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L7

Oito motivos para não perder a nova passagem do quarteto californiano por Curitiba e outras cidades brasileiras

Texto por Abonico Smith

Foto: Divulgação

Trinta anos atrás elas passaram feito um furacão por nosso país. Foi em janeiro de 1993, no Festival Hollywood Rock, quando tivemos a primazia, hoje cada vez rara, de receber bandas novas que estavam em alta lá fora. Era ainda o tempo da explosão do rock alternativo na mídia tradicional e o L7 era um dos nomes mais badalados daquela turma, com videoclipe em alta rotação na MTV Brasil e críticas elogiosas em revistas especializadas de música. Para completar, ainda abriram o esperadíssimo (e polêmico) show do Nirvana nas cidades de São Paulo e Rio de Janeiro.

Donita Sparks (guitarra e voz), Suzi Gardner (guitarra e voz), Jennifer Finch (baixo e voz) e Dee Plakas (bateria), ícones daquela época áurea em que vocais berrados, guitarras sujas e distorcidas e uma estética que cruzava informações vindas do punk rock e do heavy metal saíram do subterrâneo para tomar de assalto o mainstream, a imprensa corporativa, as grandes gravadoras, a matriz e as filiais da MTV e o gosto das pessoas espalhadas ao redor do planeta.

Depois do fim em 2001 e de um longo tempo na inatividade, a banda, com sua formação clássica, voltou a se encontrar com os fãs em 2015. As quatro gurias (hoje na faixa dos 60 anos de idade) voltaram às turnês, tocando aqui, ali e em todo lugar. Passaram novamente pelo Brasil, com parada em cinco capitais (Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba Porto Alegre e Belo Horizonte) em dezembro de 2018. De la para cá também soltaram novidades: um álbum (Scatter Than Rats, 2019) e mais três singles (“Dispatch From Mar-a-Lago”, “I Came Back To Bitch” e “Cooler Thn Mars”). Os dois primeiros foram nos meses anteriores à segunda vinda para cá. O último foi disponibilizado semanas atrás nas plataformas digitais de áudio e vídeo.

Agora o L7 vem pela terceira vez tocar para a gente. A tour começou ontem em São Paulo e alcança Ribeirão Preto (SP), no domingo (22 de outubro). Em Curitiba (24), acontecerá o ponto alto, quando o quarteto sobe ao palco no mesmo que outra história banda do rock independente norte-americano, o Black Flag (mais informações sobre local, horário e ingressos deste show na capital paranaense você tem clicando aqui; mais sobre o Black Flag você encontra aqui) A dobradinha se repete no dia seguinte (25) em Porto Alegre. De novo como atração única principal da noite, a banda ainda tocará em Belo Horizonte (27) e Rio de Janeiro (29). Mais informações sobre toda a rodagem em território verde-e-amarelo e os demais concertos você tem clicando aqui.

Para celebrar este retorno, o Mondo Bacana preparou uma relação com oito motivos para você não perder a terceira passagem do L7 por aqui.

Documentário

Dirigido pela cineasta Sarah Price, o documentário L7: Pretend We’re Dead foi lançado em 2016, depois de uma campanha de crowdfunding que arrecadou fundos para a sua realização. O filme conta a história da banda do underground ao estrelato e, então, de volta ao underground até o fim das atividades em 2001. São muitas imagens de arquivo e acervo pessoal com trechos de concertos e festivais, curiosidades de bastidores e depoimentos de Donita, Suzi, Jennifer e Dee em off.

Nada de girl band

Se existe uma coisa que elas deixam claro logo nos primeiros minutos de L7: Pretend We’re Dead é para não chamá-las de “banda de garotas”. Afinal, essa questão da diferenciação pelo gênero – e sempre através de um modo tão comparativo quanto negativo, diga-se de passagem – já é uma coisa tão batida, sem noção e sem sentido que elas já disparam que estão enojadas e cansadas de que usem isso a respeito do grupo. Donita afirma que rejeita toda a imagem criada ao longo destes anos pelo fato do L7 nunca ter sido algo que a pessoas pudessem esperar delas, sobretudo pela questão de não se encaixar no que se chama de estereótipo da beleza feminina.

