Rivalidade entre ex-amigos como analogia da guerra que dividiu as Irlandas solidifica a verve de humor ácido de cineasta britânico
Texto por Abonico Smith
Foto: Fox/Disney/Divulgação
Antes de entrar na resenha propriamente dita é bom passar algumas informações que podem ajudar no entendimento deste filme que ganhou nove indicações para o Oscar deste ano. Inisherin é uma ilha fictícia, criada para ser o ambiente dessa trama. Banshees são entidades mitológicas que pertencem à categoria das fadas. São do gênero feminino e, segundo a tradição celta, elas costumam aparecer para determinadas pessoas como um aviso de que elas bem em breve receberão uma notícia envolvendo a morte de alguém. A Guerra Civil Irlandesa durou de junho de 1922 a maio de 1923 e foi um conflito entre dois grupos nacionalistas que discordavam quanto ao fato da Irlanda pertencer ao Império Britânico e que marcou a criação do Estado Livre Irlandês como uma entidade autônoma do Reino Unido. Em suma, isto acabou dividindo politicamente a ilha em dois países: a Irlanda do Norte, formada por seis dos 32 condados, que segue, de alguma forma, vinculada à Grã-Bretanha; e a Irlanda (ou Eire), constituída pelas outras 26 regiões rebeldes, A parte “do sul”, bem maior geograficamente, é formada por uma população majoritariamente católica, enquanto a divisão “do norte” se divide até hoje entre o catolicismo e o protestantismo herdado dos vínculos reais. Por fim, o cineasta Martin McDonagh é inglês e descende de irlandeses.
Tudo isto posto e sabido, vira uma delícia assistir a Os Banshees de Inisherin (The Bashees Of Inisherin, Reino Unido/EUA/Irlanda, 2022 – Fox/Disney), mesmo com o crasso erro do título adotado pela distribuidora brasileira (alguém poderia avisar por lá que o artigo definido, na língua portuguesa, obedece ao gênero?). A trama se passa na quase erma e muito verde ilha durante o começo do ano de 1923. Os poucos habitantes de lá não possuem muita perspectiva do que fazer em suas vidas: enquanto ouvem tiros de canhões pipocando na guerra que se desenha bem longe, cuidam de suas casas e animais de estimação enquanto jogam conversa fora e bebem. Ir ao bar para se divertir é programação garantida dia sim, dia também.
O desequilíbrio de toda essa tranquilidade acontece quando Colm Doherty (Brendan Gleeson) decide interromper de modo brusco a longa amizade que tem com Pádraic Súlleabháin (Colin Farrell). Assim, de nada, de uma hora para outro, sem qualquer motivo plausível. Quer dizer, sem qualquer motivo na visão de Pádraic, que fica inconformado com o fato e se abala profundamente com a “tragédia”. A questão é que Pádraic é tido com um grande pária pelo resto da ilha. Ninguém em Inisherin o suporta. Sequer o cumprimentam. Os maiores diálogos de sua vida parecem se resumir a três pessoas: a irmã Siobhán (Kerry Condon), o vizinho Colm e o jovem Dominic Kearney (Barry Keoghan), sempre de comportamento errático e imprevisível e outro que não pensa duas vezes em entornar um copo dentro do organismo por não conseguir aceito em casa pelo pai.
McDonagh é um grande diretor e roteirista que trabalha a passos lentos. A cada meia década, em média, entrega uma obra ao espectador. Já possui quatro longas no currículo. Os dois primeiros, Na Mira do Chefe (2008) e Sete Psicopatas e um Shih Tzu (2012) são primores de comédia de humor ácido, com a verve corrosiva tipicamente inglesa. Martin constrói diálogos que fazem quem está na poltrona do cinema (ou no sofá de casa) gargalhar sem sentir culpa de nada em absoluto. Em plena tragédia, inclusive. Não sobra para ninguém. Este seu estilo foi definitivamente abraçado por Hollywood em Três Anúncios para um Crime (2017). Depois de se destacar em diversos festivais pelo mundo e levar cinco dos oito Bafta ao qual concorreu, o filme ganhou dois de sete Oscar, três de quatro SAG Awards e quatro de seis Globos de Ouro.
Apesar de não abandonar a marca registrada da acidez verborrágica, McDonagh faz de Os Banshees de Inisherin seu filme mais denso e dramático. Este é, na verdade, um filme sobre o luto. Ou melhor, o que vem logo após a perda de algo ou alguém para muita gente: a negação, a raiva, a revolta. Pádraic sente isso ao ser descartado sumariamente por Colm e realizar várias frustradas tentativas de se reconectar ao ex-amigo. Fica remoendo dia após dia o pena bunda até o dia em que um trágico acontecimento desperta uma vontade incontrolável de fazer “justiça” com as próprias mãos e dar o troco a quem lhe abandonara. De melhor amigo, vira o pior inimigo.
O contraponto de Colm diante desta ruptura intempestiva e repentina, porém, é o que torna interessante este “duelo”. O diretor e roteirista utiliza o personagem para fazer uma interessante analogia à guerra das Irlandas, mais especificamente o uso da religiosidade diante de suas atitudes. Colm, que sempre toca violino em casa e no bar, passa a ignorar Pádraic porque acha que perde tempo estando com ele, como está em uma idade mais avançada, quer passar a usar o tempo que lhe resta da vida para compor uma obra musical que lhe dê transcendência à vida. Ou seja, que faça com que sua alma seja lembrada posteriormente que seu corpo deixar este plano. Só que sua luta para atingir a glória e a perfeição deve se tornar ainda mais difícil aos poucos. Então, Colm vai desnorteando aos poucos o espectador (claro, Pádraic também) com uma série de atos de extremo radicalismo e coragem, que inclusive vão irritando cada vez mais o novo desafeto.
Outra diferença entre ambos – e que remonta à divisão das Irlandas e à diferença das religiões – é a mais completa ausência da culpa judaico-cristã por parte de Colm. E assim corre a (divertida) rixa entre os dois em uma ilha onde não há absolutamente muito mais nada de concreto para ser feito a não ser a perseguição de um ideal que contrapõe a conservação do mais do mesmo à ambição da superação física e a criação de uma obra “a serviço de Deus”.
