Music

Phil Spector – Parte 1

Produtor musical que revolucionou o rock e o pop morre aos 81 anos enquanto cumpria pena de prisão por feminicídio

Texto por Carlos Eduardo Lima (Célula Pop)

Foto: Michael Ochs Archives/Redferns/Reprodução

Morreu ontem, dia 16 de janeiro de 2021, o produtor musical e gênio Phil Spector. As fontes do Departamento de Correções e Reabilitação da Califórnia deram conta do falecimento pela manhã de domingo e disseram que a causa será determinada pela necropsia a ser realizada pelas autoridades do estado, mas sites como o TMZ já apontam complicações advindas da covid-19. Spector estava preso, acusado do assassinato da atriz Lana Clarkson, que foi alvejada por ele em sua mansão na madrugada de 3 de fevereiro de 2003. A condenação saiu apenas em abril de 2009.

Spector iniciou a carreira ainda quando estava no high school – o equivalente americano do nosso ensino médio – e produziu e gravou o primeiro sucesso com o grupo Teddy Bears, “To Know Him is To Love Him”. A partir daí, ele iniciou uma carreira brilhante como produtor de estúdio, criando e inventando vários efeitos e técnicas para obter novas sonoridades no estúdio, entre elas, aquela batizada de wall of sound. Isto consistia num arranjo específico de microfones e ênfase em instrumentos de harmonia, privilegiando a força de todos eles ao mesmo tempo, dando a sensação de arremessá-los nos ouvidos do público, criando a tal sensação de “emparedamento” sonoro.

Por conta disso, influenciou, produziu e gravou muitos artistas, de Righteous Brothers, Darlene Love e Ronettes a Beatles, John Lennon, George Harrison, Leonard Cohen, Tina Turner e Ramones. Sempre deixava sua marca característica nas gravações: a sensação de impacto advinda do uso dos instrumentos harmônicos, o que levava a experimentações com várias guitarras e vários pianos sendo gravados ao mesmo tempo, além do uso de orquestras e naipes de metal. Spector assinou, por exemplo, a produção de Let It Be, o último álbum lançado pelos Beatles, e sua presença divide até hoje os fãs. Muitos preferem a versão lançada nos anos 2000 como o título de Let It Be … Naked, que tira a presença dos naipes de orquestra e outros efeitos. Outros – eu incluído – preferem o original.

Brian Wilson, líder e mente brilhante dos Beach Boys, sempre se declarou fã do trabalho de Spector no estúdio, especialmente da técnica do wall of sound. Tal visão influenciou diretamente a produção de um disco-chave para a história do rock, Pet Sounds, lançado em 1966. Além disso, Wilson sempre declarou que “Be My Baby”, sucesso de 1963/1964 das Ronettes, trio vocal produzido por Spector, é a sua música preferida de todos os tempos.

Apesar de todo o sucesso e reconhecimento, Phil Spector era um homem de comportamento violento, fato notório mesmo antes das complicações penais por conta do assassinato do qual foi acusado em 2009. Ronnie Spector, ex-integrante das Ronettes e ex-esposa do produtor, sempre declarou os problemas que viveu enquanto esteve casada com ele.

Neste início de 2021 vai-se um gênio. Louco, controverso, violento. Mas um gênio.

>> Clique aqui para ler o texto sobre oito canções essenciais produzidas por Phil Spector

Books, Music, teatro

Antônio Bivar

O eterno beatnik que organizou o primeiro festival punk no Brasil e transformou Rita Lee em persona glam após a saída dela dos Mutantes

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Texto por Regis Martins

Foto: TV Cultura/Reprodução

É difícil imaginar que um sujeito como Antônio Bivar iria morrer de uma forma tão abrupta aos 81 anos. Um ser humano como ele – leve, centrado e feliz – merecia coisa melhor. Mas a vida, amigos, é injusta, e neste domingo 5 de julho lá se foi um dos meus heróis, levado pela peste chamada covid-19, que assola esse mundo.

Tive o grande prazer de conhecer Bivar por questões profissionais. Na verdade, usei o jornalismo como desculpa para poder falar com ele. Acho que consegui realizar umas cinco entrevistas com Bivar: duas pessoalmente e três por telefone. Por incrível que pareça, sempre tinha algo diferente pra arrancar de sua memória prodigiosa.

