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NX Zero – ao vivo

Adolescentes da geração emocore brasileira cresceram, não se escondem mais e se renderam à nostalgia para celebrar a história da banda

Texto e foto por Frederico Di Lullo

Sexta-feira, dia 7 de julho, estava um pouco receoso, confesso. O último show que tinha visto do NX Zero em Florianópolis tinha sido em 2006 (??), na antiga Creperia da Lagoa junto a bandas como a gaúcha Atrack e algumas outras da cena emo local. E lá fui eu conferir a volta à ativa do quinteto, agora na Arena Opus, situada em São José (SC)

A questão é que eu não sou mais um jovem de 17 anos. Voltar a ver uma banda 17 anos depois, então, tem seu preço. Eu paguei pra ver. E, na real, boa parte dos presentes (em grande número, diga-se de passagem), estavam lá também para sentir um pouco do saudosismo da minha geração.

Com um público majoritariamente adulto, o NX Zero iniciou a apresentação da turnê Cedo ou Tarde passando das 22h. Com um som impecável, Di Ferrero (voz), Daniel Weksler (bateria), Gee Rocha (guitarra e backings), Fi Ricardo (guitarra) e Caco Grandino (baixo) mostraram que o tempo é uma construção social. Ou algo até melhor, que dá para melhorar, mesmo depois de um hiato de pouco mais de seis anos de duração.

set começou com “Só Rezo” e terminou com “Razões e Emoções. No meio, sucessos como “Pela Última Vez”, “Apenas um Olhar”, “Meu Bem”, “Além de Mim” e “Ligação” Na parte acústica, tivemos ainda Di Ferrero, a capella, tocando “Vagabundo Confesso”, do Dazaranha. Sim, praticamente um nativo, que mora na Ilha de Santa Catarina faz mais de seis anos, tendo a particularidade de ter sido uma das primeiras pessoas que teve COVID-19 na cidade. Loucura, mas nem tanto.

Em resumo, este show do NX Zero foi uma celebração da história da banda e uma prova do poder que o emocore brasileiro teve na primeira década deste novo século. Se antigamente o emo se escondia, hoje a nostalgia fala mais alto e mostra que os adolescentes de ontem são os adultos de hoje. Além disso, o visual do palco e a iluminação complementaram perfeitamente a energia do show, com jogos de luzes intensos e um cenário que transmitia a identidade do grupo. 

Ninguém sabe ao certo se este é um retorno definitivo (acredito que nem a banda sabe!), mas a turnê é uma chance dos fãs matarem a saudade. Até porque muitos, talvez, nunca tenham visto a banda tocar ao vivo, bem ali à frente. Contudo, quem tiver vontade não deve pensar duas vezes e colar nas datas restantes de Cedo ou Tarde. A diversão é garantida!

Set list: “Só Rezo”, “Daqui Pra Frente”, “Bem ou Mal”, “Pela Última Vez”, “Apenas Um Olhar”, “Onde Estiver”, “Uma Gota no Oceano”, “Espero a Minha Vez”, “Inimigo Invisível”, “Cedo ou Tarde”, “Meu Bem”, “Insubstituível”, “Incompleta”, “Vagabundo Confesso”, “Silêncio”, “Cartas Pra Você”, “Mais Além”, “Hoje o Céu Abriu”, “Vamos Seguir”, “Pedra Murano”, “Ligação” e “Nào é Normal”. Bis: “A Melhor Parte de Mim”, “Um Pouco Mais”, “Além de Mim” e “Razões e Emoções”.

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NX Zero

Oito motivos para não perder a nova turnê nacional do quinteto, que está voltando à ativa depois de uma pausa de seis anos

Texto por Frederico Di Lullo

Foto: Cesar Ovalle/Divulgação

Grande sucesso no rock brasileiro dos anos 2000, o NX Zero está voltando aos palcos com sua formação original, composta por Di Ferrero (vocais), Gee Rocha (guitarra), Caco Grandino (baixo), Daniel Weksler (bateria) e Fi Ricardo (guitarra). A tour Cedo Ou Tarde começou em maio e até dezembro irá passar pelas cinco regiões do Brasil – mais informações sobre datas e shows você pode ter clicando aqui.