Enquanto isso, McDonagh se revela – de novo – um ótimo diretor de atores. As grandes interpretações de Farrell e Gleeson já não chegam a ser uma novidade, já que esta é a segunda vez que a dupla trabalha em conjunto com o autor (a primeira fora em Na Mira do Chefe). No papel de Siobhán, Condon brilha fazendo a voz da lucidez diante da cega obsessão e da mais completa falta de ambição do irmão Colm. Já Keoghan, que vem pavimentando um caminho de filmes cult nos últimos anos (O Sacrifício do Cervo Sagrado, Dunkirk, A Lenda do Cavaleiro Verde) mostra as credenciais, como o sempre bêbado Dominic, para estourar de vez em Hollywood como o novo Coringa, o arquirrival de Batman.
Apesar das nove indicações para o Oscar, Os Banshees de Inisherin não levou nada neste domingo, como já era previsto. Contudo, isso pouco importa. O bom é que Martin McDonagh, com esta obra, mostra ascensão criativa em seu quarto filme e solidifica de vez seu nome no panteão dos grandes cineastas autorais do século 21.Certamente teremos mais humor ácido e histórias fora do comum nos seus próximos filmes.
Do maior craque do futebol de todos os tempos a Edson: a divindade transcende o homem que se tornou o brasileiro mais conhecido do planeta
Texto por Fábio Soares
Fotos: Reprodução
Ao morrer, na tarde deste 29 de dezembro de 2022, Edson Arantes do Nascimento era a pessoa física mais conhecida do planeta Terra. Rei em outro planeta (chamado Bola), transformou o ofício de seu esporte num ato tão simples quanto tomar um copo d’água.
Na véspera de sua despedida do Santos, no dia 2 de outubro de 1974, ele era dúvida para a partida devido à sua condição física. Entretanto, declarou um pouco antes: “Jogo até de muletas!”. Na vitória santista contra a Ponte Preta por 2 a 0 não marcou mas monopolizou as atenções do mundo ao ajoelhar-se de braços abertos no círculo central, aos 22 minutos do segundo tempo.
Para além da questão futebolística, a imagem de Pelé transcendia a estética fotográfica. O Rei negro com uniforme branco e número 10 às costas transformou-se em ícone pop que encantou, inclusive, Andy Warhol, que imortalizou seu rosto numa serigrafia em 1977 – obra esta que foi arrebatada por US$ 855 mil, cerca de R$ 3,58 milhões num leilão da Christie’s, em Nova York, em novembro de 2019.
“Te conheço há um bom tempo. Sou uma pessoa muito mais curiosa do que vocês imaginam. Inclusive, canto samba. Qualquer dia vamos cantar um samba”, teria dito o artista ao Rei. Coincidência ou não, o álbum The New Brazil’ 77, de Sérgio Mendes, encontrava-se estourado nas rádios norte-americanas.
O mundo de sonhos de Pelé com contornos de parque de diversões dentro dos gramados, no entanto (e por muitas vezes), contrastou com atitudes nada elogiáveis do homem Edson Arantes do Nascimento. Como a falta de engajamento político, a constante onipresença ao lado de presidentes americanos e sobretudo o modo como deixou-se ser usado pela ditadura militar de Médici com ares de alienação. “A gente sabia de muitas coisas que aconteciam no país, mas outras não”. Houve ainda a forma inacreditável que lidou com a questão de sua filha biológica Sandra Regina (morta em 2006). Tudo isso escancarou o lado “santo com pés de barro”, o homem com muitos defeitos, a pessoa real por trás do personagem.
Desde 1957, quando passou a defender o time dos profissionais do Santos, Pelé é um, Edson é outro. Assim como Diego era um, Maradona era outro e Ziggy Stardust era um ser distinto a David Bowie. Pelé ganhou tr6es Copas do Mundo (o único a consgeur tal feito até agora) em quatro disputadas. Ele elevou o futebol ao status de arte e, como artista, descolou-se de seu corpo físico. Um dos únicos casos da história em que a divindade superou o homem, superou a própria história e o próprio país. Um rosto que, de tão popular, em todo o planeta, teve o mesmo alcance de símbolo máximo de uma religião.
Morre o homem, fica o Deus. E deuses não morrem. Até para ateus.
Quinze anos depois britânicos retornam ao palco da Pedreira Paulo Leminski como uma das maiores bandas de rock do mundo
Texto e foto por Abonico Smith
Antes de entrar na resenha propriamente dita, vai aqui uma proposta de uma ligeira brincadeira que envolve imaginação, projeção e percepção sobre a vida. Pense em como você era e onde estava quinze anos atrás. Agora pense em você daqui a quinze anos, lá no ano de 2037. Muita diferença em relação ao você de hoje?
Pois bem, ver o Arctic Monkeys tocando na Pedreira Paulo Leminski no último dia 8 de novembro provocou este exercício de memória. Quando o quarteto inglês subiu ao palco da mais bela arena a céu aberto do sul do país esta não era a estreia em tal espaço. Alex Turner e seus fieis escudeiros já haviam tocado ali em novembro de 2017, com uma das atrações da etapa curitibana do falecido Tim Festival. Assim como nos dias de hoje um sideshow de um grande festival nacional.
Três dias antes eles haviam sido headliners do primeiro dia da primeira edição do Primavera Sound São Paulo. Um cenário diferente daquele primeira vinda à capital paranaense. Agora os Monkeys são uma das mais importantes bandas de rock do mundo. Uma década e meia atrás, com dois badalados e já grandiosos álbuns na carreira, eram a grande aposta da música britânica naquela época. As letras de Turner, bastante incensadas pela imprensa musical. Quatro garotos de vinte e poucos anos com um indie rock avassalador, pungente e urgente como um quase hardcore. Com o acréscimo de uma habilidade lírica pouco vista para moleques daquela idade. Tanto que, apesar de ainda estarem em início de carreira, já ocupavam na grade do line up daquele dia em Curitiba um espaço mais importante que a veterana Björk, por exemplo (a mesma que, por sinal, tocou horas antes dos ingleses no mesmo Primavera Sound SP).
