hoje mas trocando a música pelos reality shows e os dois “amigos” de Madonna morreram de forma precoce e inesperada. Nada mais justo do que a cantora, no show que celebra os 40 anos de sua carreira fonográfica, renda as devidas homenagens a ambos. A deidade púrpura é citada durante um solo de guitarra enquanto o eterno menino dançarino aparece em um belo duelo de sombras ao som de “Billie Jean” e “Like a Virgin”.

Movies

Não Tem Volta

Em ritmo frenético de redes sociais, comédia com Manu Gavassi mira na descoberta das dores de amores pela geração Z

Texto por Frederico Di Lullo

Foto: Star Distribution/Divulgação

Quem nunca sofreu por amor? Talvez o assunto mais abordado na história da música, do cinema e da literatura é o que permeia a comédia, ora meio romântica, ora meio dramática Não Tem Volta (Brasil, 2023 – Star Distribution/Disney), que já estreou nos cinemas brasileiros.

Dirigida por César Rodrigues (conhecido pelo trabalho em Modo Avião e Vai Que Cola: O Filme), o filme conta a história de Henrique (Rafael Infante), um rapaz que, depois de perder Gabriela (Manu Gavassi), toma a decisão de tirar a própria vida. Para isso, contrata uma agência especializada no assunto.

Tudo ocorria bem. No entanto, sua grande paixão retorna à vida para continuar o que tinha acabado. Só que existe um porém nessa história: os matadores de aluguel disseram que, caso fossem contratados, não haveria forma alguma de voltar atrás.  E é assim, nessa trama até meio descompromissada, que inicia a história do filme. Com cortes e cenas que tranquilamente poderiam ser reels de Instagram ou TikTok, o longa vai de se desenvolvendo.

Filmado e editado no exato padrão de uma hora e trinta minutos de duração, Não Tem Volta progride na narrativa flertando com diversos gêneros, mas nunca esquece a comédia como eixo centralizador. Reações, comoções e situações inusitadas levam o enredo num ritmo frenético que mais parece um feed: uma hora estamos no Rio Janeiro, em outra estamos em Salvador.

Em suma, uma produção padrão, que cria identidade, curiosidade e o principal: entretenimento. É isso que, hoje em dia, muitas pessoas procuram, dentre centenas de opções em telas, aparelhos celulares e computadores.

E, como a voz doce e delicada da Manu Gavassi, o filme também viabiliza o seu segundo propósito: atinge em cheio a descoberta pela geração Z de seus respectivos dilemas afetivos. Afinal, quem nunca sofreu por amor?

Movies

Indiana Jones e a Relíquia do Destino

Oito motivos para você correr ir ao cinema para assistir ao quinto e último filme da franquia clássica protagonizada por Harrison Ford

Texto por Abonico Smith

Fotos: Disney/Lucasfilm/Divulgação

Estreia hoje um dos títulos mais aguardados dos últimos anos pelos cinéfilos de plantão. Indiana Jones e a Relíquia do Destino (Indiana Jones and The Dial Of Destiny, EUA, 2023 – Disney/Lucasfilm) é a quinta aventura protagonizada pelo arqueólogo mais adorado da sétima arte. Fechando uma trajetória que já dura mais de quarenta anos (basta lembrar que o primeiro longa de Indy foi lançado no já longínquo ano de 1981), a história é encarada como uma despedida digna do personagem, já que a tentativa anterior, de quinze anos atrás, não foi lá muito bem sucedida e recebida por fãs e crítica. Por isso, aqui estão oito motivos para você ir correndo à sala de cinema mais próxima da sua ou, então, aquela melhor aparelhada tecnologicamente que você curte freqüentar.

Personagem icônico

Se ao longo dos anos 1980 o termo blockbuster ganhou popularidade, também se transformou em espécie de sinônimo de aventuras juvenis que encantavam com histórias empolgantes dignas de qualquer sessão da tarde (isto é, liberado para todas as idades de uma família). Com a direção de Steven Spielberg e a assinatura de George Lucas entre os roteiristas, Indy passou a figurar em um panteão hipercultado ao lado de nomes como E.T., Darth Vader e Marty McFly. Tudo isso, vale a pena ressaltar, muito antes do nicho dos super-heróis (leia-se DC e Marvel, praticamente) tomar conta da programação anual de lançamentos cinematográficos.

