Music

Primavera Sound São Paulo 2022 – ao vivo

Arctic Monkeys, Lorde, Interpol, Mitski, Japanese Breakfast, Björk, Phoebe Bridgers e mais shows na estreia do cultuado festival indie no Brasil

Texto por Abonico Smith

Foto: Primavera Sound SP

ARCTIC MONKEYS

Há algo de realmente estranho na relação entre os Arctic Monkeys e o palco de um grande festival. Por mais que o grupo britânico seja headliner, por mais que Alex Turner e companhia lancem discos de qualidade, por mais que venham tocar no Brasil (terra tradicionalmente reconhecida pelos músicos de rock como  um público caloroso e quente), a passagem do quarteto como a grande atração do primeiro dos dois dias da edição de estreia do Primavera Sound em São Paulo não foi lá tão arrasadora quanto muitos fãs poderiam esperar.

Distrito Anhembi, Zona Norte paulistana, dez da noite de 5 de novembro. Turner, Jamie Cook (guitarra e teclados), Matt Helders (bateria e vocais) e Nick O’Mailey (baixo) subiram a um dos dois palcos principais do PSSP para mais uma escala da turnê do recém-lançado álbum The Car, o sétimo da carreira. Contando com um luxuoso aparato cenográfico, que ao trazer uma atmosfera vintage nos holofotes espalhados entre os instrumentistas e no design destes equipamentos acaba casando com a postura e performance cada vez mais de crooner de Alex, o grupo calibra um repertório que se distancia daqueles moleques ruidosos, com uma urgência quase hardcore nas batidas e vocais, lá do início da carreira. Agora, os Monkeys são da sofisticação, de arranjos que permitem falsetes, grooves lentamente mais sensuais e texturas sonoras proporcionadas por alguns sintetizadores que emulam outros instrumentos. Tudo muito técnico, bem executado – até mesmo quando Turner rege, de costas para o público, o stacatto da banda inteira em conjunto antes de entrar com sua voz em “There’d Better Be a Mirrorball”. Mas falta alguma coisa a mais.

O que falta chama-se justamente punch. A pegada que ficou pra trás junto com as lembranças da pós-adolescência de seus integrantes. Por mais luxuoso e requintado que tenha ficado em sua sonoridade – acompanhando a habilidade extrema de seu vocalista em escrever versos vagamente sensoriais e bons títulos quilométricos – parece que isso afetou também a performance das apresentações. Do indie rock pulsante e vibrante de outrora sobrou só o rock. Não que isso, na verdade, seja um demérito. Entretanto, parece mais um espetáculo profissional de música do que um show executado diante de uma grande multidão. 

Certo, ainda existem os momentos mágicos proporcionados pelas poderosas faixas de AM, o álbum mais pesado e popular dos Monkeys. Afinal, é impossível deixar de cantar junto os refrãos matadores de “Do I Wanna Know?” e “R U Mine?” ou balançar a cabeça junto aos riffs sabbathianos de “Arabella”. Ao mesmo tempo, a pose demiblasé de Turner, sempre posando de popstar retro-anacrônico, querendo/não querendo estar ali. Talvez seja fruto de mais uma noite consecutiva de show, agora a céu aberto (na véspera a banda se apresentara no Rio de Janeiro), carregando os sinais de cansaço e a defensiva do resguardo corporal. Talvez Alex seja sempre assim mesmo, inclusive diante de uma audiência brasileira que exagera na entrega aos seus ídolos e traduz isso ao cantar tudo a plenos pulmões. Mas que isso afeta o resultado final, afeta. Deixa o concerto com aquele gostinho de quero mais em relação ao artista, aquela sensação de que poderia ter sido dado algo extra ali no palco.

