Music

Violent Femmes – ao vivo

Cultuada banda alternativa americana celebra os 40 anos de seu álbum de estreia tocando-o na íntegra em Los Angeles

Texto por Paulo Biscaia

Foto: Reprodução

Quando se pensa em álbum lendário na história da música pop, daqueles que apresentam vários hits perfeitos, surgem de pronto clássicos como White AlbumThe Dark Side Of The MoonSome GirlsThrillerOK Computer, Purple Rain e mais outros suspeitos de sempre. Só que mesmo alguns destes trabalhos, que são referência para várias gerações, têm uma ou outra canção que desliza e foge do padrão de qualidade do todo. Sempre muito subjetivo, é claro, mas tem.

Existe um album de 1983 que detém o raro feito de ter um conjunto PERFEITO de faixas e nem todo mundo trata dele com a devida reverência. Trata-se do primeiro disco do Violent Femmes, que carrega o mesmo nome da banda. No aniversário de 40 anos de lançamento, a banda fez um show de comemoração no The Novo em Los Angeles e este que vos escreve teve a imensa felicidade de estar presente naquela noite de 16 de novembro. 

A banda entrou e de cara Brian Ritchie abriu com os acordes inconfundíveis da primeira faixa do álbum, “Blister In The Sun”. Com Gordon Gano à frente, seguiram-se então, na exata ordem do disco, cada uma das faixas do album de estreia. Uma mais perfeita que a outra: “Kiss Off”, “Please Do Not Go”, “Add It Up”, “Confessions”, “Prove My Love”, “Promise”, “To The Kill”, “Gone Daddy Gone” e “Good Feeling”.

Ritchie no baixo (e mais voz e mais xilofone e mais um monte de outras coisas) e Gano na guitarra (e voz e violino e banjo e mais outras coisas), estavam acompanhados de dois jovens integrantes que certamente nem tinham nascido na época da estreia dos Violent Femmes. Um deles, um sujeito misteriosamente pomposo, todo de preto com um enorme chapéu de caubói, ficava de pé, imóvel, e entrava pontualmente em momentos para tocar uma singular tuba/sax barítono tão gigante que era maior que o próprio músico (e bem maior que o baixinho Gordon Gano). O jovem baterista seguia a tradição do original Victor de Lorenzo. Ao apresentá-lo, Ritchie disse que LA tem os mais bateristas incríveis por metro quadrado, mais do que qualquer outro lugar do planeta, mas que nenhum “tocava churrasqueira como ele toca”. Sim, a velha churrasqueira de metal ainda é o padrão de bateria e percussão do som único dos Femmes. 

Terminadas as faixas do disco de estreia, teria alguma outra música à altura? Claro! “Jesus Walking On The Water”, “Country Death Song”, “I Held Her In My Arms” e outras que culminaram com o grand finale de “American Music”. Uma aventura sonora conduzida por um grupo de instrumentistas ousados, inquietos e com letras provocadoras sobre o frágil american way of life

Depois de quase duas horas de show de arrepiar e tantas faixas memoráveis será que eles tinham gabaritado tudo o que há de perfeito em toda a discografia? Andando ao meu lado no corredor de saída, uma fã de 20 e poucos anos disse que faltou “Waiting For The Bus”. Só pensei: “Sim! Faltou essa. Amo essa música”. Pois é!

Violent Femmes é uma das bandas mais consistentes que já ouvi e lamentavelmente pouco lembrada nas listas de melhores de todos os tempos. A volumosa quantidade de composições incríveis da banda de Milwaukee garante seu lugar no panteão dos gigantes. Pelo menos ela está aqui no meu e no das pessoas que saíram maravilhadas do The Novo.

Set list: “Blister In The Sun”, “Kiss Off”, “Please Do Not Go”, “Add It Up”, “Confessions”, “Prove My Love”, “Promise”, “To The Kill”,  “Gone Daddy Gone”, “Good Felling”, “Jesus Walking On The Water”, “I’m Nothing”, “Memory”, “Country Death Song”, “I Could Be Anything”, “Old Mother Reagan”, “Dance Motherfucker Dance”, “Color Me Once”, “I Held Her In My Arms”, “Black Girls” e “Give Me The Car”. Bis: “I’m Not Gonna Cry” e “American Music”.