Portanto, os astros que hoje se aproximam da quarta década da idade estão, se comparados com aqueles mesmos de uma década e meia atrás um tanto mais seguros do que são no momento e do lugar que ocupam dentro do mundo musical. Alex Turner tem presença de palco monstruosa, já um tanto liberto da obrigação de sempre tocar sua guitarra, transforma-se naquele rockstar marrento, exalando propositalmente sensualidade, para fazer os hormônios das teenagers e pós-adolescentes da plateia passarem do ponto de ebulição, gerando na plateia da Pedreira gritos constantes, típicos de uma juventude feminina diante de um ídolo do rock desde os tempos de Elvis Presley e dos Beatles.
No palco, Turner não só corresponde como também provoca e excita. Bastante. No figurino retrô, nas poses um tanto quanto teatrais, no jeito de se comportar no palco e se portar por trás do microfone. Parece muito concentrado em representar essa figura, o que suscita também um certo desconforto em quem quer de um show algo maior do que um mero jogo sexual entre ídolo e fã.
Musicalmente, Arctic Monkeys é sinônimo de uma grande banda. Primeiro pelo fato do quarteto nunca se prender a uma zona de conforto. Depois de alcançado o estrelato de forma até precoce, não se pode acusá-lo de comodismo. A cada novo disco, uma tentativa de se reinventar e trilhar por novos caminhos. Até chegar ao novíssimo álbum, disponibilizado nas lojas e plataformas de streaming na semana anterior da vinda da banda ao Brasil. Sétimo álbum em vinte anos de carreira, The Car é uma bela proposta de se chegar à excelência de um pop refinado, com pitadas de falsetes, grooves e orquestrações, na melhor tradição sixtie britânica. Uma evolução do predecessor, Tranquility Base Hotel + Casino, e direcionamento bem diferente dos outros anteriores, que flertavam com o stoner, o psicodélico, o hard rock e até mesmo o heavy metal.
O que faz chegar ao ponto exato para se costurar um repertório fantástico passeando por todos os sete álbuns da carreira e criando um belo mosaico do que são esses vinte anos de trajetória. Na Pedreira foram 21 canções distribuídas de forma nada desigual. Forma cinco dos dois primeiros álbuns, da série de arranjos quase como um rolo compressor hardcore com os instrumentos atuando juntos e sem dar muito tempo para a respiração ao acompanhar os vocais urgentes de Turner. Outras cinco da etapa seguinte, quando a banda embarcou nas viagens quase solitárias do deserto californiano para gravar mais dois discos com uma psicodelia que nunca seria encontrada no velho continente europeu. Mais cinco só de AM, o disco divisor de águas da carreira, aquele capaz de fornecer sucessos avassaladores, daqueles de fazer qualquer arena cantar em uníssono e entrar em transe enquanto isso. Aliás, este é aquele disco que diz muito sobre o set list de uma banda. Afinal, normal é deixar, hoje em dia, hits lá do início da trajetória, mas é impossível subir ao palco sem tocar clássicos como “Arabella” (com direito a final emulando o riff contagiante de “War Pigs”, do Black Sabbath), “R U Mine?” ou “Do I Wanna Know?”. Do período mais recente, requintado e luxuoso, seis canções foram pinçadas para completar a noite: os dois singles doTranquility Base Hotel + Casino mais pérolas complexas que ainda estão para ser digeridas pelo público (ainda mais quando executadas ao vivo, com o apoio de mais três músicos recrutados para a turnê) como “Sculpture Of Anything Goes”, “Body Paint”, “There’d Be A Mirrorball” e a faixa-título.
Nessa noite quem foi ver os britânicos ainda foi brindado com a oportunidade de ter uma grande banda como atração de abertura. Quem tocou também foi o Interpol, formação de carreira já tão longeva quanto os Monkeys e com o mesmo número de álbuns na discografia. Coube ao trio americano (que vira quinteto ao vivo) dar o pontapé inicial da noite com um repertório calibrado de 13 peças. Três delas retiradas do mais novo álbum (The Other Side of Make-Believe, lançado no meio deste ano) e oito dos incensados dois primeiros discos (entre estas, “Untitled”, “Evil”, “C’Mere”, “PDA” e “Slow Hands”). Tocando sabiamente numa dimensão espacial mais reduzida de palco (os músicos todos lá na frente, bem próximos uns dos outros, como se fosse em um clube indie do Brooklyn nova-iorquino, de onde a banda saiu para conquistar o planeta) e com uma atmosfera soturna proporcionada pela combinação de muita fumaça e predominantes luzes azuis e vermelhas, nem parecia que os guitarristas Paul Banks e Daniel Kessler mais o baterista Sam Fogarino encaravam uma Pedreira Paulo Leminski numa noite muito fria de primavera.
O Interpol mandou ver um puta show de abertura, digno de qualquer outra noite em local fechado e de capacidade bem menor. O que enaltece ainda mais a grandiosidade do Arctic Monkeys nos dias de hoje. Muito provavelmente algo que Alex Turner, Jamie Cook (guitarra), Matt Helders (bateria e backings) e Nick O’Malley (baixo e backings) não poderiam sequer imaginar há quinze anos.
Set List Arctic Monkeys: “Sculptures Of Anything Goes”, “Brainstorm”, “Snap Out Of It”, “Crying Lightning”, “Don’t Sit Down ‘Cause I’ve Moved Your Chair”, “Why’d You Only Call Me When You’re High?”, “Body Paint”, “Four Out Of Five”, “Arabella”, “Potion Approaching”, “The Car”, “Cornerstone”, “Do I Wanna Know?”, “Tranquility Base Hotel + Casino”, “Pretty Visitors”, “Do Me a Favour”, “From The Ritz To The Rubble” e “505”. Bis: There’d Better Be a Mirrorball”, “I Bet You Look Good On The Dancefloor” e “R U Mine?”.