A banda, que acumula mais de 20 anos de estrada contando este recente intervalo das atividades em conjunto, lançou seis álbuns de estúdio, emplacou diversos hits e é um verdadeiro baluarte da geração emo nacional. Anos depois do boom, o NX Zero anunciou uma pausa nas atividades em 2017. Agora vêm os primeiros shows desde então. Músicas como “Razões e Emoções”, “Daqui Pra Frente”, “Pela Última Vez”, “Hoje o Céu Abriu” e a própria “Cedo ou Tarde” – que foram a trilha sonora de adultos, outrora jovens apaixonados e descrentes da vida amorosa – voltam a ser executadas ao vivo pelo quinteto.

“A gente está muito empolgado. Ficamos nos olhando, lembrando, parece que foi ontem que a gente deu uma pausa. Estou sentindo que vai ser um dos momentos mais incríveis das nossas vidas. Depois de várias histórias que cada um viveu nesse tempo, vamos trazer essa bagagem pra essa tour. Não vejo a hora de tocar”, contou Di Ferrero sobre o retorno aos estúdios para ensaiar para este giro nacional.

Por isso, seja pelo gatilho emocional, saudosismo ou apenas por querer participar de tudo, aqui citamos oito motivos para não perder, de jeito nenhum, a tour Cedo ou Tarde.

Reencontro com o seu eu adolescente 

Aquele rapaz ou garota de 15 anos que ficou lá no passado certamente estará orgulhoso de você. A turnê promete trazer um set list repleto de sucessos que marcaram a carreira do NX Zero. Prepare-se para cantar junto e relembrar os hits que embalaram aquela geração.

Energia contagiante

Os shows do quinteto sempre foram conhecidos pela energia intensa e entrega total da banda. Não importa se foi em 2001, 2004, 2007, 2017 ou se será agora em 2023: certamente haverá uma experiência eletrizante, durante a qual você se sentirá parte de algo maior, do seu passado ou até mesmo do presente.

Pura nostalgia

As letras do NX Zero sempre abordaram temas profundos, relevantes e intensos. Por isso, que tal aproveitar o reencontro para refletir sobre a vida, os desafios e as emoções que todos nós enfrentamos àquela época? Será que hoje é aquilo que você esperava?

Impacto cultural (leia-se o emo nunca morreu)

As pessoas podem falar o que quiser, mas é inegável que esta é uma das bandas mais influentes do cenário musical brasileiro. Seja pelo seu passado, pelos sucessos que se cravaram no íntimo de milhões de jovens ou pelo rebuliço que gerou o anúncio da atual turnê, o NX Zero moldou boa parte da sociedade contemporânea deste país. Pelo jeito, o emo nunca morreu: apenas estava adormecido no peito do agora jovens adultos.

Produção de alta qualidade

Espere um espetáculo visualmente impactante, com luzes, cenários e efeitos especiais que tornarão cada concerto uma experiência única. Segundo a organização da turn6e, este show irá explorar a interação com público e a criatividade no uso de led, conteúdo e tecnologia.

Momentos inesquecíveis

Os shows do Nx Zero são conhecidos por proporcionar momentos inesquecíveis aos espectadores, que sempre saem mexidos ao final. Seja cantando em coro, pulando junto com a banda ou se emocionando com uma balada especial, cada momento vivido é para ser guardado na memória para sempre. Pergunte a quem é fã.

Amostra grátis

Quem assistou in loco aos shows do festival Mita dias atrás (ou viu pelo streaming e TV a transmissão do fim de semana no Rio de Janeiro pela dobradinha de canais Bis e Multishow) pode atestar. Um dos headliners da escalação nacional, o grupo mostrou que está bastante afiado e com as baterias recarregadas para percorrer boa parte do território nacional nessas viagens. 

