Music

Placebo – ao vivo

Em noite de aplausos não fáceis e ausência de vários hits, dupla solidifica em SP a aura de integridade em três décadas de carreira

Brian Molko

Texto por Fabio Soares (com colaboração de Abonico Smith)

Fotos: Ricardo Matsuka/Mercury/Divulgação

Vinte e dois anos de idade possuía Brian Molko ao fundar o Placebo em 1994. Houve um preço a se pagar por capitanear este mastodonte alternativo por tanto tempo: abuso de álcool e drogas, exposição de sua bissexualidade, oposição às redes sociais e o recente processo movido por Giorgia Meloni, primeira-ministra italiana, a quem o vocalista chamou de “fascista” numa apresentação em Turim.

À parte das polêmicas, o Placebo 2024 segue sua trajetória com seu núcleo duro reduzido a Molko e seu fiel escudeiro (e conhecido de infância) Stefan Olsdal. De volta ao Brasil após dez anos, trouxe na bagagem a turnê de Never Let Me Go, álbum concebido durante a pandemia mas que foi finalizado somente em 2022.

“Todos os álbuns do Placebo são lapidados ao máximo e este não seria diferente”, afirmou Molko em recente entrevista. Sendo assim, quem se dirigiu ao Espaço Unimed (que já foi “das Américas”) no último domingo, 17 de março, redondamente enganou-se se esperava ouvir uma enxurrada de hits. Ela não veio. E o que se viu foi uma onda de aplausos não fáceis.

Como já esperado e praticado ao longo da atual turnê, uma mensagem em inglês nos telões laterais do palco pediu para que o público desligasse seus aparelhos celulares durante a apresentação. Aliado a este fato, um vídeo com a voz de Brian Molko repetiu o texto exibido. Por fim, logo antes do início, uma mensagem sonora em português reforçou a importância do público assistir a uma apresentação musical sem a tela de um aparelhinho manual à sua frente.

Funcionou? Sim! Nos primeiros acordes de “Forever Chemicals”, canção que também abre o mais recente álbum de estúdio, quase ninguém ousou sacar de seu telemóvel para filmar o início do show. A dupla Molko-Olsdal surgiu acompanhada por quatro músicos de apoio e a primeira faixa foi saudada com entusiasmo pela audiência, que não chegou a lotar a casa. “Beautiful James”, talvez o único hit radiofônico (não aqui no Brasil, claro!) do último disco, fez o público entoar a plenos pulmões o verso “Everybody lies/ One hundred times a day/ The silence in your hard eyes/ Is far too rare to give away”. 

Na sequência, Stefan fez às vezes de maestro, conduzindo o público a uma peculiar batida de palmas que antecedeu a indefectível introdução de “Scene Of The Crime”, estupenda faixa de Loud Like Love, grande álbum de 2013. A visceral interpretação de Brian à canção seria o mote de toda a apresentação. Antes da quarta faixa, “Hugz”, também de Never Let Me Go, o momento descontração da noite: o vocalista informou a todos sobre o aniversário do baterista e em bom português soltou a famosa frase “uma salva de palmas para ele”.

A ausência de celulares na plateia deu à belíssima “Happy Birthday In The Sky” o tom de dramaticidade e depressão que a letra sugere. Já em “Bionic”, resgatada lá do homônimo álbum de estreia de 1996, apareceu o primeiro momento catártico por parte da plateia ao entoar o refrão “Harder! Faster! Forever after!”, sobre anos 1990 que não voltam mais. E está tudo bem em não voltarem também. 

A execução da dobradinha “Twin Demons” e “Surrounded By Spies” promoveu o único momento “debandada” de alguns presentes, rumo aos banheiros ou aos bares do local. Dissonância esta que foi quebrada com os incidentais acordes de “Soulmates”, b-side de single e faixa integrante da compilação dupla A Place For Us To Dream, lançada em 2016. Apostaria um braço que não há um único fã da banda sobre a face deste planeta que não se arrepia ao menos uma vez ao ouvir o verso “Dry your eyes/ Soulmate dry your eyes/ Cause soulmates never die”.