Harrison Ford

Só pelo fato de voltar a aceitar encarnar Indiana Jones prestes a completar 80 anos (idade à qual chegou em julho do ano passado), o ator já merece aplausos. Melhor ainda que sua filmografia de respeito está longe de se resumir somente ao arqueólogo e a uma só franquia. Em Star Wars, ficou marcado como o mercenário Han Solo (que carregava sempre a tiracolo um monstrengo chamado Chewbacca, também copiloto de sua nave). Em Blade Runner, foi o ex-policial e caçador de andróides Rick Deckard. Fora das sagas, teve papeis emblemáticos em filmes como A TestemunhaForça Aérea UmPerigo Real e ImediatoO Fugitivo, Jogos PatrióticosUma Secretária de Futuro e American Graffitti – Loucuras de Verão.

James Mangold

Não poderia ter havido uma escolha mais certeira para a direção do quinto longa de Indiana Jones. Nos últimos 25 anos, Mangold vem acertando a mão frequentemente em tramas de ação, aventura e drama. Em sua filmografia constam títulos como Walk The Line (a cinebio de do maior homem de preto do rock conhecido também como Johnny Cash); Garota, Interrompida e Ford vs Ferrari. Dez anos atrás, encheu Wolverine de adrenalina e emoção no cinema em um de seus filmes solo. Quatro anos depois assinou também a “despedida” de Logan como o selvagem X-man das garras de adamantium com um filme tocante e que fugia completamente da receita formulaica das adaptações às telas dos super-heróis dos quadrinhos. Aqui, com Indy, também carrega a parte dramática na dose certa, sendo capaz de até provocar choros discretos nas poltronas do cinema.

Cena inicial

Fazia tempos que um filme de ação e aventura não entregava uma cena inicial tão eletrizante. Assim, logo de início, em seguida da logomarca inicial da produtora, como um soco no estômago de quem está na sentado na poltrona, sem deixar voltar a respiração por muitos minutos. Assim começa A Relíquia do Destino, com um flashback do tempo da Segunda Guerra. Indiana Jones é capturado pelos nazistas e posto em um trem para ser levado à punição da prisão. No veículo ele reencontra seu fiel colega, também arqueólogo e professor universitário, Basil Shaw (interpretado por Toby Jones). Segue-se então muita correria, pancada e, claro, chicotada, para tentar ficar com a posse de um poderoso instrumento lá da Grécia Antiga. À frente do outro lado da disputa pela antícitera de Arquimedes, o germânico, está mais um docente, Dr. Voller (Mads Mikkelsen, tão contundente quanto em suas atuações em A Caça e Druk – Mais Uma Rodada). Vale destacar que a aparência rejuvenescida de Mikkelsen, Jones e sobretudo Ford mostrada nas telas é fruto de truques realizados por meio de um programa de inteligência artificial.

Arquimedes

Um dos principais nomes da ciência da Antiguidade Clássica, este italiano da região de Siracusa, na ilha da Sicília, é uma das peças-chave da trama. Físico, matemático, engenheiro, astrônomo e filósofo, ele inventou e descobriu muita coisa importante para civis e militares. No caso do filme, o foco está em uma aparelhagem chamada anticítera. Ok, o que se passa ali na tela do cinema é ficção e, segundo consta, isso é capaz de fazer o ser humano furar a bolha do continuum espaço-tempo e viajar para o passado e o futuro. No caso dos alemães, pode ser um grande trunfo para a perpetuação do nazismo como regime vigente pronto para ser expandido rumo a outras terras europeias. Só que, na realidade, a tal anticítera criada por Arquimedes no século 1 a.C. tinha a função de calendário e astrologia, além de poder prever eclipses e posições astronômicas. Por isso, tem a fama de “computador analógico” mais antigo do mundo. Todos os fragmentos conhecidos da traquitana estão no Museu Arqueológico de Atenas – e não em duas partes complementares, como no roteiro de A Relíquia do Destino. Outra coisa: não é só Indy que ganha uma homenagem neste filme. O faz-tudo também acaba tendo o seu reconhecimento em um roteiro fantástico (no sentido da fantasia) que, há de se convir, chega a forçar a barra na elasticidade da verossimilhança.

