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A Ordem do Tempo

Conceituada diretora italiana Liliana Cavani volta aos cinemas adaptando para uma história ficcional conceitos de um livro de física quântica

Texto por Abonico Smith

Foto: Pandora Filmes/Divulgação

Liliana Cavani é sinônimo de reverência no cinema italiano. Contemporânea de nomes como Michelangelo Antonioni, Bernardo Bertolucci e Pier Paolo Pasolini, ela não dirigia um longa-metragem para as grandes telas desde o início deste século – mais precisamente desde 2002, quando foi lançado O Retorno do Talentoso Mr Ripley, com John Malkovich encabeçando o elenco. Passadas duas décadas e já à beira de completar a nona década de idade (hoje está com 91 já), ela encarou o desafio de acrescentar mais um título à sua extensa trajetória. Com um bom grau de dificuldade na narrativa.

A Ordem do Tempo (L’ordine del Tempo, Itália, 2023 – Pandora Filmes) chega esta semana ao Brasil trazendo para a sétima arte conceitos e discussões a respeito… de física quântica! Cavani se interessou tanto pelo livro homônimo do físico Carlo Rovelli que o chamou para também coescrever o roteiro. Mas como transpor teorias tão abstratas para uma obra audiovisual?

A saída foi inventar um núcleo de dramaturgia que pudesse usar em seus diálogos muito do que está nas páginas escritas por Rovelli. Assim, Cavani criou um grupo de amigos que ano após ano se reúnem à beira da praia, em uma luxuosa casa situada em um pequeno e sossegado vilarejo italiano. A desculpa da vez é, agora, a comemoração do meio século de idade da proprietária da residência. Isto posto, devido ao renome de Liliana na área, também pode dar ao filme um elenco recheado de grandes atores, como, por exemplo, Claudia Gerini (Elsa) e Alessandro Gassman (Pietro, seu marido).

A tranquilidade da reunião, entretanto, é abalada por uma alarmante notícia: a possibilidade de um asteroide batizado Anaconda, chocar-se contra a Terra e provocar o tão temido e polemizado fim do mundo. É o que basta para a mudança de comportamento de todos os que estão naqueles dias na casa, de Elsa à sua empregada sulamericana, passando por cada um dos convidados. Então, tendo como base considerações a respeito da passagem do tempo e de como isso se reflete na humanidade (inclusive a sensação de proximidade da finitude), é um tal de jorrar conversas, diálogos e até alguns pitis. Segredos escondidos das personagens se revelam em sequência para o espectador, assim como momentos de desconcentração também são promovidos por gente “alheia” ao grupo como Charlie Chaplin e Leonard Cohen. O primeiro aparece enquanto alguns deles caem na gargalhada ao assistir à clássica cena de Em Busca do Ouro (1925) na qual Carlitos “come” uma botina e seu cadarço. O outro canta a música “Dance Me To The End Of Love” no DVD extraído de um concerto, fazendo todos os amigos engatarem improvisadas coreografias.

Só que A Ordem do Tempo esbarra em um grande porém que acaba tornando-o maçante. É uma história baseada em diálogo demais e ações de menos. Reúne muita gente falando, falando, falando quase ao mesmo tempo em praticamente uma mesma localidade (também… o que esperar de um filme que importa conceitos e teorias de física quântica a um exercício de ficção dramatúrgica?). Mesmo que as personagens sejam diferentes em seus temperamentos e personalidades, tudo se torna arrastado. Talvez adaptada para o teatro, onde a quarta parede do palco é o público in loco, isso funcionasse melhor e fosse mais cativante do que como um audiovisual exibido numa tela, seja na sala de cinema e ou depois no streaming em casa. Talvez ficar só na leitura do livro de Rovelli possa-se entender melhor a física quântica que acabou dispersa no roteiro do longa-metragem.

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