Stefan Olsdal

A cama eletrônica de “Sad White Reggae”, aliada ao piano de Stefan Olsdal, confirma a tese de que Brian Molko é um compositor fora do comum. Fato este que se seguiu em “Try Better Next Time”, talvez a melhor faixa lapidada para o último trabalho. Olsdal permaneceu ao piano para o mais emocionante momento da noite. “Too Many Friends” (outra de Loud Like Love) arrancou lágrimas de pessoas à minha frente e ao meu lado. E não negarei: arrancou lágrimas minhas também!

Mas cadê as guitarras pesadas? Cadê o típico rock placebense por aqui? Ele viria com “For What It’s Worth” (de Battle for the Sun, de 2009) e a espetacular “Slave To The  Wage” (de Vlack Market Music, de 2000). Momento retrô para uma geração que tinha a finada MTV como norte. Curiosidade: a última ainda conta com um sample do Pavement!

Na reta final, “The Bitter End” (de Sleeping With Ghosts, de 2003) causou catarse nas primeiras filas em frente ao palco. Momento em que um mané sacou de seu celular e tentou filmá-la na íntegra. Como resposta, tomou um dedo médio em riste de Molko em sua direção. Bem feito! Então, a maravilhosa “Infra-Red” (de Meds, de 2006) fechou a primeira parte da apresentação. 

Para o bis, nada de obviedades escaladas para somente agradar aos fãs. O habitual retorno com a cover de “Shout”, do Tears For Fears, ficou de fora por aqui. “Taste In Men” (mais uma de Black Market Music), a lentíssima “Fix Yourself” (do mais recente disco) e a hipnótica versão de “Running Up The Hill (A Deal With God)” (gravada para o EP Covers, de 2003; a original, de Kate Bush, foi ressuscitada pela série Stranger Things em sua quarta temporada e teve jogada à estratosfera sua popularidade) deram números finais a uma noite que, por si só, já havia se tornado histórica. Sem celulares, sem mais de duas dezenas de hits (esqueça “Pure Morning”, “Every You, Every Me”, “You Don’t Care About Us”, “Meds”, “Come Home”, “”Bruise Pristine”, “Bright Lights”, “Loud Like Love”, “Nancy Boy”, “Special Needs”, “Special K”, “36 Degrees”, “This Picture”, “English Summer Rain”, “Battle For The Sun”, “Ashtray Heart”, “The Never-Ending Why”, “Because I Want You”, “Black-Eyed”, “Teenage Angst”, “Jesus Son”) e quase toda a última obra de estúdio recriada na íntegra. Isto reforçou a certeza de que Brian Molko é o peculiar anti-herói de uma geração que cresceu trazendo a música como melhor amiga mas que hoje pena com problemas psicológicos e a pressão das redes sociais.

Foi uma boa apresentação? Foi e pacas! Afinal, a competência de uma história ininterrupta de trinta anos deve (e sempre deverá ser) exaltada em um showzaço como este.

Set list: “Forever Chemicals”, “Beautiful James”, “Scene Of The Crime”, “Hugz”, “Happy Birthday In The Sky”, “Bionic”, “Twin Demons”, “Surrounded By Spies”, “Soulmates”, “Sad White Reggae”, “Try Better Next Time”, “Too Many Friends”, “Went Missing”, “Exit Wounds”, “For What It’s Worth”, “Slave To The Wage”, “Song To Say Goodbye”, “The Bitter End” e “Infra-Red”. Bis: “Taste In Men”, “Fix Yourself” e ” Running Up That Hill (A Deal With God)”.

festival, Music

Floripa Rock Festival – ao vivo

Pitty com Nando Reis, Paralamas do Sucesso e CPM 22 levam à capital de Santa Catarina um grande tributo ao rock nacional

PittyNando

Texto e fotos por Frederico Di Lullo

Cheguei em cima do laço para prestigiar o Floripa Rock Festival no último dia 4 de fevereiro, no Stage Music Park. E foram logo os primeiros acordes de “Tarde de Outubro” que fizeram as milhares de pessoas irem abaixo. Sim, a banda que teve a honra de abrir a primeira edição do evento realizado na capital catarinense foi o quinteto paulista de hardcore melódico CPM 22.

Tudo ocorreu como eu imaginei. Badauí e sua trupe fizeram uma apresentação longa, recheada de clássicos que fizeram a plateia sentir nostalgia dos anos 2000. No repertório não faltaram os clássicos como “Regina Let’s Go” (cantada a plenos pulmões) e “Irreversível”, além de um sample de “Mantenha o Respeito”, que fez subir uma leve maresia no ar. O som estava mais ou menos, algo que de fato me surpreendeu pela estrutura de palco. Deixava quem estava mais à frente com os ouvidos estourados. 

