Music

Pato Fu – ao vivo

Celebração de 30 anos de carreira mostra a arte do grupo de se multiplicar em diversas e absurdas identidades de si mesmo

Texto e fotos por Abonico Smith

Existe um desenho de Hanna-Barbera, lançado em 1966, chamado Impossíveis. Nele, três músicos de uma banda de rock que faz muito sucesso, de vez em quando, transformam-se em super-heróis para salvar as pessoas de terríveis ameaças vilanescas. Todos possuem um alter ego: Homem-Mola, Homem-Fluido e Multi-Homem. Este último tem como superpoder a capacidade de se multiplicar em várias cópias de si mesmo para confundir o inimigo, que pode até destruir uma ou outra criatura nunca consegue pegar a original. Dos três também é ele quem mais se assemelhava a um instrumentista de banda dos anos 1960, por ser o mais desligado e desgrenhadamente cabeludo dos três.

No mundo do rock mas fora do universo cartunesco, há dois bons exemplos de quem também toca instrumentos e prima pelo poder da multiplicação. Um deles é limitado, reduzido a um único videoclipe. Em “The Hardest Button To Button”, o White Stripes se reproduz em vários a cada tempo da batida da música, utilizando ainda a tridimensionalidade de um cenário externo para realçar o psicodelismo do audiovisual. Já o outro nome não faz isso apenas para osnossos olhos, mas sim na questão da estética sonora. E com duração de diversos videoclipes, mais do que uma dezena de álbuns e três décadas ininterruptas de carreira.

Este nome é o Pato Fu, umas das bandas que cravou a cidade de Belo Horizonte no mapa do mainstream do rock nacional durante os anos 1990. E desde então foi construindo uma trajetória sólida, sempre seguindo uma máxima interna: sempre procurar por novos caminhos no disco subsequente. Assim não só se evitou o comodismo, a rotina e a repetição que têm grande risco de surgir durante a estadia na zona de conforto. Assumir riscos, procurar outras sonoridades e se transformar em um Pato Fu diferente a cada trabalho foi justamente o que garantiu a sobrevivência do incialmente trio, por um bom tempo quarteto e hoje quinteto. Longe de significar uma esquizofrenia relacionada a distintas identidades que não dialogam entre si, este constante desafio transformou o grupo em uma bela instituição de repertório, capaz de criar ao longo dos anos diferentes opções de espetáculos (trilhas sonoras, a banda que flutua entre o pop e o alternativo, o Música de Brinquedo) e garantir um séquito fiel de fãs capaz não só de comprar a proposta da variedade como também embarcar junto com os integrantes em viagens no melhor estilo quanto mais absurdo melhor.

Na noite de 30 de setembro, foi a vez do Teatro Guaíra, em Curitiba, receber o espetáculo que celebra as três décadas de Fernanda Takai (voz, guitarra e violão), John Ulhoa (guitarras e vocais), Ricardo Koctus (baixo e voz) e Xande Tamietti (bateria) e Richard Neves (teclados). A turnê passeia pelo Brasil como um dos atrativos elaborados para este momento especial. Dois discos (um álbum de inéditas e um EP ao vivo no estúdio) já estão devidamente disponibilizados em streaming e ainda vêm mais novidades por aí. Enquanto isso o grupo gira por aí pinçando um pouco de cada disco (uns com mais faixas incluídas no set list, outros com menos) e levando a novos e velhos fãs um pouco do que de melhor fez de 1992 para cá. A sonoridade é a de banda. Muitas canções, portanto, aparecem ligeiramente modificadas, já que os álbuns iniciais ainda tinham uma boa carga de programações e batidas eletrônicas, fornecidas outrora pelos 128 japoneses que acionados por meio das traquitanas comandadas por John.

Durante o passeio de uma hora e meia e 25 canções, ficou mais do que claro que do Pato Fu você pode esperar tudo. Mas tudo mesmo. Parte de um set que abandona alguns hits radiofônicos/emetevísticos em prol de b-sidescultuados. Aparacem também alguns covers (Mutantes, Graforreia Xilarmônica, Legião Urbana) que, com maestria e personalidade, ganham um novo revestimento que se metamorfoseia em identidade de Fu e se encaixa no multiverso sonoro do grupo. Dá para esperar também que os mineiros sejam capaz de tirar da manga uma carta (ou melhor, uma música) pela qual ninguém, absolutamente ninguém da plateia espera que seja tocada.

set list começou com ótimos exemplares daquele Pato Fu lá do início, antes mesmo do primeiro contrato para lançar um disco. “Spoc” estava presente na primeira demo tape do então trio e já escancarava as esquisitices de Fernanda, John e Ricardo: pérola pop em compasso ternário, citando os protagonistas de um dos seriados mais cultde todos os tempos (Star Trek, mais precisamente um episódio em que a ética no trabalho era abordada) e tendo uma só uma estrofe, longa e cantada em francês e português, mais refrão minimalista em que cabe até o cacarejo de galináceos. Desde o início, com arroubos ousadia e perfeição, provava-se que tudo, de fato, cabia no Pato Fu.