Punk e também heavy

O L7 foi formado na esteira de um cenário punk e hardcore criado por jovens que não se encaixavam com a apatia de seus semelhantes durante o governo Ronald Reagan nos 1980. Paralelamente a isso, na cidade em que as musicistas viviam (Los Angeles), o rock era tomado pelo mainstream de bandas masculinas glam metal, mais preocupadas com o visual andrógino e a estética sexista da cosmética, levada aos extremos comerciais através dos videoclipes em alta rotação na MTV norte-americana. Entretanto, o heavy clássico, mais sujo e poderoso, também faz parte da formação delas. Isso pode ser facilmente notado em diversas faixas de álbuns como Smell The Magic (lançado pela Sub Pop em 1990) ou Bricks Are Heavy (de 1992, quando a banda era contratada do selo Slash, então ligado às gravadoras major Warner nos Estados Unidos e PolyGram no resto do mundo). São muitos riffs, pedais de efeito e power chords – sem falar que Donita leva uma guitarra Flying V a tiracolo ao subir em um palco. Sparks até então se ressentia do fato do grupo nunca ter sido convidado para participar de um festival dedicado a bandas heavy metal nos Estados Unidos. “Ne Europa nos aceitam muito bem e volta e meia participamos destes eventos. Mas em nosso país isso nunca aconteceu.”

Bricks Are Heavy

Responsável pela sonoridade assumidamente pop (porém sem negar as origens alternativas) de vários discos de sucesso da época – como Dirty (Sonic Youth), Nevermind (Nirvana) e Siamese Dream (Smashing Pumpkins) – o produtor Butch Vig também conseguiu fazer o mesmo com o L7 em Bricks Are Heavy. Deixou toda a sujeira lá, mas conseguiu aparar as arestas e arredondar as músicas compostas e cantadas por Donita, Suzi e Jennifer, inclusive fazendo os mesmos com seus vocais. O resultado foram três grandes hits (“Pretend We’re Dead”, “Monster” e “Everglade”), indispensáveis em qualquer set list do L7 até o final dos tempos da banda. Mas o repertório dos atuais shows da banda não se sustenta apenas nessas faixas do disco. Outras menos conhecidas na época continuam bastante poderosas quando tocadas ao vivo. É o caso de “Scrap”, “Slide”, “One More Thing” e “Shitlist”. Os versos desta última sempre soam como um eterno grito de guerra feminista.

Homenagem aos ídolos

Na volta para o bis de cada show, a banda rende uma saudação a uma histórica banda dos primórdios do punk rock.Primeiro single lançado em 1979 pelo trio Agent Orange, a música “Bloodstrains” foi a escolhida para a turnê passada por aqui. Desta vez, o salve vai para o Eddie and The Subtitles, com a canção “American Society”, gravada por eles em 1980. O quarteto também veio daquele cenário californiano muito prolífico para jovens inconformados e hipnotizados pela fúria e resistência comportamental do punk daquela época.

Brasil, 1993

O festival Hollywood Rock de 1993, realizado no segundo e no terceiro final de semana de janeiro, respectivamente em São Paulo e no Rio de Janeiro, trouxe uma escalação memorável. Duas das três noites eram reservadas a bandas internacionais que estavam, naquele momento, no auge de suas carreiras mundiais, fato até hoje não superado por qualquer outro evento do tipo em solo brasileiro. Uma das noites trazia o Alice In Chains e, como headliner, o Red Hot Chili Peppers. A outra, no mesmo esquema, era composta por L7 e Nirvana. E o show do L7 acabou sendo tão memorável quanto o de Kurt Cobain, Krist Novoselic e Dave Grohl. O estádio do Morumbi (onde este que aqui escreve estava presente, aliás) chacoalhava na noite do sábado 15 com a multidão pulando sem parar no gramado, cadeiras e arquibancada. Não foi bem um aquecimento para o trio principal, já disparado no topo das paradas mundiais, mas sim um show de primeira e que deixou todo mundo tão suado quanto. No Rio de Janeiro, sete dias depois, foi tudo igualzinho (conforme você pode checar aqui, assistindo à gravação da apresentação de mais de uma hora na íntegra).