Por falar em AM, foi este disco que deu o maior número de faixas ao set list da noite. Cinco, no total. O novo The Car rendeu quatro – uma delas, a faixa-título, executada pela primeira vez ao vivo pela banda e não fez feio. “Body Paint”, com seus ecos de lounge pop mezzo sixtie (Burt Bacharach, Gerge Martin) mezzo seventie (David Bowie), também revelou-se um belo momento ao vivo. Já o anterior, o intrincado Tranquility Base Hotel + Casino, bateu ponto apenas duas faixas, as suas principais (a homônima do álbum e “Four Out Of Five”), não tão luxuosamente tocadas quanto nas gravações de estúdio.

O repertório preparado para o PSSP também pérolas mais antigas. “Crying Lightning” e “Brainstorm” e “Don’t Sit Down ‘Cause I’ve Moved Your Chair”, enfileiradas logo no início, serviram para colocar fogo na plateia. Mais para o final, com o mesmo intuito, vieram “505”, revivida pela viralização recente no TikTok e a onipresente “I Bet You Look Good On The Dancefloor”. Três outras compuseram a cota reservada para “lados B”: “Pretty Visitors”, “Do Me A Favour” e “From The Ritz To The Rubble” dão um frescor apontando mais para um lado não muito pop do passado e trazendo ecos de glamheavy e do harcdore. Pelo menos eliminou da lista algumas coisas mais óbvias e famosas até hoje em programações de rádios rock. 

Quando vieram há três anos para o Lollapalooza, os Arctic Monkeys também acabaram fazendo igual ao PSSP. São que nem aquele craque que faz o gol ou a jogada decisiva da vitória, mas não se esforça muito em campo. Corre apenas o necessário, joga apena so necessário, meio que se poupando para o próximo jogo ou mesmo por marra. Os fãs não ligam e saem felizes do mesmo jeito. Mas quem sabe de todo o potencial que existe para ser entregue sempre vai achar que dá sempre para fazer mais. E está tudo certo assim. Pelo menos por equanto.

Set list: “Sculptures Of Anything Goes”, “Brainstorm”, “Snap Out Of It”, “Crying Lightning”, “Don’t Sit Down ‘Cause I’ve Moved Your Chair”, “Why’d You Only Call Me When You’re High?”, “Body Paint”, “Four Out Of Five”, “Arabella”, “Potion Approaching”, “The Car”, “Cornerstone”, “Do I Wanna Know?”, “Tranquility Base Hotel + Casino”, “Pretty Visitors”, “Do Me A Favour”, “From The Ritz To The Rubble” e “505”. Bis:  There’d Better Be a Mirrorball”, “I Bet You Look Good On The Dancefloor” e “R U Mine?”.

INTERPOL

Depois de algumas tentativas frustradas no Lollapalooza, finalmente o Interpol vem ao Brasil e entrega um show acachapante. Isso se deve à conjunção de dois fatores. O primeiro, um bom momento, refletido no excelente disco The Other Side Of Make-Believe, lançado em julho deste ano, no qual retoma a criatividade suprema de duas décadas atrás (por sinal, várias novas faias parecem ter sido extraídas de Turn On The Bright Lights, lançado há vinte anos exatos). O segundo, a grade do festival, que finalmente colocou o trio para tocar de noite, já depois do sol se por. Pode parecer um detalhe irrelevante para muitos artistas. Mas não para o Interpol. Paul Banks (guitarra e voz), Daniel Kessler (guitarra e backings) e Sam Fogarino (bateria) bebem da fonte do pós-punk, sobretudo aquela escola da estética sombria. Por isso, a atmosfera de poucas luzes (no palco, um pretume iluminado por tons vermelhos e azuis, não menos góticos) realçou por demais a força das canções. Tanto as recentes (“Toni”, “Passenger” e sobretudo a dedilhadamente melancólica “Fables”) quanto as clássicas lá do começo da trajetória (“Evil”, “C’Mere”, “Slow Hands”, “Rest My Chemistry”, “The New”, “Obstacle 1”, “PDA”). O desafio de se apresentar em um amplo espaço acaba sendo superado. O Interpol não é de muita troca de palavras com a plateia, muito menos performances fisicamente explosivas de sua linha de frente de cordas (duas guitarras e um baixo). Tudo isso, vale ressaltar, funciona melhor em palcos menores e espaços fechados, com os fãs mais próximos do palco. Porém, a força das composições desequilibra em favor da banda. O set nem precisa ser tão longo. Pouco menos de uma hora é o suficiente para todo mundo se orgulhar de estar diante de um puta show. Como poucas bandas de rock surgidas neste século 21 sabem ainda fazer em um festival de grandes proporções.