Na sequência veio “O Processo de Criação Vai de 10 a 100 Mil”, o primeiro videoclipe, faixa gravada no primeiro álbum. Groove irresistivelmente dançante, refrão pegajoso (que falava em ficar pulando alguns anos antes de Sandy & Junior!) e o início do diálogo entre som e imagem, algo no qual viria a ser uma especialidade da banda ao longo de sua trajetória. Enquanto os instrumentistas tocavam em cima de uma base eletrônica no palco, o telão começava a desfilar, simultaneamente, os clássicos clipes produzidos pelos Fus, lembrando o tempo em que o mercado fonográfico nacional ainda procurava aliar qualidade criativa à estética rock’n’roll no audiovisual televisivo.

“Sobre o Tempo”, a primeira faixa emplacada em playlists radiofônicas, completou a trilogia “raiz” que abriu a noite servindo como um espécie de passagem filosófica para o que viria depois: a alternância entre os lados A e B do Pato Fu, o diálogo entre boas faixas “escondidas” no meio dos discos lançados e ouvidos de cabo a rabo pelo fãs e um punhado de sucessos de um grupo mineiro que soube conviver pacificamente entre o underground e o mainstreamdo rock nacional. Nestas três décadas, como uma espécie de profecia de parte do que estava ali na letra daquele primeiro grande hit, o tempo mostrou que correu macio, zunindo como um novo sedã, bem amigo e ainda longe de um final para derrubar a banda.

Na segunda categoria, foram desfiladas canções como “Antes Que Seja Tarde” (início de parcerias bem sucedidas do grupo com o estilista Ronaldo Fraga e o diretor Hugo Prata, com videoclipe fofo misturando ares góticos com a comédia dell’arte), “Depois” (letra fofinha de interpretação aberta – que inclui a possibilidade de abertura de relacionamento ou a chegada de um filho para o casal – casada com um divertido vídeo de terror trash, com direito a neve fake e urso bípede sanguinário), “Ando Meio Desligado” (gravada para a abertura de uma novela das sete da Globo), “Eu” (clássico subterrâneo do rock gaúcho popularizado pelos mineiros por meio de um divertido clipe premiado no VMB), “Canção Pra Você Viver Mais” (presente composto por John como uma espécie de homenagem ao pai de Fernanda), “Anormal” (versos pop de puro romantismo cujas imagens foram pioneiras no uso do equipamento de motion caption aqui no Brasil), “Perdendo Dentes” (reflexões filosóficas em formato de música pop suave), “Made In Japan” (irresistível blend de Muppets Show, versos escritos em japonês, seriados nipônicos com robôs, letra absurdamente sci-fi e vídeo 100% digital) e “Eu Sei” (homenagem groovy aos ídolos da Legião Urbana, que acabaram virando fãs dos Fus).

Com o resto do repertório nem deu para sentir falta de pérolas que ficaram de fora da noite, como “Por Que Te Vas”, “A Necrofilia da Arte”, “Sítio do Picapau Amarelo”, “Qualquer Bobagem”, “Pinga”, “Mamãe Ama é o Meu Revólver” ou “Uh Uh Uh, La La La, Ié Ié”. Clássicos gravados (sejam autorais ou as releituras bem particulares) são o que não faltam para os Fus, afinal. “Água”, “Simplicidade” e “Licitação”, por exemplo. Todos com letras primorosas. A primeira é um belo exemplar de uma época em que novas bandas brasileiras buscavam renovar o rock cantado em português misturando sotaques, ritmos e tonalidades regionais desse extenso país (“Nóis mora aqui no poeirão/ E existe todo dia uma hora da noite/ Em que um trem no meu peito me diz/ A água um dia vai cair/ Lá do céu azulzim/ E com certeza vai estar/ Molhadinha/ E aqui vai virar um lamão/ E nessa hora eu não quero nem saber”). Para completar, o som rolava enquanto o telão mostra as imagens da banda virando desenho animado em 2D, caindo pelos precipícios e correndo por estradas dos cânions feito um papaléguas. A segunda, um pouco mais recente, vai além no olhar para dentro do país: é uma canção sertaneja de raiz que, ao vivo, despida dos vocais mecanicamente robotizados da gravação do disco, ganhou ainda mais charme e beleza (“Vai diminuindo a cidade/ Vai aumentando a simpatia/ Quanto menor a casinha/ Mais sincero o bom dia/ Mais mole a cama em que durmo/ Mais duro o chão que eu piso/ Tem água limpa na pia/ Tem dente a mais no sorriso/ Busquei felicidade/ Encontrei foi Maria/ Ela, pinga e farinha/ E eu sentindo alegria/ Café tá quente no fogo/ Barriga não tá vazia/ Quanto mais simplicidade/ Melhor o nascer do dia”). Já a terceira escancarava lá atrás a veia crítica e politizada de uma banda que, mais recentemente, nunca teve medo de se posicionar publicamente de demonstrar sua insatisfação com o desgoverno que tomou conta do Brasil (“Vamos errar português/ Vamos eleger um bundão/ Vamos votar em quem roubou mas fez/ Pena de morte para os linchadores, ou não?/ Já que a polícia não faz nada/ O menininho da calçada/ De dia dou moedinha/ De noite eu dou porrada”).