Set list Interpol: “Untitled”, “Toni”, “Evil”, “Fables”, “C’mere”, “Narc”, “Passenger”, “The Rover”, “Rest My Chemistry”, “Obstacle 1”, “The New”, “PDA” e “Slow Hands”.
Sessenta curiosidades para celebrar a trajetória de 60 anos do agente secreto britânico James Bond nas telas de cinema
Texto por Carolina Genez
Fotos: Divulgação
Seja pelo visual sempre memorável, pela trilhas sonoras marcantes ou pelas aventuras eletrizantes todo mundo conhece Bond, James Bond. Muito popular, o espião mais famoso da história do cinema já foi interpretado por um seleto grupo de seis atores.
Como neste ano de 2022 James Bond completa seis décadas de chegada às grandes telas, o Mondo Bacana elaborou 60 curiosidades que marcaram esta trajetória de sucesso de bilheterias e culto mundial que perpassa gerações e permanece cristalizado até hoje.
Ian Fleming
>> Apesar de sua estreia no cinema ter sido em 1962 em 007 Contra o Satânico Dr. No, o personagem foi criado em 1953 pelo militar, jornalista e escritor britânico Ian Fleming. Sua primeira aparição foi no livro Casino Royale.
>> Apesar de ser um personagem fictício, de fato existiu um James Bond na vida real. Fleming encontrou inspiração para o nome do agente em um livro de pássaros escrito por um ornitólogo chamado… James Bond.
>> Assim como 007, Ian Fleming também foi um espião naval durante a Segunda Guerra Mundial.
007 Contra o Satânico Dr. No (1962)
>> 007 Contra O Satânico Dr. No não era bem uma opção dos produtores para dar o pontapé inicial na história cinematográfica de James Bond. O filme foi escolhido para ser a primeira adaptação porque os sócios Albert Broccoli e Harry Saltzman, que fundaram em 1961 a companhia Eon Productions, não possuíam os direitos do livro Casino Royale. Como outras histórias ou faziam parte de uma disputa judicial ou eram muito caras para serem gravadas, Dr. No (o título original, em inglês) parecia ser a melhor decisão.
>> Desde 1962 já foram lançados nos cinemas 25 filmes do agente. Isto se for contabilizada somente a lista das produções da Eon. Existem ainda outras duas produções “não oficiais” (isto é, não bancadas pela empresa criada por Broccoli e Saltzman).
>> Casino Royale (1967) e 007 – Nunca Mais Outra Vez (1983) são os títulos fariam o número subir para 27. Na primeira, Bond (interpretado por David Niven) é tirado de sua aposentadoria para mergulhar no mundo dos cassinos de Mônaco. Sua missão é derrotar um de seus mais tradicionais inimigos, Le Chiffre (Orson Welles). No outro, com Sean Connery de volta ao papel principal, o protagonista rivaliza com membros e cabeças da Spectre. Detalhe: Um ainda iniciante e desconhecido Woody Allen está no elenco de Casino Royale.
Moscou Contra 007 (1963)
>> O papel de 007 já foi interpretado por seis diferentes atores nas produções oficiais: Sean Connery, George Lazenby, Roger Moore, Timothy Dalton, Pierce Brosnan e Daniel Craig.
>> Doze diretores já assinaram a direção dos filmes da Eon: Terence Young, Guy Hamilton, Lewis Gilbert, Peter R. Hunt, John Glen, Martin Campbell, Roger Spottiswoode, Michael Apted, Lee Tamahori, Marc Forster, Sam Mendes e Cari Joji Fukunaga.
>> John Glen é o cineasta que mais dirigiu filmes do espião britânico. São cinco no currículo.
>> Apesar de ainda não ter feito uma história de James Bond, Steven Spielberg é fã declarado do agente secreto. A série de filmes protagonizada pelo personagem Indiana Jones é uma homenagem ao espião. Já em Tubarão (1975), há cenas inspiradas em 007 Contra a Chantagem Atômica (1965).
>> Para agradecer e retribuir a homenagem de Spielberg, os roteiristas de Bond batizaram de Jaws (título original de Tubarão) o vilão de dentes de aço de 007 – O Espião que me Amava (1977). No filme, o personagem ainda mata um tubarão a dentadas.
007 Contra Goldfinger (1964)
>> O título de maior bilheteria da saga até hoje é 007 Operação Skyfall (2012). Com direção de Sam Mendes, o longa arrecadou mais de um bilhão de dólares e ainda se destacou no Oscar ao arrebatar duas estatuetas, nas categorias mixagem de som e canção original.
>> Por falar em Oscar, 007 – Sem Tempo Para Morrer (2021) é o terceiro título da franquia a levar o Oscar na categoria canção original, com “No Time to Die”, na voz de Billie Eilish, neste ano. Em 2013, Adele levou o troféu com “Skyfall”, tema de 007 Operação Skyfall (2012). Já 007 Contra Spectre (2015) foi embalado por “Writing’s On The Wall”, de Sam Smith, vencedor do ano seguinte. Detalhe é que as estatuetas foram ganhas pelas últimas três produções, lançadas nos últimos dez anos apenas.
>> Apesar de nem todas as músicas terem sido premiadas com o Oscar, os temas dos filmes da série são disputados entre os artistas do momento. Já gravaram canções de 007 nomes como Paul McCartney, A-ha, Shirley Bassey, Tom Jones, Lulu, Tina Turner, Madonna, Garbage, Nancy Sinatra, Duran Duran, Sheryl Crow e Carly Simon. No serviço de streaming Amazon Prime, por sinal, está disponível um documentário em torno da criação de várias destas famosas canções feitas e gravadas para cada filme. Chama-se As Músicas de 007.
007 Contra a Chantagem Atômica (1965)
>> Já a tão famosa música-tema de James Bond foi composta por Monty Norman. Entretanto, a cara definitiva dela foi dada pelo maestro John Barry, junto aos músicos de sua banda, que misturava rock e jazz. A música vendeu mais de 25 milhões de discos e está presente em todos os filmes da série. Em As Músicas de 007, toda a sua concepção é dissecada também.