Tampax para a plateia

A edição de 1992 do Reading Festival, na Inglaterra, entrou para a História pela trolagem do Nirvana. Havia uma expectativa negativa em relação ao show do trio porque Kurt Cobain estava entrando e saindo de períodos na rehab e muito se falava sobre a possibilidade da gig no evento ser cancelada. Sem qualquer aviso, Dave Grohl entrou no palco empurrando Kurt sentado em uma cadeira de rodas e com roupa hospitalar. O vocalista simulou uns espasmos e jogou-se ao chão, assustando e arregalando os olhos de todos. Posteriormente levantou-se e fez um puta show à frente de sua banda. Mas o L7 também deu sua bela contribuição para fazer aquele verão ser inesquecível para quem estava lá no interior inglês. A apresentação do quarteto foi um grande caos. A tensão já era grande no início, quando começou a haver problemas técnicos no som. A plateia ensandecida e à espera do Nirvana, reagia contra o grupo. A banda chegou a trolar todo mundo que queria mainstream começando a tocar o riff de “Enter The Sandman”, do Metallica, para depois parar tudo e xingar ao microfone. Depois, muita gente passou a arremessar lama em direção às integrantes. Irritadíssima, Donita não pensou duas vezes. Pôs a mão dentro da calcinha, arrancou o tampax, mostrou-o a todo mundo e arremessou-o em direção às pessoas, provocando reações de espanto e nojo em muitos. Apesar da gravação tosca e cheia de problemas, este simbólico show do L7 também está registrado no YouTube (veja aqui). O “incidente” do tampax – que chegou a ser incluído entre os cem melhores momentos de toda a história do heavy metal pelo canal de TV VH1 (veja aqui) – ocorre quase no final, aos 40 minutos e 24 segundos, assim que acaba a penúltima música do set list.

“Cooler Than Mars”

Lançado no último mês de setembro, o novo single do L7 é uma nova crítica disparada pela banda. Desta vez o foco fica nas mudanças ambientais drásticas que abatem o planeta inteiro e foram provocadas pelo mesmo ser humano que agora fala em deixar a Terra para passar a colonizar Marte. No videoclipe, as quatro integrantes interagem com cenas da natureza em um cromaqui intencionalmente tosco. Aparecem vegetações, mares e dezenas de animais da espécies variadas, das mais comuns aos mais esquisitos.

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Gross – ao vivo

Rock’n’roll, uma estrada deserta e nuances musicais: a noite de um show impecável do ex-guitarrista da Cachorro Grande

Texto e foto por Frederico Di Lullo

Era 18 de maio e passava das 20h30 quando peguei a estrada saindo da cidade de Palhoça com destino certo: a Dubai Brasileira. Também conhecida como Balneário Camboriú (ou até mesmo BC), a localidade iria receber a primeira data da turnê por Santa Catarina de Marcelo Gross, que também teria cidades como Joinville e Blumenau no roteiro. As Próximas Horas Serão Muito Boas, segundo álbum da Cachorro Grande, gravado no icônico estúdio Bafo de Bira lá em 2003 e lançado no ano seguinte encartado na “revista do Lobão”, foi a trilha sonora que balançou a trip semanal, numa espécie de culto do que estaria por vir naquela quinta-feira.