Ainda tinha mais delícias reservadas para o set list. “Vida Imbecil”, também de letra sertaneja, já pregava quase a mesma simplicidade dez anos antes de “Simplicidade”, desta vez com um quê de electronica. “Menti Pra Você Mas Foi Sem Querer”, funk a la Jovem Guarda, foi a cota do set list para as músicas feitas por Rubs Troll (ex-colega de John no Sexo Explícito, banda do guitarrista antes do Pato Fu). “Gol de Quem?” (punk rock tradicional de versos nonsense) e “Cego Para as Cores” (agora sobre uma coisa bem séria: como sair do “buraco mental”). Como se vê, várias cópias distintas de uma mesma essência.

Como ali no palco do Guaíra estavam pessoas que gostam de celebrar o passado sem deixar de continuar olhando para o futuro, era claro que o grupo não deixaria de tocar obras de sua safra mais nova – as quatro primeiras faixas incluídas no novíssimo álbum 30. Três delas (“Fique Onde eu Possa Te Ver”, “No Silêncio”, “Diga Sim”)  representam uma faceta mais calma, macia do Pato Fu. Foram feitas durante a pandemia, servem como um respiro para tempos pesados aos quais fomos submetidos recentemente. Tratam sobre isolamento, saudade, tentativa de escape da depressão. Coisa séria e bem sentimental. A outra, no entanto, é uma pedrada. Representa o lado temático mais pesado do novo disco: o politizado. “Silenciador” é curta e rápida como um tiro certeiro. Aborda a questão das novas religiões pentecostais, que se incluem no espectro do cristianismo, mas pregam a intolerância, o preconceito e a violência contra o próximo que não se encaixa dentro de certas normas falsamente validadas por Deus – que, no caso da letra de “Silenciador”, fala pelo cano do revólver. Sombria, assustadoramente arrepiante, caiu como uma luva escalada para a volta da banda para o bis. Começa sem qualquer aviso, termina como uma bala.

Por fim não tem como não deixar de falar sobre duas faixas que nunca deixam de estar presentes em qualquer showdos mineiros. Ambas bastante queridas e cultuadas pelos fãs e que só poderiam ter sido criadas e lançadas por eles – não cabe a qualquer outro artista tentar regravá-las, seja respeitando os arranjos originais ou subvertendo-os. Não dá. “Capetão 66.6 FM” e “Rotomusic de Liquidificapum” são 100% Pato Fu e tão apenas Pato Fu. Ponto final.

“Capetão” é a mais sincera homenagem dos Fus à Cogumelo, selo belo-horizontino especializado em bandas de metal e que lançou discos e nomes cultuados como Sarcófago, Overdose e Sepultura e, assim, colocou a cidade no mapa-múndi dos sons pesados. A música imita uma pessoa que vira o dial à procura de música boa e acaba parando em uma emissora tomada pelo capeta, o bichinho de estimação alimentado pela pessoa que protagoniza os versos. Ao vivo, faz a plateia liberar seus demônios e gritar guturalmente junto com Fernanda, que faz o contraponto entre a fofurice e a possessão. Curiosidade: ela e Ricardo cantam as partes que no disco ganharam as vozes de John e André Abujamra – coautor dessa loucura toda que, não por acaso, encerra a parte do set list antes do bis, chegando coladinha a “Made In Japan”.

A Cogumelo, aliás, bancou o primeiro álbum do Pato Fu, que ganhou o nome da faixa que encerra em definitivo as performances desta turnê. “Rotomusic de Liquidifcapum” virou tão significativa e tão sinônimo de que tudo pode (e se encaixa perfeitamente) dentro da proposta sonora da banda que acabou por batizar o selo próprio criados por eles no meio do percurso, o Rotomusic. Colagem de ritmos que muda algumas vezes do hard rock cantofalado a laAerosmith à polca e vice-versa, acelera e desacelera o andamento e depois acaba por derivar para canção natalina, citação do Kiss, tema dos Flintstones e… musiquinha infantil falando em morte, assassinato e psicose.

Depois disso tudo não tem como continuar mais nada. É e sempre representará os Fus chegando a seu ápice de criatividade, maluquice e identidade múltipla. Daí só fazendo como o Multi-Homem dos Impossíveis depois de se multiplicar, lutar e vencer o vilão. Ele tira o uniforme rubro-negro de super-herói impossível e volta à sua identidade de gente normal, o ruivo Multy do dia a dia. Tal qual Fernanda, John, Ricardo, Xande e Richard o fazem quando se dirigem ao camarim para não mais retornar ao palco.

Set list: “Spoc”, “O Processo de Criação Vai de 10 a 100 Mil”, “Sobre o Tempo”, “Água”, “Antes Que Seja Tarde”, “Licitação”, “Depois”, “Menti Pra Você Mas Foi Sem Querer”, “Ando Meio Desligado”, “Diga Sim”, “Vida Imbecil”, “Eu”, “Fique Onde Eu Possa Te Ver”, “Gol de Quem?”, “Canção Pra Você Viver Mais”, “No Silêncio”, “Simplicidade”, “Cego Para as Cores”, “Anormal”, “Perdendo Dentes”, “Made In Japan” e “Capetão 66.6 FM”. Bis: “Silenciador”, “Eu Sei” e “Rotomusic de Liquidificapum”.