Saia do isolamento virtual

Em tempos de isolamento virtual da humanidade, nada se compara à experiência de assistir a um show ao vivo. A energia da plateia, a interação com os fãs e a entrega dos músicos no palco criam sempre uma atmosfera única e inesquecível. O tempo pode ter passado se você é de uma geração antiga, mas sempre vale a pena se reconectar com seu interior de nem menor idade. Se você já nasceu com um mouse na mão, tente descobrir as maravilhas que vivíamos antes de toda essa tecnologia de comunicação viciar a gente.

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Floripa Eco Summer Festival – ao vivo

Novo festival da capital catarinense reuniu mais de 30 atrações e contou com um enorme atraso para o início do show de Erykah Badu

Erykah Badu

Texto por Frederico Di Lullo e Luciano Vitor

Fotos: Frederico Di Lullo

Sábado, 28 de janeiro, Hard Rock Café, continente da Grande Florianópolis. Um line up com mais de 30 artistas e bandas. Uma pergunta: quem aguentaria essa maratona debaixo de um calor insano, com tantos shows e o custo absurdo das bebidas?

Antes de começar a falar das bandas, merece um destaque o preço das bebidas no Floripa Eco Summer Festival. Uma garrafa de água saía a 12 reais. Uma lata de Heineken era 16. Já um combo com três delas, 42. Com os shows começando no início da tarde, era praticamente uma insanidade chegar às 3 ou 4 horas da manhã sem beber algo, fossem algumas latinhas de cerveja ou bastante água. Nesse caso, tudo foi proibitivo. Mas vamos aos shows que conseguimos cobrir. Que são o que interessa…

O calor estava na faixa de 34 graus quando chegamos ao Floripa Eco, onde já estava no palco a Jovem Dionisio, encarregada de abrir esta edição do incrível festival realizado na cidade de São José. Num clima de verão, literalmente, a banda desfilou todo o repertório de Acorda, Pedrinho, seu álbum de estreia lançado em 2022. Como não poderia ser diferente, a faixa quase homônima (o título, desta vez, não traz a vírgula e é grafado em maiúsculas), com mais de 85 milhões de plays no Spotify, foi a escolhida para encerrar o show. A plateia, tímida e composta majoritariamente por jovens adolescentes, cantou o hit em uníssono com o quinteto indie de Curitiba.

Maneva é um quinteto que como muitos outros mescla pop e reggae. Até ai, nada demais. Boa banda, pegada nova. Para esse que vos escreve, a mistura dos gêneros vai muito além do que faz um Natiruts, já bem conhecido, por exemplo. O problema é que foi um show curto, três covers. O famoso bordão “Toca Raul” nem precisou ser gritado aqui, pois teve cover do eterno Maluco Beleza. Maneva é uma boa banda. O problema é jogar para a galera e não focar no repertório próprio. Isso faz uma diferença enorme, mas para aqueles que não têm medo de errar.

O calor não dava trégua, mas o festival começava a lotar, fazendo milhares de jovens se espremer próximo da grade para assistir a Maria Rita. Com boa interação do público, a dona de um talento que já vem no sangue interpretou antigos e novos sucessos de sua carreira, além de clássicos da música brasileira. Com uma performance por demais agradável, o fim de tarde virou uma grande roda de samba comandada por uma das musas contemporâneas da MPB. Foi, com certeza, um dos momentos mais legais deste Eco de verão.

