festival, Music

Arvo Festival 2023

Oito motivos para não perder o festival cuja terceira edição irá marcar a volta aos palcos de Rubel e da Nação Zumbi

Rubel

Texto por Frederico Di Lullo

Fotos: Divulgação

Um dos festivais mais aguardados na Ilha da Magia, o Arvo tem sua terceira edição marcada para o próximo dia 28 de outubro, prometendo um dia histórico. Seja pelo seu histórico anteriores ou pelo lineup da atual, haverá todos os ingredientes para um evento inesquecível.

Mondo Bacana apresenta agora oito motivos para você garantir presença no festival em Florianópolis e aproveitar um sábado de muita cultura efervescente. Bora?

Estrutura de primeira

O Arvo se caracteriza por ser proporcionar uma experiência diferenciada para quem vai ao festival. Espera-se para a próxima uma estrutura equalitária às edições anteriores, com um som de primeira e três palcos que irão proporcionar o revezamento de mais de 20 atrações diferentes em mais de 12 horas de show.

O melhor bairro de Floripa

O local escolhido para o Arvo não poderia ser diferente: a Arena Império das Águias, que fica no Campeche, internacionalmente conhecido por ser um bairro que detém uma ampla e efervescente comunidade de músicos, surfistas e famílias que escolhem a tranquilidade de morar à beira-mar. Como se não bastasse, ainda é o melhor pôr-do-sol de Floripa! 

Diversidade musical

É samba, é rock, é manguebit… A diversidade que urge do atual cenário musical nacional estará presente e isso poderá ser traduzido em garantia de sucesso e diversão! Afinal, diferenças musicais e muitos gostos estando ali representados, sendo um espaço plural e diverso.

Rubel 

A turnê As Palavras é a primeira do artista em mais de três anos e vem recebendo elogios em todas as cidades que acolhem a apresentação. E não pense que ela vem de maneira enxuta: serão os 12 pessoas no palco, tocando um set list que equilibra músicas de toda a carreira de Rubel.

Nação Zumbi

ícone do movimento manguebit, a Nação Zumbi, agora com a formação de trio (mais músicos convidados) é uma força revolucionária na música brasileira e finalmente se apresenta novamente em Florianópolis. O show mescla rock, funk, maracatu e psicodelia de forma única. Está sendo aguardadíssimo, afinal, a última passagem pela cidade desta trupe, que retorna agora de um ano de pausa e sem a presença do guitarrista Lucio Maia, foi no já longínquo ano de 2019.

Jorge Aragão

Cantor, compositor e instrumentista, ele personifica o samba em sua forma mais autêntica, com uma carreira brilhante que atravessa décadas. Com certeza, não vão faltar clássicos para todo mundo cantar junto com este tesouro da música brasileira, como “Eu e Você Sempre,” “Malandro”, “Vou Festejar” e “Coisinha do Pai”. Sem dúvidas, será mais um momento histórico para este ano na Ilha da Magia.

Baco Exu do Blues 

Figurinha carimbada na capital catarinense, o baiano de 27 anos é uma atração que merece destaque na programação deste. Com letras perspicazes, o multifacetado artista promete, mais uma vez, balançar todos os presentes com suas composições, numa verdadeira e sincera polifonia sonora.

Ainda há ingressos disponíveis

Já foi anunciado pelo próprio festival que mais de 80% dos ingressos já foram vendidos. Por isso, não é para deixar pra cima da hora. Caso contrário você corre o risco de perder as atrações citadas acima mais outros nomes como Tulipa Ruiz, Rincon Sapiência, Liniker, Anelis Assumpção e Furacão 2000. Para garantir sua presença num dos dias mais legais do ano na Ilha da Magia e saber mais informações sobre as entradas, é só clicar aqui!