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Phil Spector – Parte 2

Oito canções essenciais do genial e controverso produtor que criou o wall of sound e revolucionou a música pop do século 20

Ronettes com Phil Spector

Texto por Abonico Smith

Foto: Avery/Redferns/Reprodução

Phil Spector morreu aos 81 anos de idade no último dia 16 de janeiro em um hospital de Los Angeles de complicações ligadas à covid-19. Ele cumpria, desde 2009, pena prisional pelo assassinato da atriz Lana Clarkson, cometido seis anos antes no interior de sua mansão nos arredores da cidade de Los Angeles.  O ato de feminicídio tornu-se o ápice uma carreira polêmica envolvendo confusões pessoais e genialidade profissional.

Ele foi considerado um dos principais produtores de toda a história da música popular do século 20. Começou na atividade ainda jovem, aos 18 anos de idade, enquanto dividia seu tempo como um dos músicos e vocalistas e trio Teddy Bears. Aos 20 tornou-se o mais jovem produtor de estúdio norte-americano e proprietário de um selo fonográfico. Com menos de 25, já enfileirava sucessos radiofônicos e vários compactos no número um das paradas semanais nacionais., tornando-se uma das grande sensações do pop dos anos 1960 e um dos grandes milionários do mercado fonográfico mundial.

Sua fama maior ficou em relação à criação de uma técnica revolucionária de gravação chamada wall of sound.  Consistia na tessitura de uma rede sonora composta por diversos instrumentos executados ao mesmo tempo. Não bastasse os tradicionais do pop – como guitarra, baixo, piano, bateria – havia ainda o acréscimo de muitas opções de cordas (violinos, violas, violoncelos), sopros (trompetes, trombones, saxofones) e percussões (bongôs, marimbas, tímpanos). Isto é, ele emparelhava um acompanhamento de rock a arranjos preparados para grandes orquestras. Para dar ainda mais densidade, empilhava o número dos mesmos instrumentos harmônicos. Não era raro vê-lo chamando muitos músicos para tocar o mesmo instrumento simultaneamente, como guitarristas, pianistas, violoncelistas, violinistas, saxofonistas. Toda esta massa, até então nunca utilizada em discos, provoca um impacto no ouvido. Surpreende, instiga, chacoalha e acostumava as pessoas mais desatentas a estabelecer novos parâmetros ao levar os limites sonoros a alguns passos bem a frente do usual.

Entretanto, ao mesmo tempo que via seu sucesso multiplicar fama e patrimônio, Spector também começava a se envolver em polêmicas pessoais ligadas a um comportamento excêntrico e errático. Gostava de comprar e portar armas e andava sempre com pelo menos uma a tiracolo. Também ficou notório pelo comportamento violento diante das mulheres, neuras pessoais (a ponto de chegar a sumir por dias enquanto desenvolvia algum trabalho com algum artista) e, claro, uso pesado de drogas.

Mondo Bacana condena a violência contra a mulher e também o comportamento agressivo e de ameaças. Entretanto, há que se lembrar sempre da genialidade musical do produtor Phil Spector. Esta, sim, é a sua faceta que sempre ser sempre reverenciada e lembrada. Por conta de seu falecimento, listamos aqui oito trabalhos fonográficos essenciais do cara que deixou para a  História um grande traço revolucionário na música pop.

BEN E KING – SPANISH HARLEM (1960)

Assim que saiu dos Drifters, King confiou a uma experiente dupla de compositores e produtores que já havia trabalhado com ele nos discos do grupo vocal a estreia de sua carreira solo. Depois de escreverem dezenas de hits da década inicial do rock’n’roll (como “Hound Dog”, “Searchin’”, “Jailhouse Rock”, “Poison Ivy” e “Yakety Yak”), o letrista Jerry Leiber e o músico Mike Stoller passaram a produzir alguns discos para o selo Atco. Um ainda adolescente Phil Spector, que havia se iniciado recentemente no mundo da produção sonora e direção de um selo fonográfico, pediu para o amigo Leiber para participar de sessões de gravação como guitarrista para adquirir experiência no dia a dia dos estúdios. Não só participou de diversos álbuns (Drifters incluído) como ainda ganhou cancha suficiente para assumir pré-produções. No caso desta nova fase de Ben E King aconteceu isso. Aos vinte anos de idade, Spector compôs a canção “Spanish Harlem” e ainda pilotou as demos que viriam a dar forma aos registros oficiais do novo vocalista solo. Na criação da canção, já mostrava habilidade na métrica melódica, encaixando charmosos versos ternários (isto é, valsa) no tradicional compasso quatro por quatro da música pop. No arranjo mais cru, moldou os passos iniciais da deliciosa rumba e o irresistível riff delineado pela marimba. No disco – tanto no compacto (de dezembro de 1960) quanto no álbum (lançado no ano seguinte) – os créditos de arranjo e regência saíram para o maestro Stan Applebaum (também havia cordas e um proeminente saxofone) e a autoria da canção para Phil e Jerry (que escreveu a letra). Mas ali já dava para sentir o passo inicial do que viria a ser uma gloriosa e criativa carreira musical de Spector nas produções daquela década. Para quem gosta de curiosidades e coincidências, o trio vocal feminino Ronettes – que anos depois daria a ele o megahit “Be My Baby” e sua futura esposa, Ronnie – era oriundo da área nova-iorquina chamada de Spanish Harlem.

