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A Jornada

Um olhar intimista sobre astronauta que enfrenta o distanciamento da filha pequena e as muitas dores femininas longe da Terra

Texto por Ana Clara Braga

Foto: Paris Filmes/Divulgação

Viajar ao espaço é uma ideia empolgante que inspirou diversos filmes de ficção científica, aventura e terror. Um enredo que já ganhou diversas adaptações ainda pode ser inovador, como foi o caso recente de Perdido em Marte. Agora, quase meia década depois, A Jornada (Proxima, França/Alemanha, 2019 – Paris Filmes) traz uma nova perspectiva para as viagens espaciais, deixando de lado os efeitos especiais e os alienígenas. 

A diretora e roteirista francesa Alice Winocour deixou o óbvio de lado e resolveu abordar as relações familiares de uma astronauta que ficará um ano longe da Terra. A viagem é apenas o pontapé inicial para uma história sobre amor e separação. Estrelado por Eva Green (que faz Sarah, nova integrante de um frota espacial com destino a Marte), o filme foca em seu relacionamento com sua filha que ainda é uma criança.

Com um olhar mais intimista, a história retrata Sarah treinando longe de casa e de sua família. Além de enfrentar a saudade e a pressão de ser uma mãe que trabalha fora, a astronauta também precisa lidar com o machismo e desconfiança de seus colegas homens. Os contrastes entre ela e os outros astronautas são bem colocados para expor as pressões vividas pelas mulheres profissionais e mães. Enquanto o outro tripulante Mike (Matt Dillion) conta com a ajuda de sua esposa para cuidar das crianças pelo mesmo período, Sarah vive a preocupação de que seu ex-marido não conseguirá dar conta do trabalho. 

Eva Green consegue passar emoção e sensibilidade em cada cena, principalmente quando divide o tempo de tela com a atriz mirim Zélie Boulant (que interpreta sua filha, Stella). A relação de confiança e intimidade das duas é de fácil conexão e isso torna o drama tão palpável. Afinal, ter medo de ficar sem a mãe é comum à maioria das crianças e todo mundo já foi criança.

Ao longo do filme, Sarah passa a sentir-se solitária. Nenhum de seus companheiros consegue entender sua situação e sua dor. A culpa também permeia a cabeça da astronauta, especialmente quando percebe que está perdendo momentos-chave da vida da filha. A cobrança para ser uma mãe e uma profissional perfeita (ao mesmo tempo) levam-na a tentar conciliar os dois mundo desastrosamente. Em nenhum momento, seus colegas, homens, tentam ou passam pelo mesmo. A Jornada é um filme doloroso em muitos momentos. A dor da separação, da adaptação, da solidão, da rejeição, da dificuldade, da saudade. E talvez o mais inovador desta obra seja nos instigar a pensar que essas dores não deveriam ser apenas femininas.