O grupo fez um show enérgico, que empolgou boa parte da galera, que ia de jovens a não tão jovens assim como eu. É inegável que o CPM 22 curte muito a Ilha da Magia e a Ilha da Magia curte muito a banda. A performance terminou lá em cima, mas ainda tinha tempo para mais. Foi aí que os músicos retornaram para ecoar “O Mundo Dá Voltas” e “Ontem”, além de uma miniversão de “We’re Not Gonna Take It, hino do Twister Sisters. Nesse momento, o velho roqueiro que habita em mim sorriu timidamente. Enquanto todos corriam para os banheiros e para pegar uma cerveja gelada, aproveitei para escalar algumas posições e me posicionar para o próximo show.

Paralamas do Sucesso

Já passava das 22h e chovia de maneira grotesca quando Herbert Vianna, Bi Ribeiro e João Barone subiram ao palco (acompanhados do fiel escudeiro João Fera nos teclados) e começaram seu magnifico concerto, que contou com quase duas horas de duração. A história que estes caras carregam nas costas é algo incrível, mas muitas pessoas ainda não percebem o quão importantes são para a cultura brasileira. 

Na estrada há 40 anos, sabem como agradar cada plateia em cada cidade do nosso país. Em Florianópolis foi um sucesso atrás do outro: “Ska”, “Vital e Sua Moto”, “Alagados”, “Trac Trac”. Nesta última, presenciei uma cena emocionante que envolveu pai e filha, cantando juntos, com ele visivelmente emocionado. São coisas que marcam pra sempre os envolvidos. Até minha pessoa. E no set dos Paralamas ainda cabiam mais sucessos, como “A Novidade”, “Meu Erro”, “Melô do Marinheiro” e “Você”. Uma verdadeira festa, afinal. 

Cansado cheguei ao show de Pitty e Nando Reis, dupla também conhecida como PittyNando. O clima se diferenciava dos outros dois anteriores: se por um lado tínhamos energia e vibrações pairando no ar, agora tudo era intimista e de despedida. Afinal de contas, foi a última apresentação do duo, pelo menos nesta versão de concerto. A escolha de Florianópolis como palco derradeiro não deve ter sido à toa. Eles se sentiam muito à vontade: não cansavam isso de falar nos intervalos das músicas. 

Desfilando por sucessos com arranjos distintos das gravações originais, destacava-se a alegria de “Marvin” na voz sentimental de Pitty. Outra música, que agora ganhou um viés ainda mais politizado foi “Máscara”, cantada de maneira polifônica pelos presentes.

Durante a apresentação, percebi que o espaço ia ficando menos lotado, talvez fosse seja pela chuva que não dava trégua. Mas, no palco, o clima era outro. A evidente sintonia entre Pitty e Nando ia deixando o ambiente em vibe nostálgica e totalmente emotiva. Eles entoaram outros clássicos seus como “Por Onde Andei”, “Me Adora”, “Pra Você Guardei o Amor” e “All Star“. No fim de tudo, o sentimento de realização e emoção tomou conta de todos. Plateia, artistas e equipe de apoio mandaram uma sonora e longa salva de palmas. Ficamos agora na expectativa e na vontade de uma nova parceria entre eles, talvez em formato diferenciado ou com novas composições além das conhecidas músicas autorais de cada um.

Este primeiro Floripa Rock Festival foi emocionante. Do fundo do coração, espera-se que outras edições do festival sejam anunciadas e que possamos curtir mais bandas destaque do cenário nacional que, muitas vezes, apresentam-se de maneira esparsa por aqui e a preços exorbitantes.

Music

Arctic Monkeys + Interpol – ao vivo

Quinze anos depois britânicos retornam ao palco da Pedreira Paulo Leminski como uma das maiores bandas de rock do mundo

Texto e foto por Abonico Smith

Antes de entrar na resenha propriamente dita, vai aqui uma proposta de uma ligeira brincadeira que envolve imaginação, projeção e percepção sobre a vida. Pense em como você era e onde estava quinze anos atrás. Agora pense em você daqui a quinze anos, lá no ano de 2037. Muita diferença em relação ao você de hoje?