Set list: “Toni”, “Evil”, “Fables”, “C’mere”, “Narc”, “Passenger”, “All The Rage Back Home”, “Rest My Chemistry”, “Obstacle 1”, “The New”, “PDA” e “Slow Hands”.

MITSKI

Antes tarde do que nunca. A nipo-americana Mitsuki Miyawaki, uma das grandes estrelas indie da segunda metade da última década, finalmente desembarcou no Brasil para cantar e encantar seus fãs. Agora sem muito da faceta rocker que a revelou, com gritos e distorções, mas apostando na variedade sonora com uma banda de apoio que lhe servia do pop à disco, do progressivo ao verniz do eletrônico moldado pelos anos 1980. Mitski não empunha mais as seis cordas. Agora é frontwoman total. Desloca-se sem parar no palco, corre, joga-se de joelhos no chão, rasteja. Faz gestos, caras e poses, explicitando uma farta referência da arte da mímica e do teatro kabuki (não por acaso dois dos elementos que moldaram outro popstar em ascensão, o David Bowie dos anos 1970). Com o set se equilibrando entre a fase guitarreira e os dois álbuns mais recentes, a cantora e compositora encantou a plateia ao performar intensamente TODAS as 17 músicas, indo na mesma escola dos clipes de Kate Bush apesar dos versos serem mais existenciais e metafóricos do que as narrativas histórico-descritivas da britânica. Mesmo assim, Mitski acerta no ponto de ligação com a molecada mais nova que descobriu Bush através da mais recente temporada de Stranger Things.

Set list: “Love Me More”, “Working For The Knife”, “I Will”, “I Bet On Losing Dogs”, “I Don’t Smoke”, “Washing Machine Heart”, “First Love/Late Spring”, “Geyser”, “Drunk Walk With Me”, “Nobody”, “Should’ve Been Me”, “Townie”, “Your Best American Girl”, “The Only Heartbreaker”, “Stay Soft” “Francis Forever” e “A Pearl”.

BJÖRK

Que a islandesa sempre foi uma criatura sui generis isso nunca foi novidade pra ninguém. Quem acompanha a música alternativa desde os tempos do grupo que o revelou, o Sugarcubes, sabe bem que dela se pode esperar tudo, principalmente se o negócio for sair do convencional. Nos figurinos, nos videoclipes, na sonoridade, nas apresentações ao vivo, até mesmo no tapete vermelho do Oscar. Portanto, o fato de embarcar agora em uma turnê mundial acompanhada apenas por uma orquestra, sem qualquer outro instrumento eletrônico ou convencional da música pop, não é de se espantar. Björk chega acompanhada apenas por seu maestro, também islandês. Em cada parada, músicos eruditos locais são selecionados para executar as partituras – no PSSP a função coube à Bachiana Filarmônica, de São Paulo, dirigida por João Carlos Martins. Mas participar de festival de rock e pop com uma orquestra também já não é muita novidade – no Brasil, Peter Gabriel já fez isso no extinto SWU. Então a excentridade da vez seria o fato de vetar a transmissão pela internet e proibir fotografias durante o show, inclusive a presença de fotógrafos da imprensa e celulares dos fãs? Também não, apesar da surpresa de muita gente na audiência respeitar o pedido e assistir à performance sentada no chão (inclusive cantando alguns de seus maiores hits, como “Hyperballad”, “Jóga” e “Isobel”). Seria o fato de acabar de lançar um novo disco e não tocar quase nada dele (a não ser uma única faixinha, chamada “Ovule”)? Também não. A bizarrice de Björk desta vez foi personificada pela própria Björk. Enrolada com tecidos nas cores vermelho e verde em uma roupa colante preta, rodopiava de forma um tantinho dura, como uma bailarina de caixinha de música. O que mais causou estranheza, no entanto, foi o adereço que portava na cabeça. Um misto de delicada máscara de comedia dell’arte e uma peruca preta volumosa nas laterais que de longe, lhe conferiam uma bisonha aparência de um misto de Fofão e Rainha de Copas da animação da Disney. Não tinha, realmente, como ela passar em branco naquela tarde de sábado. 