Movies

Não se Preocupe, Querida

Thriller psicológico com Florence Pugh e Harry Styles e sobre o american way life nos anos 1950 naufraga com roteiro raso e final insatisfatório

Texto por Carolina Genez

Foto: Warner/Divulgação

Tudo se passa nos anos 1950, quando acompanhamos  Alice Chambers (Florence Pugh), uma dona de casa que vive em uma comunidade experimental cercada por um deserto. Enquanto os homens da vizinhança saem para trabalhar no misterioso Projeto Vitória, também responsável pela região, as mulheres conversam, limpam a casa e cozinham vivendo uma vida previsível. Os dias passam até que Alice passa a se questionar sobre o local onde mora e com o que o marido Jack (Harry Styles) trabalha.

A história de Não se Preocupe, Querida (Don’t Worry Darling, EUA, 2022 – Warner) começa interessante, mostrando como é a vida de Alice. Imersa em um verdadeiro American Way of Life, faz café e se despede de Jack, arruma a casa, depois vai até a cidade fazer uma aula de balé e, por fim, volta para preparar o jantar e receber o marido. Apesar de pacata, essa vidinha a faz feliz: o marido a trata bem, ela tem amigas com quem conversa e fofoca constantemente, mora numa bonita e organizada residência enquanto Jack está na concorrência para uma nova promoção em seu trabalho. 

As coisas, porém, começam a desandar quando uma antiga amiga de Alice, Margaret (KIKI Layne) vai ao deserto, onde os moradores são constantemente alertados a não entrar. Lá ela também tece questionamento sobre a comunidade experimental e principalmente sobre o chefe do marido, Frank (Chris Pine). A partir dos alertas de Margaret, Alice observa mais aquela comunidade e vai percebendo que as coisas não são o que parecem.

A parte de terror da trama é muito bem executada, deixando o espectador sentir todo o nervosismo passado por Alice, já que ela não só indaga a comunidade como também passa a ser taxada como lunática pelos moradores. As cenas de tensão são muito bem dirigidas e planejadas de fato sufocando os espectadores. Parte disso acontece muito por conta da trilha sonora, que além de contar com músicas da época faz com que os sons incidentais transmitam aquela sensação estranha quando colocados no contexto certo. Aqui ainda há a composição de John Powell, que remete a sons de respiração justamente ajudando a aumentar o sufoco vivido por Alice.

O filme tinha muito potencial. Sua ambientação é maravilhosa e imersiva, de fato jogando os espectadores para 1950 com os figurinos e penteados da época e também mostrando um subúrbio colorido e alegre, similar a um conto de fadas, ao estilo das propagandas de revista do american way of life. Parte disso acontece graças à maravilhosa fotografia de Matthew Libatique ,que se aproveita das paisagens para criar bonitos planos e ainda dos aspectos coloridos dos cenários. Tudo isso para a sensação de vida perfeita.

Porém, Não se Preocupe, Querida não consegue atingir seu propósito como um todo. O roteiro é um dos grandes vilões, entregando uma narrativa que acaba decepcionado com resoluções nada satisfatórias e explorando o mínimo boa parte dos personagens. Apesar do público conseguir se conectar com Alice, até por seguir e ir descobrindo a trama junto com ela, todos os outros são muito mal aproveitados, já que não são exploradas as motivações deles, soando caricatos e desinteressantes. 

Em relação às atuações, o elenco pode não impressionar mas ainda assim consegue convencer o público com performances medianas. Uma das grandes perdas é o não aproveitamento de Chris Pine: seu personagem parece ser interessante, mas acaba sendo mal utilizado, servindo apenas para sorrisos falsos e ameaças passivo agressivas. Gemma Chan também não agrega muito. Já Harry Styles, um dos grandes chamativos de público do filme, é ok. 

A maravilha fica por conta de Florence Pugh, que vem de uma sequência de impecáveis performances com Midsommar e Adoráveis Mulheres. Em Não se Preocupe, Querida não é diferente. Novamente mostrando ser uma das grandes promessas de Hollywood, a atriz entrega uma humana e muito realista com sua dona de casa que passa por diversas sensações de horror e pânico e que vai ganhando confiança conforme o filme se desenvolve. Na pele de Alice, consegue passar com perfeição toda sua angústia e agonia, de maneira que se torna extremamente fácil do lado de cá da tela torcer por ela. Pugh tem presença marcante e puxa a atenção em qualquer cena que participe. Comunica-se com o espectador apenas com olhares e expressões corporais. Talvez sua performance a leve a algumas indicações ou prêmios da temporada.