Depois vieram os Raimundos. Desde a saída de Rodolfo a banda não saiu do lugar. Continua com o mesmo set list, variando o formato, ora para o rock mais pesado, ora para releituras das mesmas faixas com uma pegada praiana, como foi o caso agora. As canções são atemporais, ok. Querendo ou não, mesmo após 20 ou 30 anos, a força de cada música permanece. Por isso, os 50% da formação original que permaneceram tocando o projeto (leia-se o baixista Canisso e o guitarrista e agora também vocalista Digão) vão levando a banda adiante. É crime? Não, mas com um viés praiano o repertório não deixou de ser mais do mesmo. É ruim? Não, é diversão garantida para todas as idades, seja os fãs do tempo durante ou pós-Rodolfo. É um show remissivo, previsível e bacana. Mas não me espantaria ver o que restou da banda gravar algum outro trabalho, por exemplo, com versões das mesmas músicas em inglês ou espanhol para algum projeto futuro, no melhor estilo caça-níquel.

Jorge Ben Jor

Daí veio uma espera fora do normal – entre o mais recente show do palco ao lado e o início do da norte americana passou fácil mais de uma hora. Mesmo com toda a apoteose para abrir de fato o concerto, o que levou mais 3 ou 4 minutos, nada justificava o atraso de Erykah Badu (poderiam ter realocado outras atrações ou soltar um comunicado ao público).  Ela é uma diva? Sim, mas dentro de uma estrutura com mais de três dezenas de apresentações, o atraso ocasiona gastos maiores por conta do público e daí lá se repete a ladainha do início do texto: cerveja nada barata, combos nada amigáveis em termos de preços. Enfim, uma tremenda falta de respeito! Eu me pergunto o que o público diria de um atraso de um artista nacional, voltando ao atraso absurdo.

Falando da performance dela, foi algo seguro, com os maneirismos vocais da cantora e uma cozinha rítmica impecável. Só que, ao contrário dos seus pares de palco no Eco, Badu faz um show muito mais experimental. Totalmente fora dos padrões do evento. Não é ruim, talvez depois sejam trazidos outros artistas dessa vertente em atrações futuras do Floripa Eco. O som é um r&b mais atualizado, com mix de jazzfunk e soul com sobras de experimental. Isso soa bom pra caramba, só que sem a dosagem certa acaba cansado. Embora os vídeos de fundo de palco mostrem muito da influência da cantora, nada afasta a sua vertente alternativa e apegada ao desvio do mainstream. No frigir dos shows, foi um bom show, mas que deixou a desejar pelo atraso absurdo. Daí me peguei desejando ver o Jorge Ben Jor subindo logo ao palco…

Com a apresentação da Erykah Baduh seguindo aquele script, partimos para outro show, o da prata da casa, o Dazaranha. Tinha a participação do Di Ferrero (ele mesmo, do NX Zero), mas chegamos no meio de “O Mané” conhecida canção da banda ilhéu. Público conectado, energia a milhão, e muita, mas muita gente mesmo, muito mais interessada em Dazaranha do que em atração gringa. Isso é bom porque abre a opção de outras bandas locais estarem no palco, dentro de um evento de nível nacional, não apenas dividindo mas complementando o line up.

Daí veio Marcelo Falcão ou o que sobrou do Rappa, há algum tempo tentando manter a carreira solo. Desde o fim da banda, que encerrou as atividades após vários problemas entre ele e os demais integrantes, o carioca lançou um álbum em 2019, Viver (Mais Leve Que o Ar), e vem batalhando para emplacar um novo grande sucesso pós-Rappa Infelizmente, vem seguindo uma carreira errática. Como mostrou esse show. Das três primeiras músicas, duas eram do Rappa e logo na terceira chamou Maria Rita para um auxílio luxuoso, em “Rodo Cotidiano”. Ele continua sendo um baita crooner mas sem uma banda para chamar de sua carece de respaldo para levar uma carreira consistente. Possui boas músicas de sua carreira solo, porém sem o chamariz do Rappa. Esperamos que deixe seu rosebud para trás e encontre um álbum arrasa-quarteirão, daqueles para esquecer o passado. Pois para quem pediu a um ex-companheiro de banda que abrisse mão de royalties referentes às músicas que o mesmo escreveu, Falcão continua agarrado ao passado.

