Music

Men At Work – ao vivo

Colin Hay traz a Curitiba a nova formação da histórica banda para saciar a sede de nostalgia de muitos fãs, inclusive de quem não viveu aquela época

Texto por Daniela Farah e Abonico Smith

Foto de Janaina Monteiro

A chuva copiosa que caiu na capital paranaense na noite desta última terça-feira, dia 20 de fevereiro, não foi impeditivo para a rua Itajubá ficar intransitável. Muita gente andando, ambulantes, carros, havia de tudo um pouco. Era o efeito Men At Work, que mobilizou um público ansioso por um punhado de clássicos. Com o mercado de shows ainda aquecido após a pandemia, o público, afinal, tem feito muito bem a sua parte, sobretudo quando se trata de apresentações de artistas internacionais.

A partir das 21h o palco da Live Curitiba ficou tomado por uma aura de classic rock. Mais precisamente um pop misturado com tons de reggae e pós-punk. Ou seja, aquela beleza do comecinho dos anos 1980. O guitarrista e vocalista Colin Hay, o australiano que naquela época tomou de assalto as paradas dos Estados Unidos – e consequentemente do resto do mundo – é o único remanescente do grupo original. O tecladista, saxofonista e flautista falecido em 2012, Greg Ham, era seu fiel escudeiro. Foi com ele que foi retomada a trajetória do grupo após a primeira parada, em 1985. Com ele que Colin fez algumas idas e vindas e mantinha, de tempos em tempos, a chama do MAW acesa.

A mais recente empreitada ocorreu em 2019, um pouco antes da covid-19 paralisar o planeta por um bom tempo. Agora, pela primeira vez, a nova formação embarcou para uma turnê sul-americana, com três paradas pelo Brasil (Rio, Curitiba, Sampa). Quem acompanha o frontman agora é um time tecnicamente de peso. A começar pela carismática cantora peruana Cecilia Noël, que dividia as comunicações com público e até, de certa forma, incentivava Hay. Scheila Gonzalez, multiinstrumentista californiana e ganhadora de um Grammy, brilhou nos solos de saxofone. Tem ainda três cubanos: o baterista Jimmy Branly, que já tocou com uma longa lista de gente boa, incluindo Michael Bublé; o guitarrista premiado e parte da nova geração do Buena Vista Social Club, San Miguel Perez; e o baixista Yosmel Montejo, que também já tocou com muita gente talentosa, incluindo a nova lenda do jazz Kamasi Washington.

“Can’t Take This Town”, a quarta da lista, era uma das canções mais esperadas da noite, mesmo tendo sido pinçada da carreira solo de Hay, iniciada logo após a dissolução do MAW. Pouco tempo depois, “Everything I Need” foi uma grata surpresa, muito bem recebida pelo público, que filmou, cantou e fez coro. Como ela não esteve no show anterior, realizado no Rio de Janeiro, as expectativas para que ela – a única faixa do terceiro e último álbum de carreira do MAW, de 1985, época em que as relações internas já estavam desmoronando – aqui estivesse, em Curitiba, eram baixas. Na sequência, “Blue For You” trouxe um clima dançante e leve. A próxima não empolgou muito e “I Can See It In Your Eyes” foi a escolhida para pegar bebidas, ir ao banheiro e, claro, atualizar as redes sociais. Já na metade do set list, “Dr. Heckyll & Mr. Jive” dividiu opiniões no local. Mas mesmo quem não a conhecia parou para prestar atenção assim que Colin dedicou a música a Greg Ham.

A comunicação era frequente, só que cada comentário, fosse do Colin ou da Cecília (que estava muito comunicativa, especialmente pela proximidade do português com o espanhol), tinha seu som anulado pela emoção dos fãs. Aliás, falando neles, o público era bem eclético. Pessoas de todas as idades e estilos estavam lá sedentas por nostalgia, a maioria daquilo que não viveu ou nem chegou a presenciar direito. “Muito obrigado!”, disparou o fundador da banda, abafado por gritos e aplausos, logo após “No Sign Of Yesterday”.

Uns minutos de escuridão antecederam um dos picos da noite. O público ficou em silêncio até se explodir em gritos com os primeiros acordes de “Who Can It Be Now?”. A luz acendeu para que a banda pudesse ver todo mundo cantando o refrão. Três outros grandes hits do MAW acabariam ficando lá para o final e numa sequência só. Seria esta, então, a hora da plateia se deliciar com “Overkill”, “It’s A Mistake” e “Down Under”.