O roteiro se prolonga em aspectos desnecessários, complicando mais ainda a narrativa. Pior é quando chega a autossabotagem lá pelo meio, quando uma reviravolta fraca e previsível não condiz com os primeiros 40 minutos. Até há a tentativa de trazer críticas sobre o machismo e a própria vida que as mulheres do filme vivem, porém estas são colocadas de forma rasa e acabam se perdendo no meio das muitas informações presentes. Aí tudo chega ao final de forma aberta, anticlimática.

Dirigido por Olivia Wilde, esse foi um dos títulos mais aguardados e também polêmicos de 2022 (por conta de diversas tretas e brigas nos bastidores). As expectativas estavam altas pela promessa de thriller psicológico com um mistério conduzido pelo estranhamento. Entretanto, apesar de ambicioso e de parecer original à primeira vista, não consegue suprir as expectativas conquistadas em seu desenrolar. Talvez por isso mesmo venha agora, com sua chegada às telas, uma enorme desilusão. 

>> Leia aqui a resenha de Meu Policial, o outro filme protagonizado por Harry Styles em 2022

>> Leia aqui oito motivos para não perder um dos concertos da turnê de Harry Styles, que passa pelo Brasil (São Paulo, Rio de Janeiro e Curitiba) neste início de dezembro

Music

Prince

Novo álbum póstumo traz a banda de apoio New Power Generation em primeiro plano e apresenta clima de ensaio a céu aberto

Texto por Fabio Soares

Foto: Divulgação

Durante muito tempo, o termo The Vault atiçou a imaginação de ferrenhos fãs de Prince Rogers Nelson. Trata-se do porão-cofre-mina de ouro-caixa preta-arquivo master contendo todo o acervo audiovisual do artista instalado em Hollywood. O obsessivo controle sobre sua obra transformou The Vault em um ambiente inacessível a qualquer um que tentasse se aproximar. Após a morte do artista, ocorrida em 21 de abril de 2016, o arquivista Michael Howe deu a dimensão da excentricidade do ambiente. “The Vault está instalado num espaço de alta segurança, climatizado, à prova de oscilações ambientais e acidentes naturais”, afirmou, em 2019, sem revelar a exata localização do ambiente nem debaixo de um decreto.

Fonte quase inesgotável de pesquisa, The Vault já havia dado ao mundo nove álbuns póstumos de Prince. No final de julho, o décimo desta esteira deu seu ar da graça. Gravado na primavera de 2010, Welcome 2 America (Legacy/Sony) traz um Prince que queria distância dos holofotes.

De forma discreta e emulando um rap, sua voz abre o disco com a faixa homônima com uma incisiva crítica ao american way of life (“Bem-vindo à America/ Onde você pode falhar no seu trabalho/ Seja demitido, recontratado/ E receba uma gorjeta de setecentos bilhões de dólares”). Depois, a trinca de ases formada por “Running Game (Son Of A Slave Master)”, “Born 2 Die” e “1000 Light Years From Here” apresenta a cozinha standard da New Power Generation – sua principal banda de apoio durante a carreira – em sua melhor forma, fincando os pés no r&b com matadoras linhas de baixo. Em “Hot Summer”, camadas de sintetizadores tentam dar à faixa um ar oitentista sem parecer piegas.

O clima do disco é de um ensaio livre, porém com regras a serem cumpridas. Longos solos de guitarra são proibidos. Larga duração das faixas, idem. A ordem é passar a mensagem da forma mais crua possível, como na belíssima “Stand Up And B Strong” com seu quase otimismo gospel (“Está quase amanhecendo/ Levante-se e seja forte/ Encontre uma nova canção/ Antes que eles se vão”). Exercita ainda seu lado crooner na romântica “When She Comes” (“Quando ela vem/ Nunca fecha os olhos/ Não, não, não/ Ela pode ver estrelas”) para, a seguir, novamente pôr seu swing à prova em “1010 (Rin Tin Tin)”. E vamos combinar que em matéria de swing a NPG manja dos paranauê tudo.

Se tivesse saído em turnê baseada em Welcome 2 America, Prince iria se apresentar em pequenos palcos e clubes porque a sonoridade do disco em nada solicita o apelo de grandes arenas. Estaria ele propositalmente procurando intimistas ambientes a fim de se desintoxicar? Apostaria um braço que sim. Com um combo sonoro aos seus pés, um dos maiores artistas do século 20 podia experimentar à vontade em 2010. Bem verdade que Welcome 2 America está longe de tentar ser um dos momentos mais brilhantes de Prince. É um ensaio. Momento este em que o músico pode (e deve) usar como um “esquenta”. Ideal para audições despretensiosas, sem cobranças, de forma leve. Leve, como nossas vidas deveriam ser.

