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Quando Eu Me Encontrar

Dupla de diretoras do Ceará estreia com filme sobre os sentimentos do luto que chega após a perda de uma pessoa bem próxima

Texto por Leonardo Andreiko

Foto: Divulgação

Lidar com a perda é, possivelmente, uma das mais difíceis experiências de nossas vidas. É uma das poucas que é universal: chega para todos e fica cada vez maior, à medida em que os entes queridos e conhecidos falecem ou somem para nunca mais voltar. Esse segundo caso, ao que parece, é o mais dolorido, e é o mote do longa-metragem Quando Eu Me Encontrar (Brasil, 2023), das estreantes de Fortaleza Amanda Pontes e Michelline Helena.

O filme, mais um concorrente exibido na Mostra Competitiva Brasileira do 12° Olhar de Cinema, retrata como a fuga de Dayane muda a vida de sua mãe Marluce (Luciana Souza), sua irmã adolescente Renata (Pipa) e seu noivo Antônio (David Santos). A cantora Di Ferreira interpreta Cecilia, amiga de Dayane e a única que talvez saiba seu paradeiro. Começamos a projeção com um plano da cidade à noite, o mar batendo contra as rochas da praia de Fortaleza. Em off, Marluce e Dayane (de quem só ouvimos a voz) cantam “Preciso Me Encontrar”, o clássico samba de Cartola que tão bem imprime a melancolia brasileira.

Essa escolha musical é, no entanto, o componente mais brasileiro da forma do filme, que não parece certo da história que pretende contar. A abordagem de Pontes e Helena é de uma mise-en-scène estática, competentemente iluminada e que trata os cenários como atos de uma peça, em que conflitos se encerram com uma das personagens se retirando enquanto a outra permanece em cena, imóvel e em silêncio. Não há closes que explorem o rosto das ótimas atrizes e atores do longa, muito menos movimentos de câmera que adicionem materialidade aos eventos de Quando Eu Me Encontrar. A história que nos é contada soa, muitas vezes, plástica, falsa.

Uma decupagem minimalista, é certo, não significa ausência de qualidade ou mesmo preguiça. Tudo depende da história que se quer contar e uma narrativa como essa, que planeja focar nos sentimentos e paixões de três personagens distintas, não é favorecida pela escolha de um olhar tão distanciado à câmera. O poder da imagem é tolhido por uma direção descritiva, que não adiciona discurso às imagens que fotografa. Vez após outra, assistimos a conversas que não parecem reais estampadas sobre cenários que não parecem vividos, que por sua vez são iluminados sem criatividade. Um mundo sem textura, em que todo e qualquer conflito se torna monótono. Há narrativa, há até intenção, mas embaçadas pela falta de expressão da direção.

No entanto, é inegável a potência da atuação do trio de protagonistas, Luciana Souza, Pipa e David Santos. Se há materialidade em Quando Eu Me Encontrar, está na atuação contida de Souza, na raiva juvenil e ressentimento de Pipa, na entrega de um homem que nem sequer percebe o relacionamento que tinha por Santos. É uma pena que não pudemos assisti-los de perto, interpretando falas e comportamentos que lhes entregassem mais densidade, ao invés de retirá-la em nome de uma abordagem superficial de um conflito tão profundo.

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Querido Menino

Obra baseada em um caso real proporciona momentos emotivos e sinceros porém acaba cansando ao se perder na morosidade

queridomenino

Texto por Leonardo Andreiko

Foto: Diamond Films/Divulgação

Em Querido Menino (Beautiful Boy, EUA/Bélgica, 2018 – Diamond Films), Timothée Chalamet e Steve Carell encarnam pai e filho na batalha deste com seu próprio vício. O filme de Felix Van Groeningen (mais conhecido pelo trabalho em Alabama Monroe) é adaptado a partir dos livros de David Sheff, interpretado por Carell, e Nic Sheff, papel que rendeu a Chalamet diversas indicações em premiações.

Com sutileza, a direção de Van Groeningen costura a jornada de pai e filho por meio de uma câmera respeitosa, dando espaço a seus protagonistas. Infelizmente, diversos flashback se montagens musicais tomam o filme de assalto, utilizados ostensivamente e tornando a obra um tanto vagarosa. Quando não ouvimos uma das fortes músicas da trilha sonora, com nomes como Aphex Twin, o clássico David Bowie e o grupo escocês Mogwai, assistimos a diálogos expositivos intercalados por brigas entre Nic e David.

Ambos atores interpretam fortemente, mas cada um apresenta sua barreira. O Nic de Chalamet é monótono em grande parte da trama, enquanto Carell não convence em suas demonstrações de raiva e indignação. São deles, porém, os melhores momentos do filme, quando a sutileza da direção dá as margens para longos e crus planos sentimentais de pai e filho, separadamente. As atuações de Maura Tierney (Karen, madrasta de Nic) e Andre Royo (Spencer, seu padrinho de reabilitação) não têm espaço para grandes demonstrações de talento, mas ambos cumprem o papel narrativo.

A atualidade do tema, visto que a overdose é a principal causa de mortes de estadunidenses abaixo dos 50 anos, é aproveitada pela dupla de roteiristas, Van Groeningen e Luke Davies, que constroem a história do rapaz com verossimilhança, bem como a luta de David para ajudar o filho. Porém, a exposição barata rompe as tentativas de imersividade do filme, que é incapaz de conectar-se por completo com o espectador.

As idas e vindas de Nic são sempre previsíveis, mas Chalamet acerta ao interpretar o garoto com a instabilidade causada pelas drogas (quando não está monótono, como citado acima). Ainda assim, por mais arrastado que o filme seja, vale dar uma chance aos seus melhores momentos e, de quebra, ouvir a uma ótima declamação de “Let It Enfold You”, de Charles Bukowski, na voz de Timothée.