Series, TV

The White Lotus

Segunda temporada da série que explora a aventura no mundo do turismo luxuoso e sua fauna desconcertante encanta os olhos

Texto por Taís Zago

Foto: HBO Max/DIvulgação

Eu preciso confessar para vocês que a primeira temporada de The White Lotus, vencedora de onze Emmys em 2022, à primeira vista, não me empolgou muito. O elenco é inegavelmente espetacular, em especial as atuações de Murray Bartlett como Armond (o gerente da filial havaiana da franquia de hotéis de luxo) e Jennifer Coolidge, como a insensível, autocentrada e deprimida milionária Tanya. O enredo sob o sol escaldante do Havaí, apesar de multifacetado, causou-me incômodo, talvez pela simplicidade dos seus temas. Possivelmente, também, eu não tenha levado em consideração que durante sua concepção e realização estávamos vivendo tempos pandêmicos – o auge da produção data de meados de 2021, e, dadas as condições e as restrições internacionais e sanitárias, foi feito um esforço para criar um conteúdo de qualidade da forma mais segura e rápida possível. O ator, autor, produtor e diretor Mike White, mais conhecido por ter escrito especialmente para Jack Black o blockbuster Escola de Rock (2003), conseguiu criar uma trama em um ambiente relativamente hermético – a cadeia White Lotus é uma espécie de Club Med do nouveau riche norte-americano – e unir de forma interessante drama e humor macabro com bastante equilíbrio.

Na segunda temporada de The White Lotus (EUA, 2022 – HBO Max), com maior liberdade tanto criativa quanto espacial, Mike nos leva para a sede siciliana da cadeia da flor exótica. Temos diante de nós uma nova equipe de funcionários locais trabalhando no hotel e novos hóspedes a serem paparicados sem restrições. O formato da série nos lembra uma versão Upstairs, Downstairs (1971) contemporânea – sucesso britânico da década de 1970 cujo formato televisivo influenciou várias produções, entre elas a festejada série Downtown Abbey (iniciada em 2010), onde os dramas da crew do hotel têm o mesmo peso na narrativa dos dramas dos privilegiados visitantes.

Como personagens recorrentes da primeira temporada temos apenas a confusa Tanya (Jennifer Coolidge) e seu “novo” marido Greg (Jon Gries). Tanya chega ao encantador resort com uma nova assistente a tiracolo, Portia (Haley Lu Richardson). Junto a ela no barco estão dois casais de jovens amigos milionários – Cam (Theo James) e a esposa Daphne (Meghann Fahy), Harper (Aubrey Plaza) e o marido Ethan (Will Sharpe), completando a trupe dos bem-sucedidos temos os Di Grasso – o pai Domenic (Michael Imperioli), o avô Bert (F. Murray Abraham) e o filho/neto Albie (Adam DiMarco). Na frente do comando dos funcionários do hotel fica a gerente italiana Valentina (Sabrina Impacciatore), que nessa temporada assume o papel que Bartlett interpretou na primeira temporada. Completam o elenco ainda as duas garotas de programa locais Luccia (Simona Tabasco) e Mia (Beatrice Grannò). 

Mike White não nos economiza no quesito encontros e desencontros. O roteiro possui várias reviravoltas e requisita a nossa atenção aos detalhes, às vezes, escondidos nas próprias imagens paradisíacas e objetos luxuosos. Repetindo o formato da primeira temporada, iniciamos essa jornada com mais corpos sendo encontrados. Do primeiro capítulo, então, voltamos no tempo até a chegada dos turistas ao hotel onde percorremos todo o caminho de volta à cena inicial. Um formato que vagamente lembra a antiga série Ilha da Fantasia, onde os visitantes usam suas férias para trabalhar seus problemas pessoais, dificuldades de comunicação, mistérios e conflitos familiares que a rotina do dia a dia teimava em enterrar.

As atuações são um deleite à parte. Todos os atores italianos merecem aplausos de pé, principalmente Sabrina, Simona e Mia. A leveza e a pungência do humor desse país dão à segunda temporada exatamente o tempero exótico que faltou à antecessora. Gargalhamos do absurdo, assim como gargalhamos do desespero. Ao mesmo tempo nos comovemos e somos encantados por um charme tão natural e genuíno que pensamos que em Taormina, o pitoresco vilarejo siciliano, tudo é permitido.