Music

Arquivo MB: Prodigy – ao vivo (2011)

Liam Howlett, Keith Flinn e Maxim Reality mostraram em Curitiba o quão rock’n’roll pode ser a música eletrônica

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Texto por Abonico R. Smith

Foto: iaskara

>> Veja mais fotos deste show aqui

Inale, inale. Depois exale, exale. Você é vítima, afinal. E o Prodigy mostra que possui o veneno e também o antídoto. É assim uma apresentação ao vivo do grupo inglês que acaba de fazer a sua segunda passagem por terras brasileiras demonstrando que, após duas décadas, eles ainda têm muito o que incendiar.

O primeiro dos dois shows por aqui foi na madrugada de sexta (9 de novembro) para sábado (10), durante o evento que comemorou os dez anos da Vibe, um nightclub de música eletrônica da capital paranaense. Por falta de um local mais adequado para o show (leia-se “a Pedreira Paulo Leminski continua interditada pelo Ministério Público para eventos musicais de grande porte”), o palco para Liam Howlett, Keith Flint e Maxim Reality foi armado sob o galpão do Expotrade, um local para feiras e convenções que de vez em quando também abriga concertos. Apesar da inadequação do local para o tipo de performance (dava para ver as lâmpadas de luz fria no teto acima dos ingleses e o som estava baixo demais para a potência do trio) e do atraso de mais de uma década em relação ao auge do grupo, não teve como não se levar pela empolgação e arrastão sonoro provocado pelo set baseado no mais recente lançamento, o CD e DVD World’s On Fire, gravado ao vivo em uma grande arena londrina.

Logo de cara, Howlett e seus asseclas (os dois vocalistas mais os dois músicos de apoio – o baterista Leo Crabtree e o guitarrista Rob Holliday, que de vez em quando também segura o contrabaixo) já mostravam que não tinham vindo para dar moleza aos curitibanos. Depois da introdução, atacaram com a premiére mundial de uma música ainda inédita em disco. “A.W.O.L” é uma sigla de significado dúbio: pode ser interpratada tanto como “American Way Of Life” (estilo de vida estadunidense) como “Absent Without Official Leave” (ausente sem permissão oficial, termo criado e ainda bastante utilizado no âmbito militar). Nas mãos do Prodigy virou uma pancadaria punk, com guitarras duelando com os sintetizadores nos barulhos e nas harmonias e a bateria mais reta que um fã do Prodigy poderia ouvir de sua banda preferida. Isto é, nada dos breakbeats acelerados do hip hop, que tornaram a banda um dos estandartes do subgênero eletrônico que ficou conhecidos nos anos 1990 como big beat.

Em “A.W.O.L.”, Maxim e Keith já faziam a sua parte, pulando sem parar, ocupando todos os espaços vazios do palco e inflamando o público com berros e gritos de comando. Logo depois o jogo tornou-se ganho com o megabit “Breathe” vindo na sequência. A trinca de sucessos ainda foi complementada por “Omen” e “Poison” (um technoragga resgatado lá do início de carreira do trio e que não costuma aparecer muito nos sets da atual turnê). Pronto. Receita eficaz de como começar de maneira arrebatadora um show. A plateia estava completamente na mão, dominada por completo e sem muito tempo para respirar como Maxim manda na letra de “Breathe”.

O miolo do set foi dominado por obras mais recentes, lançadas no último álbum de estúdio (Invaders Must Die, de 2009), já lançado selo próprio do grupo. Com pegada rock bem menor e abusando dos timbres de sintetizadores e batidões perfeitos para academias de ginástica, foi o momento que mais agradou à turma do step e do spinning. Por falar nisso, enganou-se quem achou que a vinda do Prodigy a Curitiba levaria ao local o público mais rock’n’roll da cidade. Era incrível a multiplicação de marombados e piriguetes por metro quadrado, talvez a maior já vista na cidade durante este ano. Ficava até divertido ver o deslocamento de muitas destas garotas, sempre montadas na altura dos saltos e com roupas pequenas e justas para realçar seios e outras partes do corpo. O movimento das danças era completamente descoordenado da velocidade das BPMs e muitas mãos jogadas para o alto não sabiam se faziam o chifrinho do heavy metal, os dedos abertos do hang loose, as armas apontadas dos rappers ou tudo ao mesmo tempo. Teria se saído melhor quem preferisse apontar apenas o dedo médio para cima, mas, pensando bem… A atitude ROCK que sobrava no palco faltou em demasia naquela multidão pouco punk e mais sintonizada com o line up de DJs locais e estrangeiros que se estenderia até o dia clarear.