Aí, sim, chegou a vez daquele senhor que não deixa ninguém ficar parado: o sempre incrível, a lenda-viva da música brasileira de nome Jorge Ben Jor. E o show dele você já sabe: é sempre uma festa! Acompanhado sempre por músicas de exímia qualidade, o morador mais importante do Copacabana Palace colocou todos os presentes para dançar ao som de hinos. Teve “Take It Easy My Brother Charles”, “Oba, Lá Vem Ela”, “Menina Mulher de Pele Preta”, “Chove Chuva”, “Mas Que Nada”, “Taj Mahal” e “W/Brasil”. Bom, a lista é interminável, assim como a energia que este homem emana no auge dos seus 83 anos. Encerrou o Eco com mais um concerto memorável para a lista, parceiro!

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Rock in Rio 2022 – ao vivo

Oito grandes concertos para você se lembrar (positivamente) da mais recente edição do festival

Texto por Abonico Smith

Fotos: Cadu Oliveira/Portal RockPress (Gilberto Gil, Ratos de Porão, Gangrena Gasosa); Produção Rock In Rio/Célula Pop (Green Day, Racionais MCs); Reprodução/G1 (Måneskin, Coldplay, Homenagem a Elza Soares)

Mais um Rock in Rio realizado (no Rio de Janeiro, é bom deixar claro, apesar de parecer óbvio demais isso e não ser!) e mais uma coisa grandiloquente marcada por muitos show que, se comparando com as três primeiras edições do evento, mancham a história do evento. Teve Post Malone cantando sem qualquer acompanhamento instrumental ao vivo e ganhando o cachê mais fácil da História. Teve Justin Bieber com a cabeça dando tilt e sendo obrigado a se apresentar para não pagar uma multa altíssima, antes de cancelar todo o resto de sua turnê sul-americana. Teve Megan Thee Stalion enchendo o palco de gente vinda da plateia para compensar a mais profunda falta de performance cênica. Teve Demi Lovato botando uma banda de capacitadas instrumentistas de turnês e estúdios para dar a sensação de que seu power pop era mesmo a última bolacha do planeta. Teve Ivete Sangalo declarando seu voto no 13 (até que enfim!). Teve a esquecida Pabllo Vittar sendo ovacionada ao cantar como convidada no show de Rita Ora. Teve Ludmilla gastando rios de dinheiro em produção para ser headliner do último dia. Teve Luisa Sonza dançando muito e também dublando muito a sua própria voz pré-gravada. Teve Billy Idol se atrapalhando com o som e, segundo disseram as más línguas, esquecendo a letra de um de seus maiores hits, “Eyes Without a Face”. Teve o famoso dia do metal levando um mar de camisetas pretas na primeira das sete noites. Teve neste mesmo dia do metal headliner (Iron Maiden, em sua 765ª vinda ao país) pedindo para tocar antes da penúltima atração (Dream Theater) porque, conforme consta, a idade pesa pro sexteto clássico e eles não queriam ficar pr lá até depois das duas da manhã. Teve o Sepultura fazendo outro crossover musical, agora tocando em conjunto, na abertura oficial do evento, com a Orquestra Sinfônica Brasileira. Teve como primeiro um show de fato do evento um belo cartão de visitas: os power trio Black Pantera e Devotos se unindo para mostrar a força do rock preto brasileiro. Teve Cee-Lo Green fazendo James Brown reencarnar e soltando o vozeirão em grandes clássicos do godfather do funk, acompanhado por uma banda space jazzy viajandona e encantadora. Teve uma homenagem aos artistas nacionais do primeiro Rock In Rio (Ivan Lins, Pepeu Gomes, Alceu Valença, Evandro Mesquita) escanteando os próprios no meio do sanduíche. Teve Dua Lipa sem feder nem cheirar. Teve Djavan pela primeira faz um show para chamar de seu no festival. Teve erros de escalação e transmissão, ambos relacionados à apresentação de Avril Lavigne: ela superlotou o Sunset Stage quando cairia melhor no palco principal, o Mundo e o Multishow cortou o fim da performance dela para mostrar outra que estava começando. Teve obviedades (até quando aturar Capital Inicial e Jota Quest fazendo pela enésima vez o mesmo show?) e teve quem foi muito além da obviedade mas derrapando para o absurdo no meu sentido (como será explicado adiante, no trecho sobre o Coldplay). Ah, sim! Teve ainda o Guns N’Roses vindo pela décima terceira vez ao evento, mais uma vez com a voz de Axl sendo mais rara de ser encontrada do que a barra de ouro dos chocolates de Willy Wonka.