John Rhys-Davies

Não é só Harrison Ford que retoma um personagem classico da franquia neste novo filme. Quem também reaparece é o ator galês, fazendo novamente o grande amigo do protagonista Sallah, presente em Os Caçadores da Arca Perdida (1981) e A Última Cruzada (1989) e um tanto quanto desprezado em uma participação ínfima no anterior O Reino da Caveira de Cristal (2008). Aqui, o escavador egípicio volta para dar uma grande mão em momentos de mais tranquilidade vividos por Jones, que chega a conhecer seu casal de filhos. Não tem como não se deixar conquistar (de novo) pelo jeitão bonachão do agora pai de família Sallah Mohammed Faisel El-Kahir.

Phoebe Waller-Bridge

Esta, sim, a chave mágica do elenco principal de A Relíquia do Destino. Nome em ascensão em Hollywood depois de criar, escrever e atuar em séries britânicas (como Fleabag Crashing, ambas disponíveis em streaming no Brasil), Phoebe brilha em pé de igualdade com Ford neste filme depois de se destacar assinando o roteiro feito a oito mãos do ultimo James Bond, 007: Sem Tempo Para Morrer. A contribuição de Waller-bridge aqui é apenas atuando. Mas ela dá um show como o jovial alívio cômico introduzido para quebrar toda a sisudez do velho Indy. Sua ligação com Jones é um pai-e-filha disfarçado: sua Helena Shaw é doutoranda em arquelogia e filha de Basil. Só que não espera muita fidelidade ao padrinho: o negócio dela embarcar na procura pela outra metade da anticítera tem motivos mais escusos, porem não menos letais do que os dos nazistas.

John Williams

O quinto filme de Indiana Jones não poderia deixar de fora o nome do maestro e compositor John Williams, presente em todas as produções anteriores com o nome do arqueólogo no título. Premiado por várias obras para o cinema, indicado 53 vezes ao Oscar e cultuado por uma legião de fãs que adora prestar atenção nas trilhas sonoras, Williams também apostou na nostalgia em formato de harmonias, melodias e arranjos desenvolvidos para A Relíquia do Destino. Resgatou a alquimia em criar sons para as imagens estreladas por Harrison e sua habilidade de fazer cenas que misturam drama e comédia, ação e aventura. Também fez uma bela contribuição compondo o tema de Helena Shaw para o brilho da execução da virtuosísima violinista alemã Anne-Sophie Mutter.  O resultado imprime à personagem de Phoebe Waller-Bridge um ar de diva dos áureos tempos dos estúdios de Hollywood (leia-se anos 1940 e 1950) que contrasta com seu espírito impulsivo e aventureiro mostrado nas telas. Claro a trilha sonora também foi lançada oficialmente pela Walt Disney Records em todas as principais plataformas de streaming

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RPM

Luiz Schiavon, que faleceu aos 64 anos, foi o principal responsável pela popularidade do sintetizador na música brasileira dos anos 1980

O RPM em 1985: Fernando Deluqui, Paulo Ricardo, Luiz Schiavon e PA

Texto por Carlos Eduardo Lima (Célula Pop)

Foto: Divulgação/CBS

Na manhã da última quinta-feira, 15 de junho, recebemos a notícia da morte de Luiz Schiavon, tecladista e fundador do RPM, aos 64 anos. Além de ser precoce, é uma perda enorme para a música brasileira, uma vez que Schiavon foi um dos grandes nomes – talvez o maior – da inserção do sintetizador nas paradas pop dos anos 1980 em diante. Ele não foi exatamente o pioneiro, mas estava neste momento peculiar do tempo, no qual o instrumento de teclas se uniu à produção em escala cada vez mais massificada. A bordo do RPM, grupo que ele fundou em 1983, Schiavon assumiu condição de protagonista criativo, elaborando o conceito da banda e seu direcionamento musical.