Como muitos da minha geração, conheci a obra desse dramaturgo, escritor, produtor e agitador cultural graças ao livro O que é Punk, lançado em 1982, ano em que Bivar organizou o primeiro festival punk do Brasil (O Começo do Fim do Mundo, no Sesc Pompeia, em São Paulo). E só na faculdade, quase dez anos depois, descobri que o sujeito era de Ribeirão Preto, cidade paulista em que vivo desde os meus 15 anos.

Bivar nasceu numa fazenda na região da Serra da Cantareira e depois se mudou com a família para Igarapava e, na sequência, para Ribeirão. Viveu por aqui até os 20 e poucos anos, quando encheu o saco e foi com a cara e coragem para o Rio de Janeiro estudar teatro.  Após, seguiu rumo à capital paulista, onde morou até o fim da vida.Em uma das últimas conversas que tive com ele, dizia estar meio cansado de São Paulo e pensava até em voltar para o interior. Não deu tempo.

Mas ele nunca esqueceu suas raízes e estava sempre em Ribeirão, onde visitava a irmã e os sobrinhos. Seu irmão mais velho era Leopoldo Lima, um dos grandes nomes das artes plásticas do país. Bivar apoiava algumas bandas locais e trocava correspondência com a molecada da mesma forma em que falava com veteranos da cena punk como Jello Biafra, ex-lider do Dead Kennedys. Sobre Jello, contou certa vez que o cara era fanático por Carmen Miranda. ‘Imagina eu dizer pros punks daqui que o líder do Dead Kennedys era fã de Carmen Miranda?”, lembrou.

Uma das últimas entrevistas que fiz com Bivar, em 2016, foi sobre o lançamento do DVD em comemoração dos 30 anos do festival O Começo do Fim do Mundo. Por telefone, ele me contou que teve contato com o movimento punk paulista no início dos anos 1980, quando acabara de chegar de uma de suas várias viagens à Inglaterra. “Londres fervilhava com muitos artistas novos. Quando cheguei ao Brasil, isso aqui parecia a Idade Média. Muito atrasado. A única coisa nova era o movimento punk, que era algo diferente de tudo”, recorda. Bivar ficou tão empolgado com aquela garotada de coturno e jaquetas de couro que pensou em organizar um grande festival com as bandas de São Paulo. “Juntou eu, o Calegari (da banda Inocentes) e o Mingau (do Ratos de Porão) e fomos lá falar com a diretoria do Sesc. Eles toparam de cara, sem que a gente tivesse um projeto sequer”, ressaltou.

O ribeirão-pretano adorava a Inglaterra e desde sempre fez essa ponte entre Londres e São Paulo. No final dos anos 1960, com peças de teatro premiadas no currículo, mandou-se para a capital inglesa num autoexílio junto com o pessoal da Tropicália e o amigo (também dramaturgo) José Vicente. Mineiro de Alpinópolis e que também viveu em Ribeirão Preto, Zé Vicente foi o autor de Hoje é Dia de Rock, que fez um sucesso danado nos anos 1970. Os dois andavam na Picadilly Street de forma tão extravagante que, segundo Bivar, um olheiro da equipe de Stanley Kubrick os convidou para fazer figuração no filme que o diretor estava preparando naqueles anos: Laranja Mecânica.

TUTTI-FRUTTI

Bivar não participou do filme, mas viu nascer o glam rock em terras britânicas, gênero que o deixou maluco. De volta ao Brasil, com mil ideias na cachola, convenceu Rita Lee a entrar de cabeça no glitter e na androginia. “Na época a Rita ainda era muito ligada àquela coisa de anos 1960, muito hippie. Além disso, ela ‘se achava’”, me disse.

O fato é que toda a concepção do que seria a Rita pós-Mutantes saiu da mente de Bivar. Nascia o disco/show Fruto Proibido, um dos clássicos absolutos do rock nacional com a cantora transformada a la Ziggy Stardust e uma banda de craques para acompanhá-la, a Tutti-Frutti. Ah sim, o nome do grupo foi criado por Bivar. “Eu fazia de tudo, até a maquiagem dos meninos. No começo não achavam muito bom não, mas foram se acostumando”, lembra.