Mas para não perde tempo com aquilo sobre o qual realmente não vale a pena falar, o Mondo Bacana lista aqui os oito concertos que, sim, podem fazer você se lembrar para sempre da ediçãoo 2022 do Rock in Rio (2 a 4 e 8 a 11 de setembro) de um modo positivo.

Coldplay

Existem dois Coldplays na face da terra. Tem o old school, uma grande banda vinda do universo indie, com clássicos que arrepiam multidões até hoje como “The Scientist”, “Viva La Vida”, “Clocks” e “Yellow”. Existe também, infelizmente, o Coldplay 2.0, feito sob medida para a geração Z, aquela para qual festivais de música viraram experiência e concertos devem trazer muito mais do que boa música (aliás, a qualidade dela nem importa mais também!). A atual turnê do grupo de Chris Martin é um circo tecnológico no qual o figurino combina com a cenografia dos instrumentos e das imagens no telão. Tem um palco menor no qual a banda se aproxima bastante do público e pode tocar pertinho lá do miolo. Tem pulseiras distribuídas para toda a audiência presente ao local e que pisca e muda de cor conforme comandados disparados por técnicos da banda, formando assim um pulsante cenário tridimensional abaixo dos músicos, também na horizontal. Tem o grito pela sustentabilidade, algo do qual esses ingleses não abrem mão.  Mas também tem programações eletrônicas que descambam pro playback puro, completado por quatro horrorosas máscaras de animais (ou seriam ETs?) usadas pelos instrumentistas. Tem, nesta hora, um flerte ao TikTok, no qual Chris Martin, depois de cantar, fica simulando uma dancinha como se estivesse correndo sobre o solo do palco que vai formando desenhos abstratos. Tem uma música cantada por uma marionete manipulada em pleno palco (?!?!?!). A entrega de entretenimento do Coldplay foi prejudicada por uma chuva torrencial, que estragou a roupa de cores fosforescentes de Martin e ainda fez pifar um piano eletrônico colocado lá no palco menor junto à plateia mas de nada alterou a euforia do vocalista em voltar a se apresentar no Brasil. Ah também teve erros técnicos de gravação que fizeram o quarteto tocar na sequência duas músicas de novo (“A Sky Full Of Stars” e “Viva La Vida”) e a tenebrosa tentativa de cantar “Magic” todinha em português. No fim das contas, contudo, fã que é fã continua chorando copiosamente ao assistir de perto à banda. Mas quando o senso crítico começa a se fazer valer, percebe-se que eles passaram do ponto do exagero.

Green Day

Show do trio californiano é sempre um petardo. Neste Rock in Rio  não foi diferente. Não tiveram o menor medo de começar com um de seus maiores hits, “American Idiot” e depois enfileirar clássico atrás de clássico, sem dar tempo para a plateia respirar ou os fãs pararem de cantar e se recomporem. Billy Joe Armstrong não é apenas um entertainer de primeira. Ele comanda uma banda repleta de bom humor, que não se leva a sério na hora em que não tem de se levar a sério, que tem um repertório poderoso e sabe equilibrar-se perfeitamente entre a pegada punk e a crocância de uma melodia perfeita levada por guitarras do power pop.

