Music

Billy Idol – ao vivo

Lenda-viva do rock volta ao país depois de 31 anos e faz em São Paulo um voo de cruzeiro seguro e sem turbulências

Billy Idol, durante a apresentação no Rock In Rio, um dia depois de cantar em SP

Texto por Fabio Soares

Foto: Amanda Respicio (Célula Pop)

Quando em meados de março deste ano a organização do evento Popload Gig anunciou a vinda de Billy Idol a São Paulo, muito especulou-se sobre a qualidade da apresentação. O astro que esteve na sala de parto de nascimento do movimento punk também estava longe do Sul das Américas há (inacreditáveis) 31 anos e meio. A única vez que aportou por aqui foi na segunda edição do Rock In Rio, em 1991, quando substituira Robert Plant no palco montado no gramado do Maracanã.

Se o festival, lá atrás, trouxe para cá um artista com 35 anos de idade e uma vida regada a excessos que culminaram num recente grave acidente de moto que quase custou-lhe a amputação de uma perna, a atual The Roadside Tour 2022 apresenta um senhor à beira dos 67 anos, avô das pequenas Poppy Rebel e Mary Jane e em ótima forma física. E ainda ladeado por seu fiel escudeiro Steve Stevens, a guitarra-viva de sua carreira por quase quatro décadas.

O local escolhido para sua apresentação na capita paulista no último dia 8 de setembro foi o Pavilhão Pacaembu. Este nada mais é que um espaço construído em cima do gramado do estádio Paulo Machado de Carvalho, concedido (de forma “criminosa”) à iniciativa privada no início de 2020. Passando pelo portão monumental do estádio (ao menos isso foi preservado da octogenária construção!), o cenário é de choque: os setores laranja, cadeiras cobertas e cabines de rádio, localizados na parte central do antigo estádio, foram completamente destruídos. Já os setores amarelo e verde (a famosa curva atrás do gol voltado à Praça Charles Miller) foram substituídos por HORRENDOS assentos metálicos que em nada lembram as arquibancadas originais. A concessão foi ilegal do ponto de vista jurídico? Não! Mas certamente foi imoral diante da história deste templo do futebol brasileiro.

Voltemos ao concerto de 2022. O público, como esperado, era formado por quarentões e cinquentões que não esperavam nada mais que muita diversão diante um desfile de sucessos. Pontualmente às 20h30 vieram os primeiros acordes de “Dancing With Myself” com a guitarra de Steven Stevens mantendo-se fiel à gravação original. Cartucho queimado cedo demais? Talvez! Mas vamos combinar que ganhar o público logo de cara facilita as coisas. Praticamente passaram desapercebidos o baixo volume do microfone do cantor e da má equalização das guitarras que se seguiu em “Cradle Of Love”, mitológico hit escalado como segunda canção da noite. A audiência, que cantou em unissono sua letra, transformou a pista num verdadeiro Baile da Saudade. Era a trilha sonora da infância e adolescência de muitos ali e toda esta emoção acumulada suplantou os problemas técnicos.

A parte visual do espetáculo também chamou atenção. Inicialmente, imagens de um vilarejo britânico foram projetadas nos dois telões de led instalados de forma paralela do palco. Depois, a projeção de uma hipotética Times Square remeteu uma Nova York viva e pulsante que Billy encontrou logo após sair das fileiras do Generation X, o mitológico grupo inglês que o revelou.

“É maravilhoso estar aqui após trinta anos”, disse o cantante antes dos acordes incidentais de “Eyes Without A Face”. Alías, que atire a primeira pedra quem não possui alguma história com esta canção como pano de fundo. Unanimidade entre punks, metaleiros, dentistas e ascensoristas, seus versos certamente abalaram as estruturas daquele Pacaembu semidestruído. Perfeita comunhão artista-plateia que muito bem recebeu os recém lançados singles “Cage” e “Bitter Taste”, assim como o solo de quase três minutos de Steve Stevens. Um dos maiores guitarristas da história também executou parte do tema central de Top Gun (de sua autoria) para delírio dos presentes, antes da execução da excelente “Blue Highway”, faixa integrante da pedra fundamental Rebel Yell, disco de 1983. Também foram extraídas deste álbum “Flesh For Fantasy” e, claro, a faixa homônima, num aclamado bis que ainda contou com dois covers: um do Generation X (“One Hundred Punks”) e outro dos Heartbreakers (a arrasa-quarteirão “Born To Lose”).

