Music

Dionne Warwick

Oito motivos para não perder um show desta que muito provavelmente deverá ser a última passagem da cantora por nosso país

Texto e tradução por Abonico Smith

Foto: Divulgação

Nesta sexta-feira se consumará mais um encontro mágico entre o público brasileiro e uma das maiores cantoras norte-americanas de música pop em todos os tempos. Dionne Warwick começa hoje, por Curitiba, uma nova passagem por nosso país, com direito a outras três datas (Rio de Janeiro, Brasília e São Paulo, respectivamente nos próximos dias 20, 23 e 28 de maio). Mais informações sobre a turnê você encontra clicando aqui.

A mais perfeita tradução vocal das melodias compostas por Burt Bacharach em parceria com os versos do letrista Hal David, Dionne Warwick chega por aqui com sua nova tour. O nome, One Last Time, entretanto indica uma coisa triste: apesar da química sempre perfeita demonstrada nas outras vezes em que artista e audiência verde-amarela estiveram frente a frente, esta parece ser mesmo a última oportunidade para desfrutar ao vivo de sua voz doce.

O Mondo Bacana preparou oito motivos para você não perder esta noite especial comandada por Warwick. As aspas foram retiradas de uma entrevista concedida por ela dias antes do embarque rumo ao nosso país.

Última vez?

A expressão que dá nome à tour, One Last Time, pode ser traduzida para o português como “uma última vez”. Claro que tudo no showbiz pode mudar dependendo das circunstâncias de momento, além do entretenimento do ramo dos concertos gostar de usar bastante batismos que apelem para o emocional dos fãs. Só que isso indica mesmo ser esta a derradeira passagem da cantora por terras brasileiras. No último mês de dezembro ela completou 82 anos e a idade começa a pesar quando os artistas vão envelhecendo e ficando sem muita paciência para encarar longos tempos de viagens de lá para cá, daqui para ali. Warwick ainda corrobora a questão sendo franca em relação a isso. “Não estou parando com a música. Saberei muito bem quando chegar esta hora de parar, acredite em mim. Será quando eu notar que não conseguirei mais dar o meu melhor. Mas eu venho de um grande número de turnês, tantas quantas eu consigo fazer. Portanto, este nome não indica sobre parada na carreira, apenas um jeito de desacelerar o ritmo das viagens. É aquele negócio de passar menos dias na estrada, correndo por aeroportos”.

Melhor de si ao vivo

Dionne nunca escondeu sua satisfação e extrema vontade de subir aos palcos mundo afora. “Fico excitada sobretudo por estar em plena capacidade de vir a uma platéia e cantar aquilo que todo mundo espera de mim. Eu me preparo bastante para isso por todo este tempo. Entrego vários clássicos e ainda posso fazer surpresas com algumas canções nunca antes ouvidas. Estive ainda trabalhando ativamente esses últimos anos, gravando coisas novas”.

Clássicos eternos

Segundo a própria Dionne, existe um punhado de músicas “obrigatórias” em todos os seus shows. “I Say a Little Prayer” não pode ficar fora das turnês. “Do You Know The Way To San José?” não pode focar fora das turnês. “Alfie” não pode ficar fora das turnês. “I’ll Never Fall In Love Again” não pode ficar fora das turnês. “Toda canção que eu tenho em meu set list é uma canção que eu sei que as pessoas estão esperando que eu cante. Então eu preparo um repertório sempre de acordo com isso”.

Burt Bacharach & Hal David

Pode reparar. Mil e um nomes já fizeram suas versões de composições assinadas pela dupla que se transformou em excelência no cancioneiro popular norte-americano. Entretanto, Dionne Warwick se transformou em excelência da excelência com sua voz arrebatadoramente aveludada ao gravar dezenas de canções desses compositores. Tanto que até hoje mais da metade de seu repertório dos concertos é composta por seus hits – a ponto dela se dar ao luxo de emendar uma na outra, como medleys, sem deixar qualquer tempo para espectadores maravilhados se recomporem nas poltronas dos teatros. Além daquelas citadas por ela mesma no parágrafo acima, aí vai outra pequena lista das preciosidades que não costumam ficar de fora da qualquer set list: “What The World Needs Now Is Love”, “Anyone Who Had a Heart”, “That´s What Friends Are For”, “This Girl Is In Love With You”, “Message To Michael” e, claro, “Walk On By”.

