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Fervo Saravá – ao vivo

Festival celebrou mais uma vez a boa música em Floripa, com shows de Jovem Dionísio, Bike, Maglore, Mulamba e Metá Metá

Metá Metá

Texto e fotos por Frederico Di Lullo

O Festival Saravá tem nos deixado mal-acostumados, seja pela organização impar ou pelo line-up sempre diversificado ou ainda pelos shows de qualidade. E, como não poderia ser diferente, o Fervo Saravá – a mais recente edição, com número mais reduzido de atrações – não foi diferente no Life Club de Floripa, neste último dia 24 de setembro.

Chegamos um tanto quanto atrasados (maldito trânsito ilha-continente!), mas conseguimos pegar a banda curitibana Mulamba. Apresentando o álbum Será Só Aos Ares, novo trabalho dessa trupe de minas, parte do show assistido mostrou maturidade, num som que credencia o sexteto a crescer ainda mais no cenário independente nacional. 

Depois quem subiu ao palco foi o Maglore, que também estreava na capital catarinense  V, seu último lançamento. E é sempre um exímio prazer assistir o quarteto baiano. Afinal de contas, cada passagem deles pela Ilha da Magia desperta diversos sentimentos positivos.

Desta vez, o clima intimista da apresentação anterior deu espaço a uma performance calcada na criatividade das guitarras do Teago Oliveira e Lelo Brandão, fazendo uma verdadeira varredura pelas principais músicas da carreira, além de apresentar novas composições do já citado novo álbum. Aliás, trabalho muito bem recebido pela crítica e pelo público que acompanha a banda desde 2009. Realmente, o Maglore deixou todos os presentes num verdadeiro fervo.

Outro ponto de destaque do festival foi a discotecagem entre os intervalos das bandas. A noite já começava a esfriar, mas a DJ Naíra Iasmim colocava todo mundo para dançar e não deixava, em nenhum momento, abaixar o êxtase da galera presente. Assim, na sequência apresentou-se o trio Metá Metá, que nunca tinha tido o prazer de assistir ao vivo.

E que som, meus amigos! Calcado nos arranjos rítmicos que vão desde pela MPB, afrobeat, rock e até free jazz, a banda passeava com muita propriedade pelos principais trabalhos de sua carreira. Juçara Marçal (voz), Thiago França (sax) e Kiko Dinucci (guitarra), juntos com mais de uma década de estrada, apresentaram músicas como “Obatalá”, “Cobra Rasteira” e “Trovoa”. Todas foram cantadas em uníssono por grande parte dos presentes, deixando o show histórico e com gostinho de quero mais.

Jovem Dionísio

Na sequência, depois de carregar nossos copos com uns chopes, chegou o momento da drag Suzaninha chamar ao palco uma das revelações da música brasileira. Chegava a vez do Jovem Dionisio mostrar a que veio. E os curitibanos fizeram um concerto caótico, irreverente e com muita aceitação do público. O grande desafio deles é, com certeza, mostrar que são mais do que uma música de sucesso. E se depender deste show em Floripa, ficou evidente que existe talento de sobra. O público cantou praticamente todas as músicas deste quinteto indie. Agora é ficar na expectativa da banda produzir, no seu próximo disco, uma obra tão inspiradora quanto a da estreia. O tempo dirá isso.

Já adentrava as primeiras horas da madrugada quando a última atração foi anunciada. Sim, toda a psicodelia presente tomou conta do ambiente, pois era hora da esperada Bike iniciar os trabalhos. Já nos primeiros acordes, ficou comprovado que tudo ali seria incrível. Dito e feito. Julito, Diego, Daniel Fumega e João Gouvea incendiaram o Fervo Saravá iniciando uma grande viagem pelos quatro trabalhos da carreira. O cansaço não foi impeditivo para que as quase duas mil pessoas presentes curtissem e pedissem mais ao chegar o final.