Set list: ”Stonemilker”, “Aurora”, “Come To Me”, “Lionsong”, “I’ve Seen It All”, “Ovule”, “Hunter”, “Isobel”, “Jóga”, “Quicksand”, “Hyperballad”, “Notget” e “Pluto”.

JAPANESE BREAKFAST

Michelle Zauner foi outra asian-american que fez sua estreia tardia em nosso  país com sua banda. Bem mais solta no palco do que Mitski, porém não menos encantada com a recepção calorosa dos fãs brasileiros, ela (com make em verde e amarelo nos olhos) apresentou no cair da tarde de domingo (6 de novembro) sua sonoridade nem tão eletrônica assim no palco e com a presença de instrumentos que dão um direcionamento mais para o lado do soft rock (saxofone, violino). Metade do set se concentrou no  mais recente álbum, Jubilee, do ano passado. Este trabalho tem uma particularidade: foi lançado quase ao mesmo tempo que o memoir de Zauner, Crying In H Mart, que tornou-se best-seller nos EUA e daqui a pouco deve ser adaptado para o cinema (com trilha sonora assinada pela autora do livro). A dobradinha é um punhado de faixas/páginas sobre alegria e superação, já que Zauner havia acabado de superar um período de cinco anos de luto pela morte precoce de sua mãe coreana. Talvez isso explique todo o reflexo na performance de palco saltitante e alegre da moça. A outra metade se dividiu entre os dois primeiros álbuns como o projeto Japanese Breakfast, gravados e concebidos logo após a perda da mãe. Garantiu uma parte mais serena e contemplativa para o concerto, digna de embalar o por do sol no Distrito Anhembi. Aos fãs mais completista restou ainda a faixa “Glider”, feita por Michelle para a trilha do game Sable.

Set list: “Paprika”, “Be Sweet”, “In Heaven”, “The Woman That Loves You”, “Kokomo, IN”, “Glider”, “Road Head”, “Savage Good Boy”, “The Body Is a Blade”, “Posing In Bondage”, “Slide Tackle”, “Everybody Wants To Love You”e “Diving Woman”.

PHOEBE BRIDGERS

O Dia das Bruxas já havia sido dias atrás. Mesmo assim, Phoebe aproveitou sua estreia em solo brasileiro para promover um halloween peculiar em um dos palcos principais no domingo do PSSP. O sol mal havia se posto e ela trouxe uma atmosfera sombria, com todos os músicos no palco vestindo aquele tradicional figurino de esqueleto e luzes góticas dando o tom “colorido” àquela penumbra toda. Só que a estética soturna na qual Bridgers aposta não dá medo. Pelo contrário. Ela é de uma fofura só, um tanto contida em sua performance física, mas bem sorridente e faladeira entre as canções folk rock de versos tão melancólicos quanto afiados, mas sempre de cunho bastante pessoal. Inclusive, antes de “Chinese Satellite”, voltou a defender a legalização do aborto, chegando a assumir que já fizera um. Em “ICU”, puxou o coro de dor-de-cotovelo das fãs femininas identificadas com os versos de confusão mental após o término não muito legal de um relacionamento. Já em “Gracleand Too” (gravada em disco com os vocais de Julien Baker e Lucy Dacus, suas companheiras na formação do supergrupo Boygenius), apresentou ao público daqui um crossover de indie com americana. Além de tocar seu mais recente álbum (Punisher, de 2020) quase na íntegra e respeitando a mesma ordem das faixas, resgatou dois bons momentos do début Stranger In The Alps (de 2017), entre eles o hit “Motion Sickness”, estrategicamente colocado na abertura como um grande cartão de visitas. Mais pro fim ainda deu tempo de incluir seu single mais recente, “Sidelines”, lançado neste ano e gravado para a trilha da minissérie de TV Conversations With Friends. “Esta é uma canção de amor”, anunciou, em breve introdução à balada. Por fim, “I Know The End” troue um gosto amargo de encerramento, com alavras que refletem uma certa desesperança de Phoebe em relação aos anos mais recentes da cultura norte-americana. De qualquer forma, serviu como um belo cliffhanger para o próximo episódio… quer dizer, a próxima apresentação da “doce bruxinha” no Brasil.