Visualmente, The White Lotus é uma série de tirar o fôlego. A fotografia, a música, a ambientação, tudo nos leva a viajar pelo mundo do luxo dos resorts e dos cenários de nossos sonhos. É o olhar do turista e, portanto, também há um amontoado de clichês bem selecionados, como um catálogo de uma agência de viagens. A Sicília nos é mostrada pelos olhos encantados dos norte-americanos – com vulcão, praias de água turquesa, palazzos decadentes cobertos de ouro e pinturas renascentistas, vinhedos e ilhas rochosas cheias de mistério. White também não poupou recursos para nos alimentar os olhos. Por outro lado, também não economiza recursos ao esfregar na nossa cara a amargura, a feiúra e a traição latentes no âmago de seus personagens. De novo, não existem aqui mocinhos e bandidos: existem pessoas que ora nos encantam ora nos causam repulsa com suas atitudes. E nós, de uma distância segura, rimos muito de tudo isso.

Em uma entrevista recente, o criador explicou que o tema da primeira temporada no Havaí foi o amor, o da segunda na Sicília foi o sexo e que o da terceira será a espiritualidade. Com isso, já nos deixa na expectativa de qual paraíso desse mundo será o novo destino e na certeza da confirmação da produção da próxima aventura no mundo do turismo luxuoso e sua fauna desconcertante.

Movies, TV

Tarcísio Meira

Oito longas-metragens para relembrar sempre a excelência e a versatilidade das atuações deste que foi o grande galã das telenovelas

Texto por Abonico Smith e Marden Machado (Cinemarden)

Fotos: Divulgação

Na manhã de 12 de agosto de televisão a história da televisão brasileira ficou bem mais triste. O hospital Albert Einstein, em São Paulo, anunciou a morte do ator Tarcisio Meira, aos 85 anos de idade, por problemas de saúde decorrentes da covid-19. Ele estava internado havia alguns dias. A atriz Gloria Menezes, sua esposa de quase seis décadas, também internou-se com covid no mesmo hospital. Mas ela, ao contrário do marido, reagiu bem, não precisou ser deslocada do quarto até a UTI e teve alta hospitalar dias após ser informada do falecimento do marido.

O nome de Tarcísio Meira se confunde com o da história da TV nacional. Ele é um dos maiores símbolos da teledramaturgia, tendo somado durante a trajetória profissional 78 participações em produções seriadas (novelas, séries, minisséries), programas documentais e teleteatro (quando as encenações eram transmitidas ao vivo, o que era comum até o começo da década de 1960).

De formação teatral clássica e biotipo de galã, Tarcisio não precisou de muito para assumir o posto de protagonista de telenovela. Desde a primeira, aliás. E já em 2-5499 Ocupado, feita pela TV Excelsior em 1963 a partir de uma adaptação do texto original argentino, atou ao lado de Gloria, com quem, pelas próximas duas décadas, fez par constante em vários outros títulos. 

Mas foi a partir de 1969 que ele ajudou a construir junto com a Rede Globo uma indiscutível excelência nesse formato de folhetim diário, fazendo da emissora carioca um nome mundial da televisão com sucessivas exportações de produções para exibição em dezenas de outros países. Também ajudou a consolidar a chamada “novela das oito” (que com o passar do tempo foi começando mais tarde e atualmente começa às nove e meia da noite) como elemento principal do horário nobre da Globo, formado ao lado do Jornal Nacional e de um produto da linha de shows e entretenimento. Afinal, Tarcisio protagonizou muitas histórias de sucesso e popularidade, que ficaram na memória do público brasileiro tanto no formato de novela quanto de minisséries. Entre os títulos mais importantes da telinha que contaram com o ator no elenco estão 2-5499 Ocupado (1963), Irmãos Coragem (1970 – foto acima), Cavalo de Aço (1973), Espelho Mágico (1977), Guerra dos Sexos (1983), O Tempo e o Vento (1985), O Rei do Gado (1996) e Saramandaia (2013).