Depois de marcar, mais uma vez, o ano com um ótimo Saravá, a organização despediu-se de 2022 em grande estilo e já tratava de anunciar: fique todo mundo em prontidão, pois em janeiro o Saravá voltará com tudo. Grandes novidades estão sendo esperadas, deixando a plateia na expectativa, com ansiedade e curiosidade. Porque sim, Festival Saravá – mesmo quando menor e sob a alcunha de Fervo Saravá – é sinônimo de boa música, ótimas companhias e cerveja gelada.

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Fervo Saravá

Evento retorna a Florianópolis neste sábado trazendo uma escalação mais enxuta mas sem deixar de lado a nata da música brasileira atual

Jovem Dionísio

Texto por Frederico Di Lullo e Luciano Vitor

Fotos: Divulgação (Jovem Dionísio) e Divulgação/Fabio Setti/Tamara dos Santos (Mulamba)

Passados três meses de uma edição com shows históricos, o Festival Saravá, um dos melhores de Florianópolis, retorna com cinco atrações da cena independente nacional. O número até pode parecer pouco, mas justifica-se pela nova dinâmica: após trabalhar com muitas bandas em junho, o line-up fica mais enxuto (por isso, o novo apelido de Fervo Saravá!) sem perder a essência, deixar de proporcionar boa música, ter preço justo de ingressos e ser uma noite antenada ao mesclar artistas emergentes e consagrados.

Abaixo, o Mondo Bacana lista oito motivos para não perder o evento marcado para este sábado, 24 de setembro. Bora?

Life Club

Relativamente próximo ao centro de Florianópolis, o local é de fácil acesso, com recuo para estacionamento, comportando facilmente mais de cinco mil pessoas. Com uma estrutura de arena de shows e palco com visão de praticamente todo o complexo, a Life abriga os mais diversos estilos musicais. E tornou-se a casa do festival em junho, com direito a concertos memoráveis (leia sobre a escalação aqui). Bebidas ainda serão a preços módicos.

Manifestações artísticas

Além das apresentações musicais, o Saravá é conhecido por abrir espaço para outras manifestações artísticas, como grafite, pintura facial ritualística e exposição visual, além de danças urbanas e performance com fogo. Para esta edição, as intervenções também farão parte da programação.

Mulamba

Metá Metá

O nome é oriundo do iorubá: metá que significa três, em português. Por isso, o Metá Metá é formado por três musicistas (e dos bons!): Juçara Marçal, Kiko Dinucci e Thiago França. Eles fundem de maneira ímpar jazz, MPB, afrobeat, ritmos de matriz africana, rock e experimentalismo e cantam letras de beleza e impacto impares. Formada por três álbuns mais singles, EPs e trabalhos paralelos dos integrantes, a discografia comprova o porquê da banda paulista  ser considerada um dos maiores expoentes da música brasileira recente.

Bike

Dona de show acachapante, a Bike é uma das bandas mais representativas da psicodelia brasileira dos últimos anos. Com um novo trabalho, Força Bruta, saindo do forno e programado para ser lançado em 2023, os também paulistanos – que já fizeram algumas turnês fora do Brasil – vêm matar as saudades do público de Floripa, tocando em mais uma edição do Saravá.

Maglore

O quarteto baiano de rock alternativo e fortes influências de MPB está na ativa desde 2009. Agora volta para a Ilha da Magia com V embaixo do braço. Sim, tem show de lançamento desta pérola que, além de rock, passeia por estilos que vão da bossa nova ao reggae. Aclamado pela crítica, o repertório do quinto álbum de estúdio (daí o título V) promete colocar todo mundo pra dançar na noite do Saravá, misturado a clássicos que marcam o já longo tempo de carreira e 15 milhões de plays mensais no Spotify.

Mulamba

Nome emergente da nova MPB, a banda formada em Curitiba habita diferentes territórios em sua criação. Cantando críticas ácidas até letras poéticas, a trupe reúne a sensibilidade e a potência de suas seis integrantes como se fosse um coro uníssono. Agora, amplia seus horizontes com o lançamento de Será Só Aos Ares, um trabalho diferenciado que apresenta diversas facetas musicais. Sim, é isso mesmo que você leu: a Mulamba vem com concerto de novas músicas e novo álbum, já disponível nas plataformas de streaming.