CRYSTALS – HE HIT ME (AND IT FELT LIKE A KISS) (1962)

Canção bastante polêmica. Para muita gente, pode soar uma glorificação da violência contra a mulher em um relacionamento sexual. Outros, no entanto, consideram um cru e cruel retrato da realidade que pode levar a música ao status de instrumento transformador da sociedade ao alertar para que casos semelhantes não ocorram mais daqui para a frente. A letra é brutal e mostra como a protagonista acaba tolerando as inadmissíveis atitudes do companheiro ciumento por se sentir emocionalmente vinculada a ele, apesar de tudo. Criada por uma dos mais badaladas duplas de compositores do conglomerado Brill Building, Gerry Goffin e Carole King, a música teve inspiração em uma história real, mais precisamente na babá do casal, que era frequentemente agredida pelo namorado. Nas mãos de Spector, o arranjo feito para a gravação do grupo vocal feminino Crystals, tudo ficou ainda mais intenso. De cara, a introdução com baixo e percussão com notas em stacatto deixa um ar de suspense até a explosão chegar no clímax do crescendo musical, com direito a destaque à orquestração e até mesmo um pequeno ensaio de solo, algo incomum em se tratando de burilações de estúdio com a marca do produtor. Por causa de seus versos, já naquela época o single enfrentou sérios problemas de divulgação em rádios e vendas em lojas. De qualquer forma, nas décadas seguintes a canção caiu no gosto de bandas alternativas que a regravaram, como Motels, Hole e Grizzly Bear.

RONETTES – BE MY BABY (1963)

Para muitos, apesar de bastante simples tanto nos versos quanto na progressão harmônica, esta é a canção mais perfeita de todos os tempos da música pop. Começa com uma batida simples, básica, minimalista, que foi copiada pelas décadas seguintes por gente como Jesus and Mary Chain, Manic Street Preachers, Bat For Lashes, Billy Joel, Four Seasons, Meatloaf, Camila Cabello e Taylor Swift. Spector utilizou em estúdio músicos profissionais com quem costumava realizar suas sessões em Los Angeles, entre eles poderosos backing vocals como Darlene Love, Sonny Bono e uma então desconhecida Cher. Do trio nova-iorquino Ronettes, recém-contratado pelo produtor para o elenco de sua própria gravadora Philles, apenas Ronnie, com apenas 19 anos de idade, participou, cantando os versos de puro amor juvenil (sua irmã mais velha Estelle Bennett e a prima Nedra Talley sequer pegaram o avião para cruzar o país). O wall of sound construído neste arranjo inclui castanholas e orquestração, até então algo inédito nas faixas registradas por Spector. Quem criou a música foi o casal formado por Jeff Barry e Ellie Greenwich, uma das mais famosas duplas do Brill Building (são deles outros grandes hits daquele mesmo ano, como “Da Doo Ron Ron”, “Leader Of The Pack”, “Do Wah Diddy” e “Hanky Panky”). Phil abiscoitou um quinhão desta parceria por ter sido o grande amálgama da grandiosa sonoridade no estúdio (e também o dono da bola e do campinho!).

RIGHTEOUS BROTHERS – YOU’VE LOST THAT LOVIN’ FEELIN’ (1964)

Mais um exemplo de canção pop eficiente, agora com o tema clássico da dor-de-cotovelo e a parceria “dividida” entre Spector e outro casal clássico de compositores da Brill Building, Jeff Barry e Cynthia Weil. Com a letra trazendo a clássica estrutura de revezamento entre estrofe e refrão mais uma curta ponte instrumental perto do fim (e inspirada pela sequência de acordes de “Hang On Sloopy”), a gravação comandada por Spector é mais um exemplo da grandiloquência do produtor: aqui o wall of sound traz pianos, várias guitarras, baixo e bateria junto a orquestração de cordas, bongô, xilofone, tímpanos. O destaque aqui fica para a combinação dos timbres graves do baixo-barítono Bill Medley e do tenor Bobby Hatfield, que, incrivelmente, possuem uma grande extensão vocal e chegam a arriscar arrepiantes agudos no clímax do arranjo. Foi exatamente esta capacidade de ambos que causou espanto em Spector, quando este conheceu o duo durante uma ida a San Francisco com as Ronettes e voltou com um contrato assinado com os primeiros vocalistas brancos de sua gravadora Philles. Isto fez os Righteous Brothers serem chamados de blue-eyed soul, subgênero que ganharia mais popularidade a partir dos anos 1970. Lançado em dezembro de 1964, o single alcançou o topo das paradas americanas em fevereiro, permanecendo lá por três semanas. A gravação foi escolhida pela Biblioteca do Congresso Nacional dos EUA como uma das 25 obras fonográficas de maior representatividade histórico-cultural da sociedade estadunidense e que devem ser guardadas, mantidas e preservadas para a eternidade.