O miolo pode ter sido morno, aquecido apenas com um “Firestarter” aqui e outro “Voodoo People” ali (duas faixas dos anos 1990, a fase mais rocker do Prodigy) e uma boa versão dubsteppara “Thunder”. Contudo, o final deu uma esquentadinha com mais duas faixas extraídas de The Fat Of The Land, a obra-prima lançada pela banda em 1997). “Diesel Power” e “Smack My Bitch Up” são duas faixas com origem nos versos escritos pelo rapper Kool Keith, do grupo eightie Ultramagnetic MCs. Na última, o povo cantou em coro as duas frases que compõem a letra (“Change my pitch up/ Smack my bitch up”).

Na volta para o bis, três das quatro canções normalmente reservadas para este objetivo. Se faltou a melhor delas, “Everybody In The Place”, da época raver dos primeiros anos do Prodigy, a presença de outras duas contemporâneas (“Thier Law” e “Out Of Space” – esta, mais uma boa queda de Howlett e seu MC Reality pros lados do ragga) compensaram a barriga do set list e deram mais um gás em quem ficou até o final da performance dos dois vocalistas hiperpilhados e o cérebro musical quase sempre escondido por trás dos sintetizadores e computadores.

Set List: “Intro”, “A.W.O.L.”, “Breathe”, “Omen”, “Poison”, “Thunder (Dubstep)”, “Warrior’s Dance”, “Firestarter”, “Run With The Wolves”, “Voodoo People”, “Omen (Reprise)”, “Invaders Must Die”, “Diesel Power”, “Smack My Bitch Up”. Bis: “Take Me To The Hospital”, “Their Law”, “Out Of Space”.

>> Leia aqui a notícia sobre a morte de Keith Flint e a trajetória do Prodigy

Music

L7

Oito motivos para você não perder a volta da banda ao Brasil depois de um intervalo de vinte e cinco anos

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Texto por Abonico R. Smith

Foto: Divulgação

Vinte e cinco anos separam a histórica passagem do L7 pelo Brasil, em pleno auge do rock alternativo, da segunda vinda da banda ao país. Foi preciso esperar um quarto de século para ver de novo por aqui Donita Sparks (guitarra e voz), Suzi Gardner (guitarra e voz), Jennifer Finch (baixo e voz) e Dee Plakas (bateria), ícones daquela época áurea em que vocais berrados, guitarras sujas e distorcidas e uma estética que cruzava informações vindas do punk rock e do heavy metal saíram do subterrâneo para tomar de assalto o mainstream, a imprensa corporativa, as grandes gravadoras, as filiais da MTV e o gosto das pessoas espalhadas ao redor do planeta.

Depois de um longo tempo em inatividade, a banda voltou à ativa em 2015 com sua formação clássica. Ainda é esperado um disco novo, com faixas inéditas. Mas enquanto isso não acontece, as quatro “gurias” (hoje na faixa entre os 50 e 60 anos) estão volta às turnês, tocando aqui, ali e em todo lugar. Na primeira semana de dezembro será a vez do Brasil recebê-las, com cinco datas em cinco capitais diferentes. O giro começa pelo Rio de Janeiro no dia 1 de dezembro (mais infos aqui). Depois segue para São Paulo no dia 2 (mais infos aqui). No dia 4, a escala será em Porto Alegre (mais infos aqui). No dia 5, em Curitiba (mais infos aqui). Por fim, no dia 6, em Belo Horizonte (mais infos aqui).

Para celebrar o retorno do L7 ao país, o Mondo Bacana preparou uma relação com oito motivos para você não perder a nova passagem da banda por aqui.