Só que Tarcísio Meira não foi apenas um profissional a serviço das telenovelas. Também encenou 31 peças teatrais e rodou 22 filmes. Em homenagem ao ator, o Mondo Bacana disseca oito presenças fundamentais de Tarcisão (apelido pelo qual era carinhosamente chamado, em contraponto ao filho Tarcísio Filho, o Tarcisinho), na tela grande. E entre eles não está A Idade da Pedra (1981), o confuso último filme dirigido por Glauber Rocha… (AS)

Quelé do Pajeú (1969)

Não seria exagerado dizer que Anselmo Duarte seja o artista brasileiro mais próximo do italiano Vittorio De Sica. Ambos iniciaram carreira no cinema como atores. No caso de Anselmo, na segunda metade dos anos 1940. Pouco depois já começou a escrever roteiros e no final da década seguinte estreava na direção de longas. Sua obra maior, O Pagador de Promessas, feito em 1962, ganhou a Palma de Ouro em Cannes. Quelé do Pajeú, de 1969, foi seu quarto longa e marcou a estreia de Tarcísio Meira como protagonista em um filme. A história, criada por Lima Barreto (do sucesso O Cangaceiro, de 1953), foi roteirizada pelo próprio Anselmo Duarte. Temos aqui o mais próximo em nosso cinema de um faroeste. Tudo começa quando a jovem Marizolina (Elizângela) é violentada. Seu irmão, Quelé, mente e Celidônio (Meira) sai pela região em busca de vingança. A ação se passa nos anos 1930 no interior do nordeste brasileiro. Quelé enfrenta perigos em sua jornada, além de fazer amigos e conquistar o coração da jovem Do Carmo (Rossana Ghessa). Também conhecido como A Fúria do Vingador, temos aqui uma obra faz bom uso dos elementos clássicos de bom bang bang, porém, com um toque bem brasileiro. Além disso, Meira convence plenamente no papel-título e a trama mantém nosso interesse até o final. (MM)

Independência ou Morte (1972)

Quando das comemorações dos 150 anos da independência do Brasil, em 1972, Oswaldo Massaini e Aníbal Massaini Neto produziram um dos grandes épicos do cinema nacional. Com direção do paulista Carlos Coimbra, que vinha de uma série de filmes populares tendo o cangaço como premissa, a obra teve roteiro escrito pelo próprio Coimbra junto com Anselmo Duarte, Dionísio Azevedo e Lauro César Muniz. Acompanhamos aqui a trajetória de Dom Pedro I (Tarcísio Meira) responsável pelo famoso grito dado às margens do rio Ipiranga, em São Paulo, e que proclamou a independência de nosso país de Portugal. Misturando aventura com política e romance, o filme procura traçar um painel multifacetado do primeiro imperador brasileiro ao abordar sua grande paixão pelo Brasil, sua postura política e seu envolvimento com a Marquesa de Santos (Glória Menezes), sua amante. Meira esbanja carisma no papel principal, a exemplo do que viria a fazer, 13 anos depois, na minissérie O Tempo e o Vento, quando interpretou o capitão Rodrigo Cambará. Sucesso de público quando de seu lançamento, Independência ou Morte continua sendo a melhor cinebiografia do filho mais velho de Dom João VI. (MM)

O Marginal (1974)

O diretor carioca Carlos Manga foi um dos maiores nomes das chanchadas da Atlântida, que reinaram absolutas nas bilheterias nacionais dos anos 1950. Mais conhecido por suas comédias, tanto no cinema como na televisão, Manga dirigiu O Marginal, em 1974, e surpreendeu todo mundo ao abandonar o gênero que o consagrou. Com roteiro do próprio diretor, escrito junto com Lauro César Muniz, a partir de um argumento de Dias Gomes, o filme segue a cartilha dos policiais hollywoodianos. Incluindo alguns flashbacks e razões psicológicas para justificar o comportamento de Osvaldo de Moraes (Tarcísio Meira), na época o grande galã da TV buscando aqui fugir um pouco do estereótipo de bom moço. Ele, quando criança, fugiu de um orfanato, onde sofria maus tratos, e acabou por entrar, já adulto, para o crime. Ambicioso, Valdo termina dando “um passo maior do que a perna” e acaba preso. No melhor estilo femme fatale dos clássicos policiais noir dos anos 1940, a mulher, ou como é o caso em O Marginal, as duas que cruzam o caminho de Valdo, têm papel decisivo em sua vida. Manga imprime ritmo e realiza uma obra que não nega sua inspiração made in Hollywood, mas também não a compromete. E este filme ainda tem trilha sonora composta pela dupla Roberto e Erasmo Carlos. (MM)

República dos Assassinos (1979)