Jogo ganho e plateia entregue, coube ao megaclássico “White Wedding” encerrar os trabalhos em um final apoteótico e digno da história deste artista que, não à tôa, integra o panteão das lendas do rock mas é humilde o suficiente para fazer apresentações curtas mas cheias de energia. Foram noventa minutos que entrarão para a história dos presentes e do (modificado) velho Pacaembu em um voo de brigadeiro, sem turbulências e com tranquila aterrissagem. Ou, como diriam os argentinos, “un balazo musical”.

Set list: “Dancing With Myself”, “Cradle Of Love”, “Flesh For Fantasy”, “Cage”, “Speed”, “Bitter Taste”, “Eyes Without a Face”, solo de guitarra de Steven Stevens, “Mony Mony”, “Running From The Ghost”, “One Hundred Punks”, “Blue Highway” e “Top Gun Anthem”. Bis: “Rebel Yell”, “Born To Lose” e “White Wedding”. 

Music

Strokes

The New Abnormal apresenta tons de nostalgia e melancolia mas ainda não é capaz de fazer a banda reviver toda a maestria dos dois primeiros álbuns

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Texto por Ana Clara Braga

Foto: Divulgação

Fãs de rock tem a péssima mania de rotular novas bandas como “salvadora” do gênero. Algo um tanto quanto preconceituoso, musicalmente falando, e ingênuo. Esse pensamento de que um estado puro do rock precisa ser resgatado tem o poder de conturbar e até afundar muitas carreiras. O Strokes, quando surgiu, sofreu com a pressão do título de messias. O que poderia ser uma benção de fãs e críticos provou ser uma maldição quando a banda não conseguiu entregar trabalhos tão interessantes quanto os dois primeiros álbuns.

Quase vinte anos após a estreia, o grupo nova-iorquino lançou seu sexto álbum de estúdio, The New Abnormal (Cult/RCA Records). Foram sete anos de um hiato precedido pelo desastroso Comedown Machine. E a banda liderada por Julian Casablancas tinha muito a provar para seus sempre esperançosos fãs e para uma exigente mídia especializada.

De cara já é possível constatar que o novo trabalho é muito melhor que o antecessor. Os vocais de Casablancas – também o dono do selo pelo qual o quinteto faz seus discos agora – também melhoraram. Os falsetes estão mais certeiros, o que melhora muito a experiências das canções. A primeira faixa, “The Adults Are Talking”, tem o som centrado no baixo, uma abordagem diferente dos principais hits da banda.

No geral, o trabalho aborda sentimentos de nostalgia e melancolia. É fato que são temáticas já conhecidas de trabalhos anteriores, mas em The New Abnormal elas tomam outra proporção. Para uma banda que sempre foi apontada como a ressurreição do Velvet Underground e o “novo antigo”, a conformidade de que o passado nunca retorna em “Brooklyn Bridge To Chorus” soa catártica. “And the ’80s bands? Oh, where did they go?”, Julian canta. Se o passado nunca volta, porque voltaria na música?

Os sintetizadores sempre foram amigos do som do grupo e aqui não é diferente. Muitas faixas como “At The Door” e “Ode To The Mets” carregam a mistura do som tradicional das guitarristas com a modernidade do eletrônico. Em uma homenagem aos ídolos, o Strokes inspirou-se em várias canções já famosas para produzir The New Abnormal. Por exemplo: “Bad Decisions” é uma reescrita (de menor qualidade) de “Dancing With Myself”, hit de Billy Idol.

O álbum começa promissor, mas se perde em canções que poderiam ter sido revisadas mais algumas vezes antes da versão final. Não soa pronto e essa não parece ter sido a intenção.  Se repensado mais vezes, tinha chances de ser grande, com canções mais polidas e quem sabe uma faixa a menos (“Selfless” é uma balada completamente desnecessária!).

The New Abnormal faz um bom trabalho em redimir um desastroso passado recente. Infelizmente, o grupo não conseguiu atingir toda a qualidade da qual é capaz e o mediano não é bom o bastante para quem já provou ser grande logo no início. O Strokes permanece um eterno refém do hype do início dos anos 2000. Enquanto outras bandas contemporâneas conseguiram sair da caixinha e encontrar novos caminhos, a carreira dos nova-iorquinos parece ainda estar presa e assombrada pelos primeiros elogios que receberam.

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