Documentário

Dirigido pela cineasta Sarah Price, o documentário L7: Pretend We’re Dead foi lançado em 2016, depois de uma campanha de crowdfunding que arrecadou fundos para a sua realização. O filme conta a história da banda do underground ao estrelato e, então, de volta ao underground até o fim das atividades em 2001. São muitas imagens de arquivo e acervo pessoal com trechos de shows e festivais, curiosidades de bastidores e depoimentos de Donita, Suzi, Jennifer e Dee em off. Por enquanto, a obra pode ser vista em streaming nos Estados Unidos através da Amazon. Em breve deverá estar disponível aqui no Brasil também.

Nada de girl band

Se existe uma coisa que elas deixam claro logo nos primeiros minutos de L7: Pretend We’re Dead é para não chamá-las de “banda de garotas”. Afinal, essa questão da diferenciação pelo gênero – e sempre através de um modo tão comparativo quanto negativo, diga-se de passagem – já é uma coisa tão batida, sem noção e sem sentido que elas já disparam que estão enojadas e cansadas de que usem isso a respeito do grupo. Donita afirma que rejeita toda a imagem criada ao longo destes anos pelo fato do L7 nunca ter sido algo que a pessoas pudessem esperar delas, sobretudo pela questão de não se encaixar no que se chama de estereótipo da beleza feminina.

Punk porém também heavy

O L7 foi formado na esteira de um cenário punk e hardcore criado por jovens que não se encaixavam com a apatia de seus semelhantes durante o governo Ronald Reagan nos 1980. Paralelamente a isso, na cidade em que as musicistas viviam (Los Angeles), o rock era tomado pelo mainstream de bandas glam metal, mais preocupadas com o visual andrógino e a estética da cosmética, levada aos extremos comerciais através dos videoclipes em alta rotação na MTV norte-americana. Entretanto, o heavy clássico, mais sujo e poderoso, também faz parte da formação delas. Isso pode ser facilmente notado em diversas faixas de álbuns como Smell The Magic (lançado pela Sub Pop em 1990) ou Bricks Are Heavy (de 1992, quando a banda era contratada do selo Slash, então ligado às gravadoras major Warner nos Estados Unidos e PolyGram no resto do mundo). São muitos riffs, pedais de efeito e power chords – sem falar que Donita leva uma guitarra Flying V a tiracolo ao subir em um palco. A vocalista também se ressente do fato do grupo nunca ter sido convidado até hoje para participar de um festival dedicado a bandas heavy metal nos Estados Unidos. “Ne Europa nos aceitam muito bem e volta e meia participamos destes eventos. Mas em nosso país isso nunca aconteceu.”

Bricks Are Heavy

Responsável pela sonoridade assumidamente pop (porém sem negar as origens alternativas) de vários discos de sucesso da época – como Dirty (Sonic Youth), Nevermind (Nirvana) e Siamese Dream (Smashing Pumpkins) – o produtor Butch Vig também conseguiu fazer o mesmo com o L7 em Bricks Are Heavy. Deixou toda a sujeira sonora lá, mas conseguiu aparar as arestas e arredondar as músicas compostas e cantadas por Donita, Suzi e Jennifer, inclusive fazendo os mesmos com seus vocais. O resultado foram três grandes hits (“Pretend We’re Dead”, “Monster” e “Everglade”), indispensáveis em qualquer set list do L7 até o final dos tempos da banda. Mas o repertório dos atuais shows da banda não se sustenta apenas nessas faixas do disco. Outras menos conhecidas na época continuam bastante poderosas quando tocadas ao vivo. É o caso de “Scrap”, “Slide”, “One More Thing” e “Shitlist”. Os versos desta última, que sempre encerra todo bis, permanecem atualíssimos como um grito de guerra feminista.

Agent Orange

Na volta para o bis de cada show, a banda rende sua homenagem a uma histórica banda dos primórdios do punk rock oitentista americano. Primeiro single lançado em 1979 pelo trio Agent Orange, a música “Bloodstrains” é um petardo que não dura sequer dois minutos. Seus versos tratam da rejeição completa ao american way of life, onde a felicidade parece sempre rimar com estabilidade financeira, família e aquela vida bem baunilha. A gravação oficial do L7 para esta música está no álbum-compilação Teriyaki Asthma Vols 1-5, lançado em 1992 pelo microsselo independente C/Z, criado pelo casal Chris Hanzsek e Tina Casale em Seattle em 1985. Deste disco também fazem parte gravações raras de outras bandas de suma importância naquele momento do rock alternativo, como Nirvana, Babes In Toyland e Gas Huffer. Todas ainda em fase pré-fama, fazendo seus shows em pequenas casas e viajando pelos Estados Unidos em carros e vans.