É curioso perceber que Tarcísio Meira procurou no cinema, pelo menos entre meados dos anos 1970 até o final da década seguinte, fugir do estigma de galã que a televisão lhe havia imposto. Essa busca fica mais do que evidente em República dos Assassinos, com direção de Miguel Faria Jr. A história tem por base o romance de mesmo nome escrito por Aguinaldo Faria, que assina o roteiro junto com o próprio diretor. A ação acontece no Rio de Janeiro e gira em torno de um Esquadrão da Morte composto por policiais e liderado por Mateus Romeiro (Meira). Alçado pela mídia ao posto de heróis da sociedade, o grupo é chamado de Homens de Aço. No entanto, o modus operandi é de uma milícia. Macho até a medula, na pior acepção da palavra, Mateus trata as mulheres com quem se relaciona como meros objetos. Apesar da presença forte de Tarcísio Meira à frente do elenco, quem “rouba” o filme é Anselmo Vasconcelos, no papel do travesti Eloína. Mesmo tendo envelhecido mal, República dos Assassinos traz um retrato preciso do Brasil daquela época. Um retrato que, em muitos aspectos, infelizmente, continua o mesmo. (MM)

O Beijo no Asfalto (1981)

Nelson Rodrigues, o maior dramaturgo brasileiro, escreveu uma de suas peças mais conhecidas, O Beijo no Asfalto, em 1960. A primeira encenação ocorreu no ano seguinte e três anos depois ganhou sua primeira adaptação para o cinema, chamada simplesmente de O Beijo, dirigida por Flávio Tambellini e com o jovem Reginaldo Faria à frente do elenco. Esta segunda versão, de 1981, com direção de Bruno Barreto, teve o roteiro adaptado por Doc Comparato. No papel de Arandir temos Ney Latorraca, um bancário que ao presenciar o atropelamento de um homem por um ônibus, vai em seu socorro. Um ato de bondade termina por transformar inteiramente a vida de Arandir, tornando-o alvo de preconceito, além de investigado pela polícia. Sem contar o que acontece em sua própria casa na sua relação com a esposa, Selminha (Christiane Torloni), a cunhada Dália (Lídia Brondi) e o sogro Aprígio (Tarcísio Meira). A abordagem de Barreto procura ser fiel ao texto de Rodrigues e consegue seu objetivo. Existe uma terceira versão dessa peça, mais sofisticada em sua abordagem, dirigida em 2018 pelo ator Murilo Benício e com Lázaro Ramos e Débora Falabella nos papéis principais. (MM)

Eu Te Amo (1982)

Quem só conhece Arnaldo Jabor de seus comentários políticos na imprensa não faz ideia de que ele fora um grande cineasta antes. Jabor iniciou sua carreira na segunda metade dos anos 1960, na esteira do Cinema Novo e construiu, ao longo das décadas seguintes, uma sólida filmografia. Eu Te Amo, de 1981, é a parte dois da chamada Trilogia do Apartamento, iniciada em 1978 com Tudo Bem e concluída em 1986 com Eu Sei Que Vou Te Amar. O roteiro, do próprio Jabor, parte de uma história criada por Leopoldo Serran e apresenta o empresário Paulo (Paulo César Pereio). Duplamente falido, nos negócios e na vida pessoal, ele convida Maria (Sônia Braga), que conhecera na noite anterior, para visitá-lo em seu apartamento cheio de aparelhos de televisão. Abandonados, ambos se encontram em suas solidões. Ele, pela lembrança de Bárbara (Vera Fischer). Ela, pela de Ulisses (Tarcísio Meira). Há um misto de dor e desespero na forma como Paulo e Maria se relacionam. E Jabor, ciente do talento de seu elenco e da força ácida dos diálogos que escreveu, tira todo proveito das situações apresentadas. Com produção de Walter Clark, o então todo poderoso da Rede Globo, Eu Te Amo, apesar de marcado pela estética neon do cinema feito na época, conseguiu envelhecer bem e manter-se relevante 40 anos após seu lançamento. (MM)

Eu (1987)