>> Outra marca registrada dos filmes do agente são as bond girls. Em 25 produções, a franquia já apresentou quase 60 delas. A mais famosa delas é a suíça Ursula Andress.
>> Apesar da saga contar com muitas mulheres, foi apenas no mais recente longa que uma mulher ocupou o papel do agente. A personagem interpretada pela atriz Lashana Lynch assume o codinome 007 durante a aposentadoria do astro da espionagem, no início de 007 – Sem Tempo Para Morrer (2021).
>> Ainda sobre as bond girls, apenas duas atrizes reprisaram seus papéis: Eunice Gayson e Léa Seydoux.
Com 007 só se Vive Duas Vezes (1967)
>> Desde o primeiro filme da saga, James Bond também é lembrado pelo seu famoso drink: um martini batido (e não mexido) com vodka (e não gim). O pedido do agente foi tão marcante que fez a popularidade do gim cair.
>> Mais de 45 carros já passaram pelas mãos de James Bond. O mais famoso deles é um Aston Martin DB5, utilizado em 007 Contra Goldfinger (1964). O automóvel era equipado com traquitanas nada usuais sobre quatro rodas, como assento ejetor e metralhadoras.
>> A frase “Meu nome é Bond, James Bond” é uma das mais conhecidas da história do cinema. Ela foi dita pela primeira vez já no primeiro filme, aos 5 minutos e 38 segundos de 007 Contra o Satânico Dr. No (1962).
007 A Serviço Secreto de Sua Majestade (1969)
>> É necessária muita vontade para viver o agente britânico nas telas. Por conta das locações em diversas partes do mundo e das muitas cenas de ação, as jornadas diárias de trabalho dos protagonistas duram em média 14 horas.
>> Tendo arrecadado mais de 12 bilhões de dólares, 007 é a série de filmes mais lucrativa da história do cinema.
>> James Bond foi eleito o maior herói de Hollywood pela Entertainment Weekly em 2009. O segundo lugar ficou com Indiana Jones e o terceiro com o Homem-Aranha.
>> James Bond não é o único agente da MI-6. O codinome 007 se refere a um seleto grupo de agentes 00, onde cada zero significava inicialmente o número de mortes necessárias para se tornar um espião.
>> A designação 00 também significa (a partir do terceiro livro, 007 Contra o Foguete da Morte, publicado em 1955) que o agente possui a “licença para matar” concedida pela rainha da Inglaterra.
>> Somando todos os filmes, James Bond já matou mais de 600 pessoas.
Com 007 Viva e Deixe Morrer(1973)
>> Inicialmente Ian Fleming, via como o filme perfeito do 007 uma produção dirigida por Alfred Hitchcock e estrelada por Cary Grant. Entretanto, o escritor mudou de ideia quando viu Sean Connery em 007 Contra o Satânico Dr. No (1962).
>> Entre os atores que protagonizaram os filmes de 007, apenas Daniel Craig e Roger Moore eram, de fato, ingleses. Pierce Brosnan é irlandês. Sean Connery, escocês. Timothy Dalton veio do País de Gales. Já George Lazenby era australiano.
>> Um dos filmes de James Bond tem uma cena realizada no Brasil. Em 007 Contra o Foguete da Morte (1979), Roger Moore veio ao Brasil rodar o filme. A cena de ação tem o bondinho do Pão de Açúcar como cenário.
007 Contra o Fogeuete da Morte (1979)
>> Sean Connery quase foi morto durante a gravação de uma cena de perseguição com um helicóptero em Moscou Contra 007 (1963). O piloto era inexperiente e voou baixo demais.
>> Assim como o agente secreto, Connery também fez parte da marinha britânica. O ator se alistou aos 16 anos mas precisou se afastar por conta de problemas de saúde
>> O ator que primeiro fez 007 nos cinemas passou 12 anos sem interpretar o papel. Ausente desde 1971, retornou em 1983, em 007 – Nunca Mais Outra Vez, o tal filme que não era da Eon. Foi convencido por sua esposa a retomar o papel que o fizera famoso no cinema.
007 Somente Para Seus Olhos(1981)
>> Sean Connery foi consagrado como sir em 2000, quando tornou-se um dos cavaleiros da Rainha Elizabeth II pelos serviços pelo cinema e pelas artes.
>> Sua performance como James Bond foi ranqueada em quinto lugar na lista dos 100 maiores personagens de todos os tempos elaborada pela revista francesa Première.
007 – Permissão Para Matar(1989)
>> George Lazenby participou de um único filme da franquia, 007 A Serviço Secreto de Sua Majestade(1969). Isso ocorreu durante um breve período de ausência de Sean Connery.
>> Durante o filme, Lazenby acusou seu par romântico, Diana Rigg, de comer alho propositadamente antes de atuarem juntos em cenas de amor.
>> O australiano desejava fazer as próprias cenas de ação sem uso de dublês, porém o estúdio era contra. Um dia foi permitido que ele fizesse uma das cenas de acrobacia. O ator quebrou o braço, o que atrasou as filmagens.
>> Lazenby foi convidado para uma sequência, porém recusou. Acreditava que o agente secreto britânico se tornaria um anacronismo em plena era de Woodstock.
>> Além de um filme de 007, George fez outra aparição como um agente britânico secreto no telefilme A Volta do Agente da UNCLE (1983), que tinha como base uma popular série também de TV. Seu personagem é chamado de JB, que poderia significar James Bond. Neste longa, ele também diz o famoso bordão “batido, não mexido”.
007 Contra GoldenEye (1995)
>> Era para Roger Moore interpretar o agente britânico mais cedo. Ian Fleming queria o ator desde o primeiro filme, porém ele não pode aceitar por estar envolvido com a série O Santo (1962-1969).
>> Em um intervalo de 12 anos (1973-1985), Roger Moore atuou em sete filmes do agente britânico. É o ator que mais participou de filmes da Eon como James Bond, superando por um título Sean Connery.
>> Claro que com todo este tempo interpretando o agente secreto, Moore saiu com algumas marcas. Em Com 007 Viva e Deixe Morrer (1973), quebrou um dente em uma cena de perseguição em uma lancha. Em 007 Contra Octopussy (1983), cortou a mão e deslocou um ombro.