Após algumas paradas técnicas, cheguei ao local do show, a charmosa ArtHouseBC. Eu não conhecia o espaço artístico-cultural e fiquei surpreendido positivamente. No local funcionam cinema, auditório, coworking, bar, café, loja e estúdio… TUDO NO MESMO LUGAR E MEIO QUE AO MESMO TEMPO! O conceito é incrível e, por vez, depois de algumas cervejas, era possível fechar os olhos e se imaginar em algum local de Londres ou Amsterdam. Mas que bom que estávamos no sul do sul do mundo e prestes a assistir a um dos maiores músicos da contemporaneidade: o exímio compositor e eterno guitarrista da Cachorro Grande.

Passava das 23h, quando  a banda chegou ao ArtHouseBC e sem muitas firulas e iniciou com “Alô, Liguei” e “Me Recuperar”. Ambos são clássicos da carreira solo de Gross, que estão presentes em Chumbo & Pluma, trabalho de 2017. Com uma plateia ansiosa e em êxtase apesar de pequena, o trio era iluminado não só pela luz do palco mas sim pelo brilho que a banda como um todo emana, capitaneada pela guitarra e a voz de Marcelo. Isso sem mencionar o lendário baterista Julio Sasquatt e o baixista Lucas Chini, que atualmente formam a banda de apoio. Muito talento. Muita luz. Muita energia. Muito rock’n’rollbaby! E, sim, desde o primeiro acorde, desde a primeira nota, todos os presentes ficaram cativados.

Cabe destacar que o atual show de Gross, chamado Tour 50 Anos de Rock, é uma visita a todos os momentos da carreira do guitarrista. Por isso, o clima teve ares de nostalgia. Com isso, ao longo da apresentação, ficou cada vez mais nítida a habilidade excepcional dele na guitarra. Seus solos eram precisos e cheios de paixão. Sua voz rouca e marcante embalou “Eu Aqui e Você Nem Aí”, “Que Loucura”, “Lunático”, “Purpurina”, “Sinceramente”, “A Dança das Almas” e “O Novo Namorado”, dentre outras tantas músicas que viabilizaram o espetáculo. Aliás, a última faixa mencionada foi, pra mim, uma grande surpresa! Afinal de contas, Júpiter Maçã e os Pereiras Azuiz a lançaram em 1995 (mas isso é papo para outra resenha!).

Cada canção, meu amigo, era uma jornada musical repleta de saudosismo e acabou me envolvendo completamente. Em resumo, esta noite de maio em Balneário Camboriú foi uma verdadeira e honesta ode ao rock cantado em português (mesmo com uma cover dos Beatles encaixada no repertório). Performance impecável, presença de palco cativante, clima intimista, interação com o público e cerveja gelada foram os atenuantes de uma experiência memorável para todos os presentes.

No final, aplausos entusiasmados ecoaram na sala do ArtHouseBC. Isso só demonstrou o reconhecimento e o carinho do público. Marcelo Gross não precisava provar nada a ninguém, mas detém genialidade musical e carisma inegável. Sem sombra de dúvida, ele é um dos grandes nomes do rock. Não só o gaúcho, mas sim do Brasil todo.

Quando o show acabou, só restou achar um pico para bater um lanche, pegar a estrada, colocar La Máquina de Hacer Pájaros no bluetooth e depois descansar para acordar cedo e enfrentar o último dia útil da semana. Enfim, só sabia que aquelas próximas horas seriam muito boas.

Set list: “Alô, Liguei”, “Me Recuperar”, “Eu Aqui e Você Nem Aí”, “Que Loucura”, “Carnaval”, “Lunático”, “O Novo Namorado”, “Disfarça”, “Taxman”, “Bom Brasileiro”, “A Dança das Almas”, “Dia Perfeito”, “O Buraco da Fresta”, “Sinceramente” e “Purpurina”.