Brasil, janeiro de 1993

O festival Hollywood Rock de 1993, realizado no segundo e no terceiro final de semana de janeiro, respectivamente em São Paulo e no Rio de Janeiro, trouxe uma escalação memorável. Duas das três noites eram reservadas a bandas internacionais que estavam, naquele momento, no auge de suas carreiras mundiais, fato até hoje não superado por qualquer outro evento do tipo em solo brasileiro. Uma das noites trazia o Alice In Chains e, como headliner, o Red Hot Chili Peppers. A outra, no mesmo esquema, era composta por L7 e Nirvana. E o show do L7 acabou sendo tão memorável quanto o de Kurt Cobain, Krist Novoselic e Dave Grohl. O estádio do Morumbi (onde este que aqui escreve estava presente) chacoalhava na noite do sábado 15 com a multidão pulando sem parar no gramado, cadeiras e arquibancada. Não foi bem um aquecimento para o trio principal, já disparado no topo das paradas mundiais, mas sim um show de primeira e que deixou todo mundo tão suado quanto. No Rio de Janeiro, sete dias depois, foi tudo igualzinho (conforme você pode checar aqui, assistindo à gravação da apresentação de mais de uma hora na íntegra).

Tampax em direção à plateia

A edição de 1992 do Reading Festival, na Inglaterra, entrou para a História pela trolagem do Nirvana. Havia uma expectativa negativa em relação ao show do trio porque Kurt Cobain estava entrando e saindo de períodos na rehab e muito se falava sobre a possibilidade da gig no evento ser cancelada. Sem qualquer aviso, Dave Grohl entrou no palco empurrando Kurt sentado em uma cadeira de rodas e com roupa hospitalar. O vocalista simulou uns espasmos e jogou-se ao chão, assustando e arregalando os olhos de todos. Posteriormente levantou-se e fez um puta show à frente de sua banda. Mas o L7 também deu sua bela contribuição para fazer aquele verão ser inesquecível para quem estava lá no festival. A apresentação do quarteto foi um grande caos. A tensão já era grande no início, quando começou a haver problemas técnicos no som. A plateia ensandecida e à espera do Nirvana, reagia contra o grupo. A banda chegou a trolar todo mundo que queria mainstream começando a tocar o riff de “Enter The Sandman”, do Metallica, para depois parar tudo e xingar ao microfone. Depois, muita gente passou a arremessar lama em direção às integrantes. Irritadíssima, Donita não pensou duas vezes. Pôs a mão dentro da calcinha, arrancou o tampax, mostrou-o a todo mundo e arremessou-o em direção às pessoas, provocando reações de espanto e nojo em muitos. Apesar da gravação tosca e cheia de problemas, este fatídico show do L7 também está registrado no YouTube (veja aqui). O “incidente” do tampax – que chegou a ser incluído entre os cem melhores momentos de toda a história do heavy metal pelo canal de TV VH1 (veja aqui) – ocorre quase no final, aos 40 minutos e 24 segundos, assim que acaba a penúltima música do set list.

#Resist

Em entrevistas já publicadas por veículos brasileiros, Donita já deixou clara a sua total antipatia pelo próximo presidente que está por assumir nosso país. Só que, ao contrário do que muita gente estúpida poderá (e deverá) afirmar, a vinda do L7 não tem nada a ver com financiamento da Lei Rouanet, nem a banda não precisa de promover de qualquer forma ou deve manifestar interesse em ir à Polícia Federal em Curitiba para visitar o ex-presidente Lula. As quatro integrantes do grupo começaram a tocar durante o governo neoliberal de Ronald Reagan, que ocupou a Casa Branca entre 1981 e 1989. Depois, quando anunciaram o hiato das atividades em 2001, aguentaram mais oito anos de George W. Bush até 2009. Atualmente ela não perde a chance de dizer que adoraria jogar em Donald Trump seu tampax. “Parece que quando esses imbecis estão no poder, o punk se reaviva. A resistência dos artistas também. A música ajudou a derrubar o apartheid nos anos 1980. Ajudou os movimentos sindicais nos EUA dos anos 1930. O folk e a música de protesto ajudaram nas manifestações contra a Guerra do Vietnam. Eu acho muito importante os artistas e as pessoas em geral resistirem a toda essa merda, fazendo qualquer coisa que elas façam de melhor”, declarou Sparks ao site WikiMetal (leia toda a entrevista aqui).