>> Os contratos de Roger incluíam uma cláusula que garantia a ele um suprimento ilimitado de cigarros da marca Monte Cristo.
>> Moore também achava que corria de forma esquisita. Por isso, precisou de dublês para todas as cenas em que seu personagem aparece correndo.
007 – Casino Royale (2006)
>> Timothy Dalton fez dois filmes como James Bond: 007 Marcado Para a Morte (1987) e 007 – Permissão Para Matar (1989). Ele deveria estrelar um terceiro título. Porém, por conta de problemas com o roteiro e a produção, ocorreu um intervalo gigante até o próximo filme. Quando finalmente começaram a produzir 007 Contra GoldenEye (lançado em 1985), o ator abriu mão do papel.
>> Dalton incorporou um James Bond mais humano, realista e condizente com os livros de Ian Fleming
>> Seu Bond foi o último a fumar nas telas.
>> Os filmes de Dalton foram gravados no auge da epidemia de aids. Por isso, o ator sugeriu que James Bond tivesse apenas um relacionamento. A ideia foi acatada e assim a relação teve ares mais românticos do que nos filmes anteriores.
>> Segundo o galês, seus filmes favoritos do agente secreto britânico são: 007 Contra o Satânico Dr. No (1962), Moscou Contra 007 (1963) e 007 Contra Goldfinger (1964). A justificativa é de serem mais parecidos com os livros de Fleming.
007 Operação Skyfall(2012)
>> Pierce Brosnan interpretou James Bond entre 1995 e 2002. Durante esse período, o ator foi liberado para participar de outras produções. A única restrição era quanto ao uso em cena de um smoking.
>>007 Contra GoldenEye (1985) termina com o saldo final de 47 mortos, fazendo deste o filme um dos mais letais da franquia. O James Bond de Brosnan também é o mais assassino de todos. O ator matou 135 pessoas durante sua trajetória como o agente britânico.
>> O primeiro convite para ele atuar como James Bond veio por causa de sua primeira mulher, a atriz Cassandra Harris, que atuou em 007 – Somente Para Seus Olhos (1981), ao lado de Roger Moore. Brosnan foi visitá-la no set deste filme e o produtor ficou encantado com o ator. “Se este cara souber atuar, ele é meu próximo Bond”, disse Broccoli.
>> Pierce Brosnan foi convidado, então, para substituir Moore. Ele, porém, não pode aceitar o papel na época por estar atuando na série Jogo Duplo.
>> Além de seu salário, Brosnan recebeu um carro por cada filme.
007 Contra Spectre (2015)
>> A escolha de Daniel Craig para interpretar Bond foi polêmica já que ele é loiro, enquanto James Bond é tradicionalmente moreno. Além disso, o ator nasceu seis anos depois da estreia do primeiro filme da série.
>> Na primeira cena de luta de Casino Royale (a versão de 2006, já com os direitos adquiridos pela Eon), Craig levou um soco e perdeu dois dentes.
>> A era Daniel Craig se diverge das outras, já que pela primeira vez há uma trajetória completa, formando uma sequência, uma história coesa. Os filmes anteriores, embora fossem com o mesmo ator fazendo o papel de James Bond, sempre se revelavam aventuras independentes umas das outras.
>> Daniel Craig foi o ator que deteve por mais tempo o posto de 007: foi uma década e meia entre os lançamentos de Casino Royale (2006) e de 007 Sem Tempo Para Morrer (2021). Inclusive, a marinha britânica chegou até a dar ao ator o título de comandante honorário, a mesma patente do agente nos filmes.
>> Daniel Craig é o James Bond que mais bebe em toda a trajetória do personagem nos cinemas.
Oito motivos para não perder um dos dez concertos da turnê de 40 anos de carreira, que trará de volta os sete integrantes da formação clássica
Texto por Abonico Smith
Foto: Bob Wolfenson/Divulgação
Já dizia o velho provérbio: onde há fumaça, há fogo. Depois de algumas pistas deixadas na internet que colocaram os fãs alvoroçados sobre a possível realização de um antigo sonho, eis que tudo vem à tona oficialmente e agora como verdade: sim, os Titãs voltarão a reunir em um mesmo palco a sua formação clássica, com o retorno de quatro integrantes que deixaram a banda ao longo dos últimos trinta anos. Vale lembrar ainda que haverá, nesses shows, uma homenagem ao oitavo membro da trupe, Marcelo Fromer, falecido em 2001.
Não é definitivo nem duradouro este reencontro, claro. Isso será parte de uma turnê que celebra os 40 anos de trajetória deste grande ícone do rock brasileiro. O evento ganhou o nome de Encontro – Todos ao Mesmo Tempo Agora. Ao todo serão dez datas entre abril e junho de 2023. As cidades que receberão o show especial serão, pela ordem, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Florianópolis, Porto Alegre, Salvador, Recife, Fortaleza, Brasília, Curitiba, São Paulo. A pré-venda dos ingressos começa hoje para quem fez cadastro no site oficial da tour. A venda para os outros compradores tem início no próximo dia 22. Informações sobre preços, locais e cadastro você tem ao clicar aqui. Mais para a frente, ainda haverá a disponibilização de particularidades aos fãs, como peças oficiais de merchandising, NFT e até um grupo de Telegram.
Por tudo isso, o Mondo Bacana elenca oito motivos para você não perder de jeito nenhum uma destas dez apresentações dos agora todos 60+. E não titubeie se você nunca teve a sorte de ver a banda “inteira” de uma só vez – já o autor deste texto foi agraciado por esta oportunidade várias vezes pela TV e in loco entre os anos de 1984 e 1992. Esta poderá ser a última reunião dos sete músicos que escreveram o nome dos Titãs na história o rock nacional.