IKE & TINA TURNER – RIVER DEEP – MOUNTAIN HIGH (1966)

Assim como Phil Spector, Ike Turner também era uma criatura intragável em seus relacionamentos. Quando, nos anos 1960, foi casado com a então alguns anos mais jovem Tina, mantinha a cantora em um relacionamento abusivo, inclusive com o uso de violência física e moral, impedindo-a de assinar seus trabalhos profissionais apenas com seu próprio nome, garantindo a ele não apenas royalties como poder de decisão sobre tudo referente a ela. Este single feito para a Philles foi um bom exemplo disso, no qual Ike não contribui em absolutamente nada com a gravação, cantando ou tocando. Aqui, ao lado de um time preciso de músicos da Wrecking Crew, uma jovem Tina solta seu vozeirão, já prenunciando o furacão que viria a ser pelos palcos e estúdios, sobretudo quando fosse largar de vez o escroto cafetão musical que a controlava com rédeas curtas. O arranjo cresce junto com o gogó dela. A base de fraseado jazzy e o explosivo naipe de sopros tornam tudo irresistível. Para fazer a canção, cujo titulo utiliza metáforas geográficas para demarcar a intensidade de um amor, Spector recorreu de novo a Weil e Barry, com quem – de novo também – dividiu a parceria. Só que, apesar de toda a grandiosidade da faixa, ela não cumpriu o objetivo de emplacar nas paradas. Isto não apenas afetou o contrato dos artistas com o selo – que entregou a outra gravadora não apenas o passe da dupla como ainda os próprios direitos sobre o fonograma – como ainda provocou um impacto devastador no ânimo do produtor. Arrasado pelo fracasso, ele decidiu se retirar de suas atividades e iniciar um autoexílio do mundo artístico, que viria a durar até 1969 quando entraram em cena dois integrantes da então maior banda de rock do planeta.

PLASTIC ONO BAND – INSTANT KARMA! (1970)

A relação entre os Beatles já havia azedado completamente em 1969. Paul optou por se isolar em sua fazenda no interior da Escócia e escalou o sogro para ir a seu lugar nas reuniões sobre finanças e negócios com os demais membros e o empresário Allen Klein, que representava a trinca na Apple Records. George entregava cada vez mais elas canções para o repertório dos discos e mostrava publicamente sua insatisfação por ainda continuar com o espaço reduzido no número de composições escolhidas para cada obra. John , por sua vez, tinha mais interesse em passar mais tempo com o Yoko Ono do que com McCartney, Harrison e Starr : quando não a carregava para não fazer nada no estúdio durante as gravações (contrariando uma regra interna estabelecida previamente) largava tudo e partia para pequenas aventuras solo, como ficar nu dias e dias na cama (com ela ao lado), conversando com a imprensa de vários países, em campanha pela paz mundial. Se o ano havia sido turbulento, o ápice veio em setembro, quando comunicara, em off,  aos outros três seu desejo de não fazer mais parte do grupo. Isso resultou no inicio de carreira solo, com o lançamento de três singles no segundo semestre sob a assinatura da fictícia Plastic Ono Band (isto é, um time composto por Harrson nas guitarras e direção vocal, o alugo dos tempos de Hamburgo Klaus Voorman no baixo, Billy Preston no piano e Alan White na bateria), já que cláusulas contratuais o impediam de oficializar seu adeus e fazer qualquer outro lançamento musical que carregasse seu próprio nome. Para o último destes compactos, realizou um antigo desejo: contratou Phil Spector para produzi-lo, fazendo o excêntrico genial criador do wall of sound voltar três anos depois ao que sabia fazer de melhor, pilotado uma gravação em um estúdio. Para “Instant Karma!”, Lennon deu uma orientação simples a Spector: fazer a faia soar como se tivesse sido gravada nos anos 1950 para um disco da Sun Records (gravadora americana que revelou pioneiros do rock’n’roll como Elvis Presley, Carl Perkins, Johnny Cash e Jerry Lee Lewis). Perito nos botões da mesa, Phil apostou alto nos reverbs e meteu todo mundo dentro do aquário ao mesmo tempo para tocar junto. Por isso “Instant Karma!” soou tão visceral. Cansado das pirotecnias de gravação dos Beatles, John soltou o gogó com toda a força naquele acompanhamento cru e básico dos amigos. Combinava a letra furiosa e sarcástica, que seguia o discurso give peace a chance que ele vinha fazendo ao lado de Yoko. Lennon não se sentia mais um superstar, mas alguém com a vontade de que a humanidade evoluísse valorizando o brilho de cada pessoa comum que somos todos nós. O refrão direto e poderoso (“Well we all shine on/ Like the moon and the stars and the sun”) incentivou aquele soco no estômago para o despertar de consciência. Tudo muito cru e muito rápido – tanto que o disco estava à venda nas lojas em 6 de fevereiro de 1970, apenas dez dias após a música ter sido registrada em Abbey Road. E não por acaso este single preparou o terreno que viria a ter seu êxtase no primeiro álbum solo do já ex-Beatle, produzido por Spector e lançado em 1970, no qual o inglês mergulhou fundo nos efeitos da terapia do grito primal e libertou-se, de modo ainda mais arrebatador e explosivo, dos traumas do passado, incluindo as relações com o pai e a mãe, a fé e a religião e, claro, seu recente passado com os Fab Four.

