Music, Videos

Clipe: Fat White Family – Feet

Artista: Fat White Family

Música: Feet

Álbum: Serfs Up! (2019)

Por que assistir: Coloque no mesmo caldeirão guitarras e bongôs, aquelegrooveesperto mandado pelo contrabaixo, um bando de músicos doidões (liderados por um vocalista não menos), dorgas liberadas no estúdio e uma infinita vontade de sair dançando por horas e horas. Happy Mondays? Primal Scream? Não, não. Mas se você andava sentindo falta de uma nova banda que pudesse reviver o clima instaurado por essas duas outras lá no início dos anos 1990, pode comemorar e procurar pelo Fat White Family. Na verdade, este combo formado ao sul de Londres não é tão nova assim: foi formada em 2011 e já lançou dois celebrados álbuns pelo selo independente Fat Possum (Champagne Holocaust, em 2013, e Songs For Our Mothers, três anos mais tarde) que chegaram a fazer burburinho na imprensa alternativa. Entretanto, agora, com a força da gravadora Domino no cenário indie mundial, o novo álbum tem tudo para alcançar paradas, tocar nas rádios ou nos alto-falantes de lojas descoladas de roupa na cidade de Londres, vender bastante e espalhar o nome do FWF mundo afora. E já nos primeiros dias de janeiro o grupo liberou a primeira faixa do trabalho, “Feet”, com um arranjo que enche de alegria quem até hoje se esbalda na pista de dança ao som de clássicos como “Step On” (HM) e “Loaded” (PS). Se é grudenta a canção – que ainda traz o vocalista Lias Kaci Saoudi “recitando” versos no melhor estilo Leonard Cohen – o videoclipe feito para ela corrobora sua qualidade e estende ainda mais a pira da banda. Aqui ela é transformada em militares no front de guerra, com Lias assumindo o protagonismo na pele de um oficial que rasteja pelado pela trincheira, envolve-se em situações homoafetivas e ainda não hesita em assassinar discretamente os outros a sangue frio. Em recentes declarações para divulgar o novo disco, Saoudi e seus asseclas consideram as novas músicas como um conjunto mais diverso de tudo o que já fora feito antes por eles e uma forma mais arrojada de entender a cultura das sonoridades anglo-saxônicas baseadas nas guitarras. “Feet” é a faixa de abertura de Serfs Up!, que contará com outras nove e será lançado no dia 19 de abril.

Texto por Abonico R. Smith

Movies

As Viúvas

Diretor Steve McQueen justapõe contornos dramáticos a empolgantes cenas de ação e perturba o espectador em seu novo filme

widows2018

Texto por Abonico R. Smith

Foto: Fox/Divulgação

História de um grupo de assaltantes iniciantes que se reúne para executar aquele roubo à mão armada que vai salvar suas vidas de pendengas financeiras não é novidade no cinema. As Viúvas (Widows, Reino Unido/EUA, 2018 – Fox) , porém, traz uma diferença a esta premissa: junta nesta quadrilha sem experiência alguma no submundo do crime mulheres entre os trinta e cinquenta anos que acabaram de perder seus maridos, criminosos “assumidos” ou ainda “no armário” para a família, e receberam de “herança” dívidas que serão cobradas em breve por um cruel contraventor de uma região mais pobre da cidade de Chicago. Enquanto elas se decidem por botar a mão na massa para salvar as suas peles, duas raposas do cenário político local passam a se digladiar nos bastidores de uma eleição que em breve poderá lhes dar mais ainda mais poder em seu próprio território.

Adaptado para o cinema pela afiada dupla Steve McQueen (também assinando a direção deste longa) e Gillian Flynn (autora de Garota Exemplar e Lugares Escuros, ambos thrillers assustadores tanto nas páginas literárias quanto na grande tela) de uma série de TV escrita pela atriz, roteirista e escritora britânica Lynda La Plante, este longa-metragem prende o espectador com seus muitos contornos dramáticos permeando as cenas de ação. Se estas são de tirar o fôlego, aquelas são de levar as pessoas do compadecimento à revolta.

Ninguém é inteiramente vítima ou vilão na história. Nem os maridos assassinados pela polícia em uma ação onde tudo deu errado, nem as viúvas que decidem também se aventurar pelo crime. Nem o candidato representante da elite branca e rica, nem o rival negro e pastor de uma igreja evangélica frequentada pelos moradores pobres da área que domina. Nem o filho mimado e seu pai corrupto, nem o capanga sangue frio e seu irmão gângster. Chantagens, balas disparadas à queima-roupa, lobbies, trapaças, mentiras, intrigas, cinismo e ameaças à integridade física convivem com ações de sororidade, desesperos de mãe, a humilhação de passar por seguidos atos de abuso, o sentimento de solidão após o luto e o sofrimento de passar anos a fio pela manipulação da própria família. Discussões sobre gênero sexual, racismo, religião e abuso de poder e autoridade acabam ganhando quase o mesmo peso conforme a trama vai se desenvolvendo, fazendo com o que o tal assalto preparado pelas viúvas venha a ser apenas mais elemento dela, não o mote principal. Claro que reviravoltas acontecem durante este tempo, o que torna o filme ainda mais delicioso.

A hábil mão do diretor McQueen – que não ganhou o Oscar de sua categoria em 2014 mas viu seu 12 Anos de Escravidão levar o prêmio principal da noite – acrescenta sutis detalhes à história de La Plante. Recorre a linguagens distintas no tratamento da perspectiva pela qual o espectador vê homens e mulheres na tela. Abusa de bela fotografia, capaz também de apostar em planos-sequência matadores, e ainda brinca com a montagem desde o início da sessão, intercalando momentos de passado e presente, reflexão e ação. E, o principal de tudo, não leva seu filme a tomar partido de qualquer lado: deixa para que quem estiver vendo faça seus próprios julgamentos baseados em suas crenças, convicções e experiências de vida.

Não bastasse tudo isso, o elenco é de primeira. Viola Davis, mais uma vez, brilha nas telas na pele da protagonista Veronica, a chefe da nova quadrilha. Aos poucos, seja como personagens coadjuvantes ou ainda participações menores mas com importância em algum ponto da trama, surgem Liam Neeson, Michelle Rodriguez, Elizabeth Debicki, Carrie Coon, Cynthia Erivo, Robert DuVall, Colin Farrell, Bryan Tyree Henry e Daniel Kaluuya.

As Viúvas provoca impacto do começo ao fim, não deixa quem o vê sair levantar impassível da poltrona e, sobretudo, mostra que é possível, sim, fazer bom cinema baseado em uma sinopse que pede ação, muita ação. Chega aos cinemas já com cheirinho de várias indicações ao Oscar 2019 e outras importantes premiações da temporada.