Jovem Dionísio

Versatilidade, irreverência, peculiaridade e hits. Desta maneira, a também curitibana Jovem Dionísio vem conquistando cada canto do país (e Portugal!) com uma linguagem moderna e sonoridade que passeia entre o pop, o eletrônico e o rap. Uma verdadeira banda de amigos de colégio e de boteco de sinuca, com uma música que bate na alma de um público fiel e cada vez maior.

Acorda, Pedrinho!

É por isso que que neste sábado, todos os caminhos levam ao Fervo Saravá 2022. Serão, ao todo, dez horas de evento, cinco bandas maravilhosas e três lançamentos de discos recentes na ilha. Alguém quer ficar de fora disso? Mais informações oficiais sobre o evento (localização, acesso PCD, transporte, preços, horários, outras atrações artísticas, comprovante de vacinação) você tem ao clicar aqui.

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Clipe: Jards Macalé – Trevas

Artista: Jards Macalé

Música: Trevas

Álbum: Título a ser anunciado (2019)

Por que assistir: Entre 1915 e 1962, o norte-americano Ezra Pound escreveu a maior parte de seus Cantos, um poema inacabado em 116 seções e com inspiração plena na poesia épica da antiguidade, aos moldes de Homero (a quem se atribui a autoria de Ilíada e Odisseia). Muitos teóricos consideram esta obra como o mias importante livro de poesia moderna não só dos Estados Unidos como também do mundo ocidental. Décio Pignatari e os irmãos Augusto e Haroldo de Campos assinaram em 1960 a versão para o português dos poemas desta obra. Nove anos mais tarde, durante os anos de chumbo da ditadura militar brasileira, Jards Macalé compôs letra e música de “Trevas”, fazendo uma livre adaptação da tradução dos concretistas para o Canto 1 mas acabou não gravando a composição, que acabou se perdendo com o tempo. Uma pesquisa feita em 2016 pelo jornalista Marcelo Froes, que toca a editora literária Sonora e o selo fonográfico Discobertas (dedicado à reedição fonográfica de pérolas esquecidas da música brasileira), revelou a existência da canção, que logo acabou reaproveitada pelo seu autor, que agora, no mês fevereiro, está prestes a encerrar um intervalo de vinte anos sem lançar um álbum de inéditas. Sob a batuta dos músicos e produtores paulistas Kiko Dinucci e Thomas Harres – que também participam da banda de apoio do disco – o velho “Maldito”, aos 75 anos de idade e recuperado após passar um período de dez dias em estado de coma no início de 2018 – mostra estar plenamente conectado com a renovação da MPB, contando com novos parceiros (tanto na composição quanto na gravação) como Ava Rocha, Tim Bernardes, Romulo Froes, Rodrigo Campos, Clima, Harres e Dinucci. E pelo que mostra em “Trevas”, Macalé vai muito bem, obrigado. A música virou uma deliciosa mistura torta de samba e rock, com claras referências à bossa nova no refrão mais ruídos e dissonâncias que flertam com a no wave nova-iorquina. De quebra, há elementos como um solo de guitarra e uma bacia com água, que serviu para que o cantor mergulhasse a cabeça nela e entoasse os versos encaixados no final do arranjo. Já o clipe, dirigido pelo cineasta Gregório Gananian e o poeta e designer Gabriel Kenhart traz uma perturbadora coreografia de Jards entre lasers e a iconógrafa de vários artistas criativamente inquietos – entre eles Oswald de Andrade, James Joyce e Hélio Oiticica. Ah, sim: versos como “Chegamos ao limite da água mais funda/ Levanto o olhar pro céu” e “Trevas, trevas/ Treva a mais negra sobre homens tristes/ Me calo” caem como uma luva para o que pode vir a acontecer nos próximos anos neste país. Mas atente para o detalhe de que, apesar desta faixa ter sido lançada agora em janeiro, a gravação deste novo álbum foi toda realizada em agosto do ano passado. Portanto, antes mesmo do início da campanha eleitoral para os cargos de presidente, senador, governador e deputados federais e estaduais. Zeitgeist?

Texto por Abonico R. Smith