Pois bem, ver o Arctic Monkeys tocando na Pedreira Paulo Leminski no último dia 8 de novembro provocou este exercício de memória. Quando o quarteto inglês subiu ao palco da mais bela arena a céu aberto do sul do país esta não era a estreia em tal espaço. Alex Turner e seus fieis escudeiros já haviam tocado ali em novembro de 2017, com uma das atrações da etapa curitibana do falecido Tim Festival. Assim como nos dias de hoje um sideshow de um grande festival nacional.

Três dias antes eles haviam sido headliners do primeiro dia da primeira edição do Primavera Sound São Paulo. Um cenário diferente daquele primeira vinda à capital paranaense. Agora os Monkeys são uma das mais importantes bandas de rock do mundo. Uma década e meia atrás, com dois badalados e já grandiosos álbuns na carreira, eram a grande aposta da música britânica naquela época. As letras de Turner, bastante incensadas pela imprensa musical. Quatro garotos de vinte e poucos anos com um indie rock avassalador, pungente e urgente como um quase hardcore. Com o acréscimo de uma habilidade lírica pouco vista para moleques daquela idade. Tanto que, apesar de ainda estarem em início de carreira, já ocupavam na grade do line up daquele dia em Curitiba um espaço mais importante que a veterana Björk, por exemplo (a mesma que, por sinal, tocou horas antes dos ingleses no mesmo Primavera Sound SP).

Portanto, os astros que hoje se aproximam da quarta década da idade estão, se comparados com aqueles mesmos de uma década e meia atrás um tanto mais seguros do que são no momento e do lugar que ocupam dentro do mundo musical. Alex Turner tem presença de palco monstruosa, já um tanto liberto da obrigação de sempre tocar sua guitarra, transforma-se naquele rockstar marrento, exalando propositalmente sensualidade, para fazer os hormônios das teenagers e pós-adolescentes da plateia passarem do ponto de ebulição, gerando na plateia da Pedreira gritos constantes, típicos de uma juventude feminina diante de um ídolo do rock desde os tempos de Elvis Presley e dos Beatles.

No palco, Turner não só corresponde como também provoca e excita. Bastante. No figurino retrô, nas poses um tanto quanto teatrais, no jeito de se comportar no palco e se portar por trás do microfone. Parece muito concentrado em representar essa figura, o que suscita também um certo desconforto em quem quer de um show algo maior do que um mero jogo sexual entre ídolo e fã.

Musicalmente, Arctic Monkeys é sinônimo de uma grande banda. Primeiro pelo fato do quarteto nunca se prender a uma zona de conforto. Depois de alcançado o estrelato de forma até precoce, não se pode acusá-lo de comodismo. A cada novo disco, uma tentativa de se reinventar e trilhar por novos caminhos. Até chegar ao novíssimo álbum, disponibilizado nas lojas e plataformas de streaming na semana anterior da vinda da banda ao Brasil. Sétimo álbum em vinte anos de carreira, The Car é uma bela proposta de se chegar à excelência de um pop refinado, com pitadas de falsetes, grooves e orquestrações, na melhor tradição sixtie britânica. Uma evolução do predecessor, Tranquility Base Hotel + Casino, e direcionamento bem diferente dos outros anteriores, que flertavam com o stoner, o psicodélico, o hard rock e até mesmo o heavy metal.

O que faz chegar ao ponto exato para se costurar um repertório fantástico passeando por todos os sete álbuns da carreira e criando um belo mosaico do que são esses vinte anos de trajetória. Na Pedreira foram 21 canções distribuídas de forma nada desigual. Forma cinco dos dois primeiros álbuns, da série de arranjos quase como um rolo compressor hardcore com os instrumentos atuando juntos e sem dar muito tempo para a respiração ao acompanhar os vocais urgentes de Turner. Outras cinco da etapa seguinte, quando a banda embarcou nas viagens quase solitárias do deserto californiano para gravar mais dois discos com uma psicodelia que nunca seria encontrada no velho continente europeu. Mais cinco só de AM, o disco divisor de águas da carreira, aquele capaz de fornecer sucessos avassaladores, daqueles de fazer qualquer arena cantar em uníssono e entrar em transe enquanto isso. Aliás, este é aquele disco que diz muito sobre o set list de uma banda. Afinal, normal é deixar, hoje em dia, hits lá do início da trajetória, mas é impossível subir ao palco sem tocar clássicos como “Arabella” (com direito a final emulando o riff contagiante de “War Pigs”, do Black Sabbath), “R U Mine?” ou “Do I Wanna Know?”. Do período mais recente, requintado e luxuoso, seis canções foram pinçadas para completar a noite: os dois singles doTranquility Base Hotel + Casino mais pérolas complexas que ainda estão para ser digeridas pelo público (ainda mais quando executadas ao vivo, com o apoio de mais três músicos recrutados para a turnê) como “Sculpture Of Anything Goes”, “Body Paint”, “There’d Be A Mirrorball” e a faixa-título.