Gilberto Gil

Aos 80 anos de idade recém-completados, Gil não precisa fazer mais nada nos palcos para provar sua genialidade. Por isso mesmo, ao optar pela simplicidade de passear por clássicos das mais diversas fases de seu repertório e escalar uma banda de apoio repleta de integrantes de sua família (filha/os, neta/os, nora), fez um show mezzo dançante mezzo contemplativo e algo de primeira grandeza no Palco Mundo, honrando o passado de glórias e retomando o gostinho daquela fase bem pop mostrada lá no primeiro Rock in Rio, em 1985. Sua generosidade ainda vai além ao chamar a neta Flor, de apenas 13 anos de idade, para sair da linha das backings e dividir os vocais principais em uma versão bilíngue de “Garota de Ipanema” em ritmo de reggae e depois consolá-la durante o choro de emoção da garota. Assim, forma mais uma artista de futuro enquanto revisita eternas pérolas semprepreciosas como “Aquele Abraço”, “Palco”, “Andar Com Fé”, “Não Chore Mais”, “Drão”, “Expresso 2222”, “Tempo Rei”, “Vamos Fugir” e “Toda Menina Baiana”. De quebra, colocou dois b sides como “Barato Total” e  Estrela” para contrabalançar o hit parade e mostrar às gerações mais novas a riqueza e a diversidade de sua trajetória musical.

Måneskin

O Rock in Rio é um festival que prima por apostar no certo e no óbvio. Quase não arrisca em suas escalações e faz questão de manter boas novidades do universo da música de fora da Cidade das Artes. Então que este quarteto de vinte e poucos anos de faixa etária tenha vindo nesta edição para fazer a família Medina repensar um pouco os rumos artísticos. Para um evento que já trouxe grandes artistas em seu auge (como B-52’s, Faith No More, Prince, George Michael), ver o Måneskin em ação promovendo uma balburdia cênica e sonora das boas foi o grande alento deste ano. Misturando glamhard rock e power pop com piadas de fluidez de gênero, fizeram a massa cantar em italiano algumas de suas composições (aliás, desde os tempos de Rita Pavone que o Brasil não se entregava tanto a este idioma na música pop), escolheram um seleto conjunto de covers bacanudas e turbinadas (Who, Stooges, Britney Spears, Frankie Valli & The Four Seasons) e ainda encantaram meio mundo de quem estava in loco ou mesmo vendo pela TV. A baixista Victoria de Angelis é um show à parte, com seu ativismo e atitude: adepta do Free Niples, não teve o menor pudor de tocar quase sem roupa e ser tocada por desconhecidos em um duradouro momento de mosh. Ela e seus três mosqueteiros mostraram que rock’n’roll, de fato, é isso daí – atitude, boa música e performance incendiária. Para todo o resto dá para mandar um belo dedo do meio.

Racionais MCs

O dia em que os Racionais MCs foi de glória para o rap e o funk nacional. Antes, os cariocas Papatinho, L7nnon e Filipe Ret abriram os trabalhos no Sunset com classe. Depois veio o também carioca Xamã para mostrar a alta qualidade da nova geração do gênero, inclusive chamando o trio de rappers indígenas Bro MCs para mostrar o quão diverso o gênero pode ser sem perder a classe e a verborragia. Depois veio Criolo, mas para mostrar que o hip hop, em São Paulo, também anda de braços dados com o samba. Superprodução com filminho de abertura, cenografia elaborada imitando um vagão de metrô paulistano, citações ao clássico filme de 1979 sobre rap Warriors: Os Selvagens da Noite, muitos figurantes e dançarinos e um repertório bem porrada que é capaz de reduzir o clássico álbum Sobrevivendo no Inferno a apenas uma faixa (a sempre imprescindível “Capítulo 4, Versículo 3”). De resto, os singles mais novos e tão arrasa-quarteirões quanto (“Quanto Vale o Show?”, “Mil Faces de um Homem Leal (Marighella)” com direito a discurso sobre a figura histórica que inspirou a canção) e clássicos de outros álbuns como “Vida Loka partes 1 e 2”, “Cores & Valores”, “Eu Sou 157”,  “Jesus Chorou” e “Nego Drama”. Aqui veio o momento mais catártico da noite, quando os versos disparados por Mano Brown, Edi Rock e Ice Blue, sob as bases do DJ KL Jay, com a projeção de nomes e fotografias de pretos mortos no Rio de Janeiro pela violência da polícia e da mílicia, inclusive, claro, a vereadora Marielle Franco.