Pós-punk Rio-São Paulo
O começo da década de 1980 foi de uma efervescência mágica nas praias cariocas e nos inferninhos subterrâneos das ruas da cidade de São Paulo. Eram os anos em que a ditadura militar se esfacelava e se arrastava moribunda no Brasil e, talvez por isso mesmo, toda uma cultura jovem se formava nos grandes centros urbanos. Ainda plenamente insatisfeitos com o cotidiano e sua consequente relação com a sociedade tupiniquim que ainda não parecia querer lhes dar muita atenção, esses jovens procuravam falar, gritar, espernear. No Rio de Janeiro, a verborragia e atitude criativa dos vinte e poucos anos se estendia das praias à lona do Circo Voador e às ondas da rádio Fluminense FM, que botava no ar toscas gravações de fitas cassete de novas bandas e cantores (Blitz, Kid Abelha, Paralamas do Sucesso, Lobão, Sangue da Cidade), ainda longe de qualquer espaço no mainstream artístico nacional. Já em São Paulo, a coisa acontecia no circuito de boates alternativas como Napalm, Rose Bom Bom, Madame Satã e Carbono 14. A estética traduzia para o português muito do que acontecia no eixo anglo-americano em sonoridades, figurinos e penteados. Enquanto esse underground fervilhava de representatividade nos quadrinhos e tiras de jornal criados por cartunistas como Glauco, Laerte e sobretudo Angeli, bandas como Titãs, Gang 90 e Absurdettes, Ira!, Magazine, Mercenárias, Fellini, Akira S e as Garotas que Erraram, Patife Band, Voluntários da Pátria, Inocentes, Violeta de Outono e Ultraje a Rigor (mais agregados que volta e meia vinham de Brasília, como Plebe Rude, Legião Urbana e Capital Inicial) começavam todo um culto e burburinho ao redor de apresentações ao vivo e gravações em cassete da turma. Lojas como a Baratos Afins, cultuado ponto de encontro de apaixonados por música e colecionadores de discos que circulavam pelas grande galerias do centro paulistano, viravam selos e passavam a transformar, aos poucos, essa cena em realidade fonográfica. Comunicadores como Kid Vinil e Serginho Groisman (mais programas musicaisda TV Cultura e constantes matérias dos jornais Folha de S. Paulo e O Estado de S. Paulo) promoviam também todo um oba-oba em torno desses artistas e sonoridades ainda estranhas para os ouvidos da grande massa.
Performance de palco
Os Titãs começaram com nove pessoas, aglutinando gente que vinha de trabalhos anteriores, como a Banda Performática do artista plástico Aguilar, o Trio Mamão e a banda de ritmos caribenhos Sossega Leão. Quando assinaram contrato com a gravadora Warner e passaram a se apresentar em programas de emissoras de TV paulistas (Cultura, SBT Band) em 1984, fecharam a formação em oito. Era, ainda assim, muita gente para dividir um mesmo palco. Alguns praticavam revezamento de instrumentos. Os dois guitarristas (Marcelo Fromer e Tony Bellotto) e o baixista (Nando Reis, na maior parte do repertório) inventavam coreografias sincronizadas para este subgrupo. Já os três backing vocals de cada música (Branco Mello, Arnaldo Antunes e uma terceira posição que trazia às vezes Nando, Paulo Miklos e Sergio Britto) chamavam a atenção com coreografias esquisitas e individualizadas: Branco se esbaldava no pogo, Arnaldo encantava pelos passos robóticos, Paulo já chamava a atenção pelas caretas e gestos que reforçavam sua aura de esquisito. A esbórnia em cena era tamanha que trazia todo um novo significado para aquela leitura rock’n’rollcult de canções de alma brega (“Sonífera Ilha”, “Toda Cor”). Também havia traços de ska e do reggae jamaicano (“Querem Meu Sangue”, “Marvin”) e um pequeno eco de poesia marginal/tropicalista (“Go Back”).
Televisão
Mal o primeiro álbum, homônimo, abria espaço na mídia e trazia uma pequena popularidade aos Titãs, eles já entraram em estúdio para o segundo álbum, agora sob a produção de Lulu Santos, nome escolhido pelos próprios músicos para conseguir fugir da sonoridade pós-punk das bandas da época. E em menos de um ano depois da estreia, o álbum Televisão chegava às lojas revestindo a alma brega do início da banda com um pouco mais de agressividade nos arranjos e nos vocais. A faixa-título era um libelo contra a programação idiotizante das emissoras de TV da época e, ao mesmo tempo, tornou-se um trunfo sarcástico para eles próprios frequentarem programas de auditório da telinha (Hebe, Chacrinha, Bolinha, Raul Gil, Barros de Alencar) e esfregarem na cara dos espectadores toda aquela passividade sem muito questionamento ou inteligência à qual estavam expostos nas camás, sofás e poltronas de sua casa. Além deste grande hit, o disco proveu outros sucessos menores como “Insensível” e o hardcore “Massacre”. Curiosamente duas faixas deste repertório passaram completamente em branco nesta época e somente se transformaram em hits na década seguinte, depois que o grupo se rendeu à moda dos acústicos da MTV Brasil: “Pra Dizer Adeus” e “Não Vou Me Adaptar”.
Cabeça Dinossauro
Alguns indícios já vinham de Televisão, mas o grupo lançou em 1986 seu grande disco de explosão, visceralidade e revolta depois que dois integrantes (Tony e Arnaldo) foram presos em novembro de 1985, sob a acusação de porte e tráfico de heroína. Liminha, que já assinara a supervisão do disco anterior, agora tomou as rédeas da produção destas 13 faixas que traziam o Titãs se esbaldando feito pintos no lixo no território do punk rock. Em uma tacada só, detonavam instituições (“Igreja”, “Família”, “Polícia”). Previam as criaturas odiosas que sairiam dos esgotos décadas depois para tomar conta do noticiário e da política nacional (“Bichos Escrotos”). Vociferavam contra a elite (“Porrada”), as melodias bonitinhas (“AAUU”), a violência do capitalismo selvagem ( “Homem Primata”) e a do Estado contra seu povo (“Estado Violência”). E, segundo o exemplo da obra anterior, apontavam para um futuro próximo da banda na última faixa – “O Que” partia de uma poesia visual-concretista de Arnaldo para brincar com a sonoridade eletrônica que se acentuaria nos dois álbuns vindouros. Com o passar dos anos, Cabeça Dinossauro apenas confirmou sua condição de clássico, um dos maiores trabalhos do rock brasileiro em todos os tempos.
