Music

Jorge Du Peixe – ao vivo

Vocalista da Nação Zumbi pisa em solo sagrado com releituras de Gonzagão em show solo vibrante e com protocolos

Texto e foto por Fabio Soares

Qual foi seu último concerto antes da pandemia? Muitos terão a resposta, outros não, mas o certo é que após quase dois anos, o circuito de shows no Brasil regressa, muito embora combalido pela inatividade, associado a novos hábitos. O tão falado e necessário protocolo é o novo Norte. Assistir a uma apresentação musical “calçando” máscaras? Não brinquem, doravante será assim, aceitem que dói menos.

E foi sob este clima de recomeçar a andar que em 28 de Novembro último me dirigi ao SESC Vila Mariana, em São Paulo, para vivenciar minha primeira gig após quase dois anos: Jorge Du Peixe (corpo, alma e voz da Nação Zumbi) realizaria a derradeira de três apresentações na unidade para promover Baião Granfino, seu recente trabalho solo em que revisita o repertório de ninguém mais, ninguém menos que Luiz Gonzaga.
Acompanhado por um competentíssimo e diverso sexteto, o cantor abriu os trabalhos com “Assum Preto”, clássico gonzaguiano recheado de tristeza (“Assum Preto, o meu cantar/É tão triste como o teu/Também roubaram meu amor/Que era a luz, ai, dos ‘óios’ meus”). “Sanfona Sentida” veio a seguir na forma de um sofisticado xote com percussão pujante. Neste momento houve a primeira quebra de protocolo, com parte dos presentes dirigindo-se às laterais da plateia para dançar. A rouca voz do artista emoldurava o clássico de maneira singular. Aliás, em Baião Granfino, a particular assinatura musical do artista tira o disco de covers da zona de conforto. Ah, se todos os álbuns de versões fossem assim!

O baile seguiu com uma matadora trinca de clássicos: “Orelia”; “Sabiá” (com seu indefectível refrão “A todo mundo eu dou psiu [psiu, psiu, psiu]/ Perguntando por meu bem/ Tendo o coração vazio/ Vivo assim a dar psiu/ Sabiá vem cá também” e “Acácia Amarela”. Esta, por sua vez, despertou gatilhos neste que vos escreve ao fazer lembrar os discos de Luis Gonzaga que a mãe colocava numa alaranjada vitrola Sonata – vale ainda destacar que o refrão da canção é uma ode à desigualdade social (“Sou um feliz operário/ Onde aumento de salário/ Não tem luta nem discórdia/ E o Grande Arquiteto do Universo/ É harmonia, é concórdia”).

Entre os intervalos das canções, Peixe lembrou a plateia que Gonzagão foi o primeiro popstar da história do Brasil. “Ele foi pré-bossanova, pré-iê iê iê, pré-tropicália. Apontou caminhos que ninguém havia imaginado até então”. A plateia, extasiada, aplaudiu ao mesmo tempo que quebrava todo e qualquer protocolo.

Depois, “Festa” fez o baile de máscara explodir e a sequência formada por “Pagode Russo”, “Qui Nem Jiló” e “O Fole Roncou” colocou um fim a noventa mágicos minutos em que a sofisticação caminhou lado a lado com o popular. “Nossa missão é levar a música de Gonzagão a todos os lugares possíveis e imagináveis. Enquanto eu estiver vivo, seguirei tentando”.

Você está conseguindo, Jorge, acredite. Você está conseguindo. E com protocolos!

Set list: “Assum Preto”, “Sanfona Sentida”, “Orelia”, “Sabiá”, “Acácia Amarela”, “Baião Granfino”, “Rei Bantu”, “Festa”, “Pau de Arara”, “Cacimba Nova”, “Maria, Minha Maria”, “Erva Rasteira”, “Roendo Unha”, “Pagode Russo”, “Qui Nem Jiló” e “O Fole Roncou”.