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Meu Pai

Anthony Hopkins brilha em impactante drama sobre a evolução de doença mental que provoca estresse máximo em quem está ao entorno

Texto por Leonardo Andreiko

Foto: California Filmes/Divulgação

Forte nome para o Oscar da noite deste domingo, Meu Pai (The Father, Reino Unido/França, 2020 – California Filmes) une dois titãs da atuação em torno de um roteiro enxuto e denso para propor um tema de muito impacto: o envelhecimento de um pai.

No roteiro, escrito por Florian Zeller e Christopher Hampton a partir de uma peça do primeiro, nos imergimos na confusão mental de um idoso, o Anthony de Anthony Hopkins, cuja doença mental causa estresse a todo seu entorno. Ele confunde rostos, tempo e espaço, o que impõe dificuldades em seu cuidado por parte de Anne (Olivia Colman), sua filha. 

O longa, também dirigido por Zeller, retrata um tema complicadíssimo com sutileza tal que nunca se escora no sentimentalismo barato. Sua emoção sempre resulta do belo texto, articulado por um incrível elenco imerso em uma dinâmica espacial que expande a peça em seu lugar fílmico.

Meu Pai estabelece uma relação central entre Anthony e o seu (?) apartamento, mas não somente sob uma perspectiva da narrativa. As entradas e saídas de cena; os lapsos temporais; a decoração e até o uso de planos abertos ou claustrofóbicos: as paredes de cada cômodo são o palco dessa história, sempre em metamorfose tal que acompanha o declínio da sanidade de seus protagonistas.

Este filme coroa a carreira de imenso sucesso de Anthony Hopkins ao dar-lhe espaço para demonstrar sua sutileza e competência, em um de seus papeis mais desafiadores e, claramente, autorreflexivos. Ao encarar a doença degenerativa, um fim comum ao envelhecimento, na posição central que a personagem ocupa à narrativa de quase duas horas, Hopkins constrói um ex-engenheiro muito denso. Conforme sua memória se esvazia, Anthony revela suas facetas e traços fundamentais.

Meu Pai é um filme que ganha o espectador pelo interesse na confusão muito bem estabelecida desde o princípio em sua narrativa; prende a atenção pela direção sutil e o poder de seu elenco e diálogos; Por fim, enterra-o com sua conclusão assoladora, que rende um período de contemplação raro nos lançamentos pandêmicos que ganham notoriedade.

>> Meu Pai concorre no dia 25 de abril ao Oscar 2021 em seis categorias: filme, ator, atriz coadjuvante, roteiro adaptado, direção de arte e montagem

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Wasp Network: Rede de Espiões

Elenco de consagrados atores latinos está em trama que aborda as redes de espionagem contra Fidel Castro depois da dissolução da União Soviética

Texto por Ana Clara Braga

Foto: Netflix/Divulgação 

Após a queda da União Soviética, no final dos anos 1980, muito especulou-se sobre o que aconteceria com Cuba. As redes anticastristas se fortaleceram em Miami, chamando atenção de Havana com seus salvamentos de balsas e atentados terroristas. É justamente neste contexto que Wasp Network: Rede de Espiões (Wasp Network, França/Brasil/Espanha/Bélgica, 2020 – Netflix) acontece. Dirigido e escrito por Olivier Assayas, baseado em um livro do brasileiro Fernando Morais e com elenco talentoso, o filme abocanha mais do que consegue digerir em uma trama de espionagem fora do convencional.

A trama começa com René González (Édgar Ramírez) fugindo de Cuba e refugiando-se em Miami. No processo, ele deixa a esposa (Penélope Cruz) e a filha para trás. Em solo americano, junta-se a um grupo antirrevolucionário. Ainda no primeiro ato, o filme mostra Juan Pablo Roque (Wagner Moura) desertando do exército cubano e pedindo asilo nos EUA. Roque também tornaria-se envolvido com grupos contrários ao governo de Fidel Castro.

Assayas tenta cobrir muita coisa em duas horas de filme. São fatos, reviravoltas, burocracias – o que resulta em uma trama truncada e por vezes cansativa. A premissa é interessante, mas abrangente demais. O personagem de Gael García Bernal, por exemplo, é de extrema importância para entender o que de fato é a “Rede Vespa”, mas aparece apenas no segundo ato para conservar um tipo de plot twist, fórmula que, se não tivesse sido usada, teria favorecido a fluidez da história. 

Em mais um trabalho internacional, Wagner Moura entrega uma ótima performance. Seu personagem torna-se um dos mais interessantes e é uma pena quando ele simplesmente some de cena. Penélope Cruz também faz um belo trabalho como Olga, mulher cubana fiel à revolução e protetora de seus filhos.

O roteiro é o maior problema aqui. Ambicioso, tenta manter segredos por tempo demais, prejudicando o andar do enredo. A transição entre o primeiro e o segundo ato, feita com narração, é prova de que perdeu-se muito tempo com coisas menos importantes. Entretanto, o filme acerta ao optar pela espionagem da maneira menos óbvia ao contrário de outros longas hollywoodianos. Nesse caso, os espiões estão em cena, sem o espectador saber e (fazendo jus à verdade) não portam bugigangas hipertecnológicas como um 007.

Ao contrário do que sugere nos primeiros minutos, o longa não é uma crítica ao regime castrista, mas isso também não é um elogio. Em Wasp Network: Rede de Espiões é apresentada ao público a realidade difícil da vida em Cuba, mas também que uma das razões para isso é o embargo econômico americano. São mostradas pessoas fugindo do país em busca de uma vida melhor, mas também pessoas dispostas a dar a vida pelo ideal revolucionário. Esta nova empreitada do francês Assayas tenta ser grande, mas com tanto terreno para cobrir não consegue alcançar tal feito. Entre idas e vindas no tempo, pontas soltas e pequenas confusões, o filme se escora nas boas atuações e na história, que por si só já é interessante.