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Hoodoo Gurus – ao vivo

Apesar do repertório irregular, australianos se garantem no Rio de Janeiro com músicas novas, boas lembranças e performance bem ajustada

Dave Faulkner (Hoodoo Gurus)

Texto por Marcos Bragatto (Rock em Geral)

Fotos de Daniel Croce (Rock em Geral)

A noite é a do tipo “fadada a recordações”, diria o velho homem da imprensa, e o momento especial não poderia ser outro, mesmo porque é único. Sim, só aconteceria mesmo no Brasil (só no Rio?), onde a dobradinha de canções, que passaria batida em todo o mundo aqui tem um significado realmente especial e precisa ser tocada. Tem que por no contrato que tem que ser assim. Por isso, quando os primeiros acordes da primeira música aparecem, o público vem abaixo, piração total. E quando a segunda vem quase emendada, aí a loucura é generalizada. É assim que o excelente público que encheu o Metropolitan (ops, Qualistage), reage no auge do show do Hoodoo Gurus, na sexta 14 de março, no Rio de Janeiro.

Explica-se que tanto “Out That Door” – a primeira – quanto “What’s My Scene” – a segunda – cederam trechos para vinhetas para a programação da Rádio Fluminense FM, que marcou fortemente a derradeira passagem da emissora de Niterói pelo dial na primeira metade da década de 1990. Ou seja, motivo de emoção e saudades de um tempo marcante de verdade. Era a época em que a rádio cobria competições de surfe e as músicas que os surfistas brasileiros ouviam quando iam competir na Austrália rodavam forte na programação, ganhando a pecha de surf music, sem ter nada a ver com o subgênero criado por Dick Dale, Beach Boys e afins. A coisa cresceu tanto que todas essas bandas (parte da new wave/pós-punk/rock australiano oitentista) fizeram turnês concorridas nos anos subsequentes por aqui. A do Hoodoo Gurus, em 1997, por exemplo, lotou duas noites seguidas deste mesmo Metropolitan.

Dito isso – saudosismo uma ova! – o fato é que nesse meio tempão a banda acabou, voltou com discos pouco ouvidos e agora está na turnê do novo álbum, o bom Chariot Of The Gods, que saiu no ano passado. Dele são apresentadas quatro faixas: as boas “World Of Pain”, que abre a noite, e “Equinox”, “uma canção sobre boa sorte”, cantada pelo guitarrista Brad Shepherd; e as nem tão legais assim “Chariot Of The Gods”, a faixa-título, e “Answered Prayers”, que emula Echo & The Bunnymen e não esconde as origens 1980s da banda. Uma pena terem ficado de fora, desse disco novo, três das melhores músicas: “Get Out Of Dodge”, “My Imaginary Friend” e “Carry On”, dotada de um refrãozaço daqueles (procure saber!).

Montar set list, veremos, não chega a ser uma virtude desses aussies. Mas compor música boa, sim, e, vamos e venhamos, em mais de 40 anos de estrada, há um bocado delas pro público cantar do início ao fim. Caso de, por exemplo, “If Only…”, da época em que a banda circulou por aqui, com Dave Faulkner (vocal e guitarra) colocando a massa pra cantar; “Come Any Time”, na abertura do bis; e da deliciosamente pop colante “I Want You Back”. Além de Faulkner e Shepherd, estão na formação o baixista Richard Grossman, completando a trinca remanescente dos shows noventistas por aqui, e o batera Nik Rieth, novo na turma, mas cascudaço. É evidente em todo o show a performance bem ajustada do quarteto e os fabulosos backing vocals de Grossman e Brad Shepherd, inclusive nas músicas do disco novo, que se completam com a voz de Dave Faulkner – este, a propósito, com o falsete em dia.