BEATLES – THE LONG AND WINDING ROAD (1970)

Oito violinos. Quatro violas. Quatro violoncelos. Três trompetes. Três trombones. Duas guitarras. Catorze vozes femininas no coro. Somando tudo chega-se a 38 músicos. Todos sob a condução do maestro londrino Richard Hewson. Estes foram os recursos utilizados por Phil Spector nos overdubs desta faixa. A sessão foi realizada um ano depois da gravação feita em janeiro de 1969 por John, Paul, George e Ringo (e mais o convidado especial Billy Preston nas teclas do piano Rhodes) para o álbum Let It Be. À esta altura, os quatro já não se entendiam mais entre eles e o ponto final era iminente. De um lado, Lennon defendia os trabalhos solo feitos ao lado de Phil, que seria convidado para produzir também aquele que viria a ser o último disco lançado pela banda (John e George acabariam por estender aparceria com ele nas gravações de seus respectivos álbuns de estreia na carreira solo). Do outro, McCartney, o autor desta canção, não hesitava em demonstrar publicamente sua desaprovação pelo uso do wall of sound. Para o baixista, o mosaico sonoro desfigurou a beleza pop dos versos compostos ao piano em sua fazenda na Escócia. Ele só sossegou quando lançou em 2009 uma segunda versão do álbum, batizada Let It Be… Naked, apagando tudo o que fora feito por Spector para a Apple Records. Alguns fãs aprovaram a versão “crua”. Outros, no entanto, não abrem mão de ouvir o trabalho original com a mão do produtor americano. 

RAMONES – DO YOU REMEMBER ROCK’N’ROLL RADIO? (1980)

Depois de passar os anos 1970 se dividindo entre uma sólida parceria com John Lennon em seus discos solo e um comportamento errático com outros artistas com quem trabalhou (entre eles o também exbeatle George Harrison em seu primeiro voo solo, o álbum triplo All Things Must pass), Phil Spector achou nos Ramones o artista ideal para se reinventar. Fã de carteirinha do grupo punk de Nova York desde os primeiro disco, Spector foi chamado pelo quarteto para comandar End Of The Century, o quarto álbum da carreira e então a obra para qual havia mais orçamento destinado às gravações. Isso permitiu a Joey, Johnny, Dee Dee e Marky mergulharem fundo no louco universo de precisão absoluta e expansão sonora do produtor. A obrigação de repetir exaustivamente tomadas e mais tomadas até obter o registro perfeito abalou as estruturas emocionais do baixista e sobretudo do guitarrista, mais adepto à brutalidade sonora dos discos anteriores e que nunca hesitou em demonstrar publicamente sua irritação, a ponto de inventar histórias de que a banda teria sido mantida como refém por Spector com suas armas até conseguir acertar o ponto exato desejado por ele. No segundo single extraído desse disco, Phil consegue a proeza de levar o punk rock ao encontro do wall of sound, a ponto de conseguir desacelerar o BPM habitual dos Ramones e adicionar instrumentos completamente estranhos ao gênero, como órgão e saxofone. Na letra da música, o autor Dee Dee faz uma lista de artistas favorito e programas de rádio de TV que costumava acompanhar durante a infância e adolescência, vividas parte nos Estados Unidos e parte na Alemanha.

>> Clique aqui para ler o texto com um breve resumo sobre a suprema importância do trabalho de Phil Spector para a história da música pop

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Warpaint + Deerhunter + Mercury Rev – ao vivo

Edição 2018 do Balaclava Fest contou também com shows de Metá Metá, Jaloo, Marrakesh, Barbagallo e MOONS

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Warpaint

Texto por Fabrizio Zorzella

Fotos: Fabricio Vianna/Balaclava/Divulgação (Warpaint e Mercury Rev) e Marta Ayora (Deerhunter)

Num domingo frio de novembro em Sampa (4 de novembro), o selo Balaclava Records promoveu mais um dos seus ótimos e intimistas festivais. A Audio foi palco da farra e viu em seu espaço uma mistura de indie rock, dream pop, psicodelismo, electro, jazz e folk para ninguém reclamar. Diferentemente da versão do ano passado, em que o público não pareceu comparecer em peso, dessa vez os vários espaços dentro da excelente casa de shows estavam tomados. Me lembrou a vibedas edições do Popload Festival de 2014 e 2015 (faltou só aquele último ambiente com o caminhão de Heineken, né?).

As portas se abriram as 16 horas para, meia hora depois, no palquinho menor (o Club), a banda folk MOONS já abrir os trabalhos. Acabei não chegando a tempo de acompanhar. Falha minha! Depois, como já diria a velha expressão… quem não tem Tame Impala caça com algum amigo do Kevin Parker nos seus projetos solo. Né, não? Sendo assim, às 17 horas, o baterista francês de turnê do grupo australiano, Barbagallo, abriu o palco principal (o Stage), com um dream pop psicodélico cantado na sua língua materna. Eu vi, mas poucos viram as nove deliciosas canções tocadas. Na sequência, o Marrakesh, de Curitiba, se apresentava no palco Club. Divulgando seu mais recente álbum, o excelente Cold As Kitchen Floor, lançado pela própria Balaclava, os caras misturam três guitarras com sax! Me senti num show do King Krule.