Ligação especial com o nosso país

“Eu amo o Brasil e o Brasil já me mostrou que me ama também. Não poderia pedir por uma relação melhor, aliás. O Brasil me deu uma dos melhores abraços que já tive na carreira, melhor do que muitos outros países. Sinto que os brasileiros querem que eu seja uma parte do que eles já são. Dizem para mim “você tem de ser brasileira” e eu me desculpo dizendo que não posso ser brasileira… (risos) É um dos sentimentos mais quentes que se pode ter, o de ser bem aceita e com paixão por um povo. Eu tento arranhar umas palavras na língua portuguesa, mas só um pouquinho… (risos) Também sempre fui muito ligada na música brasileira. Eu a amo porque ela é algo feliz para mim, me faz sorrir. É ainda uma eterna referência para o país, que faz a gente amá-lo e isso é muito importante. E a feijoada é uma coisa absolutamente extraordinária”.

Ouvidos atentos para novidades

“Não conheço muita coisa nova não, mas eu tenho sete netos e eles sempre me mantêm atualizada no que está rolando por aí, ficam tocando o que gostam para eu ouvir. Claro que continuo ouvindo música durante todos esses anos, é algo que faz bem aos meus ouvidos. E gosto de ouvir qualquer tipo ou gênero musical, é o que me mantêm aqui até hoje. Um nome mais novo que me vem imediatamente à cabeça é o de Beyoncé. Eu a conheci quando ela tinha quinze anos de idade. Já dava para saber o porquê do tamanho do sucesso que ela iria obter depois em sua carreira. Outro nome é o de Rihanna, mas não gosto só das suas aventuras no mundo da música, também do que ela fazia fora disso. Ela cresceu como uma jovem que tinha aspirações a muitas, muitas coisas, não apenas musicais. Sabe, há diversas pessoas na indústria da música seguindo os seus próprios caminhos, o que é maravilhoso, por sinal. E usando o mundo dos negócios muito bem. Há muita gente abaixo dos 30 ou mesmo lá pelos 30 anos que estão imprimindo em suas carreiras justamente aquilo que gostariam de ouvir. Claro que algumas coisas não conseguem se encaixar perfeitamente nos meus ouvidos, então não há motivos para eu ouvi-las. Mas aquilo que está sendo gravando é de acordo com a sua música, a sua sonoridade, as suas palavras. E estas pessoas depositam na indústria a sua paixão”.

Ativismo social

“Todo o tempo em que me envolvi na campanha de conscientização em relação à aids foi maravilhosamente importante. Estávamos perdendo de forma precoce muitas pessoas dentro do nosso meio. Então era hora de alguém encarar os fatos e perguntar o que está acontecendo. A última coisa que eu poderia ter feito a respeito disso era fugir. Sempre fui de me meter em questões bem sérias como essas e procurei saber como poderia ajudar quem estava contraindo o vírus na época. Fui eleita uma das embaixadoras dos Estados Unidos nesta área para descobrir como poderíamos lutar contra isso não só aqui mas em outros países. Então comecei a viajar para me encontrar com pessoas em todo o mundo, observar o que estava sendo feito e dando certo em outros lugares para que pudesse retornar e trazer isso também para o meu país. O mais importante sempre foi fazer as pessoas compreenderam como e por que tudo acontecia para lutar contra isso da maneira mais apropriada, entender as causas da aids e fazer as pessoas entenderem como se cuidar e se prevenir. Isso deu toda a repercussão para este trabalho. Mas com certeza sou e sempre fui uma pequena parte disso, não levo para mim os créditos desta empreitada inteira não”.