show só engrena da metade para o final, o que se explica, de certo modo, pela escolha do repertório. Músicas como “Tojo” e “Poison Pen”, por exemplo, poderiam tranquilamente ser limadas, e não é porque “Leilani” é a primeira música composta pela banda que tem que ser tocada em todos os shows. De outro lado, que falta fazem temas como “A Place In The Sun”, “Down On Me” e “In The Middle Of The Land”, só para citar três das grandes ausências. O que não invalida momentos lindos com em “Castles In The Air” e “1000 Miles Away”, no bis, além da piração total da dobradinha “Out That Door” e “What’s My Scene”, citada lá em cima. O que, no fim das contas, faz dessa passagem do Hoodoo Gurus pelo Rio uma noite e tanto. Que voltem sempre que tiverem um novo álbum pra mostrar!

Na abertura, a banda cover VAAR Surf Band comandou um bailão daqueles. O grupo parece especializado em tocar as músicas das bandas oitentistas australianas – a tal da surf music australiana, vá lá. E aí é um Gang Gajang aqui, um Midnight Oil acolá e outro Spy Vs Spy, tudo hit que todo mundo conhece e curte o tempo todo. O bom é que o quarteto se garante no palco e se esforça para tocar tudo igualzinho às versões originais, a ponto de o vocalista se dividir entre violão, harmônica e até um trompete. O ruim é a execução no final de um inacreditável medley que incluiu Red Hot Chili Peppers e REM juntos! Mas que animou a turma, isso animou.

Set list: “World Of Pain”, “Another World”, “The Right Time”, “The Other Side Of Paradise”, “I Was The One”, “Leilani”, “Answered Prayers”, “Night Must Fall”, “Tojo”, “If Only…”, “Chariot Of The Gods”, “I Want You Back”, “Poison Pen”, “Equinox”, “Castles In The Air”, “Out That Door”, “What’s My Scene”, “Bittersweet” e “I Was a Kamikaze Pilot”. Bis: “Come Anytime”, “1000 Miles Away” e “Like Wow – Wipeout”

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Wu-Tang Clan + Planet Hemp – ao vivo

Coletivos históricos de NY e do Rio levam a SP a profusão de trinta anos da trajetória de cada um no hip hop

RZA (Wu-Tang Clan)

Texto por Fábio Soares

Fotos: Gustavo Diakov/Hedflow

O conglomerado Wu-Tang Clan já era para ter pisado em terras brasileiras em terra brasilis em abril de 2020. A pandemia da Covid-19 decretada um mês antes, entretanto, quase pôs fim ao sonho de ver esta instituição do hip-hop in loco. Eis que quase mil dias após a data prevista, naquele domingo 2 de abril era enorme a expectativa dos fãs nos arredores do Espaço Unimed, em São Paulo. Desde cedo, aficionados pelo coletivo já desfilavam camisetas, bonés e aparatos a granel com o gigantesco “W” característico do grupo. Apesar das anunciadas ausências dos fundadores GZA e Method Man, era enorme a expectativa por uma apresentação única (e, por que não dizer, a última) por aqui. Bem “hoje ou nada”.

Antes da apresentação principal, o Planet Hemp deu as caras. Com 30 anos de carreira nas costas, o coletivo carioca capitaneado por Marcelo D2 e BNegão provou porque ainda é relevante no cenário do hip hopnacional após três décadas. Apesar de haver um recente álbum lançado (Jardineiros, 2022), a performance foi carregada de emoção e nostalgia. Teve homenagens ao fundador Skunk (morto em 1994), eixbição de trechos de entrevistas concedidas no início da carreira do grupo e revisitação dos primeiros álbuns, (Usuário e Os Cães Ladram Mas a Caravana Não Para).

Citações do punk brasileiro (“Pela Paz Em Todo Mundo”, do Cólera) e inéditas como “Puxa Fumo” também deram o tom. O fator negativo ficou por conta da onipresente baixa iluminação do palco. Proposital ou não, isso incomodou. Sorte que o coeso repertório salvou a pátria. Até que o hino “Mantenha o Respeito”, com andamento alterado, decretou números finais à apresentação que em nenhum momento comprometeu e provou ser mais que adequada como passagem para a grande atração da noite.