Nessa noite quem foi ver os britânicos ainda foi brindado com a oportunidade de ter uma grande banda como atração de abertura. Quem tocou também foi o Interpol, formação de carreira já tão longeva quanto os Monkeys e com o mesmo número de álbuns na discografia. Coube ao trio americano (que vira quinteto ao vivo) dar o pontapé inicial da noite com um repertório calibrado de 13 peças. Três delas retiradas do mais novo álbum (The Other Side of Make-Believe, lançado no meio deste ano) e oito dos incensados dois primeiros discos (entre estas, “Untitled”, “Evil”, “C’Mere”, “PDA”  e “Slow Hands”). Tocando sabiamente numa dimensão espacial mais reduzida de palco (os músicos todos lá na frente, bem próximos uns dos outros, como se fosse em um clube indie do Brooklyn nova-iorquino, de onde a banda saiu para conquistar o planeta) e com uma atmosfera soturna proporcionada pela combinação de muita fumaça e predominantes luzes azuis e vermelhas, nem parecia que os guitarristas Paul Banks e Daniel Kessler mais o baterista Sam Fogarino encaravam uma Pedreira Paulo Leminski numa noite muito fria de primavera.

O Interpol mandou ver um puta show de abertura, digno de qualquer outra noite em local fechado e de capacidade bem menor. O que enaltece ainda mais a grandiosidade do Arctic Monkeys nos dias de hoje. Muito provavelmente algo que Alex Turner, Jamie Cook (guitarra), Matt Helders (bateria e backings) e Nick O’Malley (baixo e backings) não poderiam sequer imaginar há quinze anos.

Set List Arctic Monkeys: “Sculptures Of Anything Goes”, “Brainstorm”, “Snap Out Of It”, “Crying Lightning”, “Don’t Sit Down ‘Cause I’ve Moved Your Chair”, “Why’d You Only Call Me When You’re High?”, “Body Paint”, “Four Out Of Five”, “Arabella”, “Potion Approaching”, “The Car”, “Cornerstone”, “Do I Wanna Know?”, “Tranquility Base Hotel + Casino”, “Pretty Visitors”, “Do Me a Favour”, “From The Ritz To The Rubble” e “505”. Bis:  There’d Better Be a Mirrorball”, “I Bet You Look Good On The Dancefloor” e “R U Mine?”.

Set list Interpol: Untitled, “Toni”, “Evil”, “Fables”, “C’mere”, “Narc”, “Passenger”, “The Rover”, “Rest My Chemistry”, “Obstacle 1”, “The New”, “PDA” e “Slow Hands”.

Music

Billy Idol – ao vivo

Lenda-viva do rock volta ao país depois de 31 anos e faz em São Paulo um voo de cruzeiro seguro e sem turbulências

Billy Idol, durante a apresentação no Rock In Rio, um dia depois de cantar em SP

Texto por Fabio Soares

Foto: Amanda Respicio (Célula Pop)

Quando em meados de março deste ano a organização do evento Popload Gig anunciou a vinda de Billy Idol a São Paulo, muito especulou-se sobre a qualidade da apresentação. O astro que esteve na sala de parto de nascimento do movimento punk também estava longe do Sul das Américas há (inacreditáveis) 31 anos e meio. A única vez que aportou por aqui foi na segunda edição do Rock In Rio, em 1991, quando substituira Robert Plant no palco montado no gramado do Maracanã.

Se o festival, lá atrás, trouxe para cá um artista com 35 anos de idade e uma vida regada a excessos que culminaram num recente grave acidente de moto que quase custou-lhe a amputação de uma perna, a atual The Roadside Tour 2022 apresenta um senhor à beira dos 67 anos, avô das pequenas Poppy Rebel e Mary Jane e em ótima forma física. E ainda ladeado por seu fiel escudeiro Steve Stevens, a guitarra-viva de sua carreira por quase quatro décadas.