Eles agradeceram e saíram do palco. Voltaram e dessa vez cantando parabéns para os sortudos que estavam fazendo aniversário, inclusive o produtor que trouxe o show às três cidades brasileiras. Ainda faltava hit na manga, um deles vindo da carreira solo pós-MAW. “Into My Life” levou todo mundo a dançar, junto com “Be Good Johnny”, que Colin adora tocar por fazê-lo lembrar bastante, novamente, do amigo falecido. Os músicos agradeceram, tiraram aquela tradicional foto e saíram. E para valer. Restou a quem ficou por lá curtir mais nostalgia. Desta vez, a do show recém-visto.

Set list: “Touching The Untouchables”, “No Restrictions”, “Come Tumblin’ Down”, “Can’t Take This Town”, “Down By The Sea”, “Everything I Need”, “Blue For You”, “I Can See It in Your Eyes”, “Dr. Heckyll & Mr. Jive”, “No Sign Of Yesterday”, “Who Can It Be Now?”,  “Underground”, “Catch A Star”, “Upstairs In My House”, “Overkill”, “It’s A Mistake” e “Down Under”. Bis: “Into My Life” e “Be Good Johnny”.

Music

Robbie Robertson

Líder da Band, grupo que acompanhava Bob Dylan nos anos 1960 e 1970, tem como último trabalho a trilha do novo filme de Martin Scorsese

Texto por Carlos Eduardo Lima (Célula Pop)

Foto: Reprodução

Eu conheci a música de Robbie Robertson antes de conhecer a obra do grupo que ele ajudou a fundar e que se tornou um dos mais importantes da história do rock, Band. Uma distorção temporal, por certo, mas aconteceu assim. Quando Robbie lançou seu primeiro álbum solo em 1987, a canção “Fallen Angel” se tornou uma das minhas mais queridas assim que a ouvi. Lembro de ler uma resenha na antiga revista Bizz e, a partir dela, comprar o disco e colocar Band como uma das prioridades para o meu plano de expansão sonora, que envolvia comprar um aparelho tocador de CDs. Era 1988/1989.

Por mais que o álbum de 1987, homônimo, fosse sensacional, com participações de Bono e Peter Gabriel além da produção de Daniel Lanois, a grande contribuição de Robbie foi, de fato, com a Band. Assim como a maioria do grupo, ele era canadense, mas o tempo faria da BANDA o conjunto de músicos mais capazes de traduzir o espírito da música estadunidense por excelência, vinculada ao folk, calcada no blues, descobrindo e mesclando uma carga de significados no novo membro desta família de ritmos, o rock. Foram esses caras, além de Robbie, Garth Hudson, Levon Helm, Richard Manuel e Rick Danko, que acompanharam Bob Dylan quando este resolveu eletrificar seu som. Estavam com ele no palco quando algum idiota o chamou de Judas por conta disso. Começaram como Hawks e, por conta da importância de quem acompanhavam, se tornaram a BANDA. Ou BAND.

Mas não se restringiram a músicos coadjuvantes. Em 1968 lançavam um dos álbuns mais importantes da história da música pop, Music From The Big Pink, cuja primeira faixa é a antológica “The Weight”. No ano seguinte vieram com o que considero seu melhor álbum, The Band, com a capa trazendo uma foto da banda que poderia ser de 1869. Em seu interior, canções que sintetizavam esta visão da América como melting pot musical e, a partir disso, cultural. Encerraram sua carreira cedo, em 1976, com um show de despedida que trazia convidados como Van Morrison, Joni Mitchell, Staple Singers e, claro, o próprio Bob Dylan. O concerto virou disco que virou filme, The Last Waltz, servindo como porta de entrada de um jovem cineasta na linguagem dos filmes biográficos sobre música. Seu nome? Martin Scorsese.

Por conta de tantas contribuições e tantas participações, Robbie Robertson, meio que a “cara” da Band, era seu integrante mais conhecido. Agora, dentre os cinco originais, apenas o organista Garth Hudson permanece por aqui. Na verdade, isso nem tanto importa, o legado desses sujeitos já está assegurado em todo lugar em que a música seja levada a sério.  Robbie, que faleceu aos 80 anos em 9 de agosto último, permaneceu ativo até os últimos dias. Seu último trabalho é a trilha sonora de Assassinos da Lua das Flores, o novo filme de Martin Scorsese que estreia nesta semana nos cinemas (leia aqui a resenha do Mondo Bacana para este longa-metragem). Que descanse em paz. Obrigado, Robbie.