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Cemitério Maldito

Trinta anos depois, obra do cultuado escritor Stephen King volta a ganhar adaptação para as telas do cinema

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Texto por Leonardo Andreiko

Foto: Paramount/Divulgação

A obra literária de Stephen King, para o bem ou para o mal, rende diversas adaptações na indústria do cinema. Tradicionais como À Espera de Um Milagre e Um Sonho de Liberdade se unem a eternos ícones do cinema de horror, como O Iluminado; Carrie, A Estranha e Pet Sematary. Este, no entanto, é o mais novo filme a figurar a lista de adaptações relançadas nos últimos anos – fenômeno crescente, em especial, nesta década. Utilizando o mesmo método com o qual resenhei para o Mondo Bacana a versão de Suspiria feita pelo diretor Luca Guadagnino, não tecerei comparações entre o filme de Kevin Kölsch e Dennis Widmeyer e o original de Mary Lambert, lançado 30 anos atrás.

Em Cemitério Maldito (Pat Sematary, EUA, 2019 – Paramount), Louis (Jason Clarke), Rachel (Amy Siemetz) e seus filhos se mudam para uma pacata cidade, buscando sossego da correria metropolitana em uma casa de campo com terreno gigante. É claro que o plano não sai como esperado, com o advento da morte do gato da família, Church, trazido de volta dos mortos com o auxílio do misterioso vizinho da família, Jud, interpretado por John Lithgow. Embora uma história promissora, o roteiro de Matt Greenberg e Jeff Buhler, que assinou Maligno (2019), empaca o desenvolvimento com seu ritmo moroso. Demoramos a sentir que o filme se desenvolve, gastando tempo demais com a adaptação da família à casa.

Além disso, grande parte dos primeiros atos fica na criação de subtramas sem conclusão, como a intrigante relação entre Louis e o seu falecido paciente Pascow (Obssa Ahmed), alertando o perigo que ronda o protagonista e sua família ao longo do filme. O pior gasto de tempo, no entanto, é a relação de Rachel com sua irmã, Zelda (Alyssa Brooke Levine). Ainda que o trauma resulte em uma forte característica da personagem, não merece todo o furor alucinógeno com o qual a dupla de diretores trata a história – uma desculpa para gore jumpscares.

Os jumpscares do filme, inclusive, são completamente ineficientes.  Sua previsibilidade os torna artificiais demais, além de serem estragados pelo exagero na intensidade do som. O sound design de Cemitério Maldito é convencional, mas deixa muito a desejar. Da mesma forma, a música não adiciona quaisquer camadas.

Ainda sobre a convencionalidade do longa, a dupla de diretores opera de forma eficiente, entendendo bem o gênero no qual se inserem sem mergulhar nos clichês. Eles existem, em escala maior que o esperado, mas não tomam conta da trama. No entanto, a direção não cria quaisquer marcas de estilo.

Além disso, a atuação dos protagonistas é funcional. O maior problema, no entanto, é Jeté Laurence, que interpreta Ellie de maneira extremamente superficial em seus dois “estados de espírito” ao longo da trama. No fim, o terceiro ato de Cemitério Maldito contrasta os predecessores vagarosos e é extremamente apressado, sem amarrar quaisquer nós que não sua história principal.

Desta forma, a nova adaptação desta obra literária de Stephen King não foge do convencional. Sem muitos grandes aspectos, amarga uma falta de empolgação consigo mesma. É bem produzida, com cenas bem fotografadas, porém mal dirigida e perde o potencial. Aliás, com exceção de It – A Coisa, os últimos filmes que bebem da fonte de King estão deixando a desejar.

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Me Chame Pelo Seu Nome

Tente não se emocionar com a história da descoberta do novo mundo adulto por um adolescente americano morando na Itália no ano de 1983

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Texto por Abonico R. Smith

Foto: Sony Pictures/Divulgação

Existe uma bela expressão em inglês chamada “come of age”. Traduzindo literalmente para o português fica “chegada da idade”, embora a palavra maturidade caiba melhor. Seu significado é o que todo mundo vivencia quando chega a etapa adulta da vida. Ficam para trás todas as despreocupações da infâncias e as atitudes sem muitas consequências da adolescência. Crescimento pessoal, um novo entendimento da sociedade e a noção de responsabilidade emocional são alguns dos elementos muito importantes que passam a ser percebidos neste período.

Aos dezessete anos de idade Elio Perlman começa a perceber que sua vida já mudou em Me Chame Pelo Seu Nome (Call Me By Your Name, França/Itália/EUA/Brasil – Sony Pictures), que chega agora aos cinemas brasileiros sob a perspectiva de várias indicações para o Oscar e na esteira de outras premiações da temporada. Filho único de uma família de intelectuais judeus americanos que moram em uma pequena cidade italiana (o pai, que comanda o trabalho em um importante sítio arqueológico na região; a mãe, tradutora), ele passa todo o tempo do mundo dividido entre vários idiomas (italiano, francês, inglês, alemão), o gosto pela leitura constante de romances literários, o talento de tocar e criar música ao piano, os headphones ligados a um walkman, um ou outro cigarro aceso na boca, bicicletas, uma piscina no quintal e a mesma turma de amigos – da qual faz parte Marzia, garota apaixonada por ele mas para quem Elio não dá muita bola.

O turbilhão de emoções que passa a afetar a calmaria da vida do rapaz chama-se Oliver, um estudante enviado pela sua universidade para ser os assistente temporário das pesquisas de seu pai. Aos poucos vai brotando em Elio uma louca paixão pelo visitante, desde a típica rejeição inicial até as primeiras descobertas sexuais, incluindo os desejos, a iniciação de fato (realizada em um velho colchão no empoeirado sótão de casa com a mesma Marzia) e as experiências “nada secretas” com Oliver.

Adaptado de um romance literário homônimo e ambientado no verão de 1983, o filme merece muito mais atenção do que simplesmente seu principal chamariz para a mídia – a relação homoafetiva entre um adolescente e um rapaz dez ano mais velho. É uma sensível obra dirigida pelo italiano Luca Guadagnino (que em 2005 levara às telas 100 Escovadas Antes de Dormir, outra produção de erotismo teenager vinda dos livros) ajudada pela estética da fotografia sempre solar do indiano Sayombhu Mukdeeprom – que explora os raios sol refletidos em belas localidades em vilarejos e microcidades italianas – mais o roteiro do experiente americano James Ivory (diretor de Vestígios do Dia e Retorno a Howards End e com três indicações ao Oscar nesta categoria) e a deliciosa trilha sonora que mistura pérolas pop da época (o hit do filme Flashdance “Lady Lady Lady”, Loredana Berté, Ryuichi Sakamoto, Psychedelic Furs) e três faixas do ícone indie Sufjan Stevens, sendo duas delas escritas especialmente para o longa.

Contando com uma excelente performance do jovem e promissor ator Timothée Chalamet, nome certo entre os indicados de todas as premiações da temporada, o protagonista ao pouco vai descobrindo um novo mundo e não apenas com e por causa de Oliver (Armie Hammer com aquela chance de mostrar ser mais do que um ator de rostinho – e um corpinho – bonito). É esta a dramática “jornada do herói” que realmente conta para emocionar o telespectador até o último momento. Aliás, a conversa franca entre pai e filho sobre a relação com Oliver somada à derradeira cena que invade a exibição dos créditos finais são de dilacerar o coração, mesmo que levem o filme para um caminho diferente do livro.