Set list: “Motion Sickness”, “DVD Menu”, “Garden Song”, “Kyoto”, “Punisher”, Scott Street”, “Chinese Satellite”, “Moon Song”, “ICU”, “Sidelines”, “Graceland Too” e “I Know The End”.

LORDE

Quando David Bowie, em uma de suas últimas aparições públicas, posou ao lado de Lorde para uma fotografia, muita gente pode ter ficado se questionando a conexão entre ambos. Afinal, por que estaria um dos maiores ídolos do rock em todos os tempos endossando uma moleca que havia acabado de lançar um [único álbum e se tornado estrela mundial com um único hit? Quem acompanha a carreira de Lorde nestes últimos dez anos sabe a resposta. A neozelandesa é um dos grandes achados da música pop nestes tempos de efemeridade e volubilidade de consumo voraz do streaming em detrimento de exemplares físicos de discos. Horas antes de completar 27 anos de idade, ela se apresrntou no segundo e último dia do PSSP na condição de headliner do festival. E fez bonito. Deu uma geral na carreira, dando destaques equivalentes a cada um de seus três álbuns. Foi da até hoje impactante “Royals” ao seu mais recente hit “Solar Power” mostrando que dá, sim, para fazer um concerto pop sem apostar como faz a massa de artistas hoje: uma sequência de coreografias com trocentos bailarinos para ajudar a encher o palco, um desfile de figurinos diferentes que provoca torrente de entra-e-sai do palco do astro principal e mais uns espertos vocais pré-gravados para ou dobrar a voz em cena ou ajudar naqueles momentos em que a respiração ofegante vai acabar atrapalhando. Lorde ainda fez mais. Apresentou-se de vermelho do início ao fim (dando um belo realce na sua pele alva e o cabelo todo descolorido), meio que casando com a semana de alívio pós-eleição que salvou o país da beira do abismo. Chamou Phoebe Bridgers para fazer um emocionante dueto na balada “Stoned At The Nail Salon” (como faz em grandes festivais, aproveitando-se para convidar alguma amiga que esteja dando sopa nos bastidores). Esbanjando simpatia, não se furtou a conversar bastante com os fãs durante a música, inclusive sem se esquivar de se posicionar politicamente e dar os parabéns por ter ganho o candidato que ela também estava apoiando. E, sim, mostrou que o uso cenográfico do palco pode ir bem além das dancinhas, fazendo com o apoio de sua banda de apoio (com maciça presença feminina, diga-se passagem) marcações específicas para cada música, incorporando uma teatralidade pouco vista na seara dos cantores pop (mas que, por exemplo, Bowie carregava de montão em suas apresentações). Esqueça toda aquela bobagem de “pop solar” ao qual boa parte das resenhas de veículos de imprensa brasileira (inclusive renomados) se apequenou ao limitar os comentários – mesmo porque quando o show começou o sol já havia se posto. Lorde é (e ainda será) muito mais, honrando sua alcunha artística.

Set list: “The Path”, “Homemade Dynamite”, “Buzzcut Season”, “Stoned At The Nail Salon”, “Ribs”, “The Louvre”, “Secrets From a Girl (Who’s Seen It All)”, “Mood Ring”, “Liability”, “Royals”, “Bravado”, “Supercut”, “Perfect Places”, “Green Light” e “Solar Power”.

