Music

Franz Ferdinand – ao vivo

Antes tarde do que nunca, escoceses incendeiam a capital paranaense com performance arrasadora na Ópera de Arame

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Texto por Abonico R. Smith

Fotos de iaskara

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Catorze anos separam o novo álbum, o sexto da carreira, do trabalho de estreia destes escoceses. De lá para cá muita coisa mudou. O modo de consumir música e o modelo de negócios na indústria fonográfica, a formação da banda e, sobretudo, a fama. Com uma coleção de hits espalhados ao longo do caminho, o grupo escocês com o nome do arquiduque austríaco cujo assassinato foi o estopim para o início da primeira Guerra Mundial é hoje um nome reverenciado. Toca sem parar nas pistas de dança e nas programações das emissoras de rádio mais descoladas. Já visitou o Brasil várias vezes e, nesta semana, esteve por aqui de novo.

O show realizado na Ópera de Arame, na noite de quinta 11 de outubro de 2018, foi o primeiro em Curitiba e a abertura de sequência de três noites seguintes em território verde e amarelo (nos dias seguintes as datas seriam em São Paulo, também dentro da série Popload Gig, e em Natal, no festival Mada). Para uma cidade, marcada pelo conservadorismo em todos os terrenos, inclusive o musical, e há muitos anos jogada à margem do circuito dos shows internacionais mais relevantes que passam pelo país, assistir a um show de uma banda com uma década de meia de carreira poderia ser algo muito duvidoso. Afinal, uma carreira já estabilizada geralmente rende shows mais pragmáticos, corretos mas sem aquele sangue nos olhos de artistas iniciantes, de gente que respeita os fãs ali na frente mas também já não se doa tanto assim durante a performance.

Com o Franz Ferdinand, felizmente, não existe nada disso. O grupo escocês sobe no palco como se aquele fosse a última apresentação de sua trajetória. E o que se viu na Ópera de Arame, para sorte dos curitibanos, foi exatamente isso. Um vocalista carismático, classudo, se entregando sem parar. Alex Kapranos conversa com plateia, comunica-se com gestos e olhares, vem em direção à plateia para tocar na turma do gargarejo e comanda um show digno de brilho na alma. Músicos aos seu lado idem, sobretudo os dois recém-incorporados. Substitutos do egresso Nick McCarthy, o guitarrista Dino Bardot e o tecladista/guitarrista Julian Corrie nem pareciam ter entrado agora no grupo, de tão integrados que estavam, cantando tudo, entrando na coreografia de palco (que de vez em quando brinda a plateia com aquelas cenas mais icônicas do rock, como a escalada na caixa de retorno, o erguimento do cálice sagrado e o pau para coma com o braço das guitarras). Acrescentam demais aos backings do frontman e ainda ficam dançando e pulando energeticamente a todo instante, como se sempre tivessem feito parte da banda e composto e gravado aquelas mesmas músicas mais antigas.

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Por se tratar de uma turnê do disco novo, claro que boa parte do repertório acabou dedicada a faixas de Always Ascending, lançado no comecinho de fevereiro e aquele é o trabalho mais eletrônico da banda. Contudo, apesar de desconhecidas de boa parte dos fãs, as novas músicas acabam funcionando muito bem ao vivo. Primeiro porque a banda se dedica a tocar integralmente quando sobe aos palcos, sem apelar para qualquer tipo de base pré-gravada. E também porque Corrie comanda os efeitos no mooge se ainda faz presente para preencher harmonicamente a tessitura da banda. “Glimpse Of Love”, “Always Ascending”, “Feel The Love Go” e “Lazy Boy” mostraram-se bons exemplos disso.

A versatilidade de Julian ainda contribui para os momentos matadoras nos quais ele assume a terceira guitarra em cena. Quando ele se junta à fila da frente com Kapranos, Bardot e o baixista Bob Hardy, aí mesmo que não há – sendo fã assumido ou um crítico musical daqueles mais chatos – que resista a se embalar com a dobra de riffse levadas funkynas seis cordas (“Take Me Out”, “Michael”, “Do You Want To”, “No You Girls”). Estrategicamente, esses principais hits da banda são disposto de forma sequencial no começo e no final do show, dando o combustível necessário para a plateia pegar fogo nos momentos certos.

Por fim, vale a pena ressaltar aquele que faz girar todo o meio-campo sem aparecer muito para a torcida. Paul Thompson, o baterista agora de longos cabelo meio platinados meio raiz escura já aparecendo, é a força que move esta majestosa discothéque orgânica e rock’n’roll chamada Franz Ferdinand. Sim, porque está é uma das poucas bandas no universo que tem a ousadia de rimar “party” (o substantivo “festa”) com “arty” (o adjetivo “artístico/a”) e comprovar isso ali, na chincha e não apenas no estúdio, a cada show que faz.

Felizmente, para o sempre relegado público curitibano, uma década e meia de espera acabou nesta noite de 11 de outubro. Antes tarde do que nunca. E, no caso do FF, com uma gig com a mesma energia típica de um artista em início de carreira. Que incendeia, sempre de modo frenético e ao som do incontrolável bordão-refão “this fire is out of control/ We’re gonna burni this city” (“This Fire”, sempre guardada para o gran finale), cada cidade por onde passa. A capital paranaense, para variar, não ficou imune.

Set list: “Feel The Love Go”, “Lazy Boy”, “Do You Want To”, “No You Girls”, “Walk Away”, “Paper Cages”, “The Dark Of The Matinée”, “Love Illumination”, “Glimpse Of Love”, “Stand On The Horizon”, “Slow Don’t Kill Me Slow”, “Michael”, “Take Me Out” e “Ulysses”. Bis: “Finally”, “Always Ascending”, “Come On Home”e “This Fire”.