Assim como o autor de novelas Manoel Carlos tem suas Helenas, o cineasta Walter Hugo Khouri tinha seus Marcelos, que apareceram em dez dos 25 longas que ele escreveu e dirigiu. Eu, de 1987, marca a oitava aparição do personagem, vivido aqui pelo ator Tarcísio Meira. Marcelo é um empresário muito rico e possui um desejo incontrolável por belas mulheres, que sempre estão ao seu lado. Apesar disso, nunca fica satisfeito. Na verdade, ele nutre uma paixão secreta e proibida por Berenice (Bia Seidl), sua única filha. A ação se concentra na casa de praia do milionário, no período das festas de fim de ano. É para lá que ele vai acompanhado de Renata (Monique Lafond), Lila (Nicole Puzzi) e Diana (Monique Evans). Para sua surpresa, a filha também aparece levando Beatriz (Christiane Torloni), uma psicóloga amiga sua. Marcelo é um homem, pode-se dizer, que tem tudo e, ao mesmo tempo, nada. Já que, por mais que seus desejos sejam realizados, sempre parece faltar alguma coisa. E Tarcísio Meira transmite esse vazio interior misturado com arrogância de maneira perfeita. (MM)

Não Se Preocupe, Nada Vai Certo (2011)

Em quase 60 anos de carreira, Hugo Carvana atuou em muitas frentes na TV e no cinema, seja como ator, roteirista, produtor e diretor. Foram mais 100 obras e dentre elas, nove longas dirigidos por ele. O penúltimo foi Não Se Preocupe, Nada Vai Dar Certo, de 2011, derradeiro trabalho de Tarcísio Meira na telona. O roteiro de Paulo Halm apresenta Lalau Velasco (Gregório Duvivier). Ele viaja pelo interior do nordeste brasileiro com seu stand up onde conta histórias hilárias das trapalhadas de seu pai, Ramon Velasco (Meira). Certo dia, no Ceará, ele recebe uma proposta irrecusável de Flora (Flávia Alessandra) para se passar por um guru indiano contratado para uma palestra motivacional. Sem que seu pai saiba, Lalau vai para o Rio de Janeiro, onde, mais tarde, é encontrado por Ramon. Esta é uma comédia que se sustenta em situações de pura farsa que, em certa altura, assumem uma aura de mistério policial. Meira e Duvivier acertam na química, que fica melhor ainda quando entra em cena um velho amigo de ambos, Zimba, vivido pelo próprio Carvana. (MM)

Music

Morrissey – ao vivo

Ídolo britânico presenteia os fãs com repertório multifacetado e performance inspirada em São Paulo

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Texto por Abonico R. Smith e Silvia Macedo

Foto: Fernando Pires/Ultimate Music/Divulgação

Qual Morrissey é o que você quer ver? A maioria de quem já passou dos 40 anos de idade certamente prefere manter na memória aquele jovem topetudo do tempo dos Smiths, que cantava palavras de dor e sofrimento emolduradas pela luxuosa combinação entre batida e dedilhado das cordas da guitarra de Johnny Marr? Tem também aquele horroroso monstro, desprovido de escrúpulos e forrado de preconceitos, que volta e meia veículos corporativos sobre música pop (incluindo aqueles que outrora era independentes e hoje pertencem a grandes grupos de comunicação) andam pintando por aí, como se frases de impacto negativo corressem soltas em sua boca. Tem ainda um impávido senhor quase sexagenário, sagaz, perspicaz e muito bem-humorado, que não perde a chance de brincar com quem está na sua frente e fazer declarações pelas quais escorrem ironia e sarcasmo. Tem também o ídolo decadente, para quem ele parou de fazer algum álbum de boa qualidade faz tempo – as mesmas pessoas, aliás, que procuram sempre ouvir os mesmos discos mais antigos e esperam que os recentes sejam um ctrl C + ctrl Vdas mesmas coisas de sempre. Tem os que se deliciam a cada boa novidade que chega, ao notar que a atual banda está cada vez mais afiada e o acréscimo de parceiros musicais (quatro dos cinco músicos que o acompanham) só resultou em um genial painel de diversidade na sua literatura sonora.