Poder de cura pela música

“Claro que sim, acredito nisso. É de fato uma das principais forças de cura. Veja como isso funciona em hospitais, asilos… Em bebês! Bebês reagem à música. Musica traz o poder da cura. Canções são escritas e elas também podem curar as pessoas”.

Music

Tame Impala – ao vivo

Kevin Parker dribla uma fratura no quadril para guiar os fãs na Argentina em uma hora e meia de catarse psicodélica

Texto por Frederico Di Lullo

Foto: Reprodução

Algumas coisas na vida são inesquecíveis. Você, certamente, irá lembrar para sempre do seu primeiro dia de escola, daquela paixão que arrebatou seu coração ainda adolescente, de uma viagem com amigos ou até mesmo do fim de um relacionamento. Eu, por exemplo, irei me lembrar do show do Tame Impala no Lollapalooza Argentina para sempre. Aconteça o que que acontecer. E agora vou explicar o motivo nesta humilde resenha.

Cheguei no Hipódromo de San Isidro, em Buenos Aires, por volta das 17h do dia 18 de março de 2023 e logo me impressionei com o tamanho do festival. Tudo numa distância longa, com necessários vários minutos de caminhada. O sol estava começando a ficar mais fraco e a temperatura de 34ºC ia diminuindo com a ausência de luz natural. Após presenciar os concertos de Wallows, Jane’s Addiction, Catupecu Machu (uma parte), 1975 (outra parte) e ter tomado apenas duas cervejas por 1100 pesos cada (equivalente a 14 reais; sim, o festival permitia o consumo de apenas duas latas por dia!), chegou o momento de me posicionar defronte ao palco Samsung para poder presenciar pela primeira vez uma das minhas bandas favoritas.

Assim, sete anos depois e com Kevin Parker recentemente submetido a uma cirurgia no quadril fraturado, o Tame Impala voltava para a Argentina, reencontrando-se com um público em verdadeiro frenesi e euforia desmedida. Eram 20h45 em ponto e eu estava junto a dezenas de milhares de pessoas.

E os australianos deram, com toda certeza, um dos melhores espetáculos do Lollapalooza Argentina 2023. Após um vídeo introdutório distópico, no qual era apresentado Rushium, o medicamento psicodélico presente durante toda a turnê do álbum The Slow Rush, o frontman entrou auxiliado por muletas e recebeu uma estrondosa e merecida ovação. Sim, em tempos de cancelamentos repentinos e caprichosos cortes, a atitude de Kevin é louvável e necessária. Obrigado por não desistir de nós!

Assim, sob uma catarse de efeitos visuais, lasers coloridos, overdrives e distorções, o Tame Impala começou sua jornada naquela mistura de pop psicodélico, rock clássico, sintetizadores e indie rock. O set list veio com “One More Year” e, na sequência, “Bordeline”, talvez a música mais popular do seu quarto álbum.

Durante a apresentação da banda, tive diversas sensações e agitos sensorais. Um deles foi, sem dúvida, viajar através dos loops coloridos que a sequência de “Nangs”, “Breathe Deeper” e “Posthumous Forgiveness” proporcionou: uma repetição infinita, profunda e que parecia congelar o tempo. Mas o show continuava e depois rolaram os clássicos absolutos como “Elephant”, “Lost In Yesterday” e “Apocalypse Dreams”.

A física diz que não é possível estar acelerado e, ao mesmo tempo, pairando sem movimento nenhum. Contudo, Parker e companhia demostraram isso no momento de Mutant Gossip, quando todo mundo pareceu mover-se através das ondas que apareciam ao fundo, desaparecendo no oceano de psicodelia. E se diz o ditado popular  que“as águas calmas são profundas”, o que veio depois foi o mergulho absoluto ao abismo. Era tempo de “Let It Happen”, “Feels Like We Only Go Backwards”, “Eventually” e “One More Hour, que fechou a primeira parte do show e encontrou a comunhão de corpos dançando como se não houvesse amanhã.