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Mercury Rev

Depois, voltando ao Stage, vieram os americanos e velhos indies de guerra do Mercury Rev, voltando ao país depois de tocar somente em Curitiba em 2005. Eles tocaram músicas do álbum do ano de 1998 para a NME, a obra-prima da banda, Deserter’s Songs. Com os instrumentos altíssimos, chegando até ao vocal de Jonathan Donahue ficar inaudível por alguns momentos, os caras torraram o cérebro da porção mais velha do público que foi ao festival exclusivamente para vê-los. Músicas como “Holes” ou “Opus 40” soam tão magistrais e psicodélicas como na versão gravada de duas décadas atrás. Foram músicas e fim de papo.

O paraense Jaloo deu as caras com seu tecnobrega antes dos três headliners entrarem em ação (um pouco atrasado, em função de falha no sistema elétrico do Club). Misturou singles e faixas do primeiro álbum, #1, e ainda aproveitou para “testar” músicas ainda desconhecidas do grande público. Um bom ato para se requebrar. Mas da minha parte, confesso, após a quinta música já estava me dirigindo ao outro palco para ver o “meu” headliner.

A próxima atração do Stage era nada mais, nada menos que o indie do indie Deerhunter. Banda de Atlanta, Georgia, que tem como seu frontman o gigante Bradford Cox. São sete álbuns na bagagem e mais na iminência de ser lançado. O grupo americano estava estreando no Brasil. Alegria? Acho que a felicidade de verdade só para quem estava do lado de cá da plateia, porque naquele mesmo domingo já havia sido noticiada, via rede social, a morte do antigo baixista dos caras, Josh Fauver (escrevi esse texto na quarta-feira, três dias depois do show; logo depois do show no Brasil foi anunciado o cancelamento o resto da turnê sul-americana).

Verdade seja dita: mesmo com um sentimento péssimo rondando as cabeças deles, os caras mandaram demais (na minha opinião, se soubessem do fato antes da viagem para cá, teriam cancelado tudo!). Set list enxuto, mas cheio de pérolas. O que dizer de uma banda que pode se dar ao luxo de emendar na sequência “Revival”, “Breaker” e “Desire Lines”? Arranjaram ainda um tempinho de tocar o novo single, ‘Death In Midsummer’, além de voltarem para um bis e fazerem uma justa homenagem ao ex-baixista, tocando “Nothing Ever Happened”, escrita pelo mesmo. Havia visto o Deerhunter no Primavera Sound em 2016, mas esse foi disparadamente melhor. Foi também um show para o eterno amigo/colega. Quem presenciou se deu muito bem.

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Deerhunter

Após os “caçadores de cervos”, o Metá Metá fechou o palco Club. Pequeno para eles, já que mereciam o Stage! O triozaço paulista de jazz rock (que, ao vivo, toca como um quinteto) e liderado pela Juçara Marçal nos vocais, tocou faixas dos três álbuns de estúdio. Seus arranjos são fortemente influenciados por ritmos africanos e da MPB, com destaque para a derradeira canção “Oba Ina”. Bom para quem não se importou em pegar um lugar pior na última atração da noite para de fato ver algo profundamente original e dançante. Por mais Metá Metás no mundo!

Ai chegou a vez do “headliner principal”. Também dos Estados Unidos, grupo Warpaint, formado por Emily Kokal (guitarra, teclados e voz), Theresa Wayman (guitarra, teclados voz), Jenny Lee Lindberg (baixo e voz) e Stella Mozgawa (bateria e voz), veio pela terceira vez ao Brasil mostrar todo o seu rock contemplativo. Com a pista do palco Stage completamente abarrotada para vê-las, elas abriram o show com os riffs da música auto-intitulada para começar a viagem em grande estilo. Como não divulgam nenhum álbum novo nessa volta (já haviam vindo com a turnê do disco Heads Up em 2017), mesclaram bem os sons dos quatro trabalhos da carreira.

Confesso que algumas músicas são um pouco “a mais” para mim. Mas quando acertam a mão soam incríveis. “Love Is To Die” e “So Good” são bons exemplos de acertos. Na parte final do show rolou um #EleNão em uníssono (depois de uma camisa com o tema ser lançada para o palco) e uma tentativa de explicação do que isso significava para as musicistas! Emily disse que todos ficaríamos bem porque tínhamos uns aos outros que estavam ali (#divou), mas que por enquanto o importante era nos divertirmos. Então, elas emendaram o hit máximo da banda, “New Song”.

Ainda rolou “Disco//Very”, mas me dei de presente o final do festival com a música anterior. Felicidade define.

Set List: Mercury Rev: “Holes”, “Tonite It Shows”, “Endlessly”, “Opus 40”, “Hudson Line”, “Goddess On A Hiway”, “The Funny Bird”, “Pick Up If You’re There”, “Delta Sun Bottleneck Stomp” e “The Dark Is Rising”.

Set List Deerhunter: “Cover Me (Slowly)”, “Agoraphobia”, “Revival”, “Breaker”, “Desire Lines”, “Death In Midsummer”, “Take Care”, “Snakeskin”, “Helicopter”, “We Would Have Laughed”. Bis: “Nothing Ever Happened”.

Set list Warpaint: “Warpaint”, “Elephants”, “Bees”, “The Stall”, “Love Is To Die”, “Intro”, “Keep It Healthy”, “Beetles”, “Drive”, “Krimson”, “So Good”, “Billie Holiday”, “Above Control”, “New Song” e “Disco//Very”.