Ratos de Porão

Enfim, o Rock In Rio reparou uma injustiça tamanha! Se o Sepultura vem se apresentando há várias edições, por que nunca convidaram João Gordo e sua banda para tocar antes por lá? Outra das grandes instituições do rock subterrâneo brazuca, o RxDxPx precisou completar quatro décadas de carreira para ser lembrado pelo maior (em tamanho) festival de rock do país. OK que o palco reservado ao quarteto não foi nenhum dos dois principais – ironia das ironias, foi espaço chamado Supernova, dedicado a “novas” atrações. Mas João também não deixou barato em sua performance. Detonou o (des)governo bolsominion várias vezes em seu microfone e dividiu o set list entre faixas do novo álbum (o poderoso Necropolítica) e clássicos eternos dos Ratos. Para completar, ainda teve uma bandeira do MST no palco.

Gangrena Gasosa

Outra instituição do underground nacional, desta vez made in Rio de Janeiro. Aliás, o Gangrena só poderia ter nascido no Rio, para saber misturar tão bem a sonoridade do metal com a cultura da umbanda, inclusive com letras explorando (com ironias e sarcasmo) detalhes deste religião de matriz africana e cada um de seus integrantes personificando uma entidade dos terreiros. O saravá metal do Gangrena pode até ter começado sendo encarado como uma piada, um chiste, mas depois de uma trajetória de quase trinta anos, com direito a pausa nas atividades e uma barulhenta briga judicial pelo direito de uso do nome entre o vocalista e alguns ex-integrantes que fundaram o negócio. O novo Omulú da formação (Dave Sterminium) deu um gás nos vocais mais guturais e realça o contraste com o gogó mais malandro e tradicional de Zé Pelintra (Angelo Arede). A percussão rola solta no meio das palhetadas velozes e é impossível não se contagiar pela fusão sonora cada vez mais competente deste (atual) sexteto. Claro que os trocadilhos dos títulos das canções ainda provocam boas risadas, mas a performance precisa e afiada mostrada no palco Espaço da Favela revelou que muito tesouro precioso pode estar escondido nos locais mais periféricos do festival.

Homenagem a Elza Soares

Um line-up integralmente feminino marcou o último dia do festival, tanto no palco Mundo quanto no Sunset. E engana-se que quem fez o melhor concerto do dia foi a headliner Dua Lipa. Aliás, a melhor do dia nem estava presente no local, quanto mais nesta dimensão. Afinal, Elza Soares é daquelas pessoas que nem David Bowie: descarnam mas continuam por aí, preenchendo nossas vidas com tamanha presença como se estivessem ali, do nosso lado, com uma boa velha amizade. Para entoar um punhado de hinos eternizados na voz de Elza foram convocadas seis vozes tão poderosas quanto a da diva: Agnes Nunes, Mart’nália, Gaby Amarantos, Larissa luz, Majur e Caio Prado (foto acima) – vale lembrar que Alcione também estava escalada, mas teve de cancelar sua participação por causa de uma cirurgia recente. “A Carne” abriu o set cheio de discursos entre as canções e nas letras das mesmas. Pela valorização das mulheres, do universo LGBT, dos pobres, dos pretos, dos favelados. Enquanto for necessário bradar contra as injustiças sociais e de gênero, Elza Soares sempre estará muito viva ecoando em nossos ouvidos. Nem que por meio de outras vozes interpretando as suas músicas.