Ainda houve tempo para um bis quiçá um pouco mais introspectivo, mas igualmente enérgico. Aqui foi tocado “The Less I Know the Better” e “New Person, Same Old Mistakes”. Assim, pontualmente às 22h15, o turbilhão colorido psicodélico chamado Tame Impala encerrou sua participação no Lollapalooza Argentina, deixando todos os fãs realmente em êxtase e com muita coisa para processar, entender e viabilizar. Do fundo do meu coração, espero ver novamente eles em breve.

Fumei um cigarro, respirei fundo e corri para assistir ao Twenty One Pilots. Mas essa história conto em outro momento.

Set list: Rushium Intro, “One More Year”, “Borderline”, “Nangs”, “Breathe Deeper”, “Posthumous Forgiveness”, “Elephant”, “Lost In Yesterday”, “Apocalypse Dreams”, Mutant Gossip, “Let It Happen”, “Feels Like We Only Go Backwards”, “Eventually” e “One More Hour”. Bis: “The Less I Know the Better” e “New Person, Same Old Mistakes”.

Sports

Pelé – Parte 1

Do maior craque do futebol de todos os tempos a Edson: a divindade transcende o homem que se tornou o brasileiro mais conhecido do planeta

Texto por Fábio Soares

Fotos: Reprodução

Ao morrer, na tarde deste 29 de dezembro de 2022, Edson Arantes do Nascimento era a pessoa física mais conhecida do planeta Terra. Rei em outro planeta (chamado Bola), transformou o ofício de seu esporte num ato tão simples quanto tomar um copo d’água.

Na véspera de sua despedida do Santos, no dia 2 de outubro de 1974, ele era dúvida para a partida devido à sua condição física. Entretanto, declarou um pouco antes: “Jogo até de muletas!”. Na vitória santista contra a Ponte Preta por 2 a 0 não marcou mas monopolizou as atenções do mundo ao ajoelhar-se de braços abertos no círculo central, aos 22 minutos do segundo tempo.

Para além da questão futebolística, a imagem de Pelé transcendia a estética fotográfica. O Rei negro com uniforme branco e número 10 às costas transformou-se em ícone pop que encantou, inclusive, Andy Warhol, que imortalizou seu rosto numa serigrafia em 1977 – obra esta que foi arrebatada por US$ 855 mil, cerca de R$ 3,58 milhões num leilão da Christie’s, em Nova York, em novembro de 2019.

“Te conheço há um bom tempo. Sou uma pessoa muito mais curiosa do que vocês imaginam. Inclusive, canto samba. Qualquer dia vamos cantar um samba”, teria dito o artista ao Rei. Coincidência ou não, o álbum The New Brazil’ 77, de Sérgio Mendes, encontrava-se estourado nas rádios norte-americanas.

O mundo de sonhos de Pelé com contornos de parque de diversões dentro dos gramados, no entanto (e por muitas vezes), contrastou com atitudes nada elogiáveis do homem Edson Arantes do Nascimento. Como a falta de engajamento político, a constante onipresença ao lado de presidentes americanos e sobretudo o modo como deixou-se ser usado pela ditadura militar de Médici com ares de alienação. “A gente sabia de muitas coisas que aconteciam no país, mas outras não”. Houve ainda a forma inacreditável que lidou com a questão de sua filha biológica Sandra Regina (morta em 2006). Tudo isso escancarou o lado “santo com pés de barro”, o homem com muitos defeitos, a pessoa real por trás do personagem. 

Desde 1957, quando passou a defender o time dos profissionais do Santos, Pelé é um, Edson é outro. Assim como Diego era um, Maradona era outro e Ziggy Stardust era um ser distinto a David Bowie. Pelé ganhou tr6es Copas do Mundo (o único a consgeur tal feito até agora) em quatro disputadas. Ele elevou o futebol ao status de arte e, como artista, descolou-se de seu corpo físico. Um dos únicos casos da história em que a divindade superou o homem, superou a própria história e o próprio país. Um rosto que, de tão popular, em todo o planeta, teve o mesmo alcance de símbolo máximo de uma religião.

Morre o homem, fica o Deus.  E deuses não morrem. Até para ateus.

>> Leia aqui a parte 2 desta homenagem a Pelé