O local escolhido para sua apresentação na capita paulista no último dia 8 de setembro foi o Pavilhão Pacaembu. Este nada mais é que um espaço construído em cima do gramado do estádio Paulo Machado de Carvalho, concedido (de forma “criminosa”) à iniciativa privada no início de 2020. Passando pelo portão monumental do estádio (ao menos isso foi preservado da octogenária construção!), o cenário é de choque: os setores laranja, cadeiras cobertas e cabines de rádio, localizados na parte central do antigo estádio, foram completamente destruídos. Já os setores amarelo e verde (a famosa curva atrás do gol voltado à Praça Charles Miller) foram substituídos por HORRENDOS assentos metálicos que em nada lembram as arquibancadas originais. A concessão foi ilegal do ponto de vista jurídico? Não! Mas certamente foi imoral diante da história deste templo do futebol brasileiro.

Voltemos ao concerto de 2022. O público, como esperado, era formado por quarentões e cinquentões que não esperavam nada mais que muita diversão diante um desfile de sucessos. Pontualmente às 20h30 vieram os primeiros acordes de “Dancing With Myself” com a guitarra de Steven Stevens mantendo-se fiel à gravação original. Cartucho queimado cedo demais? Talvez! Mas vamos combinar que ganhar o público logo de cara facilita as coisas. Praticamente passaram desapercebidos o baixo volume do microfone do cantor e da má equalização das guitarras que se seguiu em “Cradle Of Love”, mitológico hit escalado como segunda canção da noite. A audiência, que cantou em unissono sua letra, transformou a pista num verdadeiro Baile da Saudade. Era a trilha sonora da infância e adolescência de muitos ali e toda esta emoção acumulada suplantou os problemas técnicos.

A parte visual do espetáculo também chamou atenção. Inicialmente, imagens de um vilarejo britânico foram projetadas nos dois telões de led instalados de forma paralela do palco. Depois, a projeção de uma hipotética Times Square remeteu uma Nova York viva e pulsante que Billy encontrou logo após sair das fileiras do Generation X, o mitológico grupo inglês que o revelou.

“É maravilhoso estar aqui após trinta anos”, disse o cantante antes dos acordes incidentais de “Eyes Without A Face”. Alías, que atire a primeira pedra quem não possui alguma história com esta canção como pano de fundo. Unanimidade entre punks, metaleiros, dentistas e ascensoristas, seus versos certamente abalaram as estruturas daquele Pacaembu semidestruído. Perfeita comunhão artista-plateia que muito bem recebeu os recém lançados singles “Cage” e “Bitter Taste”, assim como o solo de quase três minutos de Steve Stevens. Um dos maiores guitarristas da história também executou parte do tema central de Top Gun (de sua autoria) para delírio dos presentes, antes da execução da excelente “Blue Highway”, faixa integrante da pedra fundamental Rebel Yell, disco de 1983. Também foram extraídas deste álbum “Flesh For Fantasy” e, claro, a faixa homônima, num aclamado bis que ainda contou com dois covers: um do Generation X (“One Hundred Punks”) e outro dos Heartbreakers (a arrasa-quarteirão “Born To Lose”).

Jogo ganho e plateia entregue, coube ao megaclássico “White Wedding” encerrar os trabalhos em um final apoteótico e digno da história deste artista que, não à tôa, integra o panteão das lendas do rock mas é humilde o suficiente para fazer apresentações curtas mas cheias de energia. Foram noventa minutos que entrarão para a história dos presentes e do (modificado) velho Pacaembu em um voo de brigadeiro, sem turbulências e com tranquila aterrissagem. Ou, como diriam os argentinos, “un balazo musical”.

Set list: “Dancing With Myself”, “Cradle Of Love”, “Flesh For Fantasy”, “Cage”, “Speed”, “Bitter Taste”, “Eyes Without a Face”, solo de guitarra de Steven Stevens, “Mony Mony”, “Running From The Ghost”, “One Hundred Punks”, “Blue Highway” e “Top Gun Anthem”. Bis: “Rebel Yell”, “Born To Lose” e “White Wedding”.