Todos estes Morrisseys eram esperados, de uma forma ou de outra, por quem esteve em 2 de dezembro no Espaço das Américas, em São Paulo. Tinha até aquele fã mais desesperado e obcecado, formando fila na casa desde a manhã daquele domingo com o objetivo de pegar aquele lugar privilegiado à beira do palco, junto à grade da frente da Pista Premium. Tinha também quem não era nem nascido quando o poeta de Manchester irrompeu no cenário musical britânico à frente de sua primeira banda, entre os anos de 1982 e 1987. Mas o Morrissey que subiu ao palco era apenas um: a pessoa inspirada e de bem com a vida, desfrutando de novo período de intensa fertilidade criativa, gravando um disco após o outro, fazendo longas turnês no intervalo entre as sessões de estúdio e sem nenhum grande protesto por ora, interessado apenas em fazer aquilo que faz de melhor, que é cantar.

E como canta! Às vésperas de completar 60 anos, Morrissey canta hoje muito mais e melhor do que já cantava, sem abrir mão de estilo, técnica, doçura e interpretação das palavras. Sua performance também está mais tranquila, sem os arroubos de antes, mas ainda intimamente ligada a seus fãs mais histéricos, como aqueles que levam vinis para o ídolo assinar em plena ação no palco (e ele, bem simpático, fez isso!) ou disputam a tapas pedaços das camisas que ele tira do corpo, rasga e arremessa à plateia.

Antes da subida do sexteto ao palco a já tradicional seleção de repertório em audiovisuais feita a dedo pelo próprio vocalista. Desta vez, começou o punk dos Ramones e culminou com o glam de David Bowie em “Rebel Rebel”. Depois foram cem minutos de intenso bom humor e  boa forma de Morrissey. Quem queria um reencontro com faixas dos Smiths ganhou três delas de presente (“William It Was Really Nothing”, “Is It Really So Strange?” e “How Soon Is Now”). Quem queria novidades ficou com outras três do mais recente trabalho, o álbum Low In High School, lançado no final do ano passado (“Spent The Day In Bed”, “Jacky Is Only Happy When She’s Up On a Stage”, “I Wish You Lonely”). Quem queria o resgate de faixas que havia tempos não apareciam no repertório dos shows também pode saborear preciosidades como “Sunny”, “Jack The Ripper”, “Hold On To Your Freinds”, “Break Up The Family e “Hairdresser On Fire”. Teve o novíssimo single ainda inédito em álbum, a cover de “Back On The Chain Gang”, dos Pretenders (aliás, ele pediu aos fãs que comprasse o trabalho de regravações que lançará no início do ano que vem). Quem procurava por raridades também ganhou “Dial-a-Cliché” (do primeiro pós-Smiths, Viva Hate, de 1988, e até a atual turnê latino-americana nunca cantada em shows) e b sidesde compactos como “If You Don’t Like, Don’t Look At Me” e “Munich Air Disaster 1958”. Também teve hitsda primeira fase solo (“Alma Matters”, “November Spawned a Monster”, “Everyday Is Like Sunday). Por fim, uma breve espanada pelos bons trabalhos mais recentes (“Life Is a Pigsty”, “The Bullfighter Dies” e uma inesperado “First Of The Gang To Die” para encerrar o bis e jogar mais uma camisa na direção dos fãs).

Steven Patrick Morrissey incorpora tantos Morrisseys – tanto em seu dia a dia quanto no imaginário de seus fãs e detratores ou ambos ao mesmo tempo – que ele ainda se dá ao luxo de usar no show uma camiseta estampada com seu próprio nome e rosto (daquelas oficiais à venda foi a que se esgotou mais rapidamente, deixando muita gente a ver navios após o show) e por isso mesmo se torna a cada dia ainda mais fascinante. Desta vez ao menos, todos devem ter saído contentes do show. Sem reclamações.

Set list: “William, It Was Really Nothing”, “Alma Matters”, “I Wish You Lonely”, “Is It Really So Strange?”, “Hairdresser On Fire”, “November Spawned a Monster”, “Break Up The Family”, “Back On The Chain Gang”, “Spent The Day In Bed”, “Sunny”, “If You Don’t Like Me, Don’t Look At Me”, “Munich Air Disaster 1958”, “Dial-a-Cliché”, “The Bullfighter Dies”, “How Soon Is Now?”, “Hold On To Your Friends”, “Life Is a Pigsty”. “Jack The Ripper” e “Jacky’s Only Happy When She’s Up On The Stage”. Bis: “Everyday Is Like Sunday” e “First Of The Gang To Die”.