Movies

A Noite do Jogo

Trama que mistura suspense, perseguições e humor mostra as surpresas na qual pode se meter quem personalidade extremamente competitiva

gamenightbatemanmcadams

Texto por Abonico R. Smith

Foto: Warner/Divulgação

Uma comédia? Um thriller? Um filme de ação? Apenas duas palavras. Ou quatro, se você levar em conta o nome dado pela distribuidora para ser lançado no Brasil.

A Noite do Jogo (Game Night, EUA, 2018 – Warner) pega como premissa central o vício em jogos (tabuleiro, mímica, desenhos, whodunit? ou qualquer tipo de desculpa para você reunir amigos em sofás ou cadeiras em volta de uma mesa para soltar de vez o espírito competitivo e derrotar, sozinho ou atuando em parceira, os adversários que estiverem ao seu redor. Isso está tão claro tanto no título original quanto o em português. Pode servir como um belo chamariz para que quem curta competir em qualquer tipo de coisa que se encaixe e reuniões sociais e não-esportivas. Mas também pode limitar o interesse de quem não se interessa muito pela temática. O que, aliás, pode ser um erro bem grande a ser cometido por quem se identifica com este segundo grupo de pessoas.

Em primeiro lugar, A Noite do Jogo é um ótimo filme de entretenimento, capaz de flutuar por gêneros diferentes e, ainda assim, entregar uma obra que não apenas diverte como ainda vai mostrando, no decorrer da trama, suas qualidades. Dirigido por dois dos seis roteiristas do mais recente longa do Homem-Aranha (John Francis Daley e Jonathan Goldstein), o longa pega carona na escola de bons filmes pop instaurada nesta última década por Edgar Wright (Scott Pilgrim Contra o Mundo, Herois de Ressaca, Baby Driver – Em Ritmo de Fuga).

Combina direção ágil, diálogos com muito bom humor, algumas situações absurdas desencadeadas por ações dos personagens, entrelaçamentos musicais (de novo, o bom e velho rock dando as caras por aqui, tendo maior representatividade com hits do Queen do início ao fim e culminando com um impensável momento bossa nova-pop-trashcom Engelbert Humperdinck no clipe final, que traz “Quando Quando Quando” embalando os créditos principais da produção), tiros, perseguições e muita, muita correria (a cena que envolve a captura de um ovo Fabergé é digna de um Scooby-Doo ou qualquer outro desenho animado de turma adolescente feito por Hanna-Barbera na primeira metade dos anos 1970). Nesta mescla toda, quem ganha é o espectador, que volta e meia é surpreendido e começa a soltar aquele riso incontrolável motivado por nervosismo e tensão diante do está por acontecer.

Os protagonistas Jason Bateman e Rachel McAdams dão um show como o casal (Max e Annie) que se conheceram como adversários de uma competição e depois disso sempre costumam receber os amigos para noitadas regadas a vinhos, finger food, risos, diversão e estratégias acirradas para ver quem tem o maior repertório de informações e o raciocínio mais ligeiro. Coadjuvantes como Kyle Chandler (o picareta irmão mais velho de Max). Michael C Hall (o mafioso Búlgaro) e Jesse Plemons (o policial esnobado pelos vizinhos Max e Annie e cujo maior desejo é também ser convidado para participar das jogatinas) também entregam ótimas performances. As expressões faciais feitas por Plemons, sem qualquer demonstração de sentimentos mas capaz de transmitir medo a quem as enxerga, são o grande destaque de sua atuação.

Ao sair da sala de cinema é inevitável sentir alívio. Também resta a reflexão do que uma simples, inocente e descompromissada noite regada a jogos pode vir a render. Sobretudo para quem tem como lema “jamais entregar-se à derrota”. E uma observação pertinente: só ouse levantar da poltrona depois que todas as luzes da sala de projeção se acenderem.