Marcelo D2 (Planet Hemp)

Com trinta anos de carreira, o Wu Tang-Clan surgiu na cidade de Staten Island, NY, para mudar a cara do hip hop. Sempre com o método de trabalho colaborativo, explodiu já em sua estreia, em novembro de 1993, com o seminal álbum Enter The Wu-Tang (36 Chambers).

Na semana do show, um temor generalizado abateu-se nas redes sociais com o anúncio das ausências dos fundadores Method Man e GZA. Porém, os remanescentes Ghostface Killah, Masta Killa, RZA, Inspectah Deck, Cappadonna, U-God e o DJ Mathematics sabiam exatamente o que fazer. E assim o fizeram em Sampa. Eram pouco mais de 20h30 quando os primeiros acordes de “Killa News On The Swarm/Clan In Da Front” transformaram o Espaço Unimed num antro de celebração nas cores amarelo e preto. Com status de religião, o coletivo tinha a plateia sob seu comando e em nenhum momento deixou-a dispersar.

“Da Mystery Of Chessbown” sustentou o ar de celebração à cultura hip hop, tendo a guitarra pesada de “One Blood Under W” como sequência. Porém, nada comparado ao PANDEMÔNIO instalado no salão com o universal hino “C.R.E.A.M.”. o efeito que esta faixa ainda provoca em audiências mundo afora após três décadas é algo a ser estudado! Marca registrada do rap que seria reconhecida até dentro de uma cápsula do tempo enviada à Lua.

Após de breve intervalo, RZA surgiu com uma garrafa de champanhe aberta nas mãos “para abrir nossos caminhos”, comandando a introdução de “Reunited”, conhecida por onze em cada dez fãs do grupo. Uma atmosfera de comoção tomou conta do local, já transformado em enorme pista de dança. Tudo ficou ainda mais acentuado com a homenagem ao eterno integrante OI’ Dirty Bastard, morto em 2004.

Depois de noventa minutos, um fato inusitado: o som da casa foi cortado bem no meio da execução de “Protect Ya Neck”, provavelmente por estouro do horário-limite. Foi a ducha de água fria para uma plateia que ficaria entregue aos seus comandantes até às cinco da manhã do dia seguinte, necessário fosse.

No fim, entretanto, a certeza de que trinta anos de história ali à frente valeu a pena. O Wu-Tang Clan não é somente uma banda, um grupo ou um coletivo. É muito mais que isso: é uma ideia.

Set list Wu-Tang Clan: “Killa Bees On The Swarm”/”Clan In Da Front”, “Bring Da Ruckus”, “Da Mystery Of CHessboxin’”, “One Blood Under W”, “Shame On A Nigga”, “Wu-Tang Clan Ain’t Nuthing Ta F* Wit”, “Can It Be All So Simple”, “Clan In Da Front”, “Uzi (Pinky Ring)”, “C.R.E.A.M”, “Method Man”, “Run”, “For Heavens Sake”, “Tearz”, “Shimmy Shimmy Ya”, “Got Your Money”, “Ice Cream”, “Gravel Pit”, “Triumph”, “Reunited”, “4th Chamber”, “Smells Like Teen Spirit” e “Protect Ya Neck”.

Set list Planet Hemp: “Distopia”, Marcelo Yuka, “Taca Fogo”, “Puxa Fumo”, “Dig Dig Dig (Hempa)”, “Jardineiro”, “Amnésia”, “100% Hardcore”, “Hip Hop Rio”, “Zerovinteum”, “O Ritmo e a Raiva”, “Legalize Já”, “Deisdazseis”, “Onda Forte”, “Cadê o Isqueiro?”/”Quem Tem Seda?”, “Contexto”, “A Culpa é de Quem?” e “Mantenha o Respeito”.