Com a chegada do vocalista Paulo Ricardo – que também assumiria o baixo – um ano depois e mais as presenças de Fernando Deluqui e Paulo Pagni (conhecido como PA) na guitarra e na bateria, o RPM iniciou sua produção de canções, que resultaria num bom contrato com a CBS da época (hoje Sony) e num álbum, que se chamou Revoluções Por Minuto, lançado em 1985. É possível dizer que o quarteto se tornou, ainda que por cerca de um ano e pouco, a banda mais importante do Brasil em termos de execução e vendas de discos. Isso se devia à figura de Paulo Ricardo, que impunha doses generosas de sensualidade em suas interpretações e, sim, à qualidade das canções apresentadas.

Deste primeiro trabalho, o grupo cravou seis singles nas paradas, “Louras Geladas”, “Rádio Pirata”, “A Cruz e a Espada”, “Olhar 43”, “Revoluções Por Minuto” e “Juvenília”, que tocaram em todas as rádios e programas de auditório do país entre março de 1985 e todo o ano de 1986. A estabilidade econômica do Brasil à época, materializada pelo Plano Cruzado, turbinou as vendas deste primeiro álbum e assegurou o lançamento acelerado do segundo, Rádio Pirata – Ao Vivo, que saiu no fim de 1986.

Com este disco gravado ao vivo, o RPM tapava a lacuna da demanda por mais canções do grupo, que, exausto após turnês subsequentes por dois anos, estava esgotado e à beira do fim por conta dos desentendimentos internos. Ainda que parecesse uma usina de sucessos imparável, o RPM era palco de disputas criativas, sempre com Paulo Ricardo desejando inserir mais elementos roqueiros e Schiavon pendendo a balança para os timbres derivados do tecnopop e do new romantic, então vigentes na produção pop anglo-americana. Mesmo assim, a presença de covers de Caetano Veloso (“London, London”) e Secos & Molhados (“Flores Astrais”) no segundo álbum, além de um dueto com Milton Nascimento em “Feito Nós”, single de 1987, mostrava que a banda tinha mais do que o desejo simples pelo sucesso.

Foi preciso muito poder de convencimento para a CBS recolocar o RPM em estúdio para a gravação do terceiro álbum. Ofertas de discos solo dos participantes, mixagem em Los Angeles, orçamento polpudo liberado, tudo foi posto na mesa para que o grupo entregasse mais uma fornada de possíveis hits. Talvez os conflitos internos, talvez uma mudança de perspectiva, talvez o espírito daquele 1988, no qual a lambada já surgia como uma alternativa viável para o público jovem, sabe-se lá, mas o fato é que o novo disco, intitulado simplesmente RPM, veio muito mais profundo e “difícil” em relação aos dois discos anteriores. A preocupação estética da banda com arranjos, timbres e letras afastava o álbum do sucesso almejado, ainda que canções como “Partners”, “Um Caso de Amor Assim” e “Quatro Coiotes” tenham tocado medianamente nas rádios. Foi uma pena, pois este álbum tem detalhes interessantes e excêntricos, como a presença de Bezerra da Silva em “O Teu Futuro Espelha Essa Grandeza”. Poucos meses depois desse lançamento, o RPM encerrou as atividades. 

Nos anos seguintes até a semana passada, quando lançou o fraquíssimo single “Liberdade”, o RPM veio e foi, em diferentes encarnações. Na mais importante delas, em 2002, a banda gravou um disco ao vivo para a MTV, além de canções inéditas (como “Vida Real”, que se tornou o insuportável tema do não menos insuportável Big Brother Brasil). Alguns discos foram lançados, shows e apresentações aconteceram, além de mais e mais disputas judiciais entre os integrantes da banda. Nada do que foi feito depois de 1988 vale a pena ser considerado seriamente na antologia da banda.

Luiz Schiavon, por sua vez, também trabalhou em trilhas sonoras para a TV, como as das novelas O Rei do GadoTerra Nostra e Esperança, para as quais também escreveu canções originais, além de selecionar músicas que fizeram parte das tramas. De 2004 a 2010, foi diretor musical do Domingão do Faustão, interagindo frequentemente, ao vivo, com o apresentador do programa de auditório da Rede Globo.