Jesus Não Tem Dentes no País dos Banguelas
Em 1987, depois do avassalador sucesso do acesso de fúria de Cabeça Dinossauro, os Titãs – de novo sob a batuta de Liminha – passaram a flertar mais com a eletrônica e os grooves do funk. Ao mesmo tempo, carregava as letras de protestos contra a situação sócio-econômica de um país que prometia um futuro promissor ao deixar para trás a ditadura militar mas ainda rastejava para dar melhores condições a seu povo. Por isso, além da faixa-título, “Comida”, “Desordem”, “Lugar Nenhum”, “Armas Para Lutar”, “Mentiras” e “Nome aos Bois” definem o lado panfletário do discurso, que ainda traz reflexões sobre excessos pessoais (“Diversão”) e polarizações (“Corações e Mentes”). Em tempo: nesses últimos anos o carregamento de bichos escrotos que pipocou aos quatro cantos do Brasil e do mundo já faz urgente uma necessidade da banda fazer uma versão 2.0 de “Nome aos Bois”.
Õ Blésq Blõm
Prevendo o diálogo com as sonoridades regionais brasileiras que daria o tom ao rock nacional da década seguinte, os Titãs, lançaram outro clássico supremo de sua discografia em 1989, também produzido por Liminha. Assumindo cada vez mais a paixão pelas programações, “Miséria” abre o trabalho logo após a vinheta com um breve sample dos repentistas Mauro e Quitéria. A capa, uma colagem gráfica assinada por Arnaldo, voltava a levar a banda ao território punk. Faixas como “Flores”, “32 Dentes e “O Pulso” (uma lista que intercala doenças e situações doentias que servia, justamente como indica o título, para ratificar toda e qualquer forma de vida) ainda mantinham um pezinho do rock, mas outras como “Deus e o Diabo” e “O Camelo e o Dromedário” reafirmavam o crescimento de um novo Titãs, cada vez mais imerso em experimentações, sintetizadores e batidas eletrônicas. Em tempo: o título veio de uma expressão cantada pelo casal pernambucano em uma língua inexistente, que misturava sonoridades do português com as de outros idiomas. O que, esteticamente, combinava demais com o momento sonoro do octeto.
Muito além da banda
Já faz alguns anos que os Titãs hoje tem a formação reduzida a três integrantes originais (Sergio, Branco e Tony). Pouco a pouco, os demais foram deixando o grupo. Arnaldo foi o primeiro, em dezembro de 1992, a optar por seguir uma carreira solo na qual pudesse conciliar a música com projetos literários e de artes gráficas. Entre 1994 e 1995, durante um período de hibernação da banda para descanso das relações pessoais, alguns dos integrantes fundaram o selo alternativo Banguela ao lado dos saudosos produtores Carlos Eduardo Miranda e Vagner Garcia, revelando nomes como Raimundos, mundo livre s/a, Little Quail and the Mad Birds e Maskavo. Paulo e Nando, neste período, também se lançaram “solo em paralelo”. O baixista se separou de vez do coletivo em 2002, dando início a uma cultuada carreira de cantautor, inclusive regravando sucessos seus na voz de sua amiga recém-falecida Cassia Eller. Em 2010, o baterista Charles Gavin, que já tinha dado bons passos no ramo de pesquisador e produtor musical e estava sofrendo sintomas de pânico e depressão, não aguentou mais a vida na estrada e pendurou as baquetas titânicas. Seis anos depois, Paulo partiu de vez, agora para se equilibrar entre as facetas de cantor solo e ator no cinema e televisão. Os três que ficaram, entretanto, também fizeram bons trabalhos longe da marca Titãs. Sergio e Branco, naquela parada de meados dos 1990, criaram o grupo de pós-punk Kleiderman. O primeiro também chegou a lançar discos solo depois disso. O segundo apostou as fichas na criação de trilhas sonoras para peças teatrais e programas de TV. Já Tony abraçou outra grande paixão, a literatura. Já publicou 12 livros, sendo quatro do detetive Bellini (dois transformados em filme para o cinema). Sua mais recente obra, Dom, também se transformou em série de dramaturgia para o streaming, com roteiro também assinado pelo autor.
Marcelo Fromer
Aluno de violão de Luiz Tatit (professor, linguista e músico do grupo Rumo) na adolescência, apaixonado por gastronomia (publicou o livro Você Tem Fome de Quê? em 1999) e torcedor fervoroso do São Paulo (a loucura apor futebol levou-o ao posto de comentarista do canal esportivo SporTV durante a Copa do Mundo de 1998, frilas de cronista do jornal Folha de S. Paulo e uma biografia inacabada do ex-centroavante Casagrande), Fromer morreu aos 39 anos, no dia 13 de junho de 2001, após ser atropelado por um motoqueiro nos Jardins, em São Paulo. A banda, recém-contratada pelo selo Abril Music, braço fonográfico da Editora Abril que pouco durou no mercado mas teve atuação intensa e lançou discos de nomes como Los Hermanos, Ira!, Capital Inicial, CPM 22, Erasmo Carlos, Inocentes, Ultraje a Rigor, mundo livre s/a, Marina Lima, Rita Lee, Gal Costa, Alceu Valença e Marcelo Nova), estava prestes a começar a gravar as 16 faixas que sairiam no álbum A Melhor Banda de Todos os Tempos da Última Semana. Abalado pelo trágico acontecimento, o grupo chegou a cogitar encerrar suas atividades. Se isso realmente acontecesse, não sairiam mais clássicos para o repertório dos Titãs como “Epitáfio”, “Isso” e a música-título. Detalhe: este foi o último disco de estúdio do grupo produzido por Jack Endino (Nirvana Soundgarden, Mudhoney), que já havia feito com os brasileiros Titanomaquia (1993), Domingo (1995) e Volume Dois (1998).