Trabalhou com Rita ainda várias vezes, inclusive no programa TVLeezão, que a ruiva fez para a MTV Brasil. Na última vez que falei com Bivar, ele andava chateado com a amiga. Rita brincou maldosamente com alguma coisa que o deixou puto. Assim é Rita: perde o amigo, mas não perde a piada. Porém, descobri por meio do dramaturgo Mario Bortolotto que Rita vivia emprestando dinheiro para Bivar, sem qualquer sinal de retorno, quando a situação apertava.

Enfim, assim era Bivar. Escreveu peças maravilhosas e grandes livros, traduziu clássicos beat (como On The Road, de Jack Kerouac, trabalho feito em parceria com o escritor e jornalista gaúcho e agora youtuber Eduardo Bueno), viveu a vida que quis. Era um lorde sem lenço e sem documento. Ou melhor: um autodeclarado beatnik em pleno interior paulista numa época em que, nem na capital, sabiam o que era isso. Farewell, dude!

TV

Gugu Liberato

Oito motivos para nunca se esquecer do apresentador que fez fama nas noites de sábado e tardes de domingo do SBT e, mais tarde, da Record

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Texto por Janaina Monteiro

Foto: Record/Divulgação

A televisão brasileira perdeu, na semana passada, um de seus nomes mais importantes. O apresentador Gugu Liberato morreu no último dia 22 de novembro, aos 60 anos, após sofrer um acidente doméstico em sua residência em Orlando. Ele deixou esposa e três filhos.

Com quase quatro décadas à frente das câmeras, animando os finais de semana dos brasileiros numa época em que não havia televisão a cabo e plataformas on demand, Antônio Augusto Moraes Liberato fez história no SBT. O paulistano do bairro da Lapa tinha apenas 23 anos quando ficou famoso nos anos 1980 com o programa Viva a Noite, de onde saíram quadros como o icônico “Sonho Maluco”, quando uma fã era sorteada para realizar um desejo ao lado do ídolo, ou o “Sonho de Última Hora”, no qual uma garota do auditório bolava na hora uma peripécia com um dos artistas presentes ali no palco.

Em 1988, depois de passar alguns meses contratado pela Globo e voltar à casa anterior, o animador de auditório recebeu a missão de substituir Silvio Santos no comando de programas dominicais e disputar com a Vênus Platinada no Ibope. O dono do SBT havia passado por uma cirurgia delicada nas cordas vocais e acreditava que não voltaria a se apresentar. Gugu, porém, foi mais que um nome para a sucessão de Silvio. Foi uma espécie de filho que ele nunca teve. Tanto é que, quando Liberato assinou com a Record em 2009, os dois continuaram amigos.

Gugu fez parte de uma era romântica da televisão, com atrações e quadros que hoje não caberiam nas teles digitais politicamente corretas, como a clássica “Banheira do Gugu”, do programa Domingo Legal, transmitido ao vivo nos domingos de tarde. Foi ainda um empresário de visão, sempre revelando artistas musicais que viriam então a fazer sucesso estrondoso.

O Mondo Bacana lista oito motivos para lembrar da trajetória desse veterano apresentador. Viva a Gugu! Viva, viva, viva!

Passarinho quer dançar

Sábado à noite, em meados da década de 1980, era o momento de sentar no sofá e assistir ao Viva a Noite com a família. O programa, que tinha quadros divertidos e trazia artistas famosos na época, encerrava, em 1983, com o clássico “Baile dos Passarinhos”, versão de uma música alemã que fora lançada um ano antes – e sem fazer qualquer sucesso – pela Turma do Balão Mágico

Parada de sucessos sertanejos

No começo dos anos 1990, o Viva a Noite deu lugar ao Sabadão Sertanejo. Era o auge de vendagem de discos de duplas como Chitãozinho e Xororó, Leandro e Leonardo e Zezé di Camargo e Luciano. Detalhe: bandas de pagode também viviam se apresentando por lá.

Tardes de domingo

Ao lado de Silvio Santos, Gugu era o rosto e a voz das tardes dominicais, comandando na mesma emissora programas como Cidade Contra Cidade, Passa ou Repassa, Corrida Maluca e TV Animal.

Compactos de grande sucesso

Durante o período de Viva a Noite, outros clássicos na voz do apresentador foram “Pintinho Amarelinho”, “Bugaloo Da-Da” e “Docinho Docinho”. Clássicos de forte apelo infantil, lançados apenas em compactos de sete polegadas em vinil, que permanecem até hoje no inconsciente coletivo daqueles anos 1980.

Veia dramatúrgica

Além de apresentador, Gugu era um ator de mão cheia, tendo participado de longas-metragens cinematográficos ao lado de Xuxa e dos Trapalhões. No Domingo Legal, ele soltou a veia artística no quadro “Táxi do Gugu”, no qual se disfarçava e assumia o posto de taxista sem que, em princípio, o passageiro soubesse de tudo o que estaria armado. Havia ainda todo um processo meticuloso de maquiagem para torná-lo irreconhecível. Recetemente, o humorista Marcelo Adnet homenageou Gugu na Globo, fazendo o quadro satírico “Domingo Pesado” no programa Tá no Ar – A TV na TV.

Boy & girl bands

Primeiro foi o Menudo, boy band portorriquenha que Gugu lançou no Brasil, fazendo sucesso estrondoso e alavancando a popularidade e audiência do Viva a Noite. Logo depois, ele foi o responsável por lançar famosas boy bands nos anos 1980 e 1990 através da Promoart, empresa de entretenimento dirigida pelo apresentador. Entre estas criações estavam o Dominó (com Afonso Nigro, Nill, Marcos Quintela e Marcelo Rodrigues na primeira formação; o futuro ator e apresentador Rodrigo Faro na última) e o Polegar (com Rafael Ilha como um dos membros originais). Gugu aindaapostou nas meninas, lançando o grupo Meia Soquete, da qual Adriane Galisteu era integrante, e o Banana Split, que contava com a sua futura colega apresentadora Eliana.

Ícones do pop dos anos 1990

Quem não se lembra da original Shakira, morena e com um quilinhos a mais, cantando no Domingo Legal os seus primeiros sucessos em espanhol? E os domingos em que os também saudosos Mamonas Assassinas passavam a tarde inteira na televisão cantando o CD de cabo a rabo e fazendo estripulias ao lado de Gugu e batendo a audiência do rival Fausto Silva na Globo?

Amor incondicional à TV

Gugu era um apaixonado pelo seu ofício. Ele começou a carreira como assistente de Silvio Santos aos 13 anos de odade, depois de tatas cartas cheias de ideias que escrevia para o apresentador, então pertencente ao elenco da Globo nos anos 1970. Aos 22 anos de idade, começou a carreira à frente das câmeras, apresentando sorteios nos intervalos de filmes exibidos à noite pelo SBT. Nas duas últimas décadas, comprou estúdios na região do Alphaville, em São Paulo. Lá, por exemplo, foi rodada a biografia de Hebe Camargo que estreou neste ano nos cinemas brasileiras.

Music

Vanguart

Quarteto faz sua homenagem ao ídolo Bob Dylan em álbum-tributo que reúne muitas faixas de sua fase áurea nos anos 1960 e 1970

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Texto por Janaina Monteiro

Foto: Juan Pablo Mapeto/Divulgação

Bob Dylan é um gênio com suas crônicas e poesias rimadas e musicadas no gênero folk. Por conta de sua complexidade e riqueza artística incomparável, ouvidos menos treinados sempre encontrarão certa dificuldade em absorver sua arte. A voz rouca e o timbre anasalado do cantor e compositor norte-americano podem soar um tanto enjoativo para alguns e as canções quase intermináveis são compridas demais para cativar a atenção das novas gerações acostumadas com a fluidez das coisas. Acompanhar “Hurricane” do começo ao fim, por exemplo, exige uma dose extra de paciência.

Por isso, o recém-lançado álbum do Vanguart é um alento para quem gosta de Bob Dylan. Com uma roupagem despretensiosa e leve, Vanguart Sings Dylan (DeckDisc) é perfeito para se ouvir numa manhã de domingo ou durante uma loooonga viagem ao lado de uma agradável companhia, o que renderá um bom papo cabeça durante o percurso.

A bem da verdade as versões não são tão vanguardistas e seguem à risca o jeito Dylan de ser. Há covers que de tão fiéis às originais ficam quase impossíveis de se distinguir até surgir o vocal. Como “Hurricane” (que conta a história da prisão indevida do boxeador Rubin “Hurricane” Carter) interpretada pelo guitarrista David Dafré (que recebeu esse fardo por saber a letra com 880 palavras de cor).

A banda do vocalista Helio Flanders pode até resistir em inovar nos covers até mesmo para não macular a obra do bardo, mas nos presenteia com surpresas como a bela interpretação da violinista Fernanda Kostchak em “The House Of The Rising Sun”. À medida que se vai escutando o álbum fica clara a intenção da banda em gravar um tributo reverenciando o compositor, instrumentista autodidata, que foi grande influência para dezenas de artistas mundo afora. Aliás, essa homenagem até demorou para ser gravada em disco, porque o Vanguart sempre flertou com Dylan, tocou-o ao vivo e até gravou um especial com covers dele para o Canal Bis.

O deus do folk era respeitado, venerado no meio artístico, sobretudo nos anos 1960 e 1970 e continua sendo um grande influencer para artistas contemporâneos. Entre seus principais discípulos estão Beatles (a quem Dylan teria introduzido a marijuana) e Rolling Stones (que regravaram o clássico de Dylan “Like a Rolling Stone”). Claro que é preciso uma certa dose de preparo para consumir suas composições com seis, oito minutos de duração e seus versos com rimas impecáveis. Goste ou não, Dylan é nome de mestre. Que aprendeu de ouvido a tocar piano e violão. E com seu olhar detalhista, a observar e traduzir o mundo e suas reviravoltas, o que lhe rendeu um prêmio Nobel de literatura em 2016.

No Brasil, ele continua sendo fonte de inspiração para muitos cantores – principalmente do Nordeste – que se aventuraram no árduo e complexo trabalho de traduzir o punhado de canções mais famosas e transpor os versos em inglês impecável para a língua portuguesa. O primeiro que me vem à cabeça e cuja aura mais se aproxima do norte-americano é Zé Ramalho. O paraibano lançou em 2008 um disco com versões de Dylan, como “Knockin’ On Heaven’s Door” Mas a tradução fidedigna do refrão, por exemplo, destoa da versão original: como encaixar “céu” no mesmo acorde de “door” (“Bate, bate, bate na porta do céu”)?.

Outra versão que deve ter dado trabalho foi a de “Romance em Durango” gravada pelo cearense Fagner, que nos primeiros versos dá uma velocidade que mais parece um desespero atropelado para casar letra e música. As rimas originais desaparecem na tradução também fiel à original. A primeira estrofe (“Hot chilli peppers in the blistering sun/ Dust on my face and my cape/ Me and Magdalena on the run/ I think this time we shall escape”) se transformou em “Pimenta quente no sol escaldante/ Poeira no meu rosto e minha capa/ Eu e Madalena na corrida/ Acho que desta vez vamos escapar”.

Esses exemplos levam a concluir que a arte de Bob Dylan deve se perpetuar na língua inglesa. É preciso ouvi-lo no original, caso contrário, pode se perder todo o sentido. Por isso, o álbum de Vanguart é tão significativo por respeitar a voz e a língua do compositor.

Quinze das dezesseis faixas contemplam a primeira fase da sua obra entre suas décadas mais expressivas. Começa com baladas mais suaves como “Tangled Up In Blue” e “Don’t Think Twice it’s All Right”, “Just Like a Woman” (com a clássica gaita na introdução), “Hurricane” e “Like a Rolling Stone” aparecem em sequência, mais para o final do álbum que encerra com a obra-prima “Blowin’ In The Wind”, hino entoado em coro pela banda. Claro que faltam singles bastante conhecidos, como “Knockin’ On Heavens door” (escrita em 1972 por Dylan para o filme Pat Garrett & Billy The Kid) e “Mr. Tambourine Man”. Entrada e prato principal para um segundo